ARTIGO ORIGINAL AVALIAÇÃO DA POSITIVIDADE AO TESTE TUBERCULÍNICO ENTRE OS TRABALHADORES DA REDE BÁSICA DE SAÚDE

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Transcrição:

ARTIGO ORIGINAL AVALIAÇÃO DA POSITIVIDADE AO TESTE TUBERCULÍNICO ENTRE OS TRABALHADORES DA REDE BÁSICA DE SAÚDE EVALUATION OF REACTIVITY TO TUBERCULIN SKIN TESTING AMONG WORKERS OF THE PUBLIC HEALTH SYSTEM Julia da Silva Oliveira 1, Lia Gonçalves Possuelo 2, Karen Severo 1, Marcelo Carneiro 3,4, Eliane Krummenauer 3, Cristiane Pimentel Hernandes Machado 4,5, Andréia Rosane de Moura Valim 6 RESUMO Introdução: Os trabalhadores da área da saúde apresentam um risco elevado de infectarem-se com o Mycobacterium tuberculosis, principalmente aqueles envolvidos no contato direto com o paciente portador de tuberculose. Objetivos: Avaliar a prevalência de infecção por M. tuberculosis e investigar as características epidemiológicas dos trabalhadores da rede básica de saúde da cidade de Santa Cruz do Sul (RS). Métodos: No mês de outubro de 2009, foram entrevistados 60 trabalhadores da saúde que, posteriormente, foram submetidos ao teste tuberculínico (TT). Foram coletados dados epidemiológicos para a avaliação de características associadas à infecção latente. Resultados: Entre os 60 participantes do estudo, 16 (26,7%) apresentaram TT positivo. A positividade ao TT foi significativamente maior entre os trabalhadores com menor tempo de exposição. Conclusões: A infecção latente por M. tuberculosis entre os trabalhadores foi de 26,7%. Os dados encontrados reforçam a necessidade de implementar medidas para diminuir a exposição ocupacional, isto é, a realização de busca ativa por sintomáticos respiratórios na comunidade e a realização de diagnóstico precoce. Palavras-chave: Infecção tuberculosa; prevalência; teste tuberculínico; trabalhadores da saúde ABSTRACT Background: Health care workers are at high risk of being infected with Mycobacterium tuberculosis, especially those who are in direct contact with patients with tuberculosis (TB). Aim: To evaluate the prevalence of infection with M. tuberculosis and to investigate the epidemiological characteristics of workers in the primary health care system in the city of Santa Cruz do Sul, Rio Grande do Sul, Brazil. Methods: In October 2009, we interviewed 60 health care workers who later underwent tuberculin skin testing (TST). We collected epidemiological data to assess the characteristics associated with latent infection. Results: Among the 60 participants of the study, 16 (26.7%) had positive TST. A positive TST was significantly higher among workers with shorter exposure time. Conclusions: Latent infection by M. tuberculosis among the health care workers was 26.7%. These findings underscore the need to implement measures to reduce occupational exposure, i.e., conducting an active search for respiratory symptoms in the community and establishing early diagnosis. Keywords: Tuberculosis infection; prevalence; tuberculin skin testing; health worker Rev HCPA 2011;31(1):13-17 A tuberculose (TB) é uma das doenças mais antigas da humanidade (1,2). De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 1/3 da população mundial cerca de 1,7 bilhões de pessoas é portador do agente infeccioso. Desse total, cerca de 5 a 10% desenvolverão a doença, a qual é responsável por três milhões de óbitos por ano (3,4). Estudos demonstram que trabalhadores da saúde, principalmente aqueles em contato com pacientes com TB, apresentam um risco maior de tornarem-se portadores de infecção latente do que população em geral (5-7). Entretanto, a prevalência da infecção entre os profissionais das unidades básicas de saúde (UBSs) não especializadas no tratamento da TB é pouco estudada. A prova tuberculínica é um dos métodos u- tilizados para o diagnóstico da infecção latente, porém, o resultado pode apresentar limitações, como a baixa especificidade e a dependência de uma resposta imunológica (8-10). Os objetivos deste estudo foram verificar a prevalência de infecção latente por Mycobacterium tuberculosis e identificar as características relacionadas à infecção latente entre os traba- 1. Curso de Farmácia, Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). 2. Laboratório de Genética e Biotecnologia, UNISC. 3. Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, Hospital Santa Cruz. 4. Curso de Medicina, UNISC. 5. Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, Hospital Ana Nery. 6. Departamento de Biologia e Farmácia, UNISC. Contato: Andréia Valim. E-mail: avalim@unisc.br (Santa Cruz do Sul, RS, Brasil).

Oliveira JS et al lhadores da rede básica de Santa Cruz do Sul (RS). MÉTODOS Foi realizado um estudo descritivo do tipo inquérito, incluindo trabalhadores da rede básica de saúde que desempenhavam suas atividades no município de Santa Cruz do Sul. O município conta atualmente com 22 UBSs, sendo que o atendimento dos pacientes com TB fica centralizado em apenas uma unidade de saúde, na qual também são atendidas diversas outras especialidades médicas (centro de especialidades). As unidades de saúde apresentavam, no momento da pesquisa, condições básicas de biossegurança para atendimento geral da comunidade, tais como ventilação adequada e higienização. As mesmas condições foram observadas na unidade de atendimento especializada em TB, porém, além das medidas citadas acima, fazia-se uso da máscara N-95, recomendada para atendimentos de TB. Como a adesão ao estudo foi voluntária, de um total de 225 trabalhadores da rede, 60 (27,0%) aceitaram participar da pesquisa. Entre os profissionais que participaram do estudo, nenhum relatou histórico prévio de TB. A pesquisa foi aprovada pelo comitê de ética da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) sob o protocolo número 2333/09. Os participantes responderam a um questionário estruturado com questões referentes às características sociodemográficas; à história de vacinação BCG; ao tempo de trabalho na rede básica de saúde; à exposição potencial à TB no domicílio, na UBS e em outros locais; à infecção pelo HIV; ao uso de corticoides; e à diabetes. A vacinação BCG foi avaliada pela presença da cicatriz vacinal no braço direito. Após o preenchimento do questionário, foi realizado o teste tuberculínico (TT), conforme recomendado pelo Manual Técnico para o Controle da Tuberculose (10). Foram definidos como TT positivo aqueles que apresentavam induração 10 mm. Todos os profissionais com TT positivo foram orientados e encaminhados para consulta com o médico especialista no ambulatório de TB. As análises estatísticas foram realizadas u- tilizando os programas SPSS versão 12.0 (SPSS, Chicago, IL) e Epi-Info versão 6.04d (Centers for Disease and Control, Atlanta, GA). Os valores foram expressos como médias ± desvio padrão (DP), ou como números e porcentagens. A comparação das variáveis categóricas entre os grupos foi realizada utilizando-se o teste qui-quadrado. O teste t de Student foi utilizado para as análises das variáveis quantitativas. Todas as variáveis foram baseadas na probabilidade two-tailed, e um valor de P 0,05 foi considerado significante. RESULTADOS As características gerais da amostragem estão descritas na tabela 1. Dos 60 trabalhadores, 40 (66,7%) faziam atendimento direto aos pacientes nas unidades de saúde como agentes comunitários de saúde, enfermeiros, médicos ou técnicos de enfermagem. Os demais profissionais (33,3%) realizavam atendimento indireto como auxiliares de cirurgião dentista, auxiliares de higienização e técnicos administrativos (tabela 1). A média de tempo de trabalho dos profissionais nas suas respectivas unidades de saúde foi de 5 anos e 9 meses, variando de 2 meses a 30 anos. Nenhum dos trabalhadores avaliados relatou comorbidades (infecção pelo vírus HIV, diabetes, alcoolismo) ou uso de drogas imunossupressoras. Tabela 1 - Características epidemiológicas dos indivíduos participantes do estudo. Trabalhadores da área da saúde Número (%) Características Número de trabalhadores envolvidos no estudo 60 Sexo Feminino Masculino 58 (96,7) 2 (3,3) Média de Idade (DP) 34,5 anos (± 10,9) Cor da pele Branca 54 (90) Escolaridade Ensino médio completo Ensino superior incompleto Ensino superior completo 31 (51,7) 13 (21,7) 8 (13,3) Tabagismo 10 (16,7) Função Atendimento direto Atendimento indireto 40 (66,7) 20 (33,3) Número de profissionais em contato com paciente com TB 41 (68,3) Tempo médio de trabalho na unidade Presença de cicatriz vacinal 58 (96,7) TT reator 16 (26,7) DP = desvio padrão; TB = tuberculose; TT = teste tuberculínico 5 anos e 9 meses 14 Rev HCPA 2011;31(1)

Teste tuberculínico em trabalhadores da rede básica A positividade ao TT foi detectada em 16 (26,7%) profissionais (tabela 1). Do total de trabalhadores que realizavam atendimento direto ao paciente, 16 (40%) eram agentes comunitários de saúde, sendo que 3 (18,8%) apresentavam TT positivo. Quando analisadas as variáveis: tempo de trabalho na unidade de saúde, média de idade, cicatriz vacinal e função, não houve diferença significativa com relação à positividade ao TT (tabela 2). Tabela 2 - Resultado da análise univariada das características demográficas associadas ao teste tuberculínico positivo entre os profissionais da saúde. Fatores Reator Não reator P N = 16 (%) N = 44 (%) Média de Idade 34,4 34,5 0,96 Cicatriz vacinal (BCG) 16 (100) 42 (95,5) 0,68 Tempo de trabalho na unidade de saúde > 4 anos 4 anos 7 (43,7) 9 (56,3) Tempo de exposição* > 4 anos 4 anos Função Atendimento direto Atendimento indireto Local de trabalho Centro de especialidades Outra UBS 9 (69,2) 4 (30,8) 11 (68,8) 5 (31,2) 3 (18,8) 13 (81,2) 13 (29,5) 31 (70,5) 9 (32,1) 19 (67,9) 27 (61,4) 17 (38,6) 18 (40,9) 26 (59,1) UBS = unidade básica de saúde *41 trabalhadores afirmaram ter tido contato com paciente com tuberculose no trabalho ou em casa. 0,23 0,03 0,41 0,09 O contato com pacientes com TB no trabalho foi relatado por 39 (65%) profissionais, dos quais 13 (31,7%) apresentavam TT positivo. Quando realizada a categorização pelo tempo de exposição, verificou-se que os trabalhadores com menos de 4 anos de exposição ao bacilo apresentavam taxas maiores de positividade ao TT (P = 0,03). Com relação ao local de trabalho e à positividade ao TT, observou-se que a maioria dos testes positivos foi de trabalhadores de UBSs não especializadas no tratamento de TB (P = 0,09). No centro de especialidades, onde se localiza a UBS especializada no tratamento da TB, foram testados 21 profissionais, dos quais três (18,8%) apresentaram TT positivo, sendo que apenas um desses profissionais trabalha no atendimento direto de pacientes com TB. DISCUSSÃO O diagnóstico acurado da infecção latente pelo M. tuberculosis, ou seja, a prevalência de infecção específica pelo M. tuberculosis é um importante componente para qualquer programa de controle da TB e depende amplamente do TT (11). Em países onde a TB é endêmica, a prevalência de positividade ao TT é muito elevada (12). No presente estudo, foi observada uma taxa de positividade ao TT de 26,7% entre os trabalhadores da rede básica de saúde. Estudos semelhantes envolvendo profissionais de saúde encontraram percentuais elevados de positividade ao TT, variando de 26,7 a 69,5% (13-15). Muzy de Souza (2000) descreveu uma frequência de 51% de positividade ao TT em uma população de trabalhadores da saúde de um hospital geral do Rio de Janeiro (RJ) (16). Um estudo realizado por Oliveira et al. (2007) avaliando profissionais de um hospital universitário de Campo Grande (MT) observou uma prevalência de 38,7% de positividade ao TT (14). Rodrigues et al. (2009) avaliaram a positividade ao TT em 30 agentes comunitários de saúde da rede básica do município de Cachoeiro de Itapemirim (ES) e observaram uma prevalência de 26,7% de infecção latente (13). No presente estudo, a prevalência de positividade ao TT entre os agentes comunitários de saúde foi de 18,8%. A alta prevalência de TB latente entre profissionais de saúde está fortemente relacionada à presença de pacientes portadores de TB no ambiente de trabalho, refletindo a realidade epidemiológica dessa doença na comunidade (14). Em estudo realizado por Demkow et al. (2008), em que os autores avaliaram trabalhadores da saúde que realizavam atendimento direto e indireto ao paciente, foi observada uma prevalência de 27,1% de infecção pelo bacilo da TB, sendo que o risco de adquirir a infecção foi associado a determinadas funções no trabalho. Os técnicos de laboratório apresentaram uma taxa de positividade de 50%, os clínicos da divisão de TB, de 34%, os enfermeiros, de 30%, e a equipe administrativa, de 15% (17). No presente estudo, também foi observada uma predominância de positividade ao TT entre os profissionais que fazem atendimento direto ao paciente, como médicos, enfermeiros, agentes comunitários de saúde e técnicos de enfermagem. O pa- Rev HCPA 2011;31(1) 15

Oliveira JS et al pel do cuidado à saúde deve incluir, além do diagnóstico e do tratamento da doença, a percepção da necessidade de composição de um local com características ambientais e comportamentos adequados, e cujos membros tenham consciência de seus riscos de contrair a infecção e de suas responsabilidades na prevenção desse fato. A elaboração de rotinas seguras de trabalho e a orientação dos profissionais minimizam os riscos que podem existir (6). Diversos estudos têm avaliado o efeito booster, que variou de 5,8 a 7,8% (18,19). No presente estudo, esse efeito não foi avaliado. A Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. (2009) descreve, no III Diretrizes para Tuberculose da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, que não é necessária a testagem do efeito booster quando são avaliados os profissionais da saúde (20). Diversos fatores de risco à infecção pelo bacilo da TB já foram descritos. Entre eles, a- glomeração de pessoas, alcoolismo, fatores socioeconômicos, idade, sexo, cor da pele, uso de corticoides, diabetes e HIV (18,19,21). No presente estudo, esses fatores de risco foram avaliados e não se observou uma associação significativa com a positividade ao TT. Entretanto, observou-se que os trabalhadores que tinham menos de 4 anos de tempo de exposição aos pacientes com suspeita ou diagnóstico de TB apresentavam uma taxa de positividade ao TT significativamente maior que aqueles com mais tempo de exposição. Em um estudo realizado com profissionais de um hospital universitário, observou-se que o risco de um TT positivo seria aumentado depois de um ano de trabalho, sugerindo que a prevenção deveria ser focada nas pessoas que iniciassem suas carreiras (14). Observou-se um alto percentual de positividade ao TT entre os trabalhadores das UBSs não especializadas. Esses resultados indicam que provavelmente esses profissionais fazem o atendimento direto de pacientes portadores de TB ainda em fase inicial de tratamento, ou mesmo de pacientes sem diagnóstico clínico na unidade básica, sem utilizar as medidas de proteção necessárias ou desconhecendo as formas de transmissão do bacilo. Isso reflete uma alta taxa de positividade ao TT em trabalhadores de UBSs não especializadas no tratamento de TB. Nos países em desenvolvimento, o risco de infecção/doença entre os pacientes e profissionais de saúde poderia ser reduzido significativamente se governos e autoridades sanitárias considerassem o controle da TB uma prioridade de fato. Os trabalhadores da saúde constituem o recurso mais valioso para o controle da infecção, desde que haja comprometimento dos mesmos, podendo-se mencionar as medidas que visam sua própria proteção. É fundamental que esses profissionais sejam capacitados, conhecendo os conceitos básicos sobre transmissão, os sinais e os sintomas da doença, além da importância de medidas e práticas de trabalho específicas para o controle da TB (22). Apesar do número limitado de indivíduos testados no presente estudo, observou-se uma prevalência de 26,7% de positividade ao TT entre os trabalhadores analisados, dos quais 13 (81,2%) eram trabalhadores de UBSs não especializadas no tratamento da TB. Atualmente, o TT não faz parte dos exames admissionais desses profissionais, porém, a partir dos resultados deste estudo, sugere-se que o TT seja incluído na rotina de exames admissionais, assim como nos exames periódicos para aqueles profissionais que não são reatores. Como o teste realizado no presente estudo é uma das ferramentas utilizadas para avaliar os cuidados relativos à biossegurança dos trabalhadores, entende-se que são necessárias ações de conscientização no município, junto aos profissionais de saúde, para aumentar a adesão à realização do TT. É importante que estudos semelhantes sejam conduzidos nas UBSs não especializadas em TB de outras regiões do país para confirmar este achado e para chamar atenção para a necessidade da implementação de estratégias de biossegurança também nessas unidades, não somente em hospitais e UBSs especializadas no tratamento de pacientes com TB. Agradecimentos Às enfermeiras Fabiana Batistti e Luciana Mello e às técnicas de enfermagem Keila Soares e Rita de Cássia pelo auxílio durante a realização deste trabalho. REFERÊNCIAS 1. Kritski AL, Conde MB, Souza GR. Tuberculose: do ambulatório à enfermaria. 3ª ed. São Paulo: Atheneu; 2005. 2. Rodrigues L, Barreto M, Kramer M, Barata RC. 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