fls. 158 SENTENÇA Processo Digital nº: 1095575-53.2016.8.26.0100 Classe - Assunto Procedimento Comum - Rescisão do contrato e devolução do dinheiro Requerente: Daniel Santana da Silva Requerido: Elbrus Empreendimentos Imobiliários Ltda. (Mac Empreendimentos Imobiliários Ltda.) Juiz(a) de Direito: Dr(a). Mônica Di Stasi Gantus Encinas Vistos. DANIEL SANTANA DA SILVA ajuizou a presente ação em face de ELBRUS EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA dizendo que firmou com a ré, no dia 08/11/13, contrato para adquirir certo imóvel, a unidade 185, Torre 1, do empreendimento Condomínio Boulevard Lapa. Alega que o montante foi dividido em parcelas, das quais já pagou R$ 160.152,55. Atualmente, no entanto, não tem condições financeiras para continuar os pagamentos Diante disso, entrou em contato com a ré para rescindir o contrato e a devolução dos valores pagos corrigidos. Afirmou que esta propôs a devolução de 40% daquele total, razão pela qual ajuizou a presente. Pretende seja rescindido o contrato, devendo a empresa ser compelida a restituir 90% dos valores pagos, devidamente corrigidos, em parcela única. Pede, ainda, que caso a ré não efetue o pagamento, se proceda à desconsideração de sua personalidade jurídica para que a Mac Empreendimentos Imobiliários Ltda. passe a responder pela dívida. Citada, a ré ofereceu contestação dizendo não se opõe à rescisão desde que observado o quanto previsto em contrato no que tange à restituição das parcelas pagas: o autor fará jus à devolução de 80% do valor pago, descontadas as verbas previstas na cláusula VII 3. Ressaltou, ainda, ser inviável a responsabilização patrimonial da empresa 1095575-53.2016.8.26.0100 - lauda 1
fls. 159 Mac Incorpordora, porque não incluída no pólo passivo da ação. Houve réplica. É o relatório. Fundamento e decido. Por versar sobre matéria de direito e de fato, nesta parte apenas comprovável por meio de documentos, e considerando que os elementos probatórios colacionados aos autos são suficientes ao deslinde da questão, passo ao julgamento antecipado da lide. O pedido inicial é procedente. Trata-se de ação rescisória, cumulada com pedido de devolução de quantias pagas, tendo por objeto contrato de promessa de compra e venda de imóvel. A parte autora confessou a impossibilidade de continuar o pagamento das parcelas a que se obrigada, razão pela qual pediu a rescisão contratual, mas não nos moldes do contrato entre as partes, uma vez que este contém cláusula abusiva de penalidade. Pediu, desta forma, a restituição de 90% das quantias pagas, e que a devolução seja por meio de parcela única. Já a ré concordou com a rescisão, mas pediu que a restituição de valores respeitasse ao previsto em contrato. Da relação jurídica entre as partes Comprovado o negócio jurídico entabulado, de promessa de compra e venda de imóvel, é nítida, pois, a relação de consumo entre as partes, haja vista a existência de 1095575-53.2016.8.26.0100 - lauda 2
fls. 160 todos os elementos necessários à sua configuração, quais sejam: fornecedor, que exerce atividade de construção e prestação de serviços (art. 3º, CDC), consumidor (art. 2º, caput, CDC) e a comercialização de um produto/serviço. Diante disso, a aplicabilidade da legislação consumerista é patente, e, além, ante à hipossuficiência técnica presumida da parte autora, é de rigor o reconhecimento da inversão do ônus da prova, com base no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor. O autor provou o vínculo com a ré, e, em mesma ordem de importância, os valores pagos a ela. Resta analisar a validade das cláusulas contratuais que tratam da possibilidade de rescisão, em especial a de número VII-3. Considerando que tais disposições não se revelam isonômicas, pois preveem sanções ao inadimplemento dos compradores, mas não aplicam as mesmas consequências ao eventual inadimplemento da ré, é de se concluir pela sua nulidade. E segundo, e agora sim atinente ao que foi relatado nos presentes autos, o conteúdo da cláusula é abusivo, uma vez que prevê sanção extremamente alta à opção de rescisão por parte dos compradores: ou se paga multa de pelo menos 40% do valor pago, ou não se devolve nada do que foi pago. O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 51, incisos II e IV, condena tal prática, pois, por mais que a cláusula permita a devolução de parte do que foi pago à vendedora, tal quantia extremamente prejudicada pela multa de 10% sobre o valor do contrato. 1095575-53.2016.8.26.0100 - lauda 3
fls. 161 Neste ponto, além de colocar o consumidor em posição grandemente desfavorável, a multa perde o seu sentido ontológico, que é a de propiciar ao fornecedor de serviços que recupere o investimento feito na promoção da venda, e que o mesmo consiga colocar o objeto de volta ao mercado, se este for o seu intuito, e aliená-lo, novamente, a terceiros. Ora, como bem alegado pelo autor, o artigo 413 do Código Civil é claro ao determinar que, estando paga parte da obrigação, deve o magistrado reduzir a penalidade equitativamente. É o que faço agora. Diante da abusividade, e consequente da Cláusula VII - 3, determino a retenção de apenas 10% dos valores pagos pelo autor à ré, como pena pela rescisão contratual, e para que a ré possa recolocar o objeto, se assim quiser, de volta ao mercado. Assim, deve a parte ré devolver 90% do que lhe foi pago. Ademais, não há sentido lícito na devolução da quantia determinada em tantas parcelas quanto aquelas pagas. Ora, a aplicação de tal determinação gera enriquecimento sem causa à vendedora, que poderá lucrar e investir com dinheiro que não é seu. Por isso, seguindo a jurisprudência pacífica do egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo (súmula nº 2, in verbis : "A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição"), determino que a quantia de 90% do que foi pago pelos autores à ré seja devolvida, por esta, em parcela única. 1095575-53.2016.8.26.0100 - lauda 4
fls. 162 Esse é o entendimento dos colendos TJDF e TJSP: APELAÇÃO CÍVEL AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE UNIDADE IMOBILIÁRIA DISTRATO UNILATERAL - INICIATIVA DO COMPRADOR DEVOLUÇÃO DE PRESTAÇÕES PAGAS À COMPRADORA MULTA CONTRATUAL ABUSIVA RESTITUIÇÃO DE COMISSÃO DE CORRETAGEM VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO ART. 6º DO CDC AUSÊNCIA DE PACTUAÇÃO ESPONTÂNEA E CLARA RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-DF - Apelacao Civel : APC 20130110946090 DF 0024548-66.2013.8.07.0001). AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. Promessa de venda e compra de imóvel. Autores responsabilizados também pelo pagamento de comissão de corretagem e taxa de assessoria imobiliária. Saldo devedor que se mostrou além do convencionado, após o pagamento de valores e utilização do FGTS, motivando a propositura da demanda. Sentença de parcial procedência, que rescindiu a avença e determinou a devolução de 90% dos valores pagos, bem como da comissão de corretagem. Apela a corré Itaquiti, alegando ilegitimidade passiva para responder pela devolução da comissão de corretagem; descabimento da devolução de 90% dos valores pagos, devendo ser observada a cláusula 7.6 da avença; descabimento da determinação de devolução da intermediação imobiliária. Rescisão contratual. Ilegitimidade passiva. Alegação rechaçada. Celebração da avença que legitima a ré a estar no polo passivo, inclusive para responder pela comissão de corretagem. Consumidores que podem eleger contra quem demandar. Inteligência do art. 25, 1º, CDC. Comissão de corretagem. Consumidores que se dirigiram ao stand de venda do empreendimento. Empresas envolvidas que se beneficiaram da transação. Pertinência da devolução da comissão de corretagem, sob pena de enriquecimento sem causa. Devolução de valores. Reconhecimento da nulidade da cláusula 7.6 da avença, que permitiria a retenção de valor abusivo. Inteligência dos arts. 39, V, e 51, IV, CDC. Pertinência da retenção de 10% dos valores efetivamente recebidos, percentual apto a remunerar as despesas com a comercialização e o inadimplemento, 1095575-53.2016.8.26.0100 - lauda 5
fls. 163 inexistindo comprovação de gastos que superariam tal percentual. Necessidade de devolução de 90% do valor recebido, imediatamente e em parcela única, incidindo correção monetária desde os desembolsos e juros de mora a contar da citação. Inteligência da Súmula 2, TJSP e art. 405, CC. Recurso impróvido. (TJ-SP - Apelação : APL 10032675120148260008 SP 1003267-51.2014.8.26.0008). Ainda, para fins de decisão, considero o valor pago pelos autores sem correção monetária, para que, após o trânsito em julgado, em fase de cumprimento de sentença, proceda-se à definitiva atualização dos valores. Por fim, no que se refere ao pedido de desconsideração da personalidade jurídica, deixo para apreciá-lo no futuro, caso se verifique a necessidade. Decido Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para, nos termos do art. 269, inc. I, do Código de Processo Civil CONDENAR a parte ré a restituir 90% do que foi pago pelo, em parcela única, com a incidência de correção monetária, de acordo com a Tabela do E.TJSP, desde o(s) desembolso(s), e juros de mora no patamar de 1% ao mês desde a citação (seguindo aqui reiterada jurisprudência do E. TJSP). Nos termos do artigo 20 do Código de Processo Civil, deverá a ré arcar com o pagamento das custas e despesas processuais, bem como com o pagamento dos honorários advocatícios do patrono do autor, que fixo em 15% sobre o valor da condenação. Oportunamente, cumpridas todas as formalidades legais e não tendo os litigantes requerido quaisquer providências, arquivem-se os autos. P.R.I.C. 1095575-53.2016.8.26.0100 - lauda 6
fls. 164 São Paulo, 21 de novembro de 2016. DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006, CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA 1095575-53.2016.8.26.0100 - lauda 7