MICROENCAPSULAMENTO POR SPRAY DRYER DE ANTOCIANINAS DE JUSSARA (Euterpe edulis MARTIUS) COM MALTODEXTRINA EM DIFERENTES TEMPERATURAS E.M.F. Lima 1, D.B. Benincá 1, W.C dos Santos Junior 1, M. C. Martins 1, S.H.Saraiva 1, P.I.Silva 1 1- Departamento de Engenharia de Alimentos Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Ciências Agrárias e Engenharias CEP: 29500-000 Alegre, ES, Brasil, Telefone: (28) 3552 8638 e-mail: emiliamflima@gmail.com, daiane-beninca@hotmail.com, w.c.junior@live.com, marina_cmartins@yahoo.com.br, sergiohsaraiva@gmail.com, pollyannaibrahim@gmail.com RESUMO A substituição dos corantes sintéticos pelos naturais é uma demanda crescente no ramo alimentício, valorizando as propriedades funcionais atribuídas a compostos. As antocianinas são pigmentos naturais que conferem cores atrativas e potencial benéfico à saúde, estando presentes em grande quantidade no fruto da palmeira jussara. No entanto, apresentam instabilidade frente a alguns processos tecnológicos, dificultando sua utilização em grande escala. A microencapsulação é uma alternativa para melhorar a estabilidade de pigmentos e viabilizar sua incorporação em produtos. O objetivo deste trabalho foi obter antocianinas de jussara microencapsuladas por spray dryer com diferentes temperaturas de secagem, avaliando as microcápsulas quanto à retenção de antocianinas, fenólicos, antioxidante, atividade de água e molhabilidade. Por meio da análise de variância (p<0,05) e regressão, verificou-se que a temperatura exerceu influência sobre as três últimas respostas, recomendando a utilização de temperaturas mais amenas, dentro de intervalo testado neste trabalho. ABSTRACT The replacement of synthetic dyes by natural is a growing demand in the food sector, enhancing the functional properties attributed to these compounds. Anthocyanins are natural pigments that give attractive colors and potentially beneficial to health, being present in large quantities in the fruit of palm jussara. However, they exhibit instability to some technological processes, making them difficult to use in large scale. Microencapsulation is an alternative to improve the stability of pigments and enable its incorporation into products. The aim of this study was to obtain anthocyanins of jussara microencapsulated by spray drying with different drying temperatures, evaluating the microcapsules as the retention of anthocyanins and phenolic compounds, antioxidant activity, water activity and wettability. Through analysis of variance (p <0.05) and regression, it was found that the temperature influenced upon the last three responses, recommending the use of lower temperatures within the range tested in this work. PALAVRAS-CHAVE: atomização, fenólicos, antioxidante, atividade de água, molhabilidade KEYWORDS: atomization, phenolic, antioxidant activity, water activity, wettability 1. INTRODUÇÃO
A busca por fontes alternativas de pigmentos naturais tem estimulado o desenvolvimento de pesquisas em diferentes frutos, contribuindo para a diminuição do uso de pigmentos sintéticos em produtos alimentícios. A palmeira Euterpe edulis Martius é nativa da Mata Atlântica e utilizada comumente para a extração de palmito. O seu fruto, jussara, possui coloração de verde a marrom, devido à grande presença de antocianinas, as quais fazem parte do grupo dos compostos fenólicos, possuindo características funcionais que exercem efeitos benéficos à saúde (PASSOS, 2011; ZAIDEL et al., 2014), como a capacidade de eliminação de radicais e prevenção de doenças cardiovasculares (GE; MA, 2013). Existe um grande interesse na utilização de antocianinas como corante natural na indústria alimentícia, visto que possuem grande potencial para aplicação em alimentos (GE; MA, 2013). No entanto, sua utilização pode ser dificultada devido à instabilidade frente a processos tecnológicos (PASSOS, 2011). Alguns métodos podem ser utilizados para melhorar a estabilidade de corantes naturais, como a microencapsulação, sendo a secagem por atomização, pulverização ou spray drying, o método mais comum e econômico de encapsulação de ingredientes alimentícios (BARROS; STRINGHETA, 2006), contribuindo com a estabilização de pigmentos durante o processamento e estocagem, ao preservar a sua atividade antioxidante e promover maior estabilidade ao calor, luz, ph, além de aumentar a vida útil (RUTZ, 2013; ZAIDEL et al., 2014). O princípio da microencapsulação consiste na emulsificação do material de interesse em uma solução aquosa, e posterior bombeamento da mistura através de um bico atomizador a uma câmara com corrente de ar a alta temperatura. As partículas lançadas em meio gasoso tomam forma esférica, empacotando o composto bioativo dentro da fase aquosa. A água se evapora rapidamente ao entrar em contato com o ar aquecido, o tempo de exposição das partículas ao calor é curto, tornando possível a conservação de compostos termossensíveis (ABREU; FERREIRA, 2013; MUTKA et al., 1988). Dentre os agentes encapsulantes utilizados, destaca- se a maltodextrina, um polissacarídeo obtido pela hidrólise ácida de diferentes amidos, que possui alta solubilidade e baixa viscosidade. As características finais do pó obtido por atomização dependem de algumas variáveis do processo como a temperatura do ar de secagem, sendo necessários estudos para otimização de parâmetros, de forma a obter pós com melhores características para incorporação em produtos alimentícios. Desta forma, o objetivo deste trabalho foi avaliar a influência da temperatura de secagem no microencapsulamento de antocianinas de jussara, quanto à retenção percentual de antocianinas, teor de compostos fenólicos, atividade antioxidante e atividade de água dos pós. 2. MATERIAL E MÉTODOS Os experimentos foram realizados nos laboratórios do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Espírito Santo (CCA-UFES). A polpa de jussara (Euterpe edulis Martius) foi adquirida de agricultores do município de Rio Novo do Sul, região Sul do Estado, e foram estocadas a -20 ºC, até o momento das análises. Preparo dos extratos concentrados de jussara: a extração de antocianina foi realizada segundo Francis (1982), com modificações, utilizando álcool de cereais 70% e ácido cítrico para acidificação (ph 2,5). Após 24 horas sob refrigeração, o extrato foi filtrado em funil de buchner e levado a um evaporador rotatório para concentração a vácuo a 40% do volume inicial. Obtenção das microcápsulas: utilizou-se maltodextrina 10DE (30 % v/v) como agente encapsulante. Os extratos concentrados foram adicionados da maltodextrina na proporção de 1:3 (v/v), segundo Ibrahim Silva et al. (2013). A secagem foi realizada em um mini spray dryer (marca Yamato, modelo ADL 311S), utilizando cinco temperaturas do ar de saída: 50, 55, 60, 65 e 70 ºC. Retenção percentual de antocianinas: a quantificação foi realizada pelo método do ph único de acordo com Lees; Francis (1972), com modificações, nos extratos concentrados e extratos obtidos da reconstituição dos pós, por meio da diluição com solução extratora de Etanol:HCl 1,5N (85:15 v/v)
seguida de leitura em espectrofotômetro a 510 nm. O teor de antocianinas foi expresso em mg de cianidina-3-glicosideo por 100 g de matéria seca. Conteúdo fenólico total: determinado pelo ensaio do reagente Folin-Ciocaulteau, com base em metodologia adaptada de Singleton; Rossi (1965). Foram diluídos 0,6 ml dos extratos obtidos dos pós em 3,0 ml de reagente Folin-Ciocalteau. Após 3 minutos de reação, adicionou- 2,4 ml de solução saturada de Na 2 CO 3 (7,5 %; m/v), seguida de leitura da absorbância (760 nm), após 1 hora de repouso em ausência de luz. Foi realizada curva padrão de ácido gálico (20-150 ppm) e os resultados expressos em ácido gálico equivalente (mg AGE.100g -1 ). Atividade antioxidante (ABTS): para formação do radical ABTS, a solução aquosa de ABTS 7 mm foi adicionada à solução de persulfato de potássio 2,45 mm, mantida no escuro por 16 horas, seguida da correção da absorbância para 0,700 com adição de etanol 80 %, e leitura a 734 nm. Foram adicionados 3,5 ml da solução radical ABTS + a 0,5 ml de cada extrato, e realizada leitura espectrofotométrica após 6 minutos de reação. Construiu-se curva padrão de Trolox (10-150 mm) e os resultados foram expressos em equivalente de Trolox (mm Trolox.g -1 ), segundo Re et al., (1999). Molhabilidade: realizada segundo metodologia proposta por Hla; Kogekamp (1999) e modificada por Vissotto et al. (2006). Consistiu na queda de 2,0 g de amostra do pó sobre 400 ml de água destilada a 25 ºC disposta em um béquer de 1 L, contabilizando o tempo necessário para que todas as partículas ficassem molhadas, determinado visualmente. O experimento foi realizado em três repetições, totalizando 15 pós. Os dados foram submetidos à análise de variância (ANOVA) com o auxílio do programa STATISTICA versão 10, seguidos da análise de regressão. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Tabela 1, pode-se observar os valores de F e p obtidos da análise de variância (ANOVA) para as quatro variáveis resposta analisadas, juntamente com os modelos ajustados seguidos dos respectivos R², quando a resposta apresentou diferença significativa (p<0,05). Tabela 1: Valores de F e p obtidos na ANOVA e modelos ajustados Respostas F p Modelo ajustado R² Retenção de antocianinas 0,6096 ns 0,6651 Compostos fenólicos 1,596 ns 0,2497 Atividade antioxidante 17,424* 0,0002 Â = 12,9755-0,1152 T 0,8455 Atividade de água 17,691* 0,0002 Â = - 4,7965 + 0,1786 T - 0,001511 T² 0,9866 Molhabilidade 3,9981* 0,0344 Â = 57,8786-1,9295 T + 0,001680 T² 0,8971 ns : Não significativo (p>0,05);*: Significativo (p<0,05); Â: variável resposta; T: temperatura. No presente estudo, observou-se que o uso de diferentes temperaturas do ar de saída não exerceu influência significativa (p>0,05) pelo teste F na retenção de antocianinas e conteúdo fenólico total. No entanto, a temperatura do ar de saída influenciou significativamente (p<0,05) nas demais respostas, sendo possível ajustar um modelo matemático. Os elevados coeficientes de determinação (R²) encontrados informam que 84 % da variação da atividade antioxidante, 98 % da atividade de água e 89 % da molhabilidade são provenientes da variação da temperatura, podendo-se considerar os modelos linear e polinomiais de segundo grau, respectivamente, apropriados para relacionar estas variáveis. Assim, estão representados na Figura 1 os gráficos constituídos pelos valores das respostas versus as diferentes temperaturas utilizadas.
Por meio da Figura 1, observa-se que dentro do intervalo de temperatura testado, quanto menor a temperatura de secagem, maior a atividade antioxidante, indicando que temperaturas de trabalho mais baixas são mais indicadas para a manutenção da atividade antioxidante de microcápsulas de antocianinas de jussara. A maior média foi encontrada na temperatura de 50 ºC (75,68 mm Trolox.g -1 ) enquanto a média mínima foi encontrada na temperatura de 70 ºC, igual a 51,96 mm Trolox.g -1. Embora as temperaturas de saída utilizadas sejam consideradas baixas para o processo de secagem, sugere-se que ocorreu degradação dos compostos que conferem atividade antioxidante. Figura 1 - Representações gráficas da atividade antioxidante, atividade de água e molhabilidade, frente às diferentes temperaturas utilizadas Molhabilidade (min) At. antioxidante (mm.g -1) 80 Experimental 75 Modelo 70 65 60 55 50 45 40 45 50 55 60 65 70 75 Temperatura ( C) a w 0.50 0.45 0.40 0.35 0.30 0.25 45 50 55 60 65 70 75 Temperatura ( C) 8 7 6 5 4 3 2 1 45 50 55 60 65 70 75 Temperatura ( C) Experimental Modelo A atividade de água foi máxima na temperatura de 59,08 ºC (Aw = 0,470), enquanto a mínima foi encontrada na temperatura de 70 ºC, igual a 0,303. Os valores observados estão acima de 0,229, encontrado por Tonon (2009) em pó de suco de açaí utilizando maltodextrina 10DE como agente encapsulante e também, acima de 0,266, valor obtido por Valduga et al., (2008) em antocianinas de bagaço de uva Isabel (Vitis labrusca) microencapsuladas com diferentes agentes. No entanto, os valores encontrados estão na faixa de 0,200 a 0,400, na qual a estabilidade de alimentos desidratados é considerada alta. Nesta região, dispensa-se o uso de conservantes para controlar o crescimento microbiano e a qualidade do produto não é afetada pelas reações de escurecimento não-enzimático (ARAÚJO, 2011). A molhabilidade foi determinada pelo tempo de molhamento, que é o tempo necessário para que uma amostra de pó fique completamente submersa após ser colocada sobre a superfície de um líquido. Tonon (2009) encontrou tempo de molhamento do pó de suco de açaí com maltodextrina 10DE e 20DE iguais a 8,61 e 6,23 minutos, respectivamente, verificando redução deste tempo com o aumento da hidrólise dos amidos. Vissotto et al. (2006) afirmam que o espaço intersticial apresentado
por partículas grandes e de forma irregular favorece a molhabilidade, enquanto que partículas pequenas acarretam uma redução dos interstícios, prejudicando a penetração de água e aumentando o tempo de molhamento. No decorrer da análise, foi observada a formação de grumos no momento em que a amostra entrou em contato com a água, resultando em tempos de molhamento relativamente longos. Este fato pode ser explicado pela formação de uma camada hidrofóbica que impede o líquido de penetrar na amostra, no momento em que partículas finas entram em contato com a solução de dissolução (VISSOTTO et al., 2006). 4. CONCLUSÕES Pode-se concluir que variações na temperatura de secagem (ar de saída) proporcionaram diferenças significativas nas microcápsulas com relação à atividade antioxidante, atividade de água e molhabilidade. Sugere-se a utilização de temperaturas mais baixas no processo de secagem, uma vez que deseja-se obter pós com alta atividade antioxidante, baixa atividade de água e pequeno tempo de molhamento. Já para a retenção de antocianinas e conteúdo fenólico total, a variação da temperatura do ar de saída na secagem não foi indicativa de alteração nas microcápsulas de antocianinas de jussara. 5. AGRADECIMENTOS À CAPES, pela concessão de bolsa de estudo, e ao CNPq, pelo financiamento deste projeto (processo nº 478246/2013-7). 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Abreu, H.; Ferreira, S. M. R. (2013). Extração e encapsulação de antocianinas de Jabuticaba (Myrciaria cauliflora), Açaí (Euterpe oleracea) e Uva Isabel (Vitis labrusca). Encontro de engenharia e tecnologia dos campos gerais, Curitiba, Brasil. Araújo, J. M. A. (2011) Química de Alimentos teoria e prática (5. ed.). Viçosa: Editora UFV. Barros, F. A. R. D.; Stringheta, P. C. (2006). Microencapsulamento de antocianinas. Biotecnologia Ciência e Desenvolvimento, (36), 18 24. Francis, F. J. (1982). Analysis of anthocyanins in foods. Anthocyanins as Food Colors, [P Markakis, editor]. Academic Press, 181 207. Ge, Q.; Ma, X. Composition and antioxidant activity of anthocyanins isolated from Yunnan edible rose (An ning). (2013). Food Science and Human Wellness, 2(2), 68 74. Hla, P. K.; Hogekamp, S. (1999) Wetting behaviour of instanized cocoa beverage powders. International Journal of Food Science and Technology, 34(4), 335-342. Ibrahim Silva, P.; Stringheta, P. C.; Teófilo, R. F.; Oliveira, I. R. N. (2013). Parameter optimization for spray-drying microencapsulation of jaboticaba (Myrciaria jaboticaba) peel extracts using simultaneous analysis of responses. Journal of Food Engineering, 117(4), 538 544. Lees, D. H.; Francis, F. J. (1972). Standardization of pigment analysis in Cranberries. Hortiscience, 7, 83 84. Mutka, J. R.; Nelson, D. B. (1988). Preparation of encapsulated flavors with high flavor level. Food Technology, 42(4),154-157. Passos, A. P. S. (2011). Antocianina obtida de fruto de palmeira juçara (Euterpe edulis Mart.): Estabilização com maltodextrina e aplicação em alimentos (Dissertação de mestrado). Universidade Estadual de Maringá, Maringá. Re, R.; Pellegrini, N.; Proteggente, A.; Pannala, A.; Yang, M.; Rice-Evans, C.(1999). Antioxidant activity applying an improved ABTS radical cation decolorization assay. Free Radical Biology and Medicine, 26, 1231 1237. Rutz, J. K. (2013). Caracterização e microencapsulação de suco de pitanga roxa. (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Pelotas, Pelotas.
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