PRODUÇÃO DE BIODIESEL DE ÓLEO DE FRANGO EM ULTRASSOM UTILIZANDO LIPASE COMERCIAL DE Rhizomucor miehei Camila BONISSONI 1, Ingrid A. S. GUIMARÃES 2, Gisanara DORS 3, Cristiane SPAGNOL 4, Giniani Carla DORS 5, Maria Manuela Camino FELTES 6, Andréia DALLA ROSA 7, Samantha Lemke GONZALEZ 8. 1 Bolsista PIBIC/CNPq; 2 Bolsista IFC; 3 UFPel; 4 IFC Campus Concórdia; 5 Professora UFPel; 6 Professora IFC Campus Brusque; 7 Técnica de Laboratório IFC- Campus Concórdia; 8 Orientadora IFC Campus Concórdia.. Introdução As desvantagens econômicas e ambientais apresentadas pelo uso de combustíveis fósseis têm estimulado o desenvolvimento de combustíveis alternativos, entre os quais se destaca o biodiesel (AKOH et al., 2007; REANEY et al., 2005). No Brasil, a produção e a comercialização de biodiesel possuem importantes vantagens devido à grande disponibilidade de matéria-prima para sua produção, a saber, óleos e gorduras de origem vegetal e animal (OLIVEIRA et al., 2006). Este biocombustível é obtido a partir da reação química de óleos ou gorduras com um álcool primário, na presença de um catalisador (reação de alcoólise, genericamente conhecida como transesterificação) (REANEY et al., 2005). Matérias-primas como gordura e óleo de aves, sebo bovino, banha suína apresentam potencialidades para conversão a biodiesel. Na agroindústria, geralmente em frigoríficos de aves, os subprodutos gerados são convertidos em farinhas, que servem como insumos nas formulações de rações. O excesso de gorduras, principalmente das vísceras, é extraído, e parte é incorporada às rações (GOMES, 2005). O aproveitamento de óleo de vísceras de frango como material de partida para a produção de biodiesel pode evitar o destino impróprio desses resíduos, minimizando os impactos negativos ao meio ambiente de abatedouros e graxarias, e, ainda, representa um retorno financeiro para as indústrias. A alcoólise catalisada por lipases é uma tecnologia promissora e tem sido objeto de muita investigação, pois as condições de trabalho permitem uma economia de energia no processo, bem como a ocorrência de uma degradação térmica mínima dos substratos. Além disso, o processo de purificação dos ésteres metílicos ou etílicos (biodiesel) e do glicerol produzido como coproduto é mais simples quando comparado à catálise química, reduzindo assim, o custo do tratamento dos resíduos (FELTES et al., 2011). A lipase comercial imobilizada Lipozyme RM IM, obtida de Rhizomucor miehei, mostra-se atrativa em reações de modificação de lipídios, fato que incentiva a realização de estudos com este catalisador
visando à produção de biodiesel a partir da etanólise de óleo de vísceras de frango (SANTOS et al., 2013). Em reações de etanólise de óleos, entretanto, é preponderante a busca por alternativas que contornem a imiscibilidade dos substratos (óleo e álcool) no meio reacional. As reações assistidas por ultrassom apresentam potencialidades para contornar este desafio, já que esta técnica de alta energia permite o aumento da transferência de massa no sistema (BATISTELLA et al, 2012; POPIOLSKI, 2011). O objetivo geral do presente trabalho foi acompanhar, a partir de cromatografia em fase gasosa, a produção de ésteres derivados da etanólise de óleo de vísceras de frango utilizando lipase comercial, imobilizada, como catalisador da reação, em sistema com ultrassom. Material e Métodos Utilizou-se como matéria-prima o óleo de vísceras de frango fornecido pelo Grupo Farol de Concórdia-SC. Este óleo (sem tratamento adicional) foi caracterizado em estudos anteriores (ERIG et al., 2015), segundo metodologia oficial da American Oil Chemists Society (AOCS, 2003). A enzima comercial Lipozyme RM IM, obtida de Rhizomucor miehei, disponível na forma imobilizada (Novozymes, Brasil), utilizada como catalisador nas reações de etanólise, foi cedida pelo Laboratório de Biocatálise do Departamento de Química da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Os experimentos consistiram na etanólise enzimática do óleo com a lipase imobilizada. As reações foram conduzidas em uma lavadora ultrassônica (frequência de 40 khz e potência máxima de 132 kw), com controle da temperatura de reação e sem agitação. O reator consistiu de um balão de fundo redondo (capacidade 50 ml) acoplado a um sistema de condensação e as reações foram conduzidas por 6 horas. As condições de análise foram definidas com base em um planejamento experimental 2 4-1, com dois níveis (-1 e +1) e três pontos centrais (Tabela 1), resultando em um total de 11 ensaios. As variáveis investigadas foram proporção molar de substrato (etanol e óleo), concentração mássica de enzima (%), temperatura da reação ( C) e quantidade de solvente (hexano, em ml) utilizado na reação.
Tabela 1 Nível das variáveis investigadas no planejamento fatorial fracionado 2 4-1 para a reação de etanólise de óleo de vísceras de frango. Níveis -1 0 +1 Temperatura (ºC) 50 55 60 Proporção molar óleo de frango:etanol 1:3 1:6 1:9 Concentração de enzima % (m/m) 5 10 15 Solvente: hexano (ml) 0 20 40 As reações para a determinação do teor de éster foram acompanhadas por cromatografia em fase gasosa, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), conforme metodologia descrita por Batistella et al. (2012). Resultados e discussão A partir da definição das variáveis e da aplicação do planejamento fatorial fracionado 2 4-1, obtiveram-se os resultados indicados na Tabela 2. Tabela 2 Teor de éster obtido nas reações de etanólise do óleo de frango segundo o planejamento fatorial fracionado 2 4-1, utilizando a Lipozyme RM IM (variáveis codificadas e reais). Trat. T ( C) Proporção Molar [E] (%) Hexano Etanol Enzima Hexano Teor de Óleo (g) Óleo:etanol (m/m) (ml) (g) (g) (ml) Éster (%) 1) -1 (50) -1 (1:3) -1 (5) -1 (0) 5,0244 0,8294 0,2929 58,04 61,65 2) +1 (60) -1 (1:3) -1 (5) +1 (40) 1,0048 0,1685 0,0605 0,004 13,59 3) -1 (50) +1(1:9) -1 (5) +1 (40) 1,0046 0,4910 0,0795 0,008 35 4) +1 (60) +1 (1:9) -1 (5) -1 (0) 5,0159 2,4273 0,0373 74,14 24,08 5) -1 (50) -1 (1:3) +1 (15) +1 (40) 1,0156 0,1761 0,1796 0,004 28,07 6) +1 (60) -1 (1:3) +1 (15) -1 (0) 5,0011 0,8100 0,8712 58,04 47,56 7) -1 (50) +1 (1:9) +1 (15) -1 (0) 5,0195 2,4401 1,1203 74,14 54,65 8) +1 (60) +1 (1:9) +1 (15) +1 (40) 1,0099 0,4913 0,2273 0,008 27,3 9) 0 (55) 0 (1:6) 0 (10) 0 (20) 1,0074 0,3290 0,1352 0,02 23,7 10) 0 (55) 0 (1:6) 0 (10) 0 (20) 1,0097 0,3277 0,1382 0,02 9,34 11) 0 (55) 0 (1:6) 0 (10) 0 (20) 1,0041 0,3287 0,1358 0,02 19,54 O teor de ésteres obtido nos tratamentos apresentados na Tabela 2 variaram de 9,34% a 61,65%. Os resultados demonstraram que o tratamento 1, conduzido à temperatura de 50 C, com proporção molar 1:3 (óleo:etanol), concentração mássica de 5% de enzima e sem adição de solvente foi o que proporcionou o maior teor de éster (61,65%).
Batistella (2012) estudou a produção de biodiesel de óleo de soja em ultrassom, utilizando como catalisador a lipase Lipozyme RM IM e obteve teor de éster de 64,66% em um tratamento conduzido à temperatura de 40 C, proporção molar 1:3 (óleo/etanol), 20% de enzima, utilizando 10 ml de solvente (n- hexano). Oliveira et al. (2005), ao realizarem testes visando à produção de ésteres etílicos a partir de óleo de mamona e de soja, utilizando as lipases Lipozyme IM e Novozym 435 em solvente orgânico (n-hexano), observaram que um parâmetro que tende a afetar de forma positiva o processo de conversão é a concentração de enzima. Quando se tem uma maior concentração de enzima, tem-se uma maior disponibilidade dos centros ativos das mesmas, aumentando as velocidades de reação e diminuindo, consequentemente, o tempo, dados estes que corroboram com nosso estudo. A razão molar de óleo e etanol é uma das variáveis mais importantes que afeta o rendimento dos ésteres etílicos. A relação estequiométrica de transesterificação requer três moles de álcool e um mol de tricilgliceróis para produzir os três moles de ésteres etílicos e um mol de glicerol. Ao usar o sistema de ultrassom, a quantidade de álcool requerida pode ser reduzida. Isto ocorre, pois a cavitação do ultrassom resulta na liberação de calor e pressão em curtos intervalos de tempo e em locais específicos do líquido, fazendo com que ocorra um aumento de transferência de massa no sistema, melhorando a miscibilidade dos substratos, fornecendo energia e consequentemente reduzindo o tempo de reação (YU et al., 2010). O aumento da temperatura da reação aumenta a chance de colisão das moléculas do substrato e das enzimas, formando o complexo enzima-substrato, e levando, assim, a um aumento da atividade da enzima. No entanto, deve-se levar em conta que as enzimas dependem da temperatura, pois são facilmente desativadas a altas temperaturas (ANTCZAK et al., 2009; YU et al., 2010). Conclusão O presente trabalho indicou a possibilidade de obter ésteres etílicos a partir de óleo de vísceras de frango, em reação mediada por ultrassom e catalisada pela lipase comercial imobilizada Lipozyme RM IM. A matéria-prima utilizada é promissora para a produção de biodiesel no Brasil, devido principalmente à sua grande disponibilidade a um baixo custo.
Além disso, vale destacar que este óleo é obtido como subproduto em frigoríficos de abate de frangos, atividade econômica de destaque nos Estados do Paraná e de Santa Catarina. Em trabalhos futuros, tendo como base os resultados obtidos na presente pesquisa, pode-se fazer uma otimização do processo. Referências AKOH, C.C. et al. Enzymatic approach to biodiesel production. Journal of Agricultural and Food Chemistry, v.55, p.8995-9005, 2007. ANTCZAK, M.S.; KUBIAK, A.; ANTCZAK, T.; BIELECKI, S., Enzymatic biodiesel synthesis Key factors affecting efficiency of the process. Renewable Energy, v.34, p.1185-1194, 2009. AOCS. Official Methods and Recommended Practices of the American Oil Chemists' Society. Champaign: AOCS Press. 2003. BATISTELLA et al. Ultrasound-assisted lipase-catalyzed transesterification of soybean oil in organic solvent system. Ultrasonics Sonochemistry, v.19, p.452-458, 2012. FELTES, M.M.C. Produção de monoacilgliceróis e diacilgliceróis ricos em ácidos graxos ômega-3 a partir da glicerólise enzimática de óleo de peixe. Tese (Doutorado em Engenharia de Alimentos). UFSC Florianópolis. 2011. GOMES, L. F. S.; DE SOUZA, S. N.; BARICCATTI, R. A. Biodiesel produzido com óleo de frango. Acta Science and Technology, v.30, n.1, p.57-62, 2008. OLIVEIRA, D., et al. Kinetics of enzyme-catalyzed alcoholysis of soybean oil in n-hexane. Applied Biochemistry and Biotechnololy, v.121, p.231-41, 2005. OLIVEIRA, L. B., et al. Analysis of the sustainability of using wastes in the Brazilian power industry. Renewable & Sustainable Energy Reviews, v. 12, n.3, p.883-890, 2006. POPIOLSKI, A. S. Otimização do processo de produção enzimática de biodiesel em sistema livre de solvente em banho de ultrassom. Tese (Doutorado em Engenharia de Alimentos). Erechim: URI, 2011. REANEY, M. J. T.; HERTZ, P. B.; McCALLEY, W. W. Vegetable oil as biodiesel. In: Bailey s industrial oil and fat products. Shahidi, F. (Ed.). New York: John Wiley & Sons, p. 223-257, 2005. YU, D.; TIAN, L.; WU, H.; WANG, S.; WANG, Y.; MA, D.; FANG, X., Ultrasonic irradiation with vibration for biodiesel production from soybean oil by Novozym 435. Process Biochemistry, v.45 p.519-525, 2010.