RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS

Documentos relacionados
RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS

RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS

medida. nova íntegra 1. O com remuneradas terem Isso é bom

RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS

Utilizando a ferramenta de criação de aulas

Objetivo: Relatar a experiência do desenvolvimento do software Participar. Wilson Veneziano Professor Orientador do projeto CIC/UnB

CURSINHO POPULAR OPORTUNIDADES E DESAFIOS: RELATO DE EXPERIÊNCIA DOCENTE

FORMAÇÃO PLENA PARA OS PROFESSORES

Freelapro. Título: Como o Freelancer pode transformar a sua especialidade em um produto digital ganhando assim escala e ganhando mais tempo

Aula 5 Modelo de Roteiro Para Ser Usado nas Suas Entrevistas

Pesquisa com Professores de Escolas e com Alunos da Graduação em Matemática

Presidência da República Casa Civil Secretaria de Administração Diretoria de Gestão de Pessoas Coordenação Geral de Documentação e Informação

Os 3 erros mais comuns na adoção dos tablets na sala de aula - e como você pode evitá-los

Professor BÓRIS em O DIREITO DE SER CRIANÇA

Estudo de Caso. Cliente: Rafael Marques. Coach: Rodrigo Santiago. Duração do processo: 12 meses

Hiperconexão. Micro-Revoluções. Não-dualismo

E.E. PROF. JOSÉ AUGUSTO LOPES BORGES SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DIRETORIA DE ENSINO REGIÃO ARAÇATUBA

O CAMINHO PARA REFLEXÃO

Organizando Voluntariado na Escola. Aula 3 Planejando a Ação Voluntária

O papel do CRM no sucesso comercial

Os desafios do Bradesco nas redes sociais

GRITO PELA EDUCAÇÃO PÚBLICA NO ESTADO DE SÃO PAULO

CONFLITO DE SER MÃE EMPREENDEDORA

18/11/2005. Discurso do Presidente da República

Fala, CMO! Com Marina Xavier da UnYLeYa

VOCÊ QUER LER EM INGLÊS EM APENAS 7 DIAS?

Por que o financiamento coletivo está se tornando um fenômeno social?

Módulo 1. Introdução. 1.1 O que é EAD?

Se você acredita que as escolas são o único e provável destino dos profissionais formados em Pedagogia, então, está na hora de abrir os olhos

COMO ENGAJAR UM FUNCIONÁRIO NO PRIMEIRO DIA DE TRABALHO?

Transcriça o da Entrevista

Bate-papo: Uso do Scratch, uma nova linguagem de programação, no ensino fundamental - Web Currículo (25/05/2010)

Produtividade e qualidade de vida - Cresça 10x mais rápido

OS LIMITES DO ENSINO A DISTÂNCIA. Claudson Santana Almeida


CURSO: LICENCIATURA DA MATEMÁTICA DISCIPLINA: PRÁTICA DE ENSINO 4

Como escrever melhor em 5 passos simples

A IMPORTÂNCIA DAS DISCIPLINAS DE MATEMÁTICA E FÍSICA NO ENEM: PERCEPÇÃO DOS ALUNOS DO CURSO PRÉ- UNIVERSITÁRIO DA UFPB LITORAL NORTE

Apresentação Institucional

PROPOSTA E ROTEIRO DO VÍDEO INSTITUCIONAL DA UNEB/COITÉ

Organizando Voluntariado na Escola. Aula 1 Ser Voluntário

Como usar o Portal Hydros

PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA PIBID RELATÓRIO DE ATIVIDADES DO ALUNO BOLSISTA SUBPROJETO DE Semestre de 2011

A Tecnologia e Seus Benefícios Para a Educação Infantil

Quando era menor de idade ficava pedindo aos meus pais para trabalhar, porém menor na época não tinha nada e precisei esperar mais alguns anos.

Rousseau e educação: fundamentos educacionais infantil.

Presidência da República Casa Civil Secretaria de Administração Diretoria de Gestão de Pessoas Coordenação Geral de Documentação e Informação

Projeto Você pede, eu registro.

SUA ESCOLA, NOSSA ESCOLA PROGRAMA SÍNTESE: NOVAS TECNOLOGIAS EM SALA DE AULA

BOLETIM INFORMATIVO JAN/FEV.

Passo a Passo. Portal Hydros.

Caderno do aluno UM POR BIMESTRE: teoria, exercícios de classe, as tarefas de casa atividades complementares.

Aprenda como estudar em quatro etapas PORVIR

O Programa de Desenvolvimento Educacional e suas Interfaces

Presidência da República Casa Civil Secretaria de Administração Diretoria de Gestão de Pessoas Coordenação Geral de Documentação e Informação

Transcrição aula inaugural Professor Irineu Mario Colombo, reitor do Instituto Federal do Paraná Fevereiro de 2013

Presidência da República Casa Civil Secretaria de Administração Diretoria de Gestão de Pessoas Coordenação Geral de Documentação e Informação

ED WILSON ARAÚJO, THAÍSA BUENO, MARCO ANTÔNIO GEHLEN e LUCAS SANTIGO ARRAES REINO

Lógicas de Supervisão Pedagógica em Contexto de Avaliação de Desempenho Docente ENTREVISTA - Professor Avaliado - E 2

Entrevista exclusiva concedida pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ao SBT

Amanda Oliveira. E-book prático AJUSTE SEU FOCO. Viabilize seus projetos de vida.

Autor: Marcelo Maia

CHAIR DRYDEN: Continuemos, vamos passar ao último tema do dia. Ainda temos 30 minutos.

Motivar pessoas para o foco da organização

coleção Conversas #6 Respostas que podem estar passando para algumas perguntas pela sua cabeça.

Entusiasmo diante da vida Uma história de fé e dedicação aos jovens

UTILIZANDO BLOG PARA DIVULGAÇÃO DO PROJETO MAPEAMENTO DE PLANTAS MEDICINAIS RESUMO

Com-Vida. Comissão de Meio Ambiente e Qualidade de Vida

PRÁTICAS LÚDICAS NO PROCESSO DE AQUISIÇÃO DA LÍNGUA ESCRITA DO INFANTIL IV E V DA ESCOLA SIMÃO BARBOSA DE MERUOCA-CE

Empresário. Você curte moda? Gosta de cozinhar? Não existe sorte nos negócios. Há apenas esforço, determinação, e mais esforço.

SEM AULAS? E AGORA?... JOGOS MATEMÁTICOS COMO ESTRATÉGIA DE VALORIZAÇÃO DO AMBIENTE ESCOLAR

GUIA DE SUGESTÕES DE AÇÕES PARA IMPLEMENTAÇÃO E ACOMPANHAMENTO DO PROGRAMA DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

CartilhaEscola_Final.qxp:escola 9/16/08 6:23 PM Page 1

Distribuidor de Mobilidade GUIA OUTSOURCING

Roteiro VcPodMais#005

Como fazer contato com pessoas importantes para sua carreira?

Avanços na transparência

1. Quem somos nós? A AGI Soluções nasceu em Belo Horizonte (BH), com a simples missão de entregar serviços de TI de forma rápida e com alta qualidade.

Equipe OC- Olimpíadas Científicas

PROFISSIONALISMO INTERATIVO E ORIENTAÇÕES PARA A AÇÃO

COMO SE TORNAR UM VOLUNTÁRIO?

ÍNDICE. Introdução. Os 7 Segredos. Como ser um milionário? Porque eu não sou milionário? Conclusão. \\ 07 Segredos Milionários

Compreendendo a dimensão de seu negócio digital

W W W. G U I A I N V E S T. C O M. B R

Diversas pessoas com o objetivo de ir em frente e inovar. Esse é o valor do i9.

CARTILHA DE ORIENTAÇÃO AO TRABALHADOR

Guia Prático ORGANIZAÇÃO FINANCEIRA PARA BANCAR A FACULDADE

ESCOLA, LEITURA E A INTERPRETAÇÃO TEXTUAL- PIBID: LETRAS - PORTUGUÊS

Como mediador o educador da primeira infância tem nas suas ações o motivador de sua conduta, para tanto ele deve:

difusão de idéias QUALIDADE NA EDUCAÇÃO INFANTIL Um processo aberto, um conceito em construção

ABCEducatio entrevista Sílvio Bock

> Folha Dirigida, 18/08/2011 Rio de Janeiro RJ Enem começa a mudar as escolas Thiago Lopes

Oficina Recursos Educacionais Abertos REA. Débora Sebriam Centro Educacional Pioneiro Julho/2011

Como obter excelentes. Resultados. no Marketing Digital. Aprenda a usar 3 metas matadoras. Publicação SEVEN - SPD

Política de Afiliados

COMPETÊNCIAS E SABERES EM ENFERMAGEM

coleção Conversas #17 - DEZEMBRO u s a r Respostas perguntas para algumas que podem estar passando pela sua cabeça.

AS CONTRIBUIÇÕES DAS VÍDEO AULAS NA FORMAÇÃO DO EDUCANDO.

SocialDB Social Digital Library

Transcrição:

RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS práticas colaborativas e políticas públicas Bianca Santana Carolina Rossini Nelson De Luca Pretto organizadores São Paulo Salvador 2012 1ª edição 1ª impressão financiamento

Esta obra está sob a licença Creative Commons Atribuição 2.5 (CC-BY). Mais detalhes em http://creativecommons.org/licenses/by/2.5/br Você pode copiar, distribuir, transmitir e remixar este livro, ou partes dele, desde que cite a fonte. Coordenação editorial: Maracá - Educação e Tecnologias Casa da Cultura Digital Capa, projeto gráfico e diagramação: Lucas Pretti Revisão: Daniela Silva, Thiago Carrapatoso e Flávia Rosa Assistência administrativa: Viviane Souza Casa da Cultura Digital Maracá Educação e Tecnologias Rua Vitorino Carmilo, 459 Santa Cecília - São Paulo - SP (11) 3662-0571 casadaculturadigital.com.br Editora da Univeridade Federal da Bahia Rua Barão de Jeremoabo, s/n Campus de Ondina - Salvador - BA (71) 3283-6164 www.edufba.ufba.br edufba@ufba.br Sistema de Bibliotecas - UFBA R292 Recursos Educacionais Abertos: práticas colaborativas políticas públicas / Bianca Santana; Carolina Rossini; Nelson De Lucca Pretto (Organizadores). 1. ed., 1 imp. Salvador: Edufba; São Paulo: Casa da Cultura Digital. 2012. 246 p. ISBN 978-85-232-0959-9 1. Educação. 2. Educação Aberta. 3. Recursos Educacionais. 2 Professores. I. SANTANA, Bianca. II. ROSSINI, Carolina. III. PRETTO, Nelson De Lucca. CDU 37.01

A experiência REA em um colégio tradicional da cidade de São Paulo Valdenice Minatel e Verônica Cannata Entrevista a Paulo Darcie < texto anterior Projeto Folhas e Livro Didático Público V estir a camisa dos Recursos Educacionais Abertos era o que faltava ao Colégio Dante Alighieri. Por princípio, publicizar os conteúdos desenvolvidos por seus docentes e até alunos já era uma realidade. Sob a bandeira REA e a gestão do Departamento de Tecnologia Educacional, iniciativas que pareciam pontuais e isoladas, como oficinas e revistas produzidas por alunos, agora convergem mais claramente para a consolidação de um ambiente de educação digital e, acima de tudo, colaborativo. Na conversa aqui registrada, a coordenadora do departamento, Valdenice Minatel, e a orientadora do projeto Dante em Foco, Verônica Cannata, contam sobre as dificuldades de se quebrar paradigmas e de fazer o compartilhamento voltar a ter papel de destaque na dinâmica da educação. Como foi o início do projeto REA Dante? Valdenice: Tomamos conhecimento do movimento REA em 2010, por meio da Marcella Chartier, que foi instrutora na Oficina de Jornalismo do Dante. Quando tivemos o primeiro contato com o conceito, ele logo teve uma adesão muito grande no Departamento de Tecnologia Educacional. Nós gostamos dessa ideia de democratização de conteúdo, o que sempre foi uma das nossas linhas de trabalho. Eu digo que já fazíamos REA sem saber, sem esse nome, pois sempre nos esforçamos para publicar, mostrar a autoria dos trabalhos feitos aqui. O Dante, por ser um colégio de referência, sempre abriu as portas para visita de gente de outras escolas, educadores e estudantes que querem 239

RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS: PRÁTICAS COLABORATIVAS E POLÍTICAS PÚBLICAS saber o que e como fazemos. Em junho de 2011 participamos do Seminário Material Didático Digital: Recursos Educacionais Abertos e Qualidade na Educação, na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), e tomamos contato com outras instituições que também estão tentando desenvolver projetos REA. Trocamos experiências e, de lá para cá, estamos trabalhando para encontrar o melhor caminho. No final do ano passado, tivemos contato com a Priscila Gonsales 1. do Instituto EducaDigital, e estamos tentando chegar a uma proposta de que rumo tomar. Acredito que, assim como há o Banco Internacional de Objetos de Aprendizagem2. podemos fazer nosso portal de conteúdo para aprendizagem aqui do colégio. Eu gostaria de focar nessa linha, para que não só professores pudessem publicar conteúdo, mas também alunos e ex-alunos do Dante que tenham ou não alguma ligação com o colégio encontrem aqui uma forma mais fácil de divulgar conteúdo. Foi preciso alguma grande mudança estrutural para a implantação de REA Dante? Valdenice: Já tínhamos uma estrutura consolidada no departamento, o que nos permitiu fazer o portal sem grandes modificações. As mudanças foram mais a respeito de mobilização, articulação com os professores e articulações dentro do próprio departamento. Demos os primeiros passos criando o portal REA Dante, para armazenar o conteúdo produzido. É um portal modesto, que começou publicando os materiais que já tínhamos, como os roteiros da Oficina de Jornalismo e de Games do Dante em Foco 3. Fomos juntando as coisas. Já tínhamos alguns roteiros de aula de 6º, 7º e 8º anos, e pensamos que 1 2 Veja o capítulo Aberturas e rupturas na formação de professores, de autoria de Priscila Gonsales Trata-se de um banco de materiais didáticos compilados e organizados pelo MEC. Os mais de 16 mil arquivos de conteúdo são divididos por níveis de ensino (infantil, fundamental, médio, profissional e superior), disciplina e assunto. São postados planos de aula, vídeo, áudio, imagens, mapas, animações e o que mais os autores julgarem útil para o aprendizado daquela disciplina. O conteúdo é aberto ao público para download, e na descrição de cada recurso é possível se informar quanto à sua licença. Mais informações em http:www.objeto3 seducacionais.mec.gov.br É o projeto que mantém os blogs Dante em Foco e Dante Catraca. No primeiro, os alunos do ensino médio participam de oficinas e fazem a cobertura dos principais eventos internos e externos do colégio, criando conteúdos multimídia sobre os assuntos. No segundo, alunos dividem experiências e dicas de programas culturais na região da escola que custem até R$ 10. 240

ENTREVISTA VALDENICE MINATEL E VERÔNICA CANNATA eles poderiam ser um bom conteúdo REA, para que outras escolas pudessem tomar como base. Quais os principais obstáculos para a consolidação dessa cultura em um colégio? Valdenice: Queremos trabalhar sempre dentro da legalidade. Isso nos preocupa. Sempre que se fala em publicação de conteúdo na internet, ainda mais quando se envolve o nome de uma escola grande e de visibilidade, não se pode fazer nada que não esteja dentro de uma ética no que diz respeito à propriedade intelectual. Isso ainda está um pouco nebuloso e é preciso ter muita clareza antes de dar os próximos passos, para não queimar nenhuma etapa. Verônica: É preciso ter segurança para a instituição. Trata-se de um colégio de cem anos, tradicional. Ele tem um departamento que aposta nesse movimento, mas o colégio é maior do que o departamento. Que cuidados legais são tomados ao publicar conteúdos? Valdenice: Nós licenciamos tudo em Creative Commons, mas isso garante que o material não vai ser usado com fins comerciais? Tudo que for produzido pode ser REA? Nós queríamos que o material desenvolvido pelos alunos fosse para a rede, mas há alguma incerteza se isso pode ou não ser publicado, pois não se trata de objeto de aprendizagem, e sim algo feito por alunos em aula. Seria preciso colocar no contrato de matrícula e deixar claro para os pais que há a hipótese de publicação desses conteúdos. Estamos mexendo em uma questão maior do que o âmbito da sala de aula. Quanto aos professores, no momento em que pedimos para que assinem um documento concordando em ceder parte de seus direitos, precisamos esclarecer exatamente o que é REA, e convencê-los de que é um movimento interessante. Se isso não for tratado com cuidado, há o risco de se perder a essência. Não basta o departamento de tecnologia estar esclarecido. Todos os outros envolvidos também devem estar, caso contrário vamos agir como Don Quixote. E é difícil convencer professores a entrar nesse barco? Verônica: O que estamos tentando é mudar a cultura dos professores. Quando damos formação a eles, como no caso da formação de lousa digital, estamos incentivando a criar um banco de aulas, para que possam divulgar e compartilhar sua produção com mais facilidade. Em geral, o professor faz pesquisa e 241

RECURSOS EDUCACIONAIS ABERTOS: PRÁTICAS COLABORATIVAS E POLÍTICAS PÚBLICAS monta a aula, mas não compartilha o que faz, pois tem a ideia de que aquilo que criou é dele. Conversamos e começamos um trabalho de base, para que seja possível mudar essa cultura, rumo à cultura do compartilhamento, de contribuição para uma rede maior. Incentivamos e, felizmente, já vemos professores postando aulas no YouTube por iniciativa própria. É preciso criar sinergia entre a própria comunidade docente. De fato, a partilha não é algo comum na vivência das pessoas, precisa passar a fazer sentido para os professores. Valdenice: O professor ainda se questiona eu posso ser autor? mas o que eu faço é tão simples, isso é digno?. E a resposta é sim! A valorização da produção, do protagonismo do professor, precisa ser resgatada. É preciso ficar claro que a possibilidade não é restrita a algumas cabeças iluminadas, pois todos que se dedicarem podem produzir conteúdos interessantes e contribuir com o avanço da educação, colocando online um conteúdo que, de alguma forma, possa ser transformado em conhecimento. O REA é um movimento forte suficiente para mudar paradigmas, mas ele não pode ser visto como mais uma onda da internet, deve ser associado à educação. Outras escolas e regiões do Brasil estariam preparadas para aderir ao movimento REA? Valdenice: Como uma grande onda, talvez não, mas com ações locais, sim. Se todos acharem que é impossível e não colocarem a mão na massa, nada vai acontecer. Nós ainda temos muito que melhorar aqui no colégio, mas é preciso começar. Estivemos na Febrace 4, onde vimos projetos impressionantes de alunos de educação básica que se comparam a projetos de mestrado e doutorado. São alunos produzindo com qualidade e professores orientando com qualidade. Há muita vida inteligente e o REA é uma grande porta para se descobrir isso. 4 A Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace) tem o objetivo de despertar em alunos do ensino fundamental e médio o interesse pela pesquisa científica. Sua décima edição foi realizada em março de 2012, na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Durante os três dias de feira, 725 projetos de alunos de 8º e 9º anos, tanto de escolas públicas como privadas, concorreram a prêmios e bolsas de iniciação científica pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). 242

ENTREVISTA VALDENICE MINATEL E VERÔNICA CANNATA Projetos de lei nesse sentido podem ajudar ou é uma questão apenas de iniciativas pontuais? Valdenice: As duas coisas. É válido ter uma política pública que determine que a rede de educação básica seja responsável também por contribuir com conteúdo, em vez de apenas receber material elaborado pelas secretarias de educação. Uma lei institucionalizaria o REA e a gente precisa de fato disso. A cultura brasileira ainda funciona assim, é muito pautada pela obrigação: se virar lei, então vamos fazer. Além disso, é preciso ter polos nas escolas. Ao trabalhar com a área tecnológica, é necessário ter alguém que anime, que dê a alma para a coisa. Se não houver incentivo de alguém que busque e promova, a ação acaba pulverizada, cai na rotina, fica muito igual e logo deixa de existir. Falta ainda esclarecimento. REA é uma onda global, mas ainda é restrita a pequenos grupos. No Brasil ainda não vejo políticas públicas a não ser o Projeto Folhas, do Paraná. Mesmo aqui em São Paulo, depois da ação na Assembleia Legislativa do estado de São Paulo (Alesp), ainda não vejo resultados práticos. Verônica: Ainda é um sonho, mas o ideal seria que, ao se formarem os professores na universidade, eles já viessem com essa postura, já tivessem uma disciplina de REA. Deveriam entender que vão trabalhar de forma colaborativa. A mentalidade já mudaria. O professor hoje acha que sua produção é dele, não divide um plano de aula com o colega ao lado. A formação inicial do professor não está alinhada às necessidades que temos hoje. Estamos falando de REA aqui nessa ponta, mas a universidade mal está mexendo nisso. Especialmente na licenciatura, é necessário que se assuma o REA como uma proposta educacional, e não de uso da internet. Como mensurar o sucesso, a melhora no nível de aprendizado dos alunos, após a adoção de projetos como esse? Valdenice: Ainda não construímos uma régua para isso. Desenvolver alguma métrica é necessário para que os professores e escolas possam ter feedback, parâmetros para se autoavaliarem, estipularem novas metas e para, de fato, a coisa crescer. Mas não consigo ainda enxergar algo assim. Não é o tamanho da produção, a quantidade de arquivos que devemos olhar, e sim o cenário mais amplo, a interação dos materiais com as demandas da educação. Não é uma tarefa simples. 243