Palavras-chave: Direito subjetivo. Direito objetivo. Interesse. Vontade.



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Transcrição:

PROF. MS. FABIO TRUBILHANO PERSPECTIVAS ONTOLÓGICAS DO DIREITO SUBJETIVO: UM ESTUDO COMPARADO Palavras-chave: Direito subjetivo. Direito objetivo. Interesse. Vontade. Introdução. A estrutura deste texto compõe um artigo de compilação das teorias de renomados juristas, ao qual acrescemos, em meio ao desenvolvimento, de forma singela e modesta, o nosso entendimento sobre o tema. Longe de apresentar o tema como se fosse um ponto pacífico, esperamos que este trabalho sirva para que os interessados pelo tema reflitam nas diversas concepções ontológicas sobre o direito subjetivo, ou seja, o que é o direito subjetivo em essência, qual a sua natureza. 1. Direito subjetivo no Direito Romano O direito subjetivo, cunhado seu conceito nos tempos romanos, daí a terminologia latina, recebe o epíteto de facultas agendi, que nada mais é do que a faculdade de agir. Ao direito subjetivo opõe-se o direito objetivo, que no Direito Romano recebeu a nomenclatura de norma agendi, ou seja, a norma de agir, norma posta preconizando as condutas.

Nesse sentido, explica Thomas Marky: Direito, no sentido subjetivo, significa a facultas agendi, que é um poder de exigir determinado comportamento de outrem, porder esse conferido pela norma jurídica 1. O conceito romano de direito subjetivo, portanto, lastreia-se na possibilidade do cidadão exigir um direito que está previsto no ordenamento jurídico. É a faculdade de agir, de exigir o que a ordem jurídica garante. O termo facultas agendi elucida bem a compreensão do Direito Romano acerca do direito subjetivo: quando é facultado a alguém exigir determinado comportamento, determinada conduta, esse alguém possui a possibilidade, a liberdade de exigir ou não, a faculdade de exercer o seu direito. É, pois, uma ação facultativa, garantida por norma. Vejamos o exemplo do doutrinador acima citado: Por exemplo, a regra que responsabiliza o vendedor pelos vícios ocultos da coisa vendida é um direito no sentido objetivo. O direito de pedir rescisão da venda pelo vício descoberto na coisa recém-comprada é um direito subjetivo do comprador 2. Entendamos, nesse exemplo, que a norma possibilita, mas não exige do comprador que exercite seu direito. É mera faculdade. Caso exercite seu direito, o vendedor, este sim, não tem faculdade, mas sim o dever de cumprir o disposto no direito objetivo. É em harmonia a esse posicionamento que Oswaldo Fróes abre capítulo, em seu prestigiado livro sobre o Direito Romano 3, intitulado Tutela dos Direitos Subjetivos As legis actiones. Isto porque o cidadão, a partir do momento que resolve exercitar seu direito subjetivo, tem a seu dispor as ações judiciais. 1 2 3 MARKY, Thomas. Curso elementar de direito romano. p. 26. MARKY, Thomas. Curso elementar de direito romano. p. 26. FROÉS, Oswaldo. Direito romano: essência da cultura jurídica. p. 211.

Na acepção romana, portanto, podemos entender que as legis actiones eram instrumentos que protegiam direitos subjetivos do cidadão, o qual possuía a faculdade de agir ou não. Vale refletir sobre o termo agendi e o termo actio, ambos etimologicamente relacionados a ação, movimento, atitude. Como conclusão, podemos afirmar, portanto, que direito subjetivo e direito objetivo, na perspectiva romana, são direitos indissociáveis, complementares. 2. Direito subjetivo segundo Windscheid Windscheid, jurista alemão de notáveis conhecimentos sobre a cultura jurídica romana, concebeu o direito subjetivo como exteriorização do talante, do elemento volitivo de cada ser humano, desde que tal vontade fosse protegida juridicmente. Essa concepção guarda raízes, obviamente, no conceito romano de facultas agendi. O jurista em questão, entretanto, acentuou o aspecto psicológico humano, ou seja, o desejo, o arbítrio, o ânimo. A definição de direito subjetivo como a vontade juridicamente protegida possui frágil sustentação, tendo sofrido fortes objeções por Kelsen e Jhering, entre outros, conforme assinala Miguel Reale 4. Entre as objeções suscitadas por tais autores, temos a hipótese do credor que não queira cobrar uma dívida. Há, nesse caso, a existência do direito subjetivo, que corresponde a um direito positivado, mas não se faz uso do direito subjetivo porque o credor não quer, e nem por isso o direito subjetivo soçobra. 4 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. p. 253-255.

Outra hipótese, a contestar a teoria de Windscheid, é a da existência de direitos subjetivos que colidem com a vontade do próprio titular. Ora, um trabalhador pode não querer, no seu íntimo, receber suas horas extras trabalhadas. Nem por isso há a elisão do direito subjetivo, pois se trata de um direito indisponível, a vontade do titular pode redundar em não exercitar o direito subjetivo, mas não em sua inexistência. Como último exemplo, a refutar a caracterização do direito subjetivo como mero elemento volitivo, é a representação dos absolutamente incapazes. Estes são titulares de direitos subjetivos, mas pode ocorrer que não tenham sequer consciência de que são titulares de tais direitos, ou mesmo que não tenham desejos ou vontades, mas serão devidamente representados, o que demonstra a possível dissociabilidade entre vontade juridicamente protegida e direito subjetivo. 3. Direito subjetivo segundo Rudolf von Jhering Em seu famoso livro, A luta pelo Direito, Rudolf Von Jhering sutenta: o direito, no sentido objetivo, compreende os princípios jurídicos manipulados pelo Estado, ou seja, o ordenamento legal da vida. O direito, no sentido subjetivo, representa a atuação concreta da norma abstrata, de que resulta uma faculdade específica de determinada pessoa 5. 5 JHERING, Rudolf von. A luta pelo direito. p. 29.

Nessa obra, o ilustre jurista alemão irá sustentar que tanto o direito subjetivo como o objetivo encontram resistências, e que deve haver uma luta para a manutenção e eficácia do ordenamento. Assim sendo, apregoa Jhering que de nada adianta a validade do direito objetivo se o cidadão não exerce seu direito subjetivo, se não luta por sua possibilidade de exigir o cumprimento da norma. Da mesma sorte, não estará em harmonia o sistema jurídico se determinada coletividade possui um interesse pelo qual luta sem que haja direito objetivo que o assegure. A tônica da obra é justamente a luta pelo direito subjetivo. Vejamos as palavras do autor: Como objetivo principal do meu trabalho escolhi a luta no terreno subjetivo, mas nem por isso posso abster-me de demonstrar que a validade da minha proposição, de que a luta é a própria essência do direito, também prevalece no terreno objetivo. 6 Jhering, portanto, atenua o quesito eminentemente psicológico da teoria de Windscheid, substituindo o conceito de vontade por interesse. O direito subjetivo, então, para Jhering, é o interesse juridicamente protegido, e não mera vontade. Miguel Reale 7, em seu costumeiro bom senso, lembrando também as palavras de outros críticos, alerta para a acepção extremamente ampla e genérica do termo interesse, atribuindo pouca precisão ao conceito de direito subjetivo formulado por Jhering. 6 7 JHERING, Rudolf von. A luta pelo direito. p. 29. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. p. 256.

Precisa ser lembrado, como já foi dito por vários autores, que interesses há que o Estado garante e protege, sem que se conceda pretensão a um indivíduo determinado. Nesse sentido, há interesses que são juridicamente protegidos, mas que não geram, para o interessado, um direito subjetivo 8, o que nos faz chegar à conclusão de que o conceito de Jhering também não traduz, com plenitude, a essência do direito subjetivo. 4. Direito subjetivo segundo Georg Jellinek Não há dúvidas de que as duas teorias acima expostas, a da vontade e a do interesse, foram as maiores tendências do século XIX, no que tange à essência do direito subjetivo. O mérito de Gerog Jellinek foi conjugar as duas teorias dominantes, realizando um conceito que envolvia tanto a vontade quanto o interesse. O direito subjetivo, segundo esse pensador, constitui-se de um interesse juridicamente protegido, na medida em que concede a alguém o poder de querer. É com razão que Miguel Reale lembra que os críticos das teorias da vontade e do interesse permanecem com as mesmas objeções no que se refere à teoria de Jellinek, porquanto houve a construção de uma terceira via, uma miscelânea de conceitos, de modo que as vantagens dessa teoria mista não elidem os vícios de que padeciam as teorias originais. 8 Sobre esse assunto, no seminário apresentado durante o curso, citado na Introdução deste artigo, foram debatidos alguns direitos ambientais, os quais constituem interesses protegidos juridicamente, mas nem por isso conferem a cada cidadão um direito subjetivo.

5. Direito subjetivo segundo Del Vecchio Del Vecchio utiliza como base a teoria da vontade, mas a retifica de maneira a proporcionar, a nosso ver, a melhor definição de direito subjetivo, aproximando-se em demasia de suja essência: Del Vecchio explica que a vontade que caracteriza o direito subjetivo não é a presente e atuante, mas sim uma vontade em potencial. Nessa vereda, entende-se que não é a presença da vontade que caracteriza o direito subjetivo, mas sim a existência de um poder querer, da possibilidade de querer, da potencialidade do elemento volitivo. Excelente é a ilação de Miguel Reale, sobre essa teoria, comparando a teoria da vontade com a teoria de Del Vecchio: Assim, o problema é transposto do plano psicológico para o plano lógico. Não se trata mais da vontade psíquica, concreta, empírica, de um sujeito em determinado momento, mas tão-somente de uma possibilidade lógica de querer no âmbito administrativo. 9 Dessa maneira, o exemplo do trabalhador, suscitado acima, fica resolvido: ele pode não querer receber por suas horas-extras trabalhadas, mas tem a possibilidade de querer, tem esse potencial, respaldado juridicamente, e por isso existe o direito subjetivo, apesar de não existir o elemento volitivo factual. Reiteramos, portanto, que a teoria de Del Vecchio nos parece a mais adequada para adentrarmos a essência do direito subjetivo. Obviamente que os louros não 9 REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. p. 258.

devem ser atribuídos a um só pensador, porquanto sua construção filosófica é realizada sobre teorias anteriormente cunhadas, mas não se pode negar que os retoques realizados pro Del Vecchio à teoria da vontade proporcionaram, a nosso ver, maior precisão no tratamento o tema. 5. Direito subjetivo segundo Hans Kelsen Hans Kelsen, como não poderia deixar de ser, já que em harmonia como sua Teoria Pura do Direito, vislumbra o direito subjetivo em termos rigorosamente formais. Para Kelsen o direito subjetivo é desdobramento da norma positiva. É o dever oriundo da norma formal. Ou seja, a norma e a sua exigibilidade são facetas de uma mesma realidade formal, que é o Direito, o sistema positivado. Nesse entendimento, o direito subjetivo nada mais é do que a introjeção da norma objetiva, geral e abstrata à subjetividade, especificidade e concretude de um caso. Para Kelsen, o direito subjetivo é a própria norma, servindo a alguém em específico como poder jurídico de exigir o que a própria norma contém. Para nós, respeitando os posicionamentos contrários, parece-nos que esse entendimento formalista acaba por suprimir o direito subjetivo, entendendo tudo como norma, em diferentes momentos e percepções. Conclusão.

Retomamos, à guisa de conclusão, nosso posicionamento em relação ao direito subjetivo: parece-nos impossível compreender a essência do direito subjetivo dentro da teoria da vontade, da teoria do interesse e da teoria pura do direito. A primeira, a da vontade, porque dá excessivo valor ao elemento psíquico humano, elemento tão frágil, que padece de constantes vicissitudes, não se pode restringir a existência de um direito subjetivo ao foro íntimo de cada cidadão, visto que nem sempre a harmonia social se concretiza atendendo-se às vontades dos titulares dos direitos direitos há que são indisponíveis, e pessoas há que não conseguem externar devidamente suas vontades. A teoria do interesse cai por terra ao levantarmos casos concretos em que há interesses, há proteção jurídica, mas não há direito subjetivo atribuído a indivíduos em específico. Esses interesses muitas vezes devem ser defendidos por instituições que representem a coletividade, alijando os direitos subjetivos dos cidadãos em específico. A teoria formalista, de Kelsen, acaba por desmantelar o dualismo objetivo subjetivo, já que considera direito subjetivo e objetivo como manifestações do próprio sistema normativo. Tal teoria, praticamente monista, parece não encontrar regaço na realidade, tanto o é que algumas línguas possuem termos distintos para especificar essas duas realidades, como por exemplo o inglês, como bem lembra Tércio Sampaio Ferraz Jr. em Introdução ao Estudo do Direito, a palavra law se refere a direito objetivo, norma agendi ; e a palavra right se refere a direito subjetivo, facultas agendi.

Não só por essas refutações, mas principalmente pelos próprios méritos, harmonizamo-nos com a teoria de Del Vecchio, que modifica o elemento da vontade in acto, concebendo-a in potentia. Parece-nos, portanto, que a essência do direito subjetivo está na possibilidade de querer algo que esteja respaldado no sistema jurídico, mesmo que concretamente não se queira, há a potencialidade de querer, porquanto o direito objetivo assim garante. Bibliografia DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro : teoria geral do direito civil. São Paulo: Saraiva, 2008. FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. São Paulo: Saraiva, 2008. FRÓES, Oswaldo. Direito Romano: essência da cultura jurídica. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2004. GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 19.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. JHERING, Rudolf von. A luta pelo Direito. São Paulo: Martin Claret, 2002. KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

MARKY, Thomas. Curso elementar de Direito Romano. São Paulo: Saraiva, 1995. PÁRAMO, Juan Ramón de. Derecho subjetivo. In:. El derecho y la justicia. Madrid: Editorial Trotta, 2000. REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. 25.ed. São Paulo: Saraiva, 2000.