DIARRÉIA EM TERAPIA NUTRICIONAL ENTERAL Grupo de Suporte em Terapia Nutricional CTI-A Hospital Israelita Albert Einstein Fevereiro/10



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Transcrição:

DIARRÉIA EM TERAPIA NUTRICIONAL ENTERAL Grupo de Suporte em Terapia Nutricional CTI-A Hospital Israelita Albert Einstein Fevereiro/10 O surgimento de diarréia durante internação hospitalar é evento comum, principalmente no doente crítico. uma definição consensual na literatura, tendo sido reportado grande variação na sua incidência (2% a 92%) principalmente devido a este fator. A definição mais comumente aceita é de aumento do conteúdo de água fecal, com conseqüente aumento no numero de evacuações (> 3 vezes / 24h) ou de volume (> 300g - 250 ml / 24h). Em pacientes críticos em uso de terapia nutricional enteral a freqüência reportada na literatura varia entre 15% e 38%. Os consensos de terapia nutricional em pacientes críticos recomendam fortemente a utilização de protocolos de investigação e manejo da diarréia em pacientes em terapia nutricional enteral. Na maioria das vezes a diarréia não esta relacionada à dieta enteral, mas sim a outros fatores. A estratégia de interrupção ou redução da dieta enteral em pacientes com diarréia não deve ser utilizada antes da realização de um algoritmo que permita identificar os fatores mais comumente relacionados com o desenvolvimento de diarréia. Dentre os fatores já identificados como fatores de risco para diarréia em pacientes críticos estão: Desnutrição Hipoalbuminemia Infecção Antibioticoterapia Drogas Laxantes Procinéticos Antagonistas H2 / Bloqueadores Bomba H+ Medicações com sorbitol / magnésio Fecaloma (pseudo diarréia)

Existem ainda fatores relacionados à terapia nutricional enteral. A administração da dieta de forma intermitente aumenta o risco de desenvolver diarréia quando comparada a infusão continua. Em relação à composição da dieta apenas três fatores podem estar relacionados à diarréia: contaminação bacteriana, alta osmolaridade e ausência de fibras. As fibras são constituintes da parede celular de plantas não digeríveis e presentes na maioria das formulas enterais. A sua fermentação no trato digestivo libera ácidos graxos de cadeia curta, que regulam absorção de sal e água no cólon e é o substrato energético preferencial do colonócito. As fibras solúveis em água são úteis no controle da diarréia e as fibras insolúveis no controle de obstipação, tendo uma meta-análise demonstrado benefício da utilização de formulações enterais com fibras na redução de incidência de diarréia. A diarréia relacionada à antibioticoterapia é a causa mais comum de diarréia nosocomial. Geralmente autolimitada tem relação com alteração da microflora intestinal, aumento da motilidade e diminuição da fermentação dos carboidratos. O uso de antibióticos pode deflagrar a superinfecção por Clostridium difficile, denominada colite pseudomembranosa. Os fatores de risco relacionados à infecção por Clostridium difficile são: Antibioticoterapia Cefalosporinas / Quinolonas Internação prolongada UTI Gravidade da doença de base Bloqueador bomba de H+ Sexo feminino Idade > 60 anos Nutrição enteral

Em pacientes críticos que apresentam diarréia é fundamental afastar a possibilidade de colite pseudomembranosa, principalmente naqueles com os fatores de risco acima. A investigação é realizada com a pesquisa da toxina do Clostridium difficile nas fezes, sendo necessária a coleta de duas amostras. Os pré-bióticos são substancias que promovem o crescimento da flora bacteriana intestinal normal, freqüentemente comprometida em pacientes críticos ou devido ao uso de antibióticos. As substancias mais estudas são a inulina e o fruto-oligossacarídeo (FOS). Os pró-bióticos são microorganismos capazes de reconstituir a flora intestinal como o Saccharomyces boulardii (Floratil ), Bifidobactrium lactis e Lactobacillus casei entre outros. Há evidência advinda de cinco meta-análises que demonstram benefício na utilização de probióticos na prevenção e tratamento da diarréia associada à antibioticoterapia. Devemos entretanto, ter o cuidado de não utilizar esta estratégia em pacientes com pancreatite aguda ou isquemia mesentérica, populações em que seu uso parece estar associado à maior mortalidade. Dispomos ainda de medicações antidiarréicas que podem ser utilizadas para redução no número e volume das evacuações. Atualmente no Brasil são a loperamida (Imosec ) e racecadotril (Tiorfan ). A sua utilização é segura desde que não utilizada em pacientes com colite pseudomembranosa, isquemia mesentérica ou infecções bacterianas enteroinvasivas. A eficácia entre as duas drogas em pacientes com diarréia aguda ambulatorial é semelhante, tendo a loperamida maior incidência de efeitos colaterais. A dose do racecadotril é de 100mg três vezes ao dia, enquanto da loperamida é de 2mg duas a seis vezes ao dia. Apresentamos algoritmo de conduta a ser realizado em pacientes em terapia nutricional enteral com diarréia. Como verão, são necessários vários passos anteriores a redução ou interrupção da dieta.

FLUXO DE DIARRÉIA em Terapia Nutricional Enteral* Diarréia Problema clínico E / OU > 3 EVACUAÇÕES FARMACÊUTICA Checa medicações NUTRICIONISTA Checa Forma administração, fórmula e fibras MÉDICO Checa suspensão antibiótico e fecaloma Sim Suspensão. Aguarda Evolução Sim Intermitente Contínua Osmolaridade Início de fibra Aguarda evolução Sim Suspensão. Aguarda Evolução LEUCÓCITOS FECAIS C DIFFICILE (2x) Coprocultura Considerar: Antibiótico Colonoscopia + - - + Tratamento PAUSA DIETA 4 HORAS DIMINUIR VOLUME 50% PRÓBIÓTICOS ANTIDIARRÉICOS * Aplicável em Imunossuprimido Investigar Desabsorção Dieta semi-elementar Nutrição Parenteral

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