GREE NO BRASIL: a trajetória de uma multinacional chinesa de condicionadores de ar. www.espm.br/centraldecases



Documentos relacionados
18 de maio, 19h30. Minhas primeiras palavras são de saudação ao colega Ministro Gao Hucheng, que

a entrada da chery no mercado automotivo brasileiro, o desafio da multinacional chinesa

O Mundo em 2030: Desafios para o Brasil

Por uma nova etapa da cooperação econômica Brasil - Japão Câmara de Comércio e Indústria Japonesa do Brasil São Paulo, 11 de Julho de 2014

Estratégia Internacional

* (Resumo executivo do relatório Where does it hurts? Elaborado pela ActionAid sobre o impacto da crise financeira sobre os países em

Julia Paletta Mestre em Economia Internacional pela Universidade de Xangai

Exportação de Serviços

Informe 05/2011 AS RELAÇÕES COMERCIAIS BRASIL- CHINA NO SETOR DE ROCHAS ORNAMENTAIS E DE REVESTIMENTO: SITUAÇÃO ATUAL E PERSPECTIVAS DE EVOLUÇÃO

BNDES Financiamento à Indústria de Base Florestal Plantada. Outubro de 2014

Após a década de 1990, várias pessoas em todo o mundo mantêm hábito de consumo semelhantes.

RISCOS E OPORTUNIDADES PARA A INDÚSTRIA DE BENS DE CONSUMO. Junho de 2012

Brasil-China: Uma Agenda de

MOTIVAÇÕES PARA A INTERNACIONALlZAÇÃO

Lições para o crescimento econômico adotadas em outros países

Pequenas e Médias Empresas no Canadá. Pequenos Negócios Conceito e Principais instituições de Apoio aos Pequenos Negócios

Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia

Colégio São Paulo Geografia Prof. Eder Rubens

Manual do Integrador. Programa de Formação

Exercícios sobre Tigres Asiáticos

Como Investir em Ações Eduardo Alves da Costa

com produtos chineses perderam mercado no exterior em China Sendo que, esse percentual é de 47% para o total das indústrias brasileiras.

Plano Brasil Maior e o Comércio Exterior Políticas para Desenvolver a Competitividade

Medidas de Incentivo à Competitividade. Min. Guido Mantega 05 de Maio de 2010

Japão, Tigres asiáticos e China

1. Informações Institucionais

Descrição do Sistema de Franquia. Histórico do Setor. O Fórum Setorial de Franquia

Emilio Botín: O objetivo é nos tornarmos o banco privado número um do Brasil

SOLICITAÇÃO PARA APRESENTAÇÃO DE MANIFESTAÇÕES DE INTERESSE Nº 006/2012 SELEÇÃO DE CONSULTOR INDIVIDUAL

TRABALHO DE ECONOMIA:

Seminário RMC e os desafios para o século XXI OBSERVATÓRIO DAS METRÓPOLES/UFPR

Em Crise Profunda no Mercado Interno. Em Expansão Acelerada nos Mercados Externos

ESTRATÉGIAS CORPORATIVAS COMPARADAS CMI-CEIC

A sustentabilidade da economia requer em grande medida, a criação duma. capacidade própria de produção e fornecimento de bens e equipamentos,

COMÉRCIO EXTERIOR. Causas da dívida Empréstimos internacionais para projetar e manter grandes obras. Aquisição de tecnologia e maquinário moderno.

cargas tributárias para empresas no mundou

Welcome Call em Financeiras. Categoria Setor de Mercado Seguros

Sustentabilidade nas instituições financeiras Os novos horizontes da responsabilidade socioambiental

BRICS e o Mundo Emergente

SEMINÁRIO INTERNACIONAL CACHUELA ESPERANZA EM LA CUENCA INTERNACIONAL DEL RIO. Cochabamba(Bolívia) 14 e 15 de junho de 2011.

São Paulo: múltiplas oportunidades que impulsionam seus negócios

A nova classe média vai às compras

ANO % do PIB (Aproximadamente) % do PIB mundial % do PIB mundial % do PIB mundial 2013/ % do PIB mundial

Comentários gerais. consultoria em sistemas e processos em TI, que, com uma receita de R$ 5,6 bilhões, participou com 14,1% do total; e

Desafio Logístico 2013

NOTAS ECONÔMICAS. Regimes cambiais dos BRICs revelam diferentes graus de intervenção no câmbio

As relações Rússia e China na primeira década do século XXI 1

O Marketing Esportivo evoluiu. A Escala também.

Projeto Setorial de Exportação. ABF Associação Brasileira de Franchising

O processo de abertura comercial da China: impactos e perspectivas

COLÉGIO XIX DE MARÇO excelência em educação

Como a JETRO poderá apoiar os exportadores brasileiros

O BNDES e a Internacionalização das Empresas Brasileiras

BRASIL ARTE CONTEMPORÂNEA. Programa Setorial Integrado de Promoção às Exportações da Arte Contemporânea Brasileira.

Seminário A economia argentina e as perspectivas das relações com o Brasil e o Mercosul Rio de Janeiro, 22 de agosto de 2008

Novas Políticas Operacionais BNDES. Rio de Janeiro, 14 de fevereiro de 2006

INTERNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS BRASILEIRAS

Contax. Operação com Portugal Telecom e Dedic GPTI. Janeiro de 2011

Síntese do planejamento e os impactos para o país com a Copa do Mundo 2014

Desafios para o desenvolvimento da Tecnologia de Informação e Automação

Instituto de Engenharia

BNDES Prosoft. Programa BNDES para o Desenvolvimento da Indústria Nacional de Software e Serviços de Tecnologia da Informação

Desempenho da Agroindústria em histórica iniciada em Como tem sido freqüente nos últimos anos (exceto em 2003), os

Indicadores de Desempenho Julho de 2014

crescimento nos últimos cinco anos. Desde 1995, as vendas cresceram num total de 85%. A maior parte das vendas da GE no ano 2000 ocorreram em seu

Resumo Aula-tema 05: Análise Comparativa do Desenvolvimento Econômico da Índia e da China

Conclusão. Patrícia Olga Camargo

DESENVOLVIMENTO DAS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS, GERAÇÃO DE EMPREGO E INCLUSÃO SOCIAL. XII Seminario del CILEA Bolívia 23 a 25/06/2006

Tributação e Incentivos à Inovação

SEGUROS E RESSEGUROS

Glauco Arbix Observatório da Inovação Instituto de Estudos Avançados - USP. Senado Federal Comissão de infra-estrutura Brasília,

Rio de Janeiro: o melhor lugar para a sua empresa no Brasil

Instrumentalização. Economia e Mercado. Aula 4 Contextualização. Demanda Agregada. Determinantes DA. Prof. Me. Ciro Burgos

Conheça a trajetória da empresa no Brasil através desta entrevista com o Vice- Presidente, Li Xiaotao.

IMF Survey. África deve crescer mais em meio a mudanças nas tendências mundiais

Oracle Financing: A Maneira Mais Rápida e Acessível de Adquirir Soluções de TI

RELATÓRIO DE MISSÃO INTERNACIONAL À ALEMANHA

A COMPETITIVIDADE E O CRESCIMENTO DA ECONOMIA AÇORIANA - OPORTUNIDADES NO QUADRO DO HORIZONTE 2020

Debate Quinzenal Economia Intervenção do Primeiro-Ministro José Sócrates


fev./2010. ago./2011. fev./2012. nov.

Crescimento Econômico Brasileiro: Análise e Perspectivas

Planejamento Estratégico do Setor de Florestas Plantadas -2012

Ser grande não significa ser mais rico, e ter relevância em um dos indicadores não confere a cada país primazia em comparação a outro.

Cadeias de Valor e Aglomerações Empresariais Estratégias para Inserção Competitiva. Luiz Gilberto Mury

ELABORAÇÃO DE CENÁRIOS ECONÔMICOS E SOCIAIS. IETS Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade

Competitividade da indústria nacional de PCs Política industrial e incentivos fiscais no Brasil. 6 de outubro de 2009

Prova de Informática Petróleo e Gás PROVA DE INFORMÁTICA BÁSICA PETRÓLEO & GÁS

Nossos últimos assuntos foram: Formas de Acesso à Tecnologia. Nesta aula veremos: O Empreendedor e suas Interações. INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

O COMÉRCIO EXTERIOR DO BRASIL

O Cenário Econômico Brasileiro e as Oportunidades de Investimentos

Manufatura de Brinquedos Estrela S. A. Autora: Nádia Pontes Mantovani. Orientadora: Profª. Ms. Helane Cabral Universidade Presbiteriana Mackenzie

Empresas aéreas continuam a melhorar a rentabilidade Margem de lucro líquida de 5,1% para 2016

A INDÚSTRIA BRASILEIRA E AS CADEIAS GLOBAIS DE VALOR

1. (FGV 2014) A questão está relacionada ao gráfico e ao texto apresentados.

01/12/2010. A AFD no Brasil : uma nova fonte de financiamento do desenvolvimento urbano

Cenário Geral do Desenvolvimento Econômico da China A Política de GO OUT da China

O Processo de Integração Energética na América do Sul e o Papel Estratégico do Brasil

Resumo Aula-tema 03: Desenvolvimento Econômico da China

Micro e Pequena Empresa: Conceito e Importância para a Economia.

Transcrição:

GREE NO BRASIL: a trajetória de uma multinacional chinesa de condicionadores de ar www.espm.br/centraldecases

GREE NO BRASIL: a trajetória de uma multinacional chinesa de condicionadores de ar Preparado por Prof. Diego Pautasso, da ESPM-RS. Recomendado para as disciplinas de: negócios internacionais e relações internacionais. Este caso foi escrito inteiramente a partir de informações cedidas pela empresa e outras, obtidas no meio eletrônico e em pesquisa bibliográfica mencionadas no tópico Referências. Não é intenção do autor avaliar ou julgar o movimento estratégico do setor em questão. Este texto é destinado exclusivamente ao estudo e à discussão acadêmica, sendo vedada a sua utilização ou reprodução em qualquer outra forma. A violação aos direitos autorais sujeitará o infrator às penalidades da lei. Direitos Reservados ESPM. Outubro 2011 www.espm.br/centraldecases

RESUMO O presente estudo de caso aborda o Brasil no processo de internacionalização da GREE, empresa chinesa considerada a maior fabricante mundial de condicionadores de ar. O objetivo é contribuir para a compreensão da crescente presença de investimentos externos diretos (IED) chineses no Brasil a partir da experiência da GREE. PALAVRAS-CHAVE China, condicionadores de ar, GREE. Central de Cases 3

SUMÁRIO 1. Introdução... 5 2 A trajetória da GREE e o desenvolvimento chinês... 5 2. IED e multinacionais chinesas no Brasil... 6 3. A GREE e o setor de condicionadores de ar... 8 4. Mais reflexões... 8 5 Referências... 9 Central de Cases 4

Introdução A China tem crescido em ritmo acelerado nas três últimas décadas, sobretudo depois da política de Reforma e Abertura (1978) conduzida por Deng Xiaoping. O resultado do fortalecimento da economia da China tem sido a crescente capacidade de realização de investimentos externos diretos em vários setores e em diversos países. Esse movimento de internacionalização das empresas chinesas revela o fortalecimento produtivo do país e, sobretudo, o suporte financeiro estatal que ampara tal dinamismo. Dessa forma, quais seriam os interesses da GREE ao visualizar o mercado brasileiro como um dos seus primeiros movimentos de internacionalização? A Trajetória da GREE e o desenvolvimento chinês A trajetória da GREE somente pode ser compreendida a partir do desenvolvimento contemporâneo chinês, com suas contradições e reveses ao longo do século 20. Segundo Oliveira (2003, p. 5), o desenvolvimento da China foi resultado de quatro grandes ciclos revolucionários: a proclamação da República (1911); a Revolução Chinesa (1949); as Reformas (1978); e a inserção do país na 3ª Revolução Industrial. Nesse sentido, a política de Reforma e Abertura desencadeada por Deng Xiaoping criou as condições para alavancar o desenvolvimento da China, mas este não seria possível sem a Revolução Chinesa (1949) de Mao que assentou as bases da infraestrutura, da unificação territorial, da reorganização política e da formação de mão de obra a partir da melhoria das condições educacionais e sanitárias. O crescimento expressivo da China após a política de Reforma e Abertura (1978) coincidiu com o fortalecimento do mercado doméstico e, consequentemente, do parque produtivo nacional. A proliferação de empresas e a reestruturação das existentes deram-se por meio da assimilação de tecnologias e processos produtivos adotados pelas companhias que se estabeleciam no país oriental. Na virada do século 20 para o 21, as corporações chinesas se fortaleceram e inauguraram um ciclo de internacionalização por meio de uma combinação de reforma com capacidade e suporte estatais. A marca GREE foi fundada em 1991 e já é considerada a maior empresa especializada em condicionadores de ar do mundo. A dimensão da empresa pode ser medida através de vários elementos, entre eles: a presença em mais de 100 países; o faturamento bruto em 2008 de 42 bilhões de yuan 1 e a receita líquida de 1,967 bilhão de yuan; o volume de produção de 88 milhões de unidades em 2008 (assumindo desde 2005 a liderança global); a estrutura produtiva composta de seis unidades fabris: em Zhuhai (sede), Chongqing (China), Hefei (China), Manaus (Brasil), Paquistão e Vietnã, totalizando mais de 40.000 empregados diretos; a criação e o desenvolvimento de 20 variedades, em torno de 400 séries distintas e cerca de 7.000 modelos específicos, envolvendo cerca de 2.000 patentes técnicas registradas. Com efeito, a GREE tornou-se uma das 100 melhores empresas chinesas eleitas pela revista Fortune. Cabe ilustrar ainda que a GREE logrou participar do projeto de refrigeração da Vila da Imprensa nos Jogos Olímpicos de Pequim (2008) e de dois dos principais estádios da Copa do Mundo, na África do Sul, em 2010 (GREE, 2010). (1) Moeda chinesa Fábrica de Zhuhai 2 Fábrica do Vietnã 3 (2) (3) Fonte: site GREE - http://www. gree.com.br/pt/ conheca-a-gree.php Central de Cases 5

Dessa forma, a GREE é parte de um movimento mais amplo de afirmação das multinacionais chinesas, ou seja, trata-se de uma das manifestações mais evidentes do desenvolvimento da China e do aumento do peso de sua economia no mercado mundial. A ampliação dos investimentos externos diretos por parte da economia chinesa reflete o desenvolvimento tecnológico e a modernização das estruturas produtivas do país oriental nas últimas décadas. Na verdade, empresas chinesas ampliam sua participação no mercado mundial com empresas de setores diversos, tais como, de recursos naturais, como a Sinopec de petróleo; de comunicação, como a Huawei e a ZTE; de linha branca, como Haier, Midea e GREE; de tecnologia da informação, como a Lenovo; de monitores e televisores, como a AOC; de automóveis, como a Chery e a JAC Motors; de equipamentos eletrônicos, como a SVA; de energia renovável, como a Suntech de painéis solares; entre outras (PAUTASSO, 2008). A Chery 4 revela a ofensiva comercial das multinacionais chinesas, em especial das montadoras automotivas (PAUTASSO, 2010). Inclusive, agora a montadora chinesa anunciou uma fábrica com investimentos previstos de 400 milhões de dólares no interior de São Paulo, além de abrir um centro de pesquisa no Brasil entre 2012 e 2013 que poderá abrigar pelo menos 100 engenheiros para desenvolver veículos voltados ao público sul-americano e ajudar nos estudos sobre uma eventual produção de motores no Brasil, com investimento de cerca de 60 milhões de dólares. Esse esforço é para alcançar, até 2013, 3% do mercado automotivo brasileiro (O GLOBO, 2010). Cabe notar que a Chery é parte de uma ofensiva mais ampla de inúmeras montadoras, entre elas a JAC, a Lifan, a Chana, e a Effa, entre outras que, com maior ou menor êxito, estão entrando no mercado nacional. A GREE, nesse sentido, também tem buscado a internacionalização como forma de consolidação no mercado mundial e, da mesma forma que a montadora Chery, tem priorizado os mercados emergentes. No caso do Brasil, a empresa aproveitou o período de abertura da economia nos anos 1990 e os desafios do baixo crescimento econômico. Na última década, contudo, a ampliação da classe C (R$ 1.126 a R$ 4.854) fortaleceu o mercado doméstico e beneficiou amplamente o segmento da indústria de bens de consumo duráveis 5. IED e multinacionais chinesas no Brasil Os investimentos externos diretos (IEDs) estão ligados ao processo de internacionalização das empresas. Tal processo evoluiu sensivelmente a partir dos anos 1990 em escala global. No caso do Brasil, as políticas liberalizantes intensificaram as fusões e aquisições de empresas brasileiras, em grande medida devido às políticas macroeconômicas recessivas (juros altos, arrocho fiscal, câmbio valorizado) e à abertura econômica daquela década (GONÇALVES, 2005, p. 181-183). O aumento dos fluxos também é parte da fragmentação e integração das cadeias produtivas em escala global, redefinindo a divisão internacional do trabalho com a Revolução Científico-Tecnológica em curso. Aliás, no Brasil, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), criado para dar apoio ao desenvolvimento nacional em 1942, foi autorizado a apoiar grupos estrangeiros, em 1997, e proibido de financiar empresas estatais nacionais, em 1998. Mais do que isso, os recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador foram colocados à disposição de capitais estrangeiros, em parte para financiar o processo de privatização. Como a maior parte do setor privatizado era de serviços (energia e telecomunicações) não exportáveis, o resultado foi o envio de remessas para o exterior (lucros, royalties, pagamento por assistência técnica, etc.) e o menor efeito sobre a dinamização do parque produtivo nacional (PIQUET, 2007, p. 104-105). (4) Estudo escrito pelo autor e disponível em: http://www.espm. br/publicacoes/ CentralDeCases/ Documents/CHERY. pdf (5) Ver notícia na Agência Brasil. Disponível em: http://agenciabrasil. ebc.com.br/ noticia/2011-02-09/ ibge-bens-deconsumo-duraveisajudaram-puxarcrescimento-daproducao-industrial. Acesso em 01/07/2011. Central de Cases 6

No Brasil, o predomínio do investimento externo brownfield (voltado a aquisições) não regulamentados constrangeu o desenvolvimento do parque produtivo nacional. E como sublinha Chang (2009, cap. 4), a regulamentação dos IEDs foi elemento-chave na trajetória dos países atualmente desenvolvidos. Não por acaso, a modernização da economia chinesa utiliza-se do IED para absorver tecnologia, aumentar a capacidade produtiva com novos investimentos (greenfield) e gerar divisas com obrigações de exportação. A crescente presença dos investimentos externos diretos da China no Brasil reflete, de um lado, o crescimento e a modernização da China e, de outro, a aproximação econômica e comercial sino-brasileira. A China tornou-se, em 2009, o maior parceiro comercial do Brasil, com um fluxo de comércio de 36,1 bilhões de dólares, superando o histórico maior parceiro brasileiro, os Estados Unidos. Isso contribuiu para o país oriental tornar-se o principal destino das exportações brasileiras, totalizando um valor de 20,1 bilhões de dólares ou mais de 13,1% do total exportado (PAUTASSO, 2010). Em 2010, a China tornou-se a 2ª maior economia do mundo, suplantando o PIB japonês em dólares afinal, em 2009 o PIB chinês foi apenas 3% menor que o do Japão, somando 4,9 trilhões de dólares. Cabe destacar que, como a China mantém sua moeda artificialmente desvalorizada em até 40%, distorcendo as relações de preços com os demais países, o PIB em dólares subestima a real produção de riqueza do país oriental diferentemente de uma medição feita de poder de paridade de compra (PPC). O fortalecimento da economia chinesa tem como efeito a crescente exportação de capitais, sobretudo para os mercados emergentes, já que a China sofreu com a retração dos mercados desenvolvidos. Estima-se, pois, que a China tenha se transformado no maior investidor direto no Brasil em 2010, sobretudo nos setores intensivos em recursos naturais, como energia, minérios, entre outros (CBCDE, 2010). Portanto, o fortalecimento das relações entre China e Brasil explica o crescimento não somente do comércio, mas do fluxo de investimentos externos diretos. De um lado, há as empresas brasileiras que se estabeleceram na China, tais como: a Maxion, que produz rodas; a Fras-le, que produz autopeças para montadoras instaladas na China; a WEG, que produz motores elétricos, especialmente para exportação; a Embraco, que produz compressores; a Embraer, que produz aviões em associação com uma estatal chinesa (SHIN, 2008, p. 15-22); além de empresas que só têm escritórios, como Gerdau, por exemplo. Entretanto, devido à evolução das relações bilaterais, outras empresas, como a Sadia, estão tentando consolidar-se no dinâmico mercado chinês. De outro lado, os investimentos chineses no Brasil se apresentam em volume maior e em rápido crescimento. As grandes empresas chinesas já têm instalações no Brasil, como a SVA, a Huawei, a GREE, a Midea, a Sany, a Lenovo, entre outras (SHIN, 2008, p. 26-37). Conforme já assinalamos, são os investimentos chineses no Brasil em setores intensivos em recursos naturais que poderão alçar a China à condição de maior investidor na economia brasileira brevemente. São os casos da siderúrgica Wuhan Iron & Steel, que adquiriu parte da mineradora MMX; da petroleira Sinochen, que busca a exploração do petróleo do pré-sal; da State Grid, que está atuando na transmissão de energia elétrica, pois comprou os ativos da espanhola Plena; das mineradoras ECE e Honbridge, que estão explorando minério de ferro no País; do Chingqing Grain Group, que tem atuado na compra de terras no Nordeste para produzir soja; da Zongshen, que comprou a brasileira Kasinski para produzir motores em Manaus; entre outros casos. Portanto, a GREE é parte de um movimento mais amplo de estreitamento das relações Brasil-China, como veremos na próxima seção. Central de Cases 7

A GREE e o setor de condicionadores de ar A GREE decidiu estabelecer-se no Brasil em 1998 depois de consolidar-se como a maior fabricante de condicionadores de ar na China, em 1995. A afirmação do mercado chinês criou condições para a internacionalização através de investimento externo direto (IED). Antes de a GREE optar pelo IED no Brasil, a empresa começou exportando diretamente da China. Segundo Ronald, o Diretor de Marketing da empresa, a GREE primeiro buscou consolidar-se no mercado brasileiro, através de parcerias, para depois optar pela construção da fábrica no País. Ao perceber o potencial do mercado doméstico brasileiro, a empresa decidiu abrir uma unidade fabril no Brasil, considerado o maior país da América Latina e uma economia emergente. O desafio da entrada no mercado brasileiro começou com a escolha da Zona Franca de Manaus, em razão de suas isenções tributárias e do potencial do mercado setentrional brasileiro. O investimento total no Brasil foi de cerca de R$ 20 milhões de reais. Ao estabelecer a fábrica no Brasil, a GREE introduziu o sistema produtivo similar ao das unidades fabris na China, ao mesmo tempo em que realizou esforços para nacionalizar a produção, comprando itens e insumos de fábricas brasileiras. Ainda segundo Ronald, a GREE enfrentou o desafio de se adaptar a um novo sistema legal e outras referências culturais. De todo modo, a GREE passou a apostar no potencial de expansão do mercado brasileiro, seja pelo crescimento da economia e da renda, seja em razão de que apenas cerca de 20% das famílias brasileiras têm aparelhos de ar-condicionado. Ainda assim, segundo a ABRAVA, o Brasil ocupou o terceiro lugar no ranking mundial de aparelhos de janela no segmento de ar-condicionado, atrás apenas dos Estados Unidos e da Índia, e em nono lugar quando se fala em splits. O Brasil é um mercado em expansão em razão da entrada de novos consumidores potenciais relacionados com o alargamento da classe C. Da mesma forma, a mudança de aparelho, do condicionador de ar de janela para o split, gera novas demandas por aqueles que já possuíam o bem de consumo. A renovação dos aparelhos vincula-se tanto ao conforto quanto à melhora da eficiência energética dos novos produtos. De todo modo, cabe destacar o crescimento do setor de linha branca brasileiro nos últimos anos. Mesmo durante a crise, a redução do IPI permitiu a ampliação das vendas domésticas. O mercado de condicionadores de ar, contudo, é, segundo seu Diretor de Marketing, muito competitivo, em razão de empresas de renome que atuam no Brasil, como Carrier e Electrolux. A GREE, que já tem cerca de 50% do mercado chinês desses aparelhos, aposta em preço competitivo e, sobretudo, em se posicionar como uma empresa que produz aparelhos tecnologicamente de ponta. A empresa já ocupa uma posição de destaque no mercado brasileiro e tem aproveitado o dinamismo recente da economia brasileira que é um pivô de todo o mercado sul-americano. Mais reflexões O mercado de condicionadores de ar é um dos muitos que está se defrontando com as oportunidades e desafios de voltar-se para os segmentos de menor renda, em especial a nova classe média. As condições climáticas do Brasil associada à forte mobilidade social sugere uma nova abordagem para conquistar esses novos segmentos. O que representa a entrada das grandes corporações chinesas de eletrodomésticos, como GREE e Midea, no mercado brasileiro? Como estas marcas estão enfrentando as mudanças culturais para adentrar num mercado tão distinto do chinês? Qual o maior desafio para alcançar estes novos segmentos sociais que passaram a integrar a classe C? Como criar alternativas de promoção/divulgação destes produtos junto ao novo segmento de mercado? Central de Cases 8

Referências CBCDE (Câmara Brasil-China de Desenvolvimento Econômico). China, 2ª do mundo, será a primeira em investimentos no Brasil. 2/8/2010. Disponível em: http://www.cbcde.org.br/ home/noticias_detalhe.asp?pacodnoticia=3842. Acesso em: 10/10/2010. CHANG, Ha-joon. Maus samaritanos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. GONÇALVES, Reinaldo. Economia Política Internacional. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. GREE. Conhecendo a GREE. Disponível em: http://www.gree.com.br/pt/conheca-a-gree.php. Acesso em: 06/10/2010. O GLOBO. Chery quer 3% do mercado brasileiro de veículos até 2013. Disponível em: http:// oglobo.globo.com/economia/mat/2010/10/05/chery-quer-3-do-mercado-brasileiro-deveiculos-ate-2013-922706969.asp. Acesso em: 07/10/2010. PAUTASSO, Diego. Multinacionais.... O comércio exterior na universalização da Política Externa Chinesa no século XXI. Meridiano 47 (UnB), v. 113, p. 14-16, 2009. PIQUET, Rosélia. Indústria e território no Brasil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Garamond, 2007. SHIN, Wong. A China explicada para brasileiros. São Paulo: Atlas, 2008. Central de Cases 9