patrimônio arquitetônico prof. lucas jordano
PATRIMÔNIO Do latim patrimoniu = patri + moniu = herança paterna Para a sociedade greco-romana, o pai tinha dever de suprir as necessidades materiais da família (construção ou aquisição do lar e dos objetos do lar), enquanto a mãe tinha dever de suprir as necessidades sociais/emocionais, além do dever de gerar e cuidar dos filhos. Uma união sem filhos não era considerada consumada. Logo, tal união era considerada uma herança da mulher, daí o termo matrimônio ser diverso do termo patrimônio.
Patrimônio edificado: HISTÓRICO ou ARTÍSTICO? O patrimônio histórico é herança da história que o conformou, por isso reflete o local e a época em que foi erigido, com seus valores, hábitos, costumes e nível de desenvolvimento científico. O patrimônio histórico edificado denuncia o caráter de um grupo social em determinado período do tempo. Entretanto, nem todo patrimônio histórico é artístico.
Dois fatores revelam a distinção entre o que é artístico e o que é habitual: 1. A arte revela um mundo ideal, que não pode ser concretizado maciçamente no mundo real. Logo, ela supera o habitual, na medida em que representa as maiores aspirações de um grupo em uma época. 2. A arte se faz através de um conjunto de intenções que não são totalmente reveladas pela forma materializada, permitindo a livre interpretação, mesmo em épocas posteriores à sua criação. Logo, apesar de ter origem em uma história específica, a supera, e inspira o futuro.
Todo patrimônio artístico é necessariamente histórico.
Por que preservar o patrimônio (herança)? [...] os homens, ao desenvolverem sua produção material e suas relações materiais, transformam, a partir da sua realidade, também o seu pensar e os produtos de seu pensar. Não é a consciência que determina a [realidade objetiva], mas a [realidade objetiva] é que determina a consciência. Karl Marx e Friedrich Engels Logo, a consciência de si no mundo forma-se através de uma conjuntura material específica, e preservá-la significa manter a possibilidade de transformar-se.
O usuário não tem o construir como atividade sistemática, repetitiva e contínua, por isso não chega a produzir uma reflexão que leva à abstração, à teorização e ao aperfeiçoamento. Assim sendo, nos grupos formados por não-arquitetos por profissão, as construções são imaginadas de acordo com a tradição, pois o ato de construir, em si, está abaixo do limiar da consciência teórica, que leva à crítica da própria tradição e ao estímulo para a mudança. Elvan Silva Só se define um rumo a partir do conhecimento prévio de um rumo anterior.
Qual a importância da preservação de patrimônios distantes de nossa origem? A identidade se constrói negativamente, pela diferença. Exemplo 1: em um jogo de dados, o número 1 se define por não ser nenhum outro, do 2 ao 6. Exemplo 2: a relativa simplicidade do barroco brasileiro, ao contrastar com a maior voluptuosidade do barroco europeu, define, através dessa diferença, sua identidade (ver O Brilho da Simplicidade, de Glauco Campelo).
GLOSSÁRIO
MONUMENTO conceitos O monumental não é o grandioso em termos de dimensão física, mas de dimensão histórica. Sua etimologia está no latim MONERE, que significa simultaneamente recordar e advertir. Monumento é memória, no entanto a ultrapassa, pois adverte contra o males na lógica, na ética e na estética.
[...] o monumento é um edifício que conserva seu valor e o transmite mais além de sua própria grandeza histórica, [...] uma forma arquitetônica que transmite um conteúdo ideológico, um conteúdo que se supõe capaz de conservar uma validez para além de sua conclusão, [...] é a obra de arte que atravessa os séculos conservando e transmitindo seu próprio valor ideológico. Giulio Carlo Argan
TOMBAR Inventariar, registrar, ou colocar sob a guarda do Estado, para preservação e proteção, um bem ou imóvel que tenha valor de alguma natureza para a sociedade. Divulga-se a explicação de que a palavra tem como base a Torre do Tombo, arquivo público de Portugal, onde eram arquivados os documentos referentes à guarda de bens. Na verdade, foi o contrário: o arquivo português, fundado em 1375 pelo rei D. Fernando I, recebeu esse nome porque na época 'tombo' já significava 'arquivo, inventário, registro de documentos'.
O nome 'torre' foi adotado por ter sido o arquivo instalado numa das torres do Castelo de Lisboa. (...) O verbo tombar, portanto, assim como a Torre do Tombo, provém de 'tombo'. E este termo, segundo o etimólogo A. Nascentes, está relacionado com 'tumba' - é como se os documentos arquivados ficassem sepultados. J. P. Machado tem outra explicação: para ele, 'tombo' vem de 'tomo', que tem origem no latim tomus [pedaço, parte].
PASTICHE Obra que imita outra, frequentemente de contexto histórico extremamente diverso. Também pode ser uma imitação estilística, e não de uma obra específica. O imitado pode ter valor artístico. A imitação, por maior refinamento técnico e compositivo que tenha, não. Como não mais existem as circunstâncias que geraram a obra original, o pastiche não só é destituído de valor artístico, como gera uma falsificação histórica, contando aos leigos uma história inverídica.
RE- (prefixo) conceitos O prefixo re- tem duas conotações: volta recuo, ou repetição (no sentido de fazer ou realizar novamente). A partir disso é possível analisar algumas tênues diferenças de significados entre termos correntes ao mundo das intervenções no patrimônio edificado.
RESTAURAR Fazer voltar a um estado anterior. Re-instaurar. Recuo ao estado que deu início. Mas comumente usado no sentido de consertar. Logo, apenas a matéria, o físico, pode ser restaurado. E mesmo assim, com matéria nova, logo, a rigor, o estado anterior será recuperado apenas visivelmente. A restauração não é garantia de qualificação utilitária e de vitalidade, pois a sociedade presente não age como a que ergueu aquele sítio histórico ou monumento.
REVALORIZAR conceitos Entendido no sentido de resgatar um valor perdido, ou dotar de novo valor. Utiliza-se o termo quando um sítio histórico ou monumento deixa de ser notado socialmente ou deixa de ser considerado um exemplo positivo (no sentido de bom, e não de exato) do passado de um grupo social. Logo, revalorizar se aproxima da ideia de dar visibilidade.
REQUALIFICAR conceitos Dotar um sítio histórico ou monumento de sentido pragmático para o presente. Ou seja: destiná-lo a uma função necessária à sociedade presente. Requalificar está ligado ao sentido de capacitar o edificado a fazer algo que antes ele não fazia. Isto porque a sociedade, ao longo do tempo, transforma-se e transforma seu modo de agir. Logo, o edificado precisa também transformar-se, mais especificamente em termos de uso, de destinação prática.
REVITALIZAR A vida é algo que o edificado não pode possuir literalmente. A vida, para o edificado, é tão somente metáfora. Metáfora que vem da presença física do humano. Neste sentido, revitalizar é trazer o homem de volta para o interior e os arredores do edificado. Logo, a revitalização parte de um conjunto de estratégias políticas e sociais que visem tornar o sítio histórico ou monumento, povoado, em todos os turnos do dia e épocas do ano.
CONSERVAÇÃO INTEGRADA As estruturas urbanas devem ser utilizadas na atualidade e transformadas, no que for necessário, para a satisfação das necessidades atuais, sem que as gerações futuras possam receber um patrimônio que comprometa a sua liberdade de utilização, memória e identidade. Logo, a ideia de conservação integrada vai além de ações para manutenção do bom estado físico do edificado, mas impõe a requalificação e a revitalização. Ou seja: a integração do edificado na dinâmica social presente.
TERMOS TÉCNICOS Consolidação: intervenção física com único objetivo de dar estabilidade à edificação com danos estruturais. Anastilose: é a reconstrução de partes arruinadas do edifício unicamente a partir de elementos originais encontrados no local. Exemplo: ao encontrar uma parede de pedras ou tijolos parcialmente arruinada, porém com as pedras ou tijolos originais espalhados nas imediações, a ação de anastilose será recompor a parede utilizandose apenas daquelas pedras ou tijolos encontrados no local, sem confecção de nenhum elemento perdido.
TÉCNICAS RETROSPECTIVAS Refere-se à ação mental de retroceder à época de construção do edificado, buscando na memória as referências compositivas e construtivas que levaram ao projeto do monumento ou sítio histórico, de modo a descobrir sua lógica interna. Logo, requer prévio conhecimento das especificidades dos estilos e técnicas construtivas da época referente ao edifício ou sítio histórico analisado.
A utilização de técnicas retrospectivas permite adquirir o máximo de conhecimento acerca do edifício, o que leva à uma possibilidade de tomar decisões mais responsáveis em relação ao patrimônio. Entretanto, cada caso reserva certo grau de liberdade em relação a tais decisões. Para entender as posições atuais a respeito das ações sobre o patrimônio, é necessário retroceder a um breve histórico acerca das teorias do restauro.
SÍNTESE HISTÓRICA DA TEORIA DO RESTAURO A síntese a seguir foi elaborada pelo professor Geraldo Gomes, a partir do livro Scienza ed arte del restauro architettonico, de Ambrogio Annoni, publicado em 1946. Esse conteúdo também pode ser encontrado no livro O que é Patrimônio Histórico, de Carlos A. C. Lemos.
Annoni define três estágios de conservação dos monumentos: 1. RUÍNA - edificações cuja estrutura e condições de uso estão seriamente comprometidas, quase sempre de recuperação praticamente impossível. 2. MONUMENTO DANIFICADO - construções com danos significativos em sua estrutura e com suas condições de uso comprometidas, mas que podem ser recuperadas. 3. MONUMENTO SÃO (ileso) - edificações boas para o uso, que podem se encontrar em três estados diferentes, a seguir:
3a. MODIFICADAS EM SUA FEIÇÃO ORIGINAL DEVIDO A ACRÉSCIMOS SUCESSIVOS deve-se adotar uma postura em relação a uma possível PURIFICAÇÃO. 3b. INCOMPLETAS, por não terem sido concluídas ou por terem sido mutiladas deve-se adotar uma postura em relação a uma possível COMPLEMENTAÇÃO. 3c. NECESSITANDO DE INTERVENÇÃO, apesar de possuírem suas características originais preservadas deve-se adotar uma postura em relação a uma possível REVALORIZAÇÃO.
A partir dessa classificação quanto ao estado físico do monumento, Annoni propõe sintetizar as posturas quanto à intervenção no patrimônio em 6 grandes grupos. Por vezes, uma postura se difere de outra apenas em relação à intervenção em um único estado de conservação, tendo semelhantes recomendações em relação aos demais.
o novo deve ser expressivo 1. Método Romântico (ROM) 2. Método Historicista (HIST) 3. Método Arqueológico (ARQ) 4. Método Científico (CIE) 5. Não Método (NME) 6. Método Artístico (ART) Preocupação com a integridade biográfica do edifício CIE maior aceitação ARQ NME ART Preocupação com a integridade plástica HIST ROM o novo deve parecer antigo