Documentos. Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos em Bacias. ISSN ISSN online Abril, 2010 CGPE 8985

Documentos relacionados
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Cerrados Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Biotecnologia

Ecologia e funcionamento de ecossistemas de água doce: ênfase em macroinvertebrados bioindicadores e decomposição de matéria orgânica

Biomonitoramento da qualidade de água no rio Poxim Açu, São Cristóvão, Sergipe

EFEITO DA URBANIZAÇÃO SOBRE A FAUNA DE INSETOS AQUÁTICOS DE UM RIACHO DE DOURADOS, MATO GROSSO DO SUL

Guia para o reconhecimento de inimigos naturais de pragas agrícolas

Peixe Defumado. 2 a edição revista e atualizada

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Arroz e Feijão Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Coleta de parasitos em peixes de cultivo

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Instrumentação Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Saneamento básico rural

Uso de coletores de substrato artificial para o biomonitoramento na aquicultura

Contaminações microbianas na cultura de células, tecidos e órgãos de plantas

Aspectos Práticos da Micropropagação de Plantas

XVI CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA 22 a 26 de outubro de 2007

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Semiárido Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. A cultura da cebola

ATIVIDADES DE ESTUDO. Camadas da Terra

AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DA ÁGUA POR MEIO DE PARÂMETROS FÍSICOS, QUÍMICOS E BIOLÓGICOS EM UM RIACHO DO SUL DO BRASIL

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Tabuleiros Costeiros Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento A CULTURA DA MANGABA

A CULTURA DO CUPUAÇU: MUDAS

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Hortaliças Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Pós-colheita de Hortaliças

Ecologia II: Ecossistemas fluviais. Manuela Abelho 2012

Nome: Data: 1. Observa a molécula de água e tenta descobrir qual a fórmula escrita que melhor a representa (marca com um X a resposta correta):

ALIMENTAÇÃO DE TRÊS ESPÉCIES DE Astyanax, NO CÓRREGO ITIZ, MARIALVA, PR

Biomonitoramento na bacia hidrográfica do rio Uberabinha - conceitos e subsídios

Sumário. Apresentação dos Autores... Introdução...

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Mandioca e Fruticultura Tropical Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

A CULTURA DOS BRÓCOLIS

Professora Leonilda Brandão da Silva

UniRV- UNIVERSIDADE DE RIO VERDE FACULDADE DE BIOLOGIA E QUÍMICA CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS - LICENCIATURA E BACHARELADO

Macroinvertebrados bentônicos em riachos de cabeceira: Múltiplas abordagens de estudos ecológicos em bacias hidrográficas

O uso dos fósseis para datação relativa das rochas iniciou-se no século XIX, por William Smith, um engenheiro inglês.

DIETA DE IMPARFINIS MIRINI (Haseman, 1911) EM DOIS RIACHOS NA REGIÃO DE MARINGÁ-PR

ATIVIDADE EXPERIMENTAL DE INVESTIGAÇÃO ESTAÇÃO CIÊNCIAS

Invertebrados aquáticos em poças temporárias de um riacho de cerrado. Aquatic invertebrates in temporary ponds in a stream of savannah

Utilização da estrutura de comunidades de macroinvertebrados bentônicos como indicador de qualidade da água em rios no sul do Brasil

MACROINVERTEBRADOS AQUÁTICOS DO CÓRREGO PINHEIRINHO, PARQUE DO BASALTO, ARARAQUARA-SP: SUBSÍDIOS PARA ESTRATÉGIAS DE CONSERVAÇÃO LOCAL

BACIA HIDROGRAFICA. Governo do Estado de São Paulo Secretaria do Meio Ambiente

Troca de materiais entre os componentes bióticos e abióticos dos ecossistemas.

Estudo sobre a Água 1

ISSN ISSN online Junho, Sistema de Gestão de Horas Extras manual do usuário

Criação de pirarucu. Coleção CRIAR

GRUPOS DE PLANTAS ORNAMENTAIS UTILIZADAS NO PAISAGISMO NOS CONDOMÍNIOS RESIDENCIAIS DA CIDADE DE LAVRAS-MG.

Capítulo 04 Reabilitaçao de córregos e rios

Ecossistemas e Saúde Ambiental :: Prof.ª MSC. Dulce Amélia Santos

Circular. Técnica PROCEDIMENTO DE OPERAÇÃO, MANUTENÇÃO E VERIFICAÇÃO DA ESTUFA MARCONI MODELO MA-033/5. Brasília, DF Dezembro 2007.

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Semiárido Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. 2ª edição revista e ampliada

-ECOLOGIA APLICADA. Espécies símbolos. Prevenção da Poluição. Conservação de áreas. Preservação da diversidade genética bbbb

A PROPAGAÇÃO DO ABACAXIZEIRO

KIT MEDIDOR DE SEMENTES PARTIDAS DE SOJA

Ciclo hidrológico: ciclo fechado no qual a água de movimenta

POLUIÇÃO DIFUSA RESUMO

PLANO DE ESTUDOS DE CIÊNCIAS NATURAIS - 5.º ANO

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Amazônia Oriental Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento A CULTURA DO URUCUM

Manual de Laboratório

O melhor lugar para se viver: o caso do camarão-ferrinho 1. Danielle Mayumi Tamazato Santos*

Descritores. morfoagronômicos ilustrados para Passiflora spp.

LISTA DE EXERCÍCIOS CIÊNCIAS

DETERMINAÇÃO DO ESTADO DE EUTROFIZAÇÃO DE RESERVATÓRIOS:

ESTUDOS DOS MACROINVERTEBRADOS ASSOCIADOS À VEGETAÇÃO AQUÁTICA NO RIO NOVO - FAZENDA CURICACA, POCONÉ, MT

Ecossistemas BI63B Profa. Patrícia Lobo Faria

Anais da XII Jornada de Iniciação Científica da Embrapa Amazônia Ocidental

Coletor de Macroinvertebrados Bentônicos com Substrato Artificial para Monitoramento da Qualidade de Água em Viveiros de Produção de Tilápia

ENTRE A TERRA E O MAR

O meu Caderno de Campo

Organização da Aula. Recuperação de Áreas Degradas. Aula 2. Matas Ciliares: Nomenclatura e Conceito. Contextualização

Biota Neotropica ISSN: Instituto Virtual da Biodiversidade Brasil

Frutas Desidratadas. Iniciando um Pequeno Grande Negócio Agroindustrial. Série Agronegócios

Macroinvertebrados de solo em fragmentos florestais, Londrina-PR

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Embrapa Meio-Norte. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Metodologia para análise de mosto e suco de uva

ECOLOGIA E BIODIVERSIDADE

Biodiversidade e prosperidade económica

Fragmentação. Umberto Kubota Laboratório de Interações Inseto Planta Dep. Zoologia IB Unicamp

PEA Projeto em Engenharia Ambiental

II BARREIRA DE CONTENÇÃO PARA ALGAS DO GENERO MICROCYSTIS SP. Pós-Graduação (Didática do Ensino Superior)- Faculdades São Judas Tadeu 1991

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Uva e Vinho Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Embrapa Uva e Vinho

A importância do monitoramento ambiental na avaliação da qualidade de um rio estudo de caso - Mercedes, PR

BI63B - ECOSSISTEMAS. Profa. Patrícia C. Lobo Faria

Análise química do solo: amostras para análise

QUALIDADE DA ÁGUA DO RIO VELHO QUIXERÉ ATRAVÉS DE MACRÓFITAS

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP Embrapa Informática Agropecuária

O MÉTODO DOS QUADRATS

Comunicado 77 Técnico

CARACTERIZAÇÃO ALIMENTAR DO ACARÁ (Geophagus brasiliensis) NA LAGOA DOS TROPEIROS, MINAS GERAIS.

QUÍMICA ANALÍTICA AMBIENTAL Prof. Marcelo da Rosa Alexandre

Agrupamento Escolas José Belchior Viegas - Escola E.B. 2,3 Poeta Bernardo de Passos. Ciências Naturais Planificação anual 5ºAno Ano letivo:

Agrupamento Escolas José Belchior Viegas - Escola E.B. 2,3 Poeta Bernardo de Passos Ciências Naturais Planificação anual 5ºAno Ano letivo:

Farinha Mista de Banana Verde e de Castanhado-Brasil

Ecologia. introdução, fluxo de energia e ciclo da matéria. Aula 1/2

Estrutura e dieta da ictiofauna em dois riachos da bacia do rio Pará com ênfase nas interações tróficas entre peixes e macroinvertebrados bentônicos.

dispensa maiores gastos com tratamento) para abastecimento em vários níveis, como industrial, urbano e doméstico; isso gera déficit

Geologia e conservação de solos. Luiz José Cruz Bezerra

Exercícios de Alelobiose - Relações Ecológicas

UMA ANÁLISE DA OCORRÊNCIA DA ZONA RIPÁRIA NAS PROPRIEDADES RURAIS DE UMA MICROBACIA HIDROGRÁFICA E SUA PRESERVAÇÃO PARA A BUSCA DA SUSTENTABILIDADE

Cultivo e utilização da alfafa em pastejo para alimentação de vacas leiteiras

USO DE NINHOS ARTIFICIAIS COMO METODOLOGIA PARA VERIFICAR A TAXA DE PREDAÇÃO DE NINHOS EM DOIS AMBIENTES: BORDA E INTERIOR DE MATA

Ministério da Agricultura

Castanha de Caju. Iniciando um Pequeno Grande Negócio Agroindustrial. Série Agronegócios

COMO CULTIVAR ORQUIDEAS

Transcrição:

Documentos ISSN 1517-5111 ISSN online 2176-5081 Abril, 2010 289 Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento CGPE 8985 Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos em Bacias Hidrográficas

ISSN 1517-5111 ISSN online 2176-5081 Abril, 2010 Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa Cerrados Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento Documentos 289 Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos em Bacias Hidrográficas Kathia Cristhina Sonoda Embrapa Cerrados Planaltina, DF 2010

Exemplares desta publicação podem ser adquiridos na: Embrapa Cerrados BR 020, Km 18, Rod. Brasília/Fortaleza Caixa Postal 08223 CEP 73310-970 Planaltina, DF Fone: (61) 3388-9898 Fax: (61) 3388-9879 http://www.cpac.embrapa.br sac@cpac.embrapa.br Comitê de Publicações da Unidade Presidente: Fernando Antônio Macena da Silva Secretária-Executiva: Marina de Fátima Vilela Secretária: Maria Edilva Nogueira Supervisão editorial: Jussara Flores de Oliveira Arbués Equipe de revisão: Francisca Elijani do Nascimento Jussara Flores de Oliveira Arbués Assistente de revisão: Elizelva de Carvalho Menezes Normalização bibliográfica: Paloma Guimarães Correa de Oliveira Editoração eletrônica: Fabiano Bastos Capa: Fabiano Bastos Fotos da capa: Kathia Cristhina Sonoda Impressão e acabamento: Divino Batista de Souza Alexandre Moreira Veloso 1 a edição 1 a impressão (2010): tiragem 100 exemplares 1 a edição online (2010) Todos os direitos reservados A reprodução não-autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais (Lei no 9.610). Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Embrapa Cerrados S699o Sonoda, Kathia Cristhina. Orientações gerais para avaliação de macroinvertebrados aquáticos em bacias hidrográficas / Kathia Cristhina Sonoda. Planaltina, DF : Embrapa Cerrados, 2010. 20 p. (Documentos / Embrapa Cerrados, ISSN 1517-5111, ISSN online 2176-5081 ; 289). 1. Cerrado. 2. Inseto aquático. 3. Bacia hidrográfica. I. Título. II. Série. 595.7 - CDD 21 Embrapa 2010

Autora Kathia Cristhina Sonoda Bióloga, D.Sc. Pesquisadora da Embrapa Cerrados kathia.sonoda@cpac.embrapa.br

Apresentação Este documento foi elaborado visando transmitir informações a um público diverso, compreendendo agrônomos, biólogos, produtores rurais, técnicos agrícolas e outros interessados na temática da água, seus componentes e sua conservação. A linguagem utilizada é simples, procurando facilitar o entendimento de um assunto que não faz parte do cotidiano da maioria das pessoas, que são os insetos aquáticos e sua aplicabilidade. A intenção não foi esgotar o assunto, mas sim apresentá-lo de forma simples e despertar o interesse do público para que o mesmo procure se aprofundar no conhecimento, consultando outras obras como publicações da Embrapa, livros técnicos ou cartilhas disponíveis. Apesar de produzido pela Embrapa Cerrados, que é uma unidade ecorregional e que tem como objeto-base o Cerrado, as informações podem ser aplicadas nos diversos biomas brasileiros. José Robson Bezerra Sereno Chefe-Geral da Embrapa Cerrados

Sumário Macroinvertebrados Aquáticos... 12 Ações de Avaliação Biológica... 13 Como Coletar os Insetos Aquáticos?... 14 Época de Amostragem... 16 Triagem e Identificação dos Animais... 16 Interpretação dos Dados... 17 Cuidados... 17 Referências... 18 Abstract... 20

Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos em Bacias Hidrográficas Kathia Cristhina Sonoda Informações Gerais A bacia hidrográfica é uma área de drenagem que alimenta um conjunto de cursos d água cujo limite é estabelecido com a finalidade de facilitar o entendimento de uma determinada região (Omernik; Bailey, 1997). No esquema apresentado na Figura 1, a microbacia do riacho A está contornada em azul, a do riacho B em verde e a bacia do rio C em marrom, a qual inclui as duas microbacias anteriores, indicando que a bacia hidrográfica pode ter diferentes tamanhos. Isso acontece porque essa divisão é meramente didática, ou seja, uma bacia possui limites geográficos e toda a água que escoa para dentro do curso d água está nos limites da bacia. A partir do local onde a água escoa para outro sistema, delimita-se uma outra bacia. O ecossistema aquático é formado não apenas pelo seu curso d água, mas também pela vegetação que fica em suas margens, chamada vegetação ripária ou de galeria. O termo riparius (do latim) significa de ou pertencente à margem do rio (Naiman; Bilby, 1998). A mata ciliar é definida como a vegetação florestal que margeia os rios de médio e grande porte, enquanto, para aqueles de pequeno porte (riachos e córregos), a terminologia mais empregada é mata de galeria, em função dos corredores formados sobre os cursos d água (Ribeiro et al., 1999).

10 Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... Figura 1. Desenho esquemático representando diferentes tamanhos de bacia hidrográfica. O componente biótico do ecossistema aquático é formado por plantas e animais aquáticos, como algas, os peixes, caramujos, conchas (moluscos), caranguejos, pitus (camarões de água doce) e insetos (libélulas, borrachudos e outros) (McCafferty, 1981; Ward, 1992). Há também a parte abiótica, aquela que não tem vida, formada pelas pedras, substrato de fundo do córrego, pedaços de madeira (galhos e troncos), folhas e frutos. Todos esses componentes abióticos são importantes porque sustentam a vida dentro do córrego. Os animais e plantas que vivem dentro da água utilizam como fonte de alimento os nutrientes liberados pela decomposição da matéria orgânica. Os pedaços de folhas e madeira são utilizados tanto para abrigo como para alimento, pois, sobre eles, crescem algas, que são utilizadas como alimento por alguns animais (Merritt; Cummins, 1996). A vegetação ripária é muito importante para o curso d água porque fornece madeiras, folhas e frutos para os animais que vivem dentro do ambiente aquático (Wantzen; Wagner, 2006; Hrodey et al., 2008). Há muitos outros benefícios que essa mata proporciona ao curso d água e seus habitantes (Casatti et al., 2006; Matthaei et al., 2006), como o controle da temperatura da água, causado pelo efeito de sombreamento da copa das árvores, e a retenção do solo, evitando

Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... 11 que o mesmo seja lavado pela chuva e entre na água, carregando muitos poluentes, como agrotóxicos e fertilizantes, que poderiam entrar no curso d água (Cetra; Petrere, 2007; Galbraith et al., 2008). Uma provável entrada de solo faz com que a água fique escura e isso não é bom, pois a água turva dificulta a entrada de raios solares e dificulta (ou impede) o crescimento das algas. Uma vez que as algas são alimentos de muitos animais, sua diminuição na quantidade resulta em pouco alimento para os animais, que começam a passar fome. Se essa situação durar muitos dias, eles podem morrer e, com isso, desaparecer do ambiente. Alguns animais são mais sensíveis que outros a essas dificuldades e tendem a desaparecer primeiro. Há também aqueles animais que não se alimentam de algas, mas de outros animais. São chamados de predadores (McCafferty, 1981). A diminuição na quantidade de algas os afeta de modo indireto, já que sua fonte de alimento (outros animais) estará reduzida, e eles também começarão a desaparecer. Existem também os animais que consomem pequenas partículas suspensas na água, os chamados filtradores. Esses pequenos animais acumulam seu alimento nas antenas ou em redes, e depois os ingerem (McCafferty, 1981). Quando há solo em excesso na água, pode entupir as redes e também ocupar o espaço do alimento nas antenas e, não podendo mais se alimentar, esses animais morrem de fome. Quando um córrego se apresenta saudável, costuma existir um número grande de espécies (riqueza) vivendo ali; porém nenhuma espécie tem uma quantidade de indivíduos muito maior que outra espécie, ou seja, estão em equilíbrio (Menetrey et al., 2008; Statzner et al., 2008). Por outro lado, quando o ambiente está degradado, mesmo que a alteração seja pequena, essa dinâmica começa a mudar. A riqueza diminui porque aqueles organismos mais sensíveis não conseguirão sobreviver enquanto outras espécies, mais tolerantes, sobreviverão e, tendo mais alimento disponível e sem seus competidores, começam

12 Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... a se sobrepor em número de indivíduos, ou seja, algumas espécies tornam-se mais abundantes que outras (Melo; Hepp, 2008). Por causa dessas mudanças na comunidade, esses organismos podem e são utilizados como indicadores da qualidade ambiental, são os chamados bioindicadores (Herlihy et al., 2005; Ohiokhioya et al., 2010). Entre esses, encontram-se os macroinvertebrados bentônicos. Macroinvertebrados Aquáticos Os macroinvertebrados aquáticos constituem um grupo formado por invertebrados de grande tamanho visíveis a olho nu e que vivem junto ao sedimento (daí o termo bentônico) que fica no fundo do córrego d água. Entre esses macroinvertebrados, podem-se citar vários tipos, como a planária que, quando se apresenta abundante no ambiente, indica poluição por enriquecimento orgânico; os pitus camarões de água doce e cor cinza-escuro (Figura 2) são muito difíceis de serem capturados, no entanto, quando são encontrados em grande quantidade, pode indicar a ocorrência de poluição orgânica. Um parente deles é o caranguejo (Figura 2), algumas espécies são encontradas em ambientes de boa qualidade ambiental, onde a degradação ainda está longe de ocorrer. Os moluscos, em geral, são aqueles que possuem conchas; para capturarem alimento, eles filtram a água ou raspam superfícies duras, como as rochas, e tendem a acumular substâncias tóxicas por causa desses hábitos alimentares. Os insetos são o componente mais abundante da comunidade bentônica nos sistemas aquáticos (Armitage et al., 1995), exibindo várias formas de vida com hábitos muito diferentes uns dos outros. Alguns tipos são muito sensíveis às alterações do ambiente natural (Lepori; Malmqvist, 2007), enquanto outros conseguem suportar graus elevados de poluentes; há um gradiente de sensibilidade entre as espécies, com extremos sensível e resistente e outros que se localizam em condições intermediárias.

Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... 13 Muito sensíveis Sensíveis Tolerantes Muito tolerantes a Ephemeroptera Ephemeridae b Diptera Simuliidae c Odonata Corduliidae d Diptera Chironomidae e f g h Plecoptera Perlidae Megaloptera Corydalidae Decapoda camarão (pitu) Oligochaeta Hirudinea Sanguessuga i Trichoptera Coleoptera Psephenidae j k Decapoda caranguejo l Trichoptera Helicopsychidae m Odonata Calopterigyidae Figura 2. Exemplos de animais de acordo com os graus de sensibilidade à degradação ambiental. Fotos: (a, b, c, d, e, f, g, j, k, m) Kathia Cristhina Sonoda; (h, i) North American Benthological Society (NABS); (l) Chironomidae research Group Ações de Avaliação Biológica Os macroinvertebrados aquáticos não são diferentes somente na forma do corpo, eles apresentam diferentes respostas às mudanças no ambiente em função de seu grau de sensibilidade. O

14 Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... conhecimento dos animais aquáticos e suas exigências para viver em um determinado ambiente permite seu uso como indicadores das condições locais (Bacey; Spurlock, 2007; Chessman et al., 2007; Smith et al., 2007). Por viverem na água e incorporarem tudo o que está naquela água, tendem a acumular substâncias nocivas as quais podem gerar diversos níveis de manifestações, desde o aparecimento de malformações (Kuhlmann et al., 2000) até a morte. Sendo assim, há alguns tipos que são extremamente resistentes a poluições severas e, por isso, podem ser encontrados tanto em lugares limpos e saudáveis como em lugares com despejo de esgoto, por exemplo. Outros grupos são muito exigentes e a grande maioria deles só é encontrada se a água estiver com boa qualidade (Salles et al., 2004). Por fim, existem aqueles que vivem em ambientes médios, não sendo tão exigentes, mas também não são tão resistentes que possam viver no meio do esgoto (Figura 2). Uma vez que a comunidade bentônica responde às condições climáticas, há mudanças nas espécies presentes e na distribuição das mesmas ao longo do ano, variando da estação chuvosa para a estiagem. Além disso, cada local contém uma variedade de habitats, como corredeiras, piscinas, bancos, canais abandonados que diferem quanto ao tipo e estabilidade do substrato, velocidade da corrente de água e profundidade. Essas condições naturais características, quando associadas às exigências das espécies (Litvan et al., 2008), determinam a capacidade de um organismo viver em um habitat particular de um ponto específico do rio. Como Coletar os Insetos Aquáticos? Existem muitas maneiras de coletar os insetos aquáticos (Figura 3) e sua escolha depende, principalmente, do motivo pelo qual a coleta é feita. Se a intenção é saber a quantidade de animais presentes em um local, é preferível utilizar equipamentos que contenham uma área pré-determinada, como dragas, amostradores, substratos artificiais,

Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... 15 volumes determinados de plantas aquáticas. Para avaliar os tipos de animais presentes, sem se preocupar com sua quantidade, podemse usar azulejos e redes de mão (estas últimas também podem ser utilizadas para coleta quantitativa se for considerado o tempo de coleta). Figura 3. Fotografias de coletores: draga de Ekman (esquerda), rede de mão tipo D (centro) e draga de Van Veen (direita). Fonte: Limnotec Equipamentos para Laboratórios (http://www.limnotec.com.br/). Antes de sair a campo, é importante confirmar se todos os equipamentos estão na bolsa, evitando a não realização da coleta. Um fator importante a ser considerado é o lugar de onde a amostra será retirada. Podem ser amostrados locais de corredeira e de remanso. É importante selecionar vários locais com o mesmo habitat ao longo do córrego, para aumentar a precisão da informação. É preciso lembrar que a coleta deve perturbar os animais o mínimo possível, pois o distúrbio pode fazer com que alguns grupos desapareçam e as informações obtidas não correspondam àquilo que realmente está ocorrendo no ambiente. Por isso, deve-se pisotear o mínimo possível o leito no córrego, procurando coletar as amostras da margem; tomar cuidado com a vegetação ao longo das margens, para não danificar árvores antigas nem as mais jovens. Caso haja algum galho incomodando, não o quebre, procure outro lugar para se posicionar. Chuvas fortes, mesmo sendo um fenômeno natural, também provocam distúrbio e lavam os córregos, carregando os animais. A consequência é que a comunidade precisa de um tempo (em torno de uma semana)

16 Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... para se restabelecer. Por isso, em época de chuva, é bom realizar a coleta nos períodos de intervalo entre uma chuva forte e a próxima. Época de Amostragem Os animais variam com a mudança das estações climáticas, assim, a comunidade da época de chuva será diferente daquela da época de estiagem (Bispo; Oliveira, 2007). As duas são igualmente eficientes para informar sobre o estado da água; porém, quando se pretende comparar uma série de dados de anos diferentes, o ideal é que as informações sejam da mesma época climática. Triagem e Identificação dos Animais A triagem consiste em separar os animais daquilo que não é desejável, podendo ser grãos de areia, pedaços de madeira e folhas, plantas aquáticas ou outros animais que não são objeto da análise. Para a triagem, é bom lavar a amostra em água corrente, retirando a argila até que a água que escoa fique transparente. Os animais encontrados devem ser colocados em frascos com álcool, em concentração de 70 % (para preparar esse álcool, é só misturar o álcool comum com água, na proporção de, aproximadamente, 3 partes de álcool para 1 de água) (Humphries et al., 1998; Pinder, 1989). Depois da triagem, separam-se os animais semelhantes, caso não seja possível identificar alguns animais, é aconselhável deixá-los em um frasco separado para enviar a um especialista. Essa informação pode ser um diferencial importante para avaliar a qualidade da água. Por isso, nunca se deve tentar encaixar um animal em alguma categoria, caso não tenha certeza do que se está fazendo. Cada animal identificado deve ter suas informações anotadas em uma planilha, data e horário de coleta, condições climáticas (sol, nublado, há quantos dias não chove), local de coleta, tipo de habitat (remanso ou corredeira), quantidade de organismos daquele

Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... 17 determinado grupo, quem coletou e sempre lembrar de etiquetar os frascos (usar lápis, pois o álcool pode borrar a caneta). Interpretação dos Dados Os dados, preferencialmente, são analisados em função da quantidade de indivíduos, do número total e a proporção de indivíduos de cada categoria (família, gênero ou espécie). A riqueza das categorias (número total de famílias, por exemplo) pode ser um bom comparativo entre locais, pois dá uma ideia de como o ambiente está; se é capaz de sustentar vários tipos de animais ao mesmo tempo, pode ser um indicativo de que está bem conservado. Se você está acostumado a coletar em um local onde encontra um determinado número de grupos de animais e de repente esse número diminui, ATENÇÃO. Alguma coisa aconteceu para essa queda na riqueza. A causa deve ser investigada, como, por exemplo, no caso de algum produto ter sido ou estar sendo liberado na água. Cuidados Como toda ação em ambiente aberto, é importante considerar os riscos possíveis e se precaver antecipadamente: 1. Realizar coletas sempre acompanhado, não ir ao campo sozinho. 2. Não entrar em um córrego ou rio com água acima dos joelhos. 3. Evitar ir a campo quando o tempo está ameaçando chuva. 4. Cuidado com água poluída ou com sinais de poluição. 5. Usar luvas, máscaras, perneiras e outros itens de segurança que sejam necessários. 6. Avisar um parente/amigo/vizinho quando for a campo fazer coleta, informar o horário previsto para retorno.

18 Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... Referências ARMITAGE, P. D.; CRANSTON, P. S.; PINDER, L. C. V. (Eds.) The Chironomidae, biology and ecology of non-biting midges. New York, EUA: Chapmann & Hall, 1995. 800 p. BACEY, J.; SPURLOCK, F. Biological assessment of urban and agricultural streams in the California Central Valley. Environmental Monitoring Assessment, v. 130, p. 483-493, 2007. BISPO, P. C.; OLIVEIRA, L. G. Diversity and structure of Ephemeroptera, Plecoptera e Trichoptera (Insecta) assemblages from riffles in mountain streams of Central Brazil. Revista Brasileira de Zoologia, v. 24, n. 2, p. 283-293, 2007. Casatti, L.; Langeani, F.; Silva, A. M.; Castro, R. M. C. Stream fish, water and habitat quality in a pasture dominated basin, Southeastern Brazil. Brazilian Journal of Biology, v. 66, n. 2B, p. 681-696, 2006. CETRA, M.; PETRERE JR, M. Associations between fish assemblage and riparian vegetation in the Corumbataí river basin (SP). Brazilian Journal of Biology, v. 67, n. 2, p. 191-195, 2007. CHESSMAN, B.; WILLIAMS, S.; BESLEY, C. Bioassessment of streams with macroinvertebrates: effect of sampled habitat and taxonomic resolution. Journal of the North American Benthological Society, v. 26, n. 3, p. 546-565, 2007. Galbraith, H. S.; Vaughn, C. C.; Meier, C. K. Environmental variables interact across spatial scales to structure trichopteran assemblages in Ouachita Mountain rivers. Hydrobiologia, v. 596, p. 401-411, 2008. Herlihy, A. T.; Gerth, W. J.; Li, J.; Banks, J. L. Macroinvertebrate community response to natural and forest harvest gradients in western Oregon headwater streams. Freshwater Biology, v. 50, p. 905-919, 2005. doi:10.1111/j.1365-2427.2005.01363.x Hrodey, P. J.; Kalb, B. J.; Sutton, T. M. Macroinvertebrate community response to large-woody debris additions in small warmwater streams. Hydrobiologia, v. 605, p. 193-207, 2008. HUMPHRIES, P.; GROWNS, J. E.; SERAFINI, L. G.; KAWKING, J. H.; CHICK, A. J.; LAKE, P. S. Macroinvertebrate sampling methods for lowland Australian rivers. Hydrobiologia, v. 364, p. 209-218, 1998. KUHLMANN, M.L.; HAYASHIDA, C.Y.; ARAÚJO, R.P.A. Using Chironomus (Chironomdiae: Diptera) mentum deformities in environmental assessment. Acta Limnologica Brasiliensia, v. 12, p. 55-61, 2000. Lepori, F.; Malmqvist, B. Predictable changes in trophic community structure along a spatial disturbance gradient in streams. Freshwater Biology, v. 52, p. 2184-2195, 2007.

Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... 19 Litvan, M. E.; Stewart, T. W.; Pierce, C. L.; Larson, C. J. Effects of grade control structures on the macroinvertebrate assemblage of an agriculturally impacted stream. River Research and Applications, v. 24, p. 218-233, 2008. Matthaei, C. D.; Weller, F.; Kelly, D. W.; Townsend, c. r. impacts of fine sediment addition to tussock, pasture, dairy and deer farming streams in New Zealand. Freshwater Biology, v. 51, p. 2154-2172, 2006. MCCAFFERTY, W.P. Aquatic Entomology. The fishermen s and ecologists illustrated guide to insects and their relatives. New York, USA: Jones & Bartlett Publishers, 1981. 448 p. MELO, A. S.; HEPP, L.U. Ferramentas estatísticas para análises de dados provenientes de biomonitoramento. Oecologia Brasiliensis, v. 12, n. 3, p. 463-486, 2008. MENETREY, N.; OERTLI, B.; SARTORI, M.; WAGNER, A.; LACHAVANNE, J.B. Eutrophication: are mayflies (Ephemeroptera) good bioindicators for ponds? Hydrobiologia, v. 597, p. 125-135, 2008. NAIMAN, R. J.; BILBY, R. E. (Ed.). River ecology and management. Lessons from the Pacific Coastal Ecoregion. New York, EUA: Ed. Springer-Verlag, 1998. 705 p. Ohiokhioya, T.; Imoobe, T.; Ohiozebau, E. Pollution status of a tropical river using aquatic insects as indicators. African Journal of Ecology, v. 48, p. 232-238, 2010. OMERNIK, J. M.; BAILEY, R. G. Distinguishing between watersheds and ecoregions. Journal of the American Water Research Association, v. 33, n. 5, p. 935-949, 1997. PINDER, L. C. V. The adult males of Chironomidae (Diptera) of the Holartic region Introduction. Entomologica scandinavia Supplement, v. 34, p. 5-9, 1989. RIBEIRO, J. F.; WALTER, B. M. T.; FONSECA, C. E. L. Ecossistemas de matas ciliares. In: Simpósio de Mata Ciliar: Ciência e Tecnologia. Belo Horizonte, MG. 1999. Anais. Lavras, MG: UFLA/FAEPE/CEMIG. 1999. p. 12-24. SALLES, F.F.; DA-SILVA, E.R.; HUBBARD, M.D.; SERRÃO, J.E. As espécies de Ephemeroptera (Insecta) registradas para o Brasil. Biota Neotropica, v. 4, n. 2, 2004. Disponível em: <http://www.biotaneotropica.org.br/v4n2/pt/abstract?inventory+ BN04004022004>. SMITH, J.; SAMWAYS, M.J.; TAYLOR, S. Assessing riparian quality using two complementary sets of bioindicators. Biodiversity and Conservation, v. 16, p. 2695-2713, 2007. STATZNER, B.; BONADA, N.; DOLÉDEC, S. Predicting the abundance of European stream macroinvertebrates using biological attributes. Oecologia, v. 156, p. 65-73, 2008. Wantzen, K. M.; Wagner, R. Detritus processing by invertebrate shredders: a neotropical-temperate comparison. Journal of the North American Benthological Society, v. 25, n. 1, p. 216-232, 2006.

20 Orientações Gerais para Avaliação de Macroinvertebrados Aquáticos... General Guidelines on Aquatic Macroinvertebrates Evaluation of Hydrographic Basins Abstract The present document contributes with information about analysis of water through the use of the instream biota. Several documents and books are available but there is a lack on those kinds of published material for non-technical, ordinary Brazilian citizens. The aim of this work is to improve the disposal of simple technical information concerning on aquatic macroinvertebrates evaluation of hydrographic basins. This document is an overview of the issue of aquatic biota and may be applied to analyze different biomes. We had no intention to elucidate and finish the issue. For more detailed and profound information we recommend the consult on specialized books. Index terms: aquatic insects, biological analysis, water quality.