KATIA FRAGA LAÇOS DE FAMÍLIA: A Construção de uma comunidade de afeto no Programa Jairo Maia

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Transcrição:

KATIA FRAGA LAÇOS DE FAMÍLIA: A Construção de uma comunidade de afeto no Programa Jairo Maia Dissertação elaborada sob a orientação da Prof. Dra. Ana Lucia Silvia Enne, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do título de mestre. Área de concentração: Comunicação e Mediação Niterói Junho 2005

BANCA EXAMINADORA Prof. Dra. Ana Lúcia Enne (Orientadora PPGCOM UFF) Prof. Dra. Marialva Barbosa (PPGCOM UFF) Prof. Dra. Márcia Vidal (PPGS UFC) Niterói, 13 de junho de 2005

RESUMO Este trabalho tem o propósito de discutir a construção de uma comunidade afetiva que se consolida através da relação entre o ouvinte e o radialista, tendo a locução como lugar central de mediação, de configuração de identidade, a partir dos papéis exercidos perante a alteridade, com consentimento de seu público. analisamos, assim, os elos de identificação cirados numa família amalgamada em torno do Programa Jairo Maia, irradiado há 44 anos em emissoras capaixabas. Palavras-chave: Rádio, Mediação, Identidade

ABSTRACT The main objective of the present research it discussing the construction of na affective community, which consolidates itself through the relationship between the listener and the radio Professional, having the speech as the central element of mediation and identity development, taking into consideration the parts played by each other, with the public s agreement. Therefore, identification connections built in a consolidated family around Jairo Maia Programme, which has been presented for 44 years on radio stations in Espirito Santo State, are analyzed. Key-Words: Radio, Mediation, Identity.

SUMÁRIO INTRODUÇÃO...6 CAPÍTULO I 1- A construção de um modelo de programação popular no padrão AM da radiodifusão...28 1.1- O rádio como mediador: as relações entre o popular e o massivo...29 1.2- Peculiaridade da popularização e massificação do rádio no Brasil...38 1.2.1- Características de emissoras AM e FM no contexto brasileiro...44 CAPÍTULO II 2- Estratégias de fidelização: a performance como lugar central na relação entre locutor e ouvinte...48 2.1- A performance como instrumento no processo de fidelização do público...49 2.2- Mito e carisma na performance mediatizada...52 2.3- A linguagem radiofônica...56 2.3.1- A oralidade como um dos sustentáculos da comunicação radiofônica...57 2.3.2- Características intrínsecas ao rádio...60 2.4- Recursos de enunciação...61 2.4.1- As três vozes do rádio...61 2.4.1.1- A vocalidade...62 2.4.1.2- Os efeitos sonoros... 65 2.4.1.3- A música...67 2.5- Estratégias e táticas no processo de fidelização...69

2.5.1- O jogo estratégico da produção...71 2.5.1.1- O estilo da narração e a emocionalidade das palavras: novos indicativos de estratégias para conquistar o ouvinte...74 2.5.1.2- O jornalismo a serviço da audiência...81 2.5.2- As táticas na audição do Programa Jairo Maia...86 2.6- O locutor como mediador...91 2.6.1- Os múltiplos papéis do locutor...92 CAPÍTULO III 3- Memória, Identidade e Narrativa: os fundamento da Família Gazeta...96 3.1- A relação entre memória e identidade...96 3.2- Mídia: o espaço privilegiado da identidade e memória contemporâneas..104 3.3- A construção de comunidades via mídia...108 3.4- A construção dos laços de afeto da Família Jairo Maia...112 3.4.1- Estratégias e táticas para a construção dos elos de afeto...114 3.5- Jairo Maia: o defensor da Família Gazeta...125 CONCLUSÃO...140 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...155

INTRODUÇÃO No fundo, Ana sempre tivera necessidade de sentir a raiz firme das coisas. E isso um lar perplexamente lhe dera (Amor, de Clarisse Lispector). Estar incólume às armadilhas traiçoeiras e dolorosas da vida real talvez seja possível apenas no imaginário de quem sonha desfrutar de um mundo pleno de satisfações, solidariedade, compaixão. Mas é no lar, na família, que os anseios se materializam para nos permitir a sensação de alívio, proteção, companheirismo e alegria de quem, ao menos em instantes efêmeros e intangíveis, consiga fugir das amarras, dos perigos do se apresenta nas ruas, fora de casa. Queremos a todo instante nos proteger e encontrar alguém que nos liberte da permanente angústia da luta desenfreada pela sobrevivência, da competição implacável. Buscamos segurança, amparo. Nossos gritos interiores ecoam pedindo algo incomensurável, fugaz. É no afeto e por ele que nos juntamos em grupos, em comunidades 1, buscando um lugar seguro e confortável para viver a condição humana. É exatamente o afeto, o sentimento que norteia este estudo, com vários significados e um único sentido: os elos criados na vida de cada um de nós, sublimados no olhar, nos gestos, nas gargalhadas e lágrimas, na palavra. Essas expressões são enredo de momentos eternizados nas relações amalgamadas na solidez do carinho, gerado num ninho de conflitos, por vezes, mas, sobretudo, de alegria, confiança e prazer. A família biológica ou escolhida entre amigos, companheiros eleitos por características particulares e especiais, é progenitora dos laços afetivos, capazes de nutrir a mais profunda das carências do homem. 1 Os conceitos assinalados nessa Introdução com itálico serão desenvolvidos no decorrer da dissertação.

7 Levei dois anos para entender não somente conceitos, mas principalmente o motivo que me levou a escolher meu objeto empírico. Os autores, as entrevistas de campo, indicavam o caminho de uma família, talvez porque seja ela a minha própria razão de ser, de ser gente, feliz, espontânea, sensível. Minha orientadora sempre disse que essas pesquisas seguem o rumo da descoberta de nossa essência. Vasculhei dentro de mim, na angústia da solidão imposta por dias, noites e madrugadas a fio e na satisfação de novos ensinamentos ao longo desse processo criativo. Redescobri, num mergulho nas surpreendentes ondas do rádio, a força que emana da família. Esse cenário criado pelas irradiações radiofônicas despertou-me curiosidade desde cedo, já que o rádio permeou a minha infância. Na cozinha, na sala, ecoando por todos os cantos da casa, o rádio sempre se fez presente na família Fraga. Despertávamos ao som de Odair José, Angela Maria, Martinha, Nelson Ned, Vanusa, Paulo Sérgio, Orlando Silva, Roberto Carlos e tantos outros cantores de programas populares. Parecia que o rádio conversava e entendia minha mãe. Nunca deixando transparecer qualquer problema aos filhos, ela curava suas dores e aflições na ilusória sensação de que o radialista podia lhe apresentar um mundo diferente, repleto de sonhos realizáveis. As músicas alimentavam suas esperanças e despertavam nela o otimismo de dias melhores. Bastava ouvir alguma melodia como sorria meu bem, sorria (...) para levantar o astral. Os sentimentos mais profundos costumavam aparecer em forma de suspiros ao ouvir mensagens de otimismo levadas ao ar por Haroldo de Andrade, na Rádio Globo, o locutor de sua preferência. Criava-se, assim, um lugar acolhedor entre a música, a conversa amiga, a presença do locutor como companheiro motivador para boas emoções, e a radionovela arrancando suspiros, lágrimas, apreensão e uma torcida acirrada para o final feliz da mocinha apaixonada. Meu pai trabalhava dia e noite e ainda arranjava tempo para estudar. Chegava em casa geralmente meia noite e saía às 4 da madrugada numa dura jornada de operário que se acotovelava em trens e ônibus lotados para cumprir o horário de entrada nas obras de prédios chiques erguidos em áreas nobres do Rio de Janeiro. O radinho de pilha não lhe faltava nem no trabalho, nem quando chegava em casa, na Baixada Fluminense. Sem dinheiro para comprar um aparelho de TV, era em torno do rádio que a família se reunia,

8 completa, nos finais de semana, com crianças saltitantes em busca de carinhos e afagos, nem que para chamar a atenção dos adultos fosse preciso fazer algumas travessuras. Duque de Caxias parecia ser uma fração da comunidade compartilhada entre ouvintes de programas populares. No subúrbio, meu pai conseguiu transformar o barraco no qual morávamos numa casa de alvenaria. Tudo, graças à sua luta, ao apoio da esposa dedicada à família, e à ajuda de vizinhos, solidários e afetivos em todos os momentos, assim como observamos em momentos emocionais das irradiações radiofônicas. Mudamos de estado, quando meu pai conseguiu uma boa colocação em Vitória, no Espírito Santo, onde anos antes havia deixado para trás todos os seus parentes a fim de tentar a sorte na cidade maravilhosa. Mas o hábito de ouvir rádio continuou da mesma forma e, em pouco tempo, minha mãe já elegia outro locutor preferencial em emissoras capixabas: Jairo Maia, pelo estilo semelhante às programações que acompanhava no Rio. Eu crescia envolta nesse clima e, ainda criança, passei a fazer parte dos programas, ligando sempre para responder o nome das historinhas infantis veiculadas em um quadro da programação. Acertava e ganhava os discos, que não cansava de ouvir. Cresci mantendo a essência da alegria de uma criança feliz e amada. No jornalismo, coincidência ou não do destino, tive a oportunidade de trabalhar em rádio, veículo com o qual me identifiquei mais do que o jornal, meio em que também atuei. Fiz um teste e fui aprovada para compor a equipe de jornalistas da Rádio Gazeta AM 2, no horário da manhã, entre os programas de Luiz Carlos Peixoto (já falecido), de 6 às 9 horas, e de Jairo Maia, de 9 ao meio dia, ocupando o horário nobre da emissora. Entrava no ar com participações ao vivo 3, principalmente de comunidades com reivindicações de melhorias para os bairros. Ficava intrigada com a confiança que os moradores depositavam no meu trabalho e na atuação dos radialistas, além da forma carinhosa como era tratada. Assim que o carro de reportagem, a unidade móvel, chegava tinha sempre alguém gritando no meio da rua de regiões periféricas, com a ansiedade de alguém que espera um porta-voz para lutar por seus direitos de cidadão: Vamos gente, chegou a reportagem da rádio ; agora eu quero ver o 2 Emissora que compõe o sistema de rádio Gazeta AM, Litoral FM, CBN e Antena 1- da Rede Gazeta, empresa vinculada a Rede Globo, sendo o maior complexo de comunicação do Espírito Santo. 3 Sem gravação prévia.

9 prefeito dizer que não vai calçar nossa rua ; olha, Kátia Flávia chegou. E era Kátia Flávia mesmo, em vez do sobrenome legítimo Fraga, por influência de uma música conhecida. Aquelas cenas, a todo instante, faziam latejar perguntas permanentemente: o que faz com que as pessoas credenciem jornalistas e radialistas a buscar soluções para os seus problemas? Que espécie de vínculo era aquele capaz de fazer com que os ouvintes imaginassem que todos nós e eles - compartilhássemos das mesmas aspirações? Como nós que aparecíamos no ar somente com voz e nome podíamos ser identificados em lugares públicos, mesmo quando não estávamos trabalhando? Que tipo de elos criamos nesse cenário radiofônico? Somente no decorrer da produção desta dissertação de mestrado pude sinalizar indicativos para tais questionamentos. Há que se pontuar, todavia, que quando decidi desvelar meu objeto de estudo desvinculei-me desse ouvir marcadamente pessoal para assegurar uma reflexão acadêmica isenta para problematizar o que antes vivenciei como dado. A experiência de dez anos como profissional de rádio, inclusive em outra emissora da mesma empresa de comunicação, a Rádio CBN, me permitiu atuar como professora, principalmente em disciplinas ligadas ao rádio, na Faculdade de Educação e Comunicação (Faesa), em Vitória. Essa prática profissional foi também uma das motivações desse estudo, cujo interesse se dá, ainda, pela escassez do número de pesquisas acadêmicas sobre o rádio no Brasil, proporcionalmente em relação a outros meios de comunicação, como a televisão, por exemplo, resultando numa oferta tímida de instrumentos de pesquisa em relação ao veículo e de reflexões sobre essa mídia, principalmente na contemporaneidade. Partiu daí o interesse em decifrar o mistério que move diariamente uma multidão de ouvintes a sintonizar o rádio em um programa preferencial em detrimento de outro. Nosso estudo de caso, localizado como facilitador metodológico às reflexões teóricas, refere-se ao Programa Jairo Maia 4, com uma trajetória de 44 anos. Estamos considerando o programa como sendo representativo de mais da metade da história nacional do rádio, mantendo-se praticamente no mesmo formato e líder de audiência. 4 Optamos, para facilitar a compreensão, por grafar os nomes e quadros de programas com aspas e os nomes das emissoras em itálico.

10 Com mais de 60 mil ouvintes por minuto, em média, segundo dados do IBOPE, 5 o programa foi lançado na Rádio Espírito Santo, em 1961, e teve veiculação em várias emissoras capixabas. Recebe, normalmente, mais de 300 ligações diárias, além de cartas, visitas de fãs, enfim, diversas formas de contato com o programa, veiculado atualmente na Rádio Gazeta AM, de Vitória, no Espírito Santo. O Programa Jairo Maia tem estilo semelhante ao de comunicadores de destaque no cenário radiofônico nacional como Haroldo de Andrade, Eli Corrêa e tantos outros, que passaram a fazer parte do dia-a-dia de seus ouvintes - entrando nos lares, no trabalho, para levar alegria, entretenimento, emoção, e se destacando pela peculiaridade do estilo de locução, da interatividade e da forma de envolver o receptor, consolidando ao longo de mais de oito décadas de história a fidelidade desse público. Nossa dissertação de mestrado busca investigar como o Programa Jairo Maia consegue manter a fidelização de ouvintes ao longo de todo esse tempo, respondendo, assim, a uma pergunta transformada em slogan do PMJ 6 : Programa Jairo Maia, 44 anos no ar. Deve haver uma razão para uma existência tão longa 7. Tentaremos desvendar, assim, o fenômeno da relação locutor-ouvinte, considerando a interface comunicacional do radialista. Nesse sentido, trabalharemos com algumas hipóteses. Uma delas é a locução como lugar central de mediação, de configuração de identidade, o que ocorre pela empatia, pela proximidade com o radialista, que assume múltiplos papéis, como o de defensor do ouvinte, mediante o domínio do lugar político e estratégico de autoridade, conferido por seu público. Outra interpretação para a qual chamamos a atenção é a de que a linguagem informal, o estilo divertido e o conteúdo variado pegadinha, prestação de serviço, informação, doações, etc - são estratégias de produção no processo de fidelização da audiência cativa de programas populares em emissoras AM. Vinculado a isso estão as táticas dos ouvintes, produtores invisíveis, ou co-produtores, a partir das diversas formas de participação desse formato de programação. 5 Pesquisa do IBOPE, realizada no período de 14 a 21 de março a 5 de abril de 2005. 6 Adotamos a sigla como forma de evitar continuamente a repetição do nome do programa na íntegra. 7 Grifo da autora.

11 Entremeado todas essas instâncias pretendemos demonstrar a construção de uma comunidade afetiva, representando uma espécie de família entre o radialista, a produção do programa e os ouvintes, possível pela intercessão entre mídia, identidade e memória, cuja afinidade é constituída por elos de afeto e solidariedade da Família Gazeta. Para averiguar nossas hipóteses, recorreremos a pesquisas bibliográficas sobre história e popularização do rádio, procurando refletir sobre a relação entre locutor e ouvinte. Neste sentido, conceitos teóricos como mediação, linguagem e características do rádio, oralidade, melodrama, cultura de massa, cultura popular, vocalidade, memória, identidade, mito, carisma, poder simbólico, autoridade, comunidade imaginada, dentre outros, serão fundamentais. Buscaremos, dessa forma, desvendar o segredo do sucesso dos programas populares em emissoras AM, as estratégias de permanência e fidelização da audiência. Do ponto de vista metodológico, lançaremos mão da transcrição de programas veiculados durante uma semana consecutiva, nos meses de setembro (entre os dias 6 e 11) e outubro de 2004 (entre os dias 18 e 23), e de outras irradiações em datas especiais como o Dia do Índio (19 de abril de 2004), Dia da Independência do Brasil e do Aniversário de Vitória (respectivamente, 7 e 8 de setembro de 2004) e Dia de Nossa Senhora da Penha (4 de abril de 2005), padroeira do Espírito Santo 8, para fazer uma análise do Programa Jairo Maia 9, mediante a relação dialógica travada entre o comunicador e o ouvinte, o conteúdo e o formato da programação; além de entrevistas com o apresentador, ouvintes e profissionais do rádio que atuam na equipe de produção e que trabalharam no programa anteriormente. Como não estamos fazendo um estudo de recepção e sim uma análise do programa, decidimos entrevistar ouvintes a partir de indicação da produção do PJM - que são uma espécie de co-produtores do programa para verificar a estratégia de narrativa no processo de fidelização do público. Entrevistamos, ainda, profissionais ligados ao rádio que acompanham ou acompanharam momentos marcantes das irradiações do PJM. 8 Utilizamos períodos salteados e datas de grandes acontecimentos no Espírito Santo, ligados à cultura local para facilitar a verificação da multiplicidade de formas de irradiação. 9 Metodologicamente, escolhemos trabalhar com uma semana em ordem seqüencial para obtermos um panorama mais completo do programa, em especial para percebermos se existe continuidade no decorrer da semana escolhida. No entanto, a semana em si, que aqui aparece como base de nossos estudos, foi escolhida aleatoriamente, visando a percepção da rotina da programação. No caso das datas comemorativas, que também serão referenciais em nossas análises, procuramos utilizá-las por compreender que elas oferecem uma

12 Assim, no decorrer dos capítulos da dissertação, iremos recorrer ao material coletado através das entrevistas e da escuta do programa para, em alguns casos, ilustrar algumas de nossas reflexões, e em outros, servir de material de análise acerca das questões que estamos propondo. Dessa forma, as falas do locutor, de profissionais da produção, de ouvintes e de outros agentes ligados com a temática irão permear as discussões teóricas, evitando, assim, uma disposição textual que segregue teoria e análise. Para além de nosso objetivo principal, que é o de pensar como um programa radiofônico, através da interação entre emissores e receptores, pode se construir como uma comunidade de afeto, numa imbricação entre o popular e o massivo, temos também alguns objetivos específicos, a saber: a) organizar, de maneira sintética, um histórico da constituição do rádio AM e FM no Espírito Santo; b) historicizar e caracterizar o Programa Jairo Maia, tentando compreender quais são os mecanismos, as estratégias e táticas, que garantiram a permanência e audiência do programa por mais de quarenta anos; c) discutir algumas características fundamentais da narrativa radiofônica, como a oralidade, a vocalidade, os diversos recursos de áudio, a performance do locutor, etc; d) compreender os múltiplos papéis desempenhados pelo locutor na construção de sua narrativa, em especial aqueles que garantem a ele credibilidade e autoridade para desempenhar o papel de defensor do ouvinte, dentre outros. Assim, antes de iniciar a discussão acerca do PJM, visando o objetivo maior desta dissertação, nos preocuparemos em apresentar, de maneira breve, uma síntese do contexto midiático no Espírito Santo e a inserção do programa no cenário capixaba, bem como um resumo histórico da trajetória de Jairo Maia e do programa, com a finalidade de atender não só aos demais objetivos deste trabalho, mas principalmente permitir que o leitor compreenda o cenário radiofônico e o tipo de programa sobre o qual discutiremos nos capítulos seguintes. a) A mídia radiofônica no cenário capixaba No cenário histórico da imprensa capixaba, o rádio surge um século depois do primeiro jornal, o Estafeta, implantado em 1840, mas que, conforme Ferreira, 10 teve quebra dessa mesma rotina e um acirramento de alguns dos aspectos sobre os quais refletimos no decorrer desta dissertação, em especial aqueles ligados à memória e à identidade. 10 FERREIRA, Giovandro Marcus (in GONTIJO, 2001, p.256).

13 somente uma edição, sendo o precursor do Diário Oficial, 11 ligado ao Governo provincial do presidente João Lopes da Silva, na época em que a impressão de jornais era uma concessão do poder público. A primeira emissora de rádio começou a ser gerada em 1935, por iniciativa de um grupo de amigos Antonio Becacici, Guilherme Abaurre, Balbino Quintaes Júnior, Olinto Couto Aguirre, Nicanor Paiva, Nilton Thevernarde, Alonso Fernandes Oliveira, Aphrodisio Ribeiro Coelho, Manoel Luiz Mazzi, Carlos Dumans Filho, Otávio Lengruber, entre outros, que decidiram criar a Sociedade Rádio Clube do Espírito Santo. 12 O grupo, porém, precisava de um terreno para instalar os transmissores e, para viabilizar a idéia, pediu apoio ao Governo do Estado, que concordou, com a condição de ser sócio majoritário. 13 O jornalista Danilo Souza, atual diretor de programação da emissora, conta que as obras de fundação começaram em abril de 1937, e, em 12 de outubro de 1939, a emissora entrou no ar, em caráter experimental. Situada na Avenida Nossa Senhora da Penha, número 2141, mesmo local onde permanece até hoje, 14 a PRI-9 Rádio Clube do Espírito Santo, A Voz do Canaã, 15 foi inaugurada oficialmente somente no dia 14 de janeiro de 1940. Segundo Pessali (1984, p.7-21), a Sociedade não sobreviveu ao autoritarismo do interventor federal, João Punaro Bley, e poucos meses depois de ir ao ar, era desfeita e caía nas mãos do acionista majoritário. Nessa época, 16 a emissora ficou sob responsabilidade do Departamento Estadual de Imprensa, que fiscalizava rigorosamente o noticiário sobre a guerra na Europa e qualquer notícia relacionada à posição do Governo Brasileiro. A RES seguia os moldes de grandes emissoras populares no país, como a Tupy e a Nacional, no Rio de Janeiro, promovendo programas de auditório, entrevistas e shows. Passou a ser conhecida em outros Estados, conforme relata Pessali: 11 Informações repassadas pelo jornalista e diretor de programação da emissora, Danilo Souza, em entrevista concedida a autora em março de 2004. 12 As informações são resultado de uma pesquisa informal realizada pelo atual diretor de programação da RES, Danilo Souza. 13 PESSALI, Hésio. A Imprensa no Espírito Santo, in Revista de Cultura da Universidade Federal do Espírito Santo. Ano IX nº 28, 1984, p. 07-21. 14 Maio de 2005. 15 A Voz do Canaã era o slogan utilizado pelos radialistas da época. 16 Nesse período, os estúdios estavam instalados na esquina da rua Araribóia, na Avenida Jerônimo Monteiro, no Centro de Vitória, onde permaneceram até 1971 - e o transmissor de onda curta de um kilowatt ficava no final da Avenida Nossa Senhora da Penha, onde atualmente também estão os estúdios (PESSALI, op. cit., p.17).

14 Cantores como Silvio Caldas, Carlos Galhardo, Vicente Celestino, Olga Nobre e Dalva de Oliveira por várias vezes passaram pelos microfones de PRI-9; atores e humoristas como César Ladeira, Isis de Oliveira e Renato Murce também incluíram Vitória em suas temporadas pelo Brasil. (Pessali, 1984, p.18). Nesse clima de prestígio, A Voz do Canaã levava o público ao delírio com seus programas de auditório ao vivo. Entre os de maior destaque, o Paraíso Infantil foi lançado pelo radialista Bertino Borges, em 1944, um programa que revelou grandes artistas adultos de décadas seguintes e chegou a publicar uma revista com o mesmo nome. Bertino Borges apresentava o Paraíso Infantil no início das manhãs de domingo e, ao meio-dia, comandava o programa Brinca Pessoal, que veiculava músicas carnavalescas, de acordo com o jornalista Danilo Souza. Nas noites de domingo, as atenções eram voltadas para os talentos lançados pelo radialista Darly Santos e, mais tarde, Duarte Júnior, no Calouros no Ar, com o acompanha mento de grandes músicos, como o violonista capixaba Maurício de Oliveira. Os ouvintes também interagiam pedindo músicas no programa Felicidade Para Você, comandado pelo speaker 17 Betino Borges, mas os pedidos tinham que ser feitos por carta, já que naquela época o uso do telefone residencial ainda era escasso. Outros programas também fizeram grande sucesso, como Caravana da Alegria e Sebastião e sua Turma. Participar de programas de auditório era uma das principais diversões de moradores de Vitória 18 e regiões vizinhas. Capixabas do interior também vinham em caravanas para fazer parte da animação no auditório da Rua Araribóia, que ficava em cima do Mercado Capixaba, no centro da cidade. Pessali lembra, ainda, dos eventos públicos promovidos pela emissora: O rádio, como promotor de grandes eventos recreativos, promoveu até a década de 50 programas que levavam multidões ao ar livre, nas praças Oito e Costa Pereira, na Concha Acústica do Parque Moscoso, no Clube Vitória [...]. 19 (Idem, ibidem, p.18). Mas a emissora também atraía os ouvintes com suas estrelas. A exemplo da acirrada disputa entre Emilinha Borba e Marlene, na Rádio Nacional, os fãs também se 17 Locutor. 18 Vitória, a capital do Espírito Santo.

15 dividiam entre duas cantoras de destaque Maria Cibeli e Ieda Oliveira. Era a época da orquestra formada por músicos capixabas e de um cast (elenco) feminino que emocionava o público nas radionovelas. Entre os anos 40 e 50, as radionovelas melodramáticas prendiam a atenção do público com os roteiros produzidos pela escritora capixaba Arlete Cypreste de Cypreste. Uma radionovela de destaque foi A Vida de Anita Garibaldi, que tinha no elenco personalidades de destaque nacional como o ex-ministro da Defesa, Élcio Álvares, o senador Gerson Camata e Creuza Gramacho, conhecida como a astróloga Zora Yonara. 20 A Voz do Canaã, que mais tarde passou a se chamar Rádio Espírito Santo (RES), lançou talentos como músicos, cantores, locutores, pessoal técnico, dando início a um canal de comunicação que começou aos poucos a se propagar no Estado. A Rádio Espírito Santo pertence atualmente ao Governo do Estado, assim como a TV Educativa, vinculada à TV Cultura. Outras emissoras capixabas Somente a partir da década de 50, a Rádio Espírito Santo teve que disputar a audiência com concorrentes. A Rádio Vitória foi a segunda emissora capixaba a ser implantada. De propriedade de um engenheiro eletrônico paulista, foi incorporada à Rede Diários Associados (Pessali, 1984, p.18). Permaneceu com programação marcadamente esportiva, que predominou até 1984, quando se voltou para a fórmula do vitrolão com músicas populares e sertanejas (Bitencourt e Arcanjo, 1990). Em 1955, surge a Rádio Capixaba (1984, p.18), de propriedade de Alceu Nunes de Fonseca, dono da Organização Bandeirantes, empresa de radiodifusão do Rio de Janeiro. A exemplo das primeiras rádios, a Capixaba também seguia o padrão de emissoras populares como a Rádio Nacional, com música, esporte, informações policiais, cobertura jornalística em geral, e outras peculiaridades da fórmula criada por emissoras cariocas. O formato da Rádio Capixaba continuou sendo mantido, mesmo quando foi comprada pela Arquidiocese de Vitória, proprietária no período de 1962 a 1974. Depois, 19 Todos os logradouros mencionados ficam localizados no Centro de Vitória. 20 Que até hoje apresenta, dentro do Programa Jairo Maia, o quadro de horóscopo, como descreverei e analisarei adiante.

16 pertenceu ao radialista Jairo Maia, de 1974 a 1978, 21 quando foi adquirida pelo político Hugo Borges. Atualmente, a rádio pertence à igreja pentecostal Deus é Amor. A Rádio Difusora de Cariacica foi a seguinte a ser inaugurada, em 1962, tendo uma irradiação limitada apenas ao público da capital devido à sua baixa potência. Com um padrão diferente, sua programação compreendia músicas, comerciais e hora certa. A partir de 1983, seus programas se popularizaram. Em 1993, a emissora foi comprada pela Arquidiocese de Vitória e passou a ser denominada Rádio América, com linha editorial voltada para religião, cidadania e educação. Antes do surgimento da Rádio América, o grupo Rede Gazeta 22 cria a Rádio Gazeta AM, em 1976. A programação era basicamente musical e com programas populares comandados por disc-jóqueis. A emissora implantou uma redação jornalística para produzir noticiários com informações locais, nacionais e internacionais (Bitencourt e Arcanjo, 1990). Depois da Rádio Gazeta, é fundada, em 23 de outubro de 1983, a Tribuna AM, irradiada para todo o estado, se caracterizando pelo estilo popular voltado para as classes C, D, E, 23 com música popular brasileira, samba, sertanejo, os clássicos populares, pagode e os novos sucessos de todos os estilos. Faz parte do segundo maior grupo de Comunicação do Estado, a Rede Tribuna. 24 Inaugurada no dia 12 de agosto de 1989, na cidade de Afonso Cláudio, a Rádio Novo Tempo AM foi a primeira de uma rede de 15 emissoras nacionais, sendo grande atrativo para o público evangélico. No Espírito Santo, já conta com quatro emissoras, Novo Tempo de Vitória (AM e FM), de Nova Venécia (FM) e de Afonso Cláudio (AM). Além das rádios, a Novo Tempo pode ser acessada pela Internet no site da Rede Novo Tempo de Rádio 25 e na TV por assinatura TECSAT, canal 91. 26 21 O período em que Jairo Maia se tornou proprietário da emissora será abordado adiante. 22 A família Lindenberg forma o primeiro e maior complexo de comunicação do Espírito Santo a Rede Gazeta - atualmente com três emissoras de televisão (TV Gazeta; TV Norte, atendendo ao norte capixaba; e a TV Cachoeiro, responsável pela geração para o sul do estado); dois jornais diário (A GAZETA e Notícia Agora, o mais popular); um jornal online (Gazeta Online), quatro emissoras de rádio (Gazeta AM, CBN, Litoral e Antena 1 ), além de uma produtora de vídeo. 23 Site http://www.redetribuna.com.br (pesquisa realizada em junho de 2004). 24 A Rede Tribuna é o segundo maior complexo de comunicação do Espírito Santo, englobando um jornal (A Tribuna), uma emissora de televisão (TV Tribuna) e duas rádios (Tribuna AM e FM). 25 Site http://www.novotempo.org.br (pesquisa realizada em junho de 2004). 26 Site http://www.novotempo.org.br (pesquisa realizada em junho de 2004).

17 A caçula é a CBN (1.250 AM) e que passou a operar na faixa FM (93,5 FM), em 7 de abril de 2005. Inaugurada em 30 de abril de 1996, integra o complexo da rede via satélite com 22 afiliadas no país, de emissoras all News, 27 especializada em notícias de economia, política, esporte, contando com notícias nacionais e regionais. 28 NOME DA EMISSORA RADIO ESPIRITO SANTO RADIO VITORIA QUADRO I PRINCIPAIS EMISSORAS DE RÁDIO DO ES NA FAIXA AM DATA E LOCAL PROPRIETÁRIO PROPRIETÁRIO CARACTERISTICA FUNCIONAMENTO ORIGINAL ATUAL PROGRAMAÇÃO 1940/Vitória 29 Governo do Estado do Espírito Santo 1958/Vitória Rede Diários Associados. RADIO 1955/Vitória Organizações CAPIXABA 31 Bandeirantes Governo do Estado do Espírito Santo Grupo Buaiz Igreja Deus é Amor RADIO AMÉRICA 32 1962/Vitória Rômulo Conde Fundação Nossa Senhora da Penha, Arquidiocese de Vitória. ATUAL Programação popular, tendo como ponto forte a prestanção de serviço, música sertaneja 30 e sucessos musicais do passado Programação religiosa voltada para o público evangélico. Programação religiosa voltada para o público evangélico. Voltada para o público C, D e E, prioriza em sua grade programas educativos, de evangelização e entretenimento. GAZETA AM 1976/Vitória Rede Gazeta Rede Gazeta Programação popular, destinada as classes B, C, D e E, voltada para o entretenimento, com destaque para músicas sertanejas TRIBUNA AM 1983/Vitória Rede Tribuna Rede Tribuna Programação popular, priorizando o 27 Com transmissão de notícias 24 horas por dia. 28 Site http://www.gazetaonline.globo.com (pesquisa realizada em maio de 2004). 29 Funcionou em caráter experimental nos cinco anos que antecederam sua inauguração oficial. Começou a funcionar por iniciativa de um grupo de amigos, passando a ter como único acionista o Governo do Estado, conforme descreveremos na introdução desta dissertação. 30 Sertaneja é classificada atualmente entre os programadores musicais das emissoras como estilo breganejo, incluindo ritmos como forró, sertanejo, entre outras tocadas em emissoras essencialmente populares. 31 Funcionou em caráter experimental nos cinco anos que antecederam sua inauguração oficial. Começou a funcionar por iniciativa de um grupo de amigos, passando ater como único acionista o Governo do Estado, conforme descrevemos na introdução desta dissertação. 32 A emissora foi propriedade do radialista Jairo Maia no período de 1976 a 1978, como detalhamos na introdução desse estudo.

18 entretenimento e musicas sertanejas. NOVO TEMPO 1989/Vitória Igreja Adventista Igreja Adventista Programação religiosa voltada para o público evangélico. CBN 33 1996/Vitória Terezinha Rios Rede Gazeta Conteúdo Gava e Alair essencialmente Amélia Néspoli jornalístico. Prioriza as Ceolin áreas de economia, política, nas coberturas regional, nacional e internacional. Faz parte de uma rede nacional de emissoras All News. Emissoras FM A primeira emissora FM no Estado foi a Cariacica FM, fundada em 1975, que liderou o mercado com seu estilo soft music. 34 Foi um marco na locução capixaba, passando a criar um novo estilo de locução, empostado e sombrio, que caracterizava a rádio (Tavares, 1988). Uma mesma programação chegou a ser veiculada simultaneamente na Cariacica FM e AM. A Cariacica FM, a exemplo do que ocorreu com a emissora AM ambas da família Conde - foi vendida para a Arquidiocese de Vitória, em 1993. A diferença é que, em 1999, a rádio FM foi arrendada para a Universidade de Vila Velha, que tinha interesse em ter uma emissora, principalmente por contar com um curso de Comunicação Social. Mudou de estilo para atender ao seu público jovem e também de nome: Rádio Cidade. A Gazeta FM entrou no ar em 1978, como retransmissora da Excelsior de São Paulo. Só em 1982 começou a trabalhar com programação local, introduzindo pequenos blocos de notícias regionais. No dia 30 de março de 1980, surge a Tribuna FM, que manteve uma programação popular até 1985. No ano seguinte, passou a ser mais segmentada, no estilo da Rádio JB, tendo como diferencial uma programação basicamente MPB e de música internacional. No estilo jovem e mais voltada para classes de menor poder aquisitivo, a pioneira foi a Tropical FM, em 1982, mantendo o formato até hoje. Sua principal concorrente é a Litoral FM da Rede Gazeta. 33 Antiga Rádio Difusora de Cariacica. 34 Música orquestrada para o almoço e clássicos da MPB.

19 NOME DA EMISSORA QUADRO II PRINCIPAIS EMISSORAS DE RÁDIO DO ES NA FAIXA FM DATA E LOCAL PROPRIETÁRIO PROPRIETÁRIO CARACTERISTICA FUNCIONAMENTO ORIGINAL ATUAL PROGRAMAÇÃO RADIO CIDADE 35 1975/Vila Velha Rômulo Conde Fundação Nossa Senhora da Penha, da Arquidiocese de Vitória ATUAL O ritmo mais tocado é o rock nacional e internacional ANTENA 1 36 1978/Vitória Rede Gazeta Rede Gazeta Programação voltada para o público adulto contemporâneo, destaca os maiores sucessos internacionais de todos os tempos. TRIBUNA FM TROPICAL FM LITORAL FM 1980/Vitória Rede Tribuna Rede Tribuna É uma emissora mais votlada para o público adulto contemporâneo, tendo como diferencial a programação de MPB e música internacional. 1982/Vitória 1994/Vitória Fundação de Assistência e Educação Faesa Antonio Roldi e Carlos Magno Pimentel Fundação de Assistência e Educação Faesa Rede Gazeta Pioneira em adotar na faixa FM uma programação com conteúdo, semelhante ao de AM. Seu estilo jovem é direcionado para uma programação popular. Adota uma programação popular e seu ponto forte é o Pop Hits. b) Jairo Maia e sua inserção na mídia radiofônica do Espírito Santo Em meio ao surgimento das primeiras emissoras, o público se encantava cada vez mais com as novidades e a magia desse meio de comunicação. Com o passar do tempo, foram surgindo locutores que conquistaram audiência cativa dos ouvintes na Grande Vitória e em outros municípios do Espírito Santo, dentre eles, Jairo Gouvêa Maia. Jairo Maia acompanhava as irradiações desde menino, graças ao hábito de sua família de adensar a audiência de emissoras de rádio. 37 Em Bom Jesus, 38 sua cidade natal, 35 Quando foi fundada, em 1975, era, ainda, Cariacica FM. Hoje a rádio pertence à Arquidiocese de Vitória (Fundação Nossa Senhora da Penha) e está arrendada pela Universidade de Vila Velha. 36 Antiga Gazeta FM

20 Jairo Maia começou a ensaiar seu namoro com o rádio numa brincadeira de quintal, onde cantarolava num microfone improvisado - uma lata pregada na ponta do cabo de vassoura. Suas primeiras participações radiofônicas foram cantando esporadicamente na Rádio Clube da cidade, ainda em fase de experiência. Por intermédio do amigo Geraldo Carvalho, Jairo aceitou fazer um teste na Rádio Cachoeiro, onde começou a atuar, em 1957, como locutor horista. Nessa época, foi convidado para ser representante da União Brasileira de Composito res (UBC), o que facilitou seu acesso na Rádio Espírito Santo, que freqüentava periodicamente para tratar de direitos autorais. Na emissora, conseguiu uma vaga de apresentador, em 1961, quando entrou no ar às 15 horas, com o programa que recebeu seu nome por indicação de outro radialista. Tempos depois, obteve a transferência para o horário de 9 às 12 horas. Em 1962, Jairo Maia entrou na Rádio Vitória, onde ficou até 1964. Depois, foi para a Rádio Capixaba, permanecendo por 15 anos. Em dezembro de 1973, seu contrato venceu e ele saiu do ar. E no dia 26 de janeiro de 1974, comprou a emissora, mantendo-se proprietário até 1978. Decidiu vendê-la para o político Hugo Borges. Nesse mesmo ano, voltou para a Rádio Espírito Santo e, em 8 de maio de 1989, Jairo Maia foi para a Rádio Gazeta AM, onde continua até hoje. Portanto, são 43 anos praticamente ininterruptos de programa radiofônico. O caráter empreendedor de Jairo Maia foi além das ondas do rádio. Na juventude, animava os bailes com suas eletrolas, fazendo os convidados dançarem ao som de Matinha, Golden Boys, Eduardo Araújo, entre outros. Era contratado até mesmo no high-society e em festas de casamentos de colunáveis do estado 39. Foi também proprietário de lojas de discos, ambiente em que conheceu a esposa. O comunicador foi o precursor no estado nas transmissões de rua e também em colocar dois telefones no ar ao mesmo tempo, dentre outras inovações. O nome Jairo Maia virou uma marca tão forte, que o comunicador conta um fato pitoresco, quando ainda trabalhava na Rádio Capixaba : 37 Os dados biográficos de Jairo Maia foram colhidos em entrevistas com o locutor, realizadas no decorrer da pesquisa para esta dissertação, e também em matérias publicada nos jornais A Gazeta (6 de maio de 1981 e 19 de julho de 1981) e A Tribuna (1º de maio de 1988), e na Revista Target (junho de 2000). 38 Município situado no norte do ES.

21 O diretor mandou me chamar dizendo para eu falar menos no meu nome e mais na rádio (...) quando terminei o programa fui ao gabinete dele e disse: Eu não estou entendendo; o senhor pediu para falar mais da rádio e menos de mim. E ele falou; Não, é que houve uma pesquisa e os ouvintes disseram estar ouvindo a rádio Jairo Maia. 40 O relato demonstra o carisma do comunicador, principalmente em função da relação dialógica estabelecida com seus ouvintes, da narrativa utilizada, bem como diversas estratégias, que contribuem para a formação de uma comunidade, a Família Gazeta, questões a serem discutidas em capítulos posteriores. A seguir, descreveremos a estrutura do Programa Jairo Maia. Programa Jairo Maia: do Jeito que o Povo Gosta Jairo Maia é um patrimônio histórico do rádio brasileiro porque acompanhou várias épocas da radiofonia nacional e, no Espírito Santo, é um dos poucos radialistas da década de 60 que permanece no ar e ainda é líder de audiência. O elogio do jornalista Joel Vieira 41 demonstra a força do Programa Jairo Maia, que chega a ter 63.716 ouvintes por minuto, contra 22.068 da segunda colocada na pesquisa do Ibope, a Rádio Vitória, e 7.040 ouvintes por minuto, na que aparece em terceiro lugar, a Rádio Novo Tempo. Isso significa dizer que a cada 100 aparelhos rádios ligados em emissoras AM, 60 estão sintonizados no PJM 42. Além da liderança de audiência do Programa Jairo Maia, a Rádio Gazeta AM, onde o PJM é veiculado, aparece com 51% de participação no meio AM 43, conquistando ao longo de sua programação diária a marca média de 22.556 ouvintes por minuto, somente atingido picos de audiência no Programa Jairo Maia. Entre os programas em emissoras capixabas na faixa AM, o Programa Jairo Maia é um dos que mais se destaca, tanto em termos de pesquisas de audiência quanto em 39 Jornal A GAZETA, de 10 de abril de 1986. 40 A Tribuna, 1981. 41 Joel Vieira, que concedeu entrevista à autora em março de 2005, atuou como repórter policial no PJM durante dez anos. 42 As informações foram repassadas pela analista de Marketing da Rede Gazeta, Michelle Bissoli, logo depois da divulgação da pesquisa. 43 A segunda colocada na pesquisa do Ibope, a Rádio Vitória, conta com 23% de audiência em emissoras AM.

22 reconhecimento do público e de profissionais que atuam no mercado radiofônico. Jairo Maia admite que se baseou no programa de Valdir Vieira 44 para compor a estrutura do seu programa, e explica: copiar os bons não é defeito, é virtude. Pela diversidade de quadros, pela variedade de seções, e a presença marcante do apresentador que dá o caráter e assegura a unidade do programa, o PJM se enquadra no gênero Variedades, também conhecido como Radiorrevista ou Miscelânea (Barbosa Filho, 2003, p.139). O entretenimento e a prestação de serviços também são características do programa, que inclui jornalismo, hora certa, pegadinhas, curiosidades sobre datas comemorativas, santos do dia, regime da lua, além de divulgar pedido e oferta de emprego, achados e perdidos, pedidos de doação de sangue e de outras carências apresentadas em cartas lidas no ar no quadro Telefone da solidariedade. Nas mais de 15 mil edições ao longo dos 44 anos de existência, o PJM sofreu poucas mudanças 45 em termos de quadros, linguagem e recursos, embora o apresentador afirme fazer inovações para não cair no comum. No que se refere a tempo de duração, o programa perdeu uma hora com a inclusão do programa do padre Marcelo Rossi, retransmitido pela Rádio Globo na emissora afiliada, de 9 às 10 horas. Sem essa primeira hora de irradiação, o PJM passou a ser veiculado de 10 às 12 horas. Alguns quadros foram extintos como Eu paro e você continua, Aponte o erro, Lingua enrolada, entre outros, principalmente de caráter educativo, que segundo Jairo Maia não têm boa aceitação por parte do ouvinte. A disposição de música também sofreu modificação. Nos anos iniciais metade do programa era destinado à músicas nacionais e a outra parte à canções nacionais. Atualmente as músicas ficam entremeadas entre os quadros, com exceção do programa de sábado, basicamente voltado para sucessos antigos, tomando boa parte do tempo. Em alguns sábados, esporadicamente, Jairo Maia leva um convidado que permanece por aproximadamente uma hora no ar para responder a perguntas dos ouvintes, o que não ocorre ao longo da semana. O quadro qual é a música foi um dos primeiros a ser criado e permanece até hoje, assim como as pegadinhas, como Show do quebra-cuca e a Pergunta do dia. Outras nesse estilo - Dadalto pergunta (charada patrocinada por estabelecimentos comerciais), e 44 Radialista já falecido. 45 BITENCOURT, Aymeé e ARCANJO, Marinete do Carmo. Programa Jairo Maia, 1990, pp. 30-35.

23 Rádio teste, já não existem mais. Outro quadro que permanece com nome diferente é o Você é minha última esperança, que nos últimos anos passou a ser Telefone da solidariedade. Além dos já mencionados, fazem parte da atual programação os quadros Pai- Nosso, a oração de abertura do programa com o padre Marcelo Rossi; Simpatia do dia, Show do quebra-cuca ; Horóscopo, com a astróloga Zora Yonara; Pensamento do dia ; Permita-me um momento, com Douglas Borba apresentando curiosidades ou informações sobre fatos históricos; Secretária eletrônica ; Corrente de oração pela família ; Aniversariantes do dia ; e alguns inseridos mediante demanda como Troca-troca, destinado a quem quer vender ou comprar; Bolsa de empregos, Achados e perdidos e É namoro ou amizade, para quem está em busca de romance ou disposto a fazer novos amigos. No decorrer de nossa dissertação pontuaremos questões relacionadas aos quadros de maior destaque do programa e que mais envolvem o público. produção: No quadro a seguir podemos observar o roteiro do programa, disponibilizado pela QUADRO III Roteiro do Programa Jairo Maia NOME DO QUADRO HORÁRIO DE INSERÇÃO CARACTERÍSTICAS Pensamento do dia 10h15 Mensagem geralmente em forma de parábola. Horóscopo 10h20; 10h40; 10h50. Previsão para o dia, com a astróloga Zora Yonara. Show do quebra-cuca 10h25; 11h25. Perguntas feitas com a participação de ouvinte por telefone. Troca-troca Durante o programa, sem horário fixo. Espaço destinado a classificados, para quem quer vender e trocar produtos, utensílios domésticos, móveis e imóveis. Qual é a música 10h30; 11h30. O ouvinte pede a música de sua preferência. Secretária eletrônica Sem horário definido O ouvinte liga e grava sua mensagem no telefone 32231140 e sua reivindicação ou recado é veiculado no decorrer do programa O telefone da solidariedade 11h15. Momento mais emocional do PJM, quando o apresentador lê uma carta enviada por um

24 ouvinte fazendo apelo para alguma doação como cadeira de rodas, colchão, etc. Aniversariantes do dia 11h10 Jairo Maia parabeniza os aniversariantes do programa, mediante envio prévio dos nomes de quem faz aniversário no dia. A simpatia do dia 11h15 Dicas, superstições para resolver problemas amorosos, de saúde, ou para melhorar a auto-estima. Corrente de oração pela família 11h40 Jairo Maia lê os nomes de pessoas enfermas, formando uma corrente pela saúde delas. O roteiro disposto acima foi disponibilizado pela produção do PJM. Há que se considerar que uma parte do programa não é inserida porque o operador de áudio, o comunicador e a secretária sabem que algumas seções só entram no ar mediante demanda como explicamos na introdução deste trabalho. Jairo Maia também não demarca no roteiro a oração do Pai Nosso, com o padre Marcelo Rossi, na abertura do programa, seguida da mensagem de fé lida pelo comunicador. Os programas institucionais como os da Assembléia Legislativa e da Prefeitura da Serra também não estão incluídos porque não fazem parte do quadro permanente do programa. Mesmo sem estar especificado no roteiro, o noticiário Gazeta Notícias tem espaço reservado a cada hora cheia (10h, 11h, 12h). Além disso, a inserção comercial varia dependendo da negociação de horários com os clientes. Por fim, vale comentar a própria programação da Rádio Gazeta AM, na qual o Programa Jairo Maia está inserido. Líder de audiência entre as emissoras AM no Espírito Santo, a Gazeta AM trabalha com um conceito que permeia todos os seus horários - Você ouve a gente porque a gente ouve você - um slogan que sinaliza a importância da participação do ouvinte. Marcada por música sertaneja, entretenimento e interatividade com o público, sua grade conta com os seguintes programas: Show da Manhã, com Aloísio Ovelha (de 6 às 9 horas); Momento da Fé, com padre Marcelo Rossi (de 9 às 10 horas); PJM (de 10 às 12 horas); Radiopatrulha, programa policial comandado por Eduardo Santos (de 12 às 13h30m); Fala Comunidade, espaço dedicado à reivindicações de moradores por meio de uma equipe de reportagem, também sob o comando de Eduardo Santos (de

25 13h30m às 14 horas); Rádio-Mulher, especialmente voltado para o público feminino, com Camila Domingues (de 14 às 16 horas); Barraco da Alegria, ancorado pelo comediante Rossine Macedo (de 16 às 19 horas); Gazeta Esportes Show, apresentado por Jair Oliveira (de 20 às 23 horas); e programação musical até 6 horas. Assim, a partir desta breve exposição acerca da história da radiodifusão no Espírito Santo, destacando o Programa Jairo Maia e as principais características de seu formato atual, retomaremos agora a proposta fundamental do trabalho, que é pensar como esse tipo de programa consegue formar uma comunidade entre produção e ouvintes, através de estratégias e práticas adotadas no processo comunicacional radiofônico, questão que desenvolveremos neste estudo, da seguinte forma: No primeiro capítulo, a questão central é a mediação como sustentáculo das práticas comunicacionais nos meios tecnológicos, tendo Barbero (2003) como referencial teórico para analisar a interface comunicacional dos radialistas e as relações entre o popular e o massivo. Outra perspectiva são as peculiaridades da popularização do rádio no Brasil e as características exploradas por programas populares do rádio AM, a partir de elementos ligados a esse padrão de radiofonia, constituindo, sem dúvida, um dos principais fatores de identificação do público. No Capítulo 2, discutiremos a performance como lugar central no processo de fidelização de audiência, a construção do mito e o lugar do carisma nos programas radiofônicos. Analisaremos a linguagem, as características do veículo e os recursos de enunciação, sobretudo a tríplice voz do rádio (Vigil, 2003), incluindo a vocalidade, perpassando a herança histórica da oralidade, os efeitos sonoros e a música. E, assim, trataremos das estratégias do locutor como forma de envolver o ouvinte, que, por sua vez, adota uma série de táticas, passando a atuar como co-produtor nesse ato comunicacional. Interpretaremos, também, o poder da fala, o sentido e o ritmo das palavras, a emoção das mensagens verbalizadas. Dessa forma, o locutor assume uma multiplicidade de papéis visando a manutenção da audiência cativa. Por intermédio do discurso midiático, e explorando ao máximo as trivialidades do cotidiano popular, o radialista busca criar uma comunidade imaginada em torno do seu programa matinal, o que consideramos a questão central do nosso estudo, entremeada em todos as etapas de discussão e cuja reflexão será conclusiva no Capítulo 3. Observaremos a