PROCESSO INTERESSADO ASSUNTO - TC-7363/2010 - CÂMARA MUNICIPAL DE AFONSO CLÁUDIO - CONSULTA EMENTA ALIENAÇÃO DE BENS MÓVEIS DO PODER LEGISLATIVO - PROCEDIMENTO LICITATÓRIO - PREFEITURA MUNICIPAL - REGRA - RECEITA REPASSADA AO PODER EXECUTIVO - DOAÇÃO DE BENS MÓVEIS INSERVIVEIS - PODER LEGISLATIVO - NÃO GERA RECEITA. Vistos, relatados e discutidos os autos do Processo TC-7363/2010, em que o Presidente da Câmara Municipal de Afonso Cláudio, Sr. Nilton Luciano de Oliveira, formula consulta a este Tribunal, nos seguintes termos: 1 A quem cabe a alienação de bens móveis do Poder Legislativo? 2 Qual o Poder deverá abrir o processo licitatório de alienação: Legislativo ou Executivo? 3 A receita proveniente da Alienação de bens será destinada ao Poder Legislativo ou Executivo: Caso seja destinada à Câmara Municipal, como esta receberá tal
receita? Poderá recebê-la além das transferências pelo Poder Executivo à câmara Municipal? 4 Nos casos de doação dos bens móveis inservíveis da Câmara Municipal a quem cabe fazê-lo: O Poder Legislativo ou o Executivo? Considerando que é da competência deste Tribunal decidir sobre consulta que lhe seja formulada na forma estabelecida pelo Regimento Interno, conforme artigo 1º, inciso XXIV, da Lei Complementar nº 621/12. RESOLVEM os Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, em sessão realizada no dia vinte e dois de janeiro de dois mil e treze, à unanimidade, acolhendo o voto do Relator, Conselheiro José Antônio Almeida Pimentel, preliminarmente, conhecer da consulta, para, no mérito, respondê-la nos termos da Orientação Técnica em Consulta nº. 15/2012, da 8ª Controladoria Técnica, firmada pela Auditora de Controle Externo, Senhora Maria Clara Seabra de Mello Costa, abaixo transcrita: Orientação Técnica em Consulta 15/2012: Trata o presente feito de consulta formulada pelo Sr. Nilton Luciano de Oliveira, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Afonso Cláudio, cujas indagações transcrevemos a seguir: 1 A quem cabe a alienação de bens móveis do Poder Legislativo? 2 Qual o Poder deverá abrir o processo licitatório de alienação: Legislativo ou Executivo?
3 A receita proveniente da Alienação de bens será destinada ao Poder Legislativo ou Executivo: Caso seja destinada à Câmara Municipal, como esta receberá tal receita? Poderá recebê-la além das transferências pelo Poder Executivo à câmara Municipal? 4 Nos casos de doação dos bens móveis inservíveis da Câmara Municipal a quem cabe fazê-lo: O Poder Legislativo ou o Executivo? É o relatório. DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE Antes de adentrar ao mérito da consulta, faz-se necessário verificar a presença dos requisitos de admissibilidade, conforme prescreve o artigo 96 da Resolução TC nº 182/2002 (Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo - RITCEES): Art. 96. A consulta deverá revestir-se das seguintes formalidades: I ser subscrita por autoridade competente; II referir-se a matéria de competência do Tribunal; III conter indicação precisa da dúvida ou controvérsia suscitada; IV ser formulada em tese; V conter o nome legível, a assinatura e a qualificação do consulente. No tocante ao requisito constante no inciso I, é possível
verificar que a definição de autoridade competente encontra suas balizas no artigo 95, inciso II, do referido diploma normativo: Art. 95. O Plenário decidirá sobre consultas quanto a dúvidas suscitadas na aplicação de dispositivos legais e regulamentares concernentes à matéria de sua competência, formuladas:... II - no âmbito municipal, pelos prefeitos, presidentes de Câmaras, presidentes de Comissões Parlamentares da Câmara Municipal, dirigentes de autarquias, das sociedades de economia mista, das empresas públicas e das fundações instituídas e mantidas pelo Município. De fato, sendo o consulente Presidente da Câmara Municipal de Afonso Cláudio, tem-se como atendido o primeiro requisito. Verifica-se ainda que o referido dirigente está devidamente qualificado nos autos, donde consta seu nome legível e assinatura (inciso V). A questão aborda matéria de competência desta Corte, pois se refere à alienação e doação de bens de propriedade da Câmara Municipal. Outrossim, constata-se que há indicação precisa das dúvidas e que essas foram formuladas conforme preceitua o inciso III do artigo 96 acima transcrito. As indagações também foram formuladas em tese, como determina o Regimento Interno deste Tribunal.
Embora não tenha havido a indicação expressa da norma objeto de questionamento, é possível extraí-la do relato da consulta. Nesse sentido, nos autos do processo TC n. 303/2011 (fls. 10/12), restou configurado pelo Exmo. Sr. Conselheiro Sebastião Carlos Ranna de Macedo que, em se tratando de caso de fato notório ou de norma de direito federal ou nacional, torna-se desnecessária a indicação do dispositivo em debate. Isto posto, reconhecendo que estão presentes os requisitos de admissibilidade da consulta, somos pelo seu CONHECIMENTO. DO MÉRITO O Muncípio é entidade federativa, integrante da organização político-administrativa da República Federativa do Brasil, e possui autonomia, nos termos da Constituição, como preconiza o artigo 18 da Carta Magna. No âmbito municipal, o Poder Legislativo corresponde à Câmara Municipal. Esta goza de independência em relação ao Executivo, como derminado pelo art. 2º da Constituição Federal e goza ainda de autonomia para dispor sobre organização e funcionamento dos seus serviços, conforme artigo 51, IV da Constituição Federal, ambos aplicáveis ao Legislativo Municipal em razão do princípio da simetria. Os bens sob administração da Câmara Municipal são bens públicos e obedecem às regras da Lei n. 8.666/93 para alienação. O art. 17, II, do diploma legal mencionado preconiza que a alienação de bens móveis da
Admnistração Pública depende de avaliação prévia e licitação, sendo esta dispensada nas situações das alíneas a a f. O parágrafo 6º do mesmo artigo determina ainda que para os bens móveis avaliados até R$ 650.000,00, a alieanação poderá ser efetivada mediante leilão. A Câmara, todavia, não possui personalidade jurídica, e os bens sob sua responsabilidade na verdade pertencem ao Município, como ensina Hely Lopes Meirelles 1. Manifestase na mesma linha o Tribunal de Contas de Santa Catarina: Prejulgado 0416: A transferência de bens públicos pelo Poder Executivo ao Poder Legislativo implica tão somente na faculdade de administração, ou seja, utilização, guarda, conservação e aprimoramento, vez que referidos bens são de propriedade do Município e não de seus órgãos e Poderes. Assim responde-se aos itens 1 e 2 no sentido de que como os bens pertencem ao Município, sua alienação, via de regra, deve ser feita pela Prefeitura, mediante procedimento licitatório. Todavia, tendo em vista a autonomia concedida pela Constituição Federal ao Legislativo, este pode realizar a alienação, pois como os bens estão sob sua guarda e administração, está mais apto a melhor determinar a conveniência ou não da alienação. Isto posto, passa-se à análise de a quem pertencerá o recurso advindo da alienação: 1 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 14ª edição, Malheiros, 2006, p. 304/306.
A Câmara Municipal não é unidade arrecadadora de receita pública, seja originária, seja derivada. Isso porque, nos termos do art. 168 da CF, os recursos financeiros correspondentes à dotação orçamentária do Poder Legislativo serão a este entregues pelo Executivo, até o dia 20 de cada mês. Assim, se a fonte de recursos financeiros da Câmara é constituída pelos repasses do Executivo (duodécimo), não há que se falar em arrecadação de receita por parte do Legislativo. Além disso, os gastos da Câmara Municipal devem estar em concordância com o art. 29-A, norma constitucional que estabelece o limite de despesas do Poder Legislativo. A utilização dos recursos de alienações configurar-se-ia como despesa acima desses valores e, portanto, inadequada. Responde-se, portanto, ao terceiro questionamento, no sentido de que a receita proveniente da alienação de bens sob responsabilidade da Câmara deve ser repassado ao Executivo, que irá contabilizá-lo como receita de capital. Nesse sentido, posicionamento já firmado por esta Corte de Contas, no Parecer em Consulta n. 090/97, em vigor: Considerando-se entretanto, seja a alienação realizada nos moldes legais, o preço obtido é receita extra-orçamentária da Câmara que, por não possuir receita própria, repassa imediatamente à Prefeitura como receita extraorçamentária, e esta o contabiliza como receita orçamentária - Receita de Capital, Alienação de Bens Móveis (2210.00.00).
O mesmo entendimento é adotado pelo Tribunal de Contas de Pernambuco, senão vejamos: PROCESSO TC Nº 1060047-4 PRESTAÇÃO DE CONTAS DA MESA DIRETORA DA CÂMARA MUNICIPAL DE OROBÓ (EXERCÍCIO DE 2009) RELATOR: CONSELHEIRO ROMÁRIO DIAS ÓRGÃO JULGADOR: SEGUNDA CÂMARA DECISÃO T.C. Nº 0808/11: [...] Determinar, por fim, ao atual gestor da citada Câmara Municipal, com base no art. 69 da Lei Estadual nº 12.600/2004, que: a) institua controle de despesas com combustíveis (mapa de abastecimento, relatório de viagens/utilização, relatório mensal de abastecimento, registro de quilometragem rodada, menção às placas dos veículos nas notas fiscais, requisições com os dados necessários para identificação dos veículos); b) repasse à Prefeitura do valor referente à alienação do veículo (R$ 18.100,00), uma vez que a receita proveniente da venda de bem público pertence ao Município, e não ao Poder Legislativo (Decisão TC nº 0029/04) (grifamos) [...] Observamos ainda que o montante pode ser devolvido à Câmara pela Prefeitura, devendo então ser considerado como antecipação de duodécimo, o que garante a obediência aos limites impostos pelo art. 29-A da Constituição Federal. Quanto ao quarto questionamento, as considerações feitas nos itens anteriores também são pertinentes ao seu
deslinde. Gozando a Câmara de autonomia nos termos da Carta Magna e como a doação não gera receita, pode o Poder Legislativo praticá-la, desde que que obedecidos os ditames da Lei n. 8.666/93, art. 17, II, a, quais sejam: avaliação prévia dos bens a serem doados; que a doação seja para fins e uso de interesse social; que seja feita uma avaliação de sua oportunidade e conveniência socioeconômica em relação a outra forma de alienação. Impende ressaltar, por fim, que o cumprimento dos critérios legais acima elencados deve restar claro no procedimento administrativo de alienação, devendo cada etapa ser registrada por escrito nos autos, a fim de conferir total transparência e controle do ato. CONCLUSÃO Desse modo, considerando os preceitos constitucionais e legais aplicáveis ao presente caso e a fundamentação exposta, opinamos para, no mérito, responder ao questionado nos termos elencados neste feito. É o nosso entendimento. Composição Plenária Presentes à sessão plenária da apreciação os Srs. Conselheiros Sebastião Carlos Ranna de Macedo, Presidente, José Antônio Almeida Pimentel, Relator, Sérgio Aboudib Ferreira Pinto, Domingos Augusto Taufner, Rodrigo Flávio Freire Farias Chamoun e os Conselheiros em substituição Márcia Jaccoud Freitas e
João Luiz Cotta Lovatti. Presente, ainda, o Dr. Luciano Vieira, Procurador Especial de Contas em substituição ao Procurador-Geral do Ministério Público Especial de Contas. Sala das Sessões, 22 de janeiro de 2013. CONSELHEIRO SEBASTIÃO CARLOS RANNA DE MACEDO Presidente CONSELHEIRO JOSÉ ANTÔNIO ALMEIDA PIMENTEL Relator CONSELHEIRO SÉRGIO ABOUDIB FERREIRA PINTO CONSELHEIRO DOMINGOS AUGUSTO TAUFNER CONSELHEIRO RODRIGO FLÁVIO FREIRE FARIAS CHAMOUN
CONSELHEIRA MÁRCIA JACCOUD FREITAS Em substituição CONSELHEIRO JOÃO LUIZ COTTA LOVATTI Em substituição DR. LUCIANO VIEIRA Procurador Especial de Contas em substituição ao Procurador-Geral Lido na sessão do dia: ODILSON SOUZA BARBOSA JUNIOR Secretário Geral das Sessões