HISTORIOGRAFIA E LITERATURA: O POTENCIAL HISTORIOGRÁFICO DO ENREDO TRÁGICO RESUMO



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HISTORIOGRAFIA E LITERATURA: O POTENCIAL HISTORIOGRÁFICO DO ENREDO TRÁGICO RESUMO Fernanda Mattos Borges da Costa 1 O presente artigo pretende reconstruir a revolução historiográfica do século XIX a partir de uma análise da tradição da Escola dos Annales e da afirmação da Nova História. A respeito disso, trata do estudo de Peter Burke dos historiadores do final do século XVIII e inovações trazidas pelo início do século XIX. Dentre elas serão destacadas as mudanças apreendidas no papel do historiador e da natureza do método historiográfico, a Revolução Heurística e a construção de uma história das mentalidades. Complementado com o estudo de Hayden White sobre a narrativa histórica, e suas diferenças com as concepções anteriores. Será destaca a relação entre a historiografia e a literatura, para inserir um debate mais específico da construção histórica a partir do enredo trágico. Neste ponto pretende-se analisar as características particulares da tragédia que permite sua proximidade com o seu contexto ético. A intenção deste trabalho é formular um debate introdutório que venha a complementar um Trabalho de Curso embasado na análise de duas diferentes concepções de justiça a partir das particularidades entre contextos éticos distintos, pré-moderno e o moderno. Para exemplificar o uso historiográfico da obra trágica, tratar-se-á das tragédias Orestéia, de Ésquilo, e Hamlet, de Shakespeare. Em ambas o assassinato demanda um dever de vingança, porém a Orestéia narra o sentido de justiça a partir do conflito entre destino e salvação em um embate de ordens e leis divinas distintas, enquanto Hamlet reflete a busca do sentido de justiça a partir do conflito entre destino e livre arbítrio, em meio aos questionamentos da ordem estabelecida pelo costume e da tradição. Ambos reflexos de caracteres próprios de seu tempo. Palavras-chave: Historiografia, Literatura, Tragédia. 1 Estudante do Curso de Direito do Centro Universitário do Pará- Cesupa

ABSTRACT This article seeks to reconstruct the historiographical revolution of the nineteenth century from an analysis of the tradition of the Annales and the affirmation of the New History. In this regard, deals with the study of Peter Burke of the historians from the late eighteenth and innovations brought by the early nineteenth century. Among them will be highlighted changes in perceived role of the historian and the nature of historiographical method, the Heuristic Revolution and the construction of a history of mentalities. Complemented by the studies of Hayden White s theory of historical narrative, and its differences between the previous conceptions. It will be highlight the relationship between historiography and literature, to enter a more specific discussion of the historical development from the tragic plot. At this point we intend to analyze the particular characteristics of the tragedy that allows its proximity to its ethical context. The intent of this paper is to formulate an introductory discussion that will complement a TC based in the analysis of two different conceptions of justice from the particularities among different ethical contexts, pre-modern and modern. To illustrate the use of historiographical work tragic case will the tragedies Oresteia, by Aeschylus, and Hamlet, by Shakespeare. In both the murder demands a duty of vengeance, but the Oresteia tells the sense of justice from the conflict between destiny and salvation in a clash of different orders and divine laws, while Hamlet reflects the search for the meaning of justice from the conflict between destiny and free will, in the midst of questioning the order established by custom and tradition. Both characters' own reflections of his time.. Key-words: Historiography, Literature, Tragedy 1 INTRODUÇÃO O presente artigo pretende ser uma introdução ao meu Trabalho de Curso. Neste, abordarei as diferenças na relação entre justiça e vingança correspondentes aos contextos éticos pré-moderno e moderno, com o estudo comparativo das tragédias Orestéia, de Ésquilo, e Hamlet, de Shakespeare. Aqui farei apenas uma preliminar metodológica dessa tarefa. Explicarei como as mudanças da concepção da narrativa histórica e da tarefa do historiador permitiram novas formas de ver a relação entre história e literatura. Desse modo, pretendo mostrar que minha futura tentativa de interpretar contextos históricos a partir de obras literárias que neles tiveram lugar encontra suporte teórico nas idéias da Nova História. A revolução historiográfica e da Escola dos Annales, acompanhada por outros historiadores da época, revela a importância do estudo das mentalidades do passado. Neste contexto ocorre o debate sobre a possibilidade, a validade e os cuidados para o uso de textos literários nas conclusões históricas. Mas a temática historiográfica constitui-se de forma relativamente autônoma, o que permite seu tratamento a parte e um debate mais concentrado para fins de publicação.

Neste trabalho falarei da transição do pensamento historiográfico com a cisão da tradição histórica entre Velha História e Nova História. Explicarei o papel da narrativa histórica e a renovação das fontes, trazidas pelo novo modelo historiográfico. Em seguida tratarei sobre as relações entre a História e a Tragédia, com o fim de mostrar as particularidades do enredo trágico e sua relação com a mentalidade de seu período. Ao final, serão trazidas algumas das semelhanças e diferenças presentes nas tragédias de Orestes e Hamlet. 2 RELAÇÕES ENTRE HISTÓRIA E LITERATURA Da Velha História para a Nova História e o surgimento da história das mentalidades: Antes da revolução historiográfica e do desenvolvimento da Nova História os textos de referência ao passado vertiam-se basicamente sobre os acontecimentos políticos e militares. As fontes históricas já no paradigma do século XVIII estavam restritas àquelas de origem documental. Esta maneira de pensar a história, posteriormente batizada de Velha História, foi liderada por Leopold Von Ranke e continuada de forma mais radical por seus seguidores 2. Qualquer abordagem histórica não política era desconsiderada de cientificidade, e neste sentido, incapaz de predizer verdades históricas. No século XIX, a história dos grandes acontecimentos, dos grandes feitos e dos grandes homens ainda gozava de supremacia. Porém já insurgiam visões mais amplas do trabalho historiográfico. Autores como Michelet e Burckhardt apresentavam interesse por temáticas tais como a visão das camadas populacionais desfavorecidas nos diferentes tempos históricos ou a integração entre Estado, Religião e Cultura 3. No final do século pululavam manifestações contra a historiografia tradicional e no início do século XX o debate chegara a um nível intenso. Neste contexto que se desenvolveu a revista Annales d histoire économique et sociale, criada por Marc Bloch e Lucien Febvre. O movimento liderado pela Escola dos Annales estabeleceu-se como busca de superação da tradicional narrativa de acontecimentos e pela adoção do método da históriaproblema. Neste formato desenvolve-se o estudo e a pesquisa voltados para responder à questão trazida pelo historiador, uma atividade maior do que relacionar fatos. Também era 2 BURKE, Peter. A escola dos annals (1929-1989): a revolução francesa da historiografia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997. p.18. 3 Ibid., p.19.

objetivo dos historiadores da revista a defesa de uma história total, uma história real (na defesa de Durkheim) 4 ou uma história econômica e cultural dos povos (conforme defendeu Karl Lamprecht) 5, abrangente e relacionada a todas as atividades humanas. A Escola defendeu intensamente o contato do estudo histórico com outras disciplinas em prol de novas abordagens históricas a partir da contribuição das demais ciências sociais. Uma das criações de Marc Bloch, Les Rois Thaumaturges exemplifica o método de história-problema, que visa respostas à questão trazida pelo autor. O livro trata da crença sobre os povos feudais sobre as habilidades de cura de seus reis exercida por meio do toque real especialmente praticado na Inglaterra e na França durante vários séculos. A partir desta constatação, Bloch desenvolve uma série de possibilidades às crenças nos milagres por meio da contribuição das disciplinas da psicologia, antropologia, e sociologia. Na sociologia sofreu grande influência durkheiminiana acerca das representações coletivas, em que embasou seus resultados 6. Nesta obra desenvolveu também o que chamou de história comparativa. Seu trabalho pretendeu ir além dos estudos comparativos de até então, baseados somente nas semelhanças entre regiões contíguas, vizinhas no tempo e no espaço. Com um novo método alcança relações mais profundas que levam à maior compreensão dos costumes e das crenças compartilhadas. No Les Rois Thaumaturges, além do estudo comparativo entre a prática a Inglaterra e na França, identifica o mesmo costume sendo realizado na Polônia e destaca os seus paralelos com relação à Europa 7. Em outro estudo chamado Societé Féodale, trabalha um estudo da consciência, da memória e das representações coletivas da Europa feudal, permitindo um paralelo com o sistema do xogunato japonês. Braudel, na segunda geração dos Annales, renovou os sentidos de história de longa duração e história de curta duração. A primeira refere-se aos grandes processos, enquanto a segunda trata de fatos específicos, militares ou políticos. O acréscimo de Braudel está na centralização do estudo nas relações do homem com seu meio e todos os elementos que o envolvem. Assim, conciliou um estudo de longa duração com o movimento lento do ambiente geográfico, cultural e econômico, em prol da construção da história total 8. A história das mentalidades foi uma das grandes contribuições da terceira geração da Escola dos Annales, sendo negligenciada nas gerações anteriores. O estudo das mentalidades modificou parte da 4 Ibid., p. 20. 5 Ibid., p. 20. 6 Ibid., p. 29-30. 7 Ibid., p. 30. 8 Ibid., p. 54.

historiografia, reduziu o foco da economia e da história quantitativa para colocar em primeiro plano a cultura e a história social 9. Philippe Airès foi historiador das mentalidades, apesar de não estar ligado aos Annales e à atividade historiográfica institucional. Pesquisou e escreveu acerca das relações que a cultura estabelece com fenômenos naturais, tais como a morte e a infância. Seu estudo foi construído a partir da literatura e da arte de quase mil anos. A abordagem que fez acerca da morte trouxe para o debate dos Annales a mentalidade das diferentes sociedades em épocas distintas. Autores como Vovelle e Chaunu empregaram complementações à visão da morte por várias gerações a partir de abordagens quantitativas 10. Houve grande influência de Michel Foucault na terceira geração, e a partir de suas contribuições a idéia do real expandiu-se para além do social até alcançar o campo do pensamento 11. Apesar da primazia dos medievalistas dentre os historiadores da Escola dos Annales, o movimento alcançou também os estudos historiográficos da antiguidade. Autores tais como Jean-Pierre Vernant e Paul Veyne desenvolveram suas pesquisas paralelamente aos Annales e suas obras foram embasadas na psicologia, na sociologia e na antropologia 12. A narrativa histórica: Paul Ricoeur, em Tempo e Memória, declara a volta da narrativa à historiografia. Defende que todas as obras históricas são narrativas, mesmo àquelas da tradição dos Annales 13, na qual a narrativa remeteria apenas ao aspecto da história contada a partir de fatos e eventos políticos ou realizações de poucos indivíduos. A partir de um estudo formal da historiografia, Hayden White traz uma nova perspectiva da função e do saber historiográfico. No Meta-História, faz uma análise das concepções do processo histórico apresentadas por quatro grandes historiadores do século XIX (Michelet, Ranke, Tocqueville e Burckhardt). Em seguida trabalha as reflexões sobre a história e sua construção nas teorias dos principais filósofos da história do mesmo período (Hegel, Marx, Nietzsche e Croce). Neste estudo pretende demonstrar o trabalho historiográfico como construção de idéias na forma de um discurso narrativo. Por conta disso, White descreve as formas de narrativas históricas possíveis a partir das principais obras dos 9 Ibid., p. 78. 10 Ibid., p. 80-81 e 88. 11 Ibid., p. 88 e 99. 12 Ibid., p. 114. 13 Ibid., p. 104.

historiadores destacados. Identifica modelos de representação e reflexão histórica alternativos entre si, que culminam em quatro estilos possíveis de reconstrução histórica: romance, tragédia, comédia e sátira. Da mesma forma é viável a sobreposição de estilos, como também podem haver outras modalidades narrativas de construção historiográfica, tal como o épico. Quando aborda sua teoria da obra histórica 14, White estabelece cinco níveis na formação da obra histórica: a crônica, a estória, o modo de elaboração de enredo, o modo de argumentação e o modo de implicação ideológica. A crônica é formada por todos os elementos do campo histórico, seqüenciados em ordem cronológica de acontecimento e indistintos dentre o todo. Para formar a estória, o historiador reorganiza os elementos do campo histórico de modo a formar um processo, com início, meio e fim distinguíveis. A partir disso, os eventos são selecionados de acordo com sua relevância para o processo que se pretende construir. Eles serão divididos em categorias, como eventos de motivos iniciais, de motivos de transição ou de motivos conclusivos, ordenando-os de forma coerente dentro de um período determinado. Nem todos os eventos na crônica serão selecionados para integrar a estória. A crônica constitui-se de todos os fatos do passado possíveis de serem conhecidos, e o historiador seleciona e ordena apenas aquilo que entende ser relevante para a formação de seu enredo. Um mesmo evento, tal como uma revolução ou alteração política, pode constar como motivo inicial, transitório ou conclusivo dentro da estória. Depende da relevância que apresenta dentro do processo construído e analisado pelo historiador. O trabalho historiográfico foi afastado da tarefa do ficcionista porque este inventava suas narrativas, enquanto se atribuía ao historiador a capacidade de encontrar as histórias reais do passado em meio aos fatos da crônica. No entanto já não se pode afastar a percepção do grau de inventividade na pesquisa e no produto do estudo historiográfico. Basta que se destaque um evento: a partir das várias abordagens historiográficas já feitas, o momento da queda da Bastilha pode ser verificado de diversas maneiras, nos mais distintos ângulos. Sãolhe atribuídos motivos e relevâncias diferentes, a depender de onde o fato figura dentro do processo destacado no enredo. Por exemplo, se o objetivo é apontar a revolta do povo ao governo francês, o evento será colocado como motivo de meio ou ainda de início, para explicar os outros acontecimentos posteriores, como a própria Revolução. Os fatos históricos o são na medida em que constituem relevância para o processo que o historiador pretende narrar. 14 White, Hayder. Meta-história: a imaginação histórica do século XIX. 2. Ed. São Paulo: EDUSP, 1995.

White destaca, ainda, que o estabelecimento dos eventos dentro da estória tanto trazem quanto respondem a questões trazidas pelo historiador. Proposições como O que aconteceu?, porque aconteceu dessa forma e não de outra?, como aconteceu?, ou ainda questões mais abrangentes como qual o sentido de tudo isso? podem ser respondidas de várias formas, a partir de explicações por elaboração de enredo, por argumentação e por explicação ideológica 15. Estabelecer um enredo, seja ele romanesco, trágico, comédia ou satírico, é dar sentido a cada estória que compõe a narrativa. Uma explicação por argumentação formal refere-se à pretensão de construção de uma finalidade ou sentido para os argumentos trazidos pelo historiador. Esta explicação trabalha de modo silogístico, estabelece uma lei putativa e universal de explicações históricas e segue para enquadrar os fatos continentes no enredo. O resultado é uma conclusão lógica dos eventos organizados no enredo, que exprimam o significado dos acontecimentos a partir de um argumento nomológico-dedutivo. Um exemplo de lei putativa universal é dado pelo próprio White: dentro da teoria marxista, qualquer alteração que ocorra na Base, sendo esta os meios de produção e a relação entre eles, acarretará modificações dentro dos componentes da Superestrutura, que são as instituições culturais e sociais 16. Estas leis não são estabelecidas tais como as leis das ciências naturais. Os historiadores divergem a respeito do conteúdo delas, sem convergir em consensos metodológicos. White resume que as explicações históricas são obrigadas a basear-se em diferentes pressupostos meta-históricos acerca da natureza do campo histórico, pressupostos que geram diferentes concepções dos tipos de explicação que podem ser usadas na análise historiográfica 17. São diferentes disputas historiográficas no nível da interpretação, que acabam por demonstrar divergências no que seja a verdadeira natureza da atividade do historiador. White conclui que qualquer modo explicativo de construção histórica tem um fundo ideológico. Só é possível ao historiador explorar o passado em comparação com o presente, que acaba necessariamente conseqüente daquele. Mais que isso, a própria forma que se constrói os eventos passados depende de como se percebe o presente, como coerência daquilo que passou. Assim, o compromisso com uma forma identificada no passado predetermina os tipos de generalização que o historiador pode fazer acerca do mundo presente. Por ideologia, no entendimento de White, trata-se do conjunto de prescrições éticas que o historiador 15 ver White,op.cit 16 Ibid., p. 26-27 17 Ibid., p. 28.

apresenta sobre o seu próprio tempo, voltadas à atuação social, seja para modificá-la ou mantê-la 18. Na empresa de construir sua narrativa, o historiador utiliza modalidades de elaboração de enredo, determinadas explicações por modalidades de argumentação e implicações ideológicas específicas. O resultado é a formação de um estilo historiográfico a partir da combinação final presente na obra. Mas cada estilo também representa a própria percepção do historiador acerca da ordenação e representação dos elementos históricos, da natureza e do método historiográfico, bem como do que são os problemas e as explicações da história. A Revolução Heurística: O estabelecimento de outras fontes históricas foi uma das grandes contribuições da Nova História. Esta abertura levou à ampliação das possibilidades de pesquisa historiográfica para além dos arquivos e documentos oficiais. Documentos cartográficos, testamentos, cartas, biografias, arquitetura ou até mesmo obras de arte ganharam o foco dos elementos culturais, econômicos e sociais à que pertenciam. Este novo olhar sobre as fontes do passado ficou conhecido como Revolução Heurística, intimamente relacionada ao apelo de interdisciplinaridade dos historiadores dos Annales. Lucien Febvre, por exemplo, desenvolveu uma tese de grandes dimensões sobre a religiosidade e o significado de ateísmo no período medieval a partir de François Rabelais 19. Mas foi na história das mentalidades que as pesquisas historiográficas embasadas em fontes literárias desenvolveram-se intensamente 20. O Montaillou de Le Roy Landurie tratou da reconstrução da vida cotidiana de uma vila francesa a partir de registros da inquisição. Por essa análise, Le Roy estabelece os contornos da tradição medieval por meio de um estudo do particular projetado para o todo. A isto se chamou, mais tarde, de micro-história, e o Montaillou sofreu as mais diversas críticas, gerando grandes contribuições às formas mais atuais de projeção do exemplo à totalidade. Dentre as críticas está a pendência de maior atenção às entrelinhas e pela leitura interpretativa dos documentos e das fontes. Este método é capaz de destacar mais do que se pode perceber a partir de uma análise literal, possibilita anunciar revelações às vezes imperceptíveis, mesmo aos contemporâneos daquela fonte 18 Ibid., p. 36. 19 Ver: BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929 1989): a revolução francesa da historiografia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997. 20 Ibid., p. 83.

histórica 21. A reconstrução de um contexto a partir da análise de uma situação particular é semelhante ao processo de análise de uma obra literária que pretende revelar os traços da sociedade que a gestou. Por conta dos estudos historiográficos de fontes literárias uma antropologia literária resultou da aproximação de críticos da arte (especialmente norte americanos) ao movimento dos Annales 22. Em toda literatura, a sociedade contempla a sua própria imagem 23. Mas a historiografia literária não constitui ciência inquestionável. A própria disciplina da história ainda encontra seus obstáculos para sua afirmação científica, na medida em que precisa lidar com os elementos subjetivos inerentes à sua atividade. Estabelecer precisamente o objeto histórico e sua relação com o historiador é complexo, mais ainda quando se trata da análise de elementos e contextos históricos a partir das obras literárias. Como bem ressaltou o professor Alexandre Flory, em seu artigo recente, a crítica e história literárias criam seus fatos literários, por assim dizer, e trabalham sobre o que poderia ter acontecido, diferindo em qualidade, não apenas em grau, do que efetivamente aconteceu 24. Em seu trabalho aborda a relação entre a formação identitária da Áustria por meio da literatura, após a Segunda Guerra Mundial e a conquista de sua independência com relação à Alemanha. É possível verificar trações deste contexto no fenômeno do movimento literário que se seguiu no pós-guerra. A Áustria buscava construir sua própria identidade, tanto nacional quanto cultural, e a literatura orientava-se para um retorno ao passado milenar e nobre do período anterior à guerra e à dominação. Também traz um exemplo de literatura como historiografia consciente a partir da peça teatral intitulada Heldenplatz, apresentada em 1988 no Burgtheader de Viena, que reformulada a percepção da participação da Áustria nos eventos nazistas de cinqüenta anos antes. A obra de Thomas Bernhard traz ao público o passado austríaco ligado ao nazismo, o qual se tinha afastado de qualquer debate até aquele momento. Sobre uma historiografia do período arcaico, a partir dos comentários de Edward Carr, pode-se afirmar que os relatos épicos dos poemas homéricos são a única forma adequada de se construir historicamente aquele período, e, juntamente com os registros míticos, a única referência possível ao mundo heróico, porque é somente esta a fonte que chegou ao 21 Ibid., p. 97-96. 22 Ibid., p. 118. 23 Ibid., p. 36. 24 Ver : FLORY, Alexandre Villibor. A literatura como espaço para a historiografia e para o debate sobre criação identitária: algumas anotações sobre a Áustria. Disponível em: http://www.pph.uem.br/cih/anais/trabalhos/488.pdf. Acesso em: 26 mar. 2010.

historiador, seja ele Heródoto ou Jaeger. A história dos períodos antigos, grego e medieval, é marcada tanto pela preservação de poucas fontes e registros, quanto pela autoria destas abordagens. Em outras palavras, a seleção destes fatos históricos foi delimitada muito mais pelos limites que permitiam as fontes do que pela escolha de abordagem do historiador. As fontes que restaram do mundo heróico constituem todo o horizonte do que é permitido conhecer e construir daquele momento. A predeterminação e pré-seleção dos registros arcaicos e antigos reduzem drasticamente o trabalho de distinção de fatos da história em relação a fatos manejáveis do passado. Além de serem poucos, os registros históricos foram formulados a partir de compreensões de vida e de mundo próprios e particulares do autor-historiador e da época em que se encontrava. Pode ser o caso dos poemas homéricos, que são relatos históricos de um período não compartilhado por Homero, mas imediatamente anterior. Assim, as contribuições trazidas pela história das mentalidades corroeram a pretensão de imparcialidade que a historiografia tradicional preservada com relação à imparcialidade do historiador perante seu objeto de estudo. Historiador e fato histórico se confundem na medida de constroem-se dentro de uma relação dialética. O historiador, por mais integrado dos debates mais antigos e mais recentes de seu objeto de estudo, só possui uma única perspectiva na qual partirá seu trabalho. O presente. Na medida em que o historiador interpreta seus estudos deixa sua própria marca no produto de sua atividade. Sua interpretação depende tanto da sua visão sobre o presente quanto de sua compreensão a respeito da natureza de sua própria atividade. Isso é bem destacado nos trabalhos historiográficos conforme adentram nas névoas do passado mais distante. E o horizonte entre interpretação subjetiva, criatividade e análise objetiva é ainda mais polêmico e perceptível quando nos estudos historiográficos constituídos com base nos produtos literários. 3 RELAÇÕES ENTRE HISTÓRIA E TRAGÉDIA O potencial hermenêutico da Tragédia: O gênero trágico de sucesso é capaz de manter conexão com seus expectadores. Eles identificam-se com as personagens, com a narrativa e com os conflitos apresentados. Estabelecer essa proximidade é essencial para a transmissão da mensagem trágica. A tragédia por sua vez, é arte de imitação. Conforme Aristóteles, ela traz os elementos presentes na realidade que descreve. Ainda que na tragédia a imitação dá-se a partir da exaltação virtuosa

do homem, para além do que se percebe na audiência. Mas personagens trágicas não se apresentam para imitar homens, e sim para apresentar uma ação completa. A trama dos fatos é a mensagem da tragédia, construída a partir da ação e do mito, e as personagens apresentamse de acordo com o que precisam para demonstrar a trama. A tragédia também traz como elemento seu pensamento. O pensamento trágico consiste em dizer, na linguagem do cidadão e do orador, aquilo que pode ser dito regulado a partir da política e da oratória. O contexto da apresentação, seja ético ou político, pode ser vislumbrado a partir da compreensão da mensagem que direciona à platéia. Assim, compreende-se mensagem e público a partir de uma hermenêutica dialética. O pano de fundo no qual a tragédia é tecida faz parte da cultura e tradição da platéia. Isso é especialmente verificável no contexto grego, cuja fonte do trágico foi o mito e o épico. O enredo é sempre constituído de histórias do conhecimento comum, as verdades do passado, históricas ou mitológicas. Werner Jaeger destaca a percepção das lendas tradicionais através das mais íntimas convicções da atualidade 25. O mito tem sentido atemporal, está no passado, mas também no futuro, graças a uma compreensão cíclica de tempo. A tragédia, a seus contemporâneos, nunca era considerada apenas em seu aspecto artístico, mas também como expressão do próprio espírito da comunidade 26 a que destina sua encenação. Os mitos do mundo antigo não constituem per si um indício histórico confiável. No entanto as narrativas míticas são a memória histórica dos povos clássicos e a compreensão dessas sociedades passa pela compreensão de seu passado heróico desaparecido. Constituem fundamento ético para as sociedades posteriores, ainda que derivadas de uma ordem parcialmente superada 27. A tragédia é carrega os valores éticos de sua sociedade. A principal característica do herói trágico é a presença exagerada de virtudes a ponto de personificá-las em uma caracterização máxima, engrandecida forma a direcionar o herói ao seu destino trágico. Em outras palavras, o destino do herói trágico só é possível na medida em que seus atos são guiados pelo excesso de virtudes. Tais virtudes serão aquelas valorizadas como tal pelo público, que ao reconhecê-las, acompanharão a peripécia, o reconhecimento e a catarse da narrativa e do herói, que culmina com sua morte ou loucura. A peripécia está nas ações que levam ao destino trágico do herói, causados por sua própria grandeza. Assim, dá-se a catástrofe, resultante dos acontecimentos da narrativa e das ações, em parte moira e em parte 25 JAEGER, Werner. Paidéia: a formação do homem grego. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 298 26 Ibid., p. 297. 27 Ver mais detalhes a respeito em MacIntyre, Depois da Virtude.

ate 28. O reconhecimento é o momento em que o herói transita do estado de ignorância para o estado de conhecimento e compreensão. Ele percebe e reconhece a culpa dos eventos em seus próprios atos e em seu destino. A peripécia e o reconhecimento suscitam piedade pelo que passou e terror pelo porvir. A partir da compreensão dos acontecimentos, chega-se à aceitação. O herói trágico é capaz de libertar-se na medida em que cumpre seu destino. Ganha domínio dos fatos e de sua vida quando os compreende e aceita. Este é o momento da catarse vivida pelo herói e seu público no desfecho trágico. O trágico traz a sombra os conflitos sócio-culturais de sua própria época. Os expectadores identificam-se não somente com as personagens, mas também com a mensagem trazida ao palco. Os embates apresentados são um reflexo tanto do cotidiano quanto dos debates éticos e políticos. MacIntyre, no Depois da Virtude, exemplifica esta situação a partir de uma análise da tragédia Filocteto, de Sófocles. Nela narra-se o conflito entre Odisseu e Neoptólemo, enviados à ilha de Lemnos para conquistar o arco mágico de Filocteto. Segundo uma profecia, este arco é a única arma capaz de levar os gregos à vitória sobre Tróia. Porém durante a narrativa trágica, Sófocles coloca Neoptolémo em um embate: deve levar o arco junto com Odisseu, ainda que o tenham conquistado por meio do ardil, ou deve devolvê-lo ao verdadeiro dono, Filocteto, cuja posse do arco conquistara por merecimento? A tragédia Filocteto dialoga diretamente com o contexto político de Atenas. A personagem de Filocteto, por exemplo, foi abandonado em uma ilha deserta pelos gregos. A mesma condição de exílio que Atenas havia condenado algumas cidades-estado que a enfrentaram durante o governo de Péricles e seus sucessores. Aliados sem os quais, no período de exposição da tragédia, Atenas não seria capaz de vencer a guerra contra Esparta. Por outro lado, Filocteto também apresenta um debate ético ateniense. Odisseu representa virtudes que caracterizam um bom cidadão, que trará os bens de eficácia (o arco) e o êxito à sua pólis, independente das ações que precise tomar perante os outros (não cidadãos). Neoptolémo, ao reconhecer em Filocteto o merecimento da posse do arco, compreende outra perspectiva do que seja a prática devida e virtuosa. O bem do cidadão e de sua cidade-estado deve ser construído conforme os critérios de merecimento. É justo para Odisseu que sua missão seja cumprida, e o arco leve a vitória à Grécia. Por outro lado, é justo para Neoptolémo que o arco permaneça com Filocteto, ainda que ele opte por não ajudar os gregos no combate. Este conflito ético diferencia dois sentidos de dike 29 e concepções rivais 28 Moira entendida como o destino constituído a partir do elemento divino e inevitável, e ate entendida como o destino causado pela própria ação humana. 29 Justiça, cuja virtude correspondente é dikaiosyne.

da virtude de ser dikaion (ser justo). Ambas as posições presentes no contexto ético ateniense dos séculos IV e V a.c. 30 Humphrey Kitto defende que a arte trágica não é intertemporal. Toda obra ao ser interpretada corre o risco de trazer não sua mensagem (ou não somente), mas os pré-conceitos do intérprete. Já não se deve cair no erro de considerar sua contemporaneidade como universal ao ler uma tragédia. Para que tenha uma compreensão abrangente da obra o crítico deve apreender determinadas informações sobre seu pano de fundo. O estudo dos pressupostos e crenças contemporâneos da tragédia permite o aprofundamento de sua grandeza 31. Portanto, a atividade interpretativa, seja do crítico ou do historiador-literário, depende de seu acervo conceitual e teórico da própria sociedade que pretende analisar a partir da obra literária. Com isso destaca-se que a atividade hermenêutica não parte somente da tragédia. A obra deve ser observada em harmonia com o que se pode saber de seu contexto, a partir de outras fontes históricas e teóricas. Dessa forma, a construção historiográfica a partir da abordagem hermenêutica da obra trágica permite identificar, para além do contexto hermético da narrativa, traços da mentalidade de seu contexto. O historiador será capaz de trazer à luz os elementos temporais característicos daquela sociedade, para a qual a obra trágica dirige-se. Uma Interpretação das tragédias: Orestéia e Hamlet. Tanto na Orestéia quando em Hamlet há um conflito de justiça e vingança. Suas semelhanças justificam a abordagem comparativa, mas são suas diferenças que torna a contraposição mais interessante. Ambas as narrativas relatam a história do assassinato do rei e o dever vingança do filho. Tal dever é apresentado como a manutenção da ordem estabelecida e o cumprimento de justiça para com a comunidade e o morto. A partir disso o enredo desenrola conflitos a respeito do destino pessoal dos heróis trágicos e do ethos tradicional estabelecido. Porém o desenvolvimento de cada tragédia segue por contextos bem diferentes. A Orestéia narra um sentido de justiça a partir do conflito entre destino e salvação inserido num embate de ordens e leis divinas distintas. Enquanto Hamlet reflete a busca de um sentido de justiça a partir do conflito entre destino e livre arbítrio, em meio a questionamentos da ordem estabelecida pelo costume e da tradição. 30 Ver: MACINTYRE, Alasdair. Depois da Virtude. Bauru/SP: EDUSC, 2001. 31 Ver: KITTO, H. D. F. Tragédia Grega. Estudo Literário 3. ed. Coimbra: Arménio Amado, 1972.

No período arcaico há a compreensão de que todo o universo segue as proposições de uma ordem coerente. Esta ordem é mantida pelas leis da themis, ou as leis de origem divina. Dentre estas leis encontra-se a dike, a obrigação de justiça. A dike, por sua vez, era acompanhada de noções de retribuição dos danos e de merecimento. Vige algo semelhante à regra do talião, as práticas de justiça são relegadas ao âmbito da vingança, aqui compreendida como justiça praticada pelas mãos da família ou do amigo. A sociedade arcaica, mesmo quando apresentava grandes proporções, regia-se pelas regras de filiação. Assim, era dever individual a execução da cobrança ou do ato de justiça. Neste contexto, não há qualquer sentido de estado constituído que concentre as demandas de justiça. Elas são responsabilidade do particular, como se dirá posteriormente. A compreensão da mentalidade clássica perpassa pela compreensão de seu período arcaico. A tragédia de Ésquilo foi apresentada à Atenas do século V a.c., que por sua vez, é herdeira da tradição mítica e homérica. O público da Orestéia conhece o contexto que lhe está sendo apresentado. Ou melhor, os contextos. Na evolução das três peças que formam a tragédia, Agamêmnon, Coéforas e Eumênides, pode-se interpretar uma transição de duas ordens divinas distintas. Cada qual com uma compreensão própria da lei da dike. Toda a apresentação de Agamêmnon é o reflexo da ordem divina arcaica. Nela justiça revela-se como retribuição da violência. Toda a trama desenvolve-se nestes termos, até seu próprio colapso, que culmina com o colapso de todo o sistema colocado para a dike. Segundo Kitto, a mensagem em Agamêmnon é clara quando se estabelece a relação harmônica entre todas as histórias trazidas por Ésquilo. O enredo traz diversos mitos em conjunto: a maldição da Casa de Atreu, Ifigênia, a Guerra de Tróia e Cassandra. A unidade de todos os mitos culmina com o duplo assassinato cometido por Clitemnestra. A presença de várias histórias na mesma narrativa, contadas fora de sua ordem cronológica, não é despropositada. O desenvolvimento da peça pode ser comparado à formação de um cerco de causas e conseqüências, que se fecha contra Agamêmnon. A tragédia constrói-se na medida em que relata os fatos a partir da culpa dos agentes. É assim com Páris, que sucumbe à hybris; com Tróia, que recebe a princesa estrangeira; com Helena, que foge de seu povo; com o naufrágio das hostes gregas, que haviam destruído os templos troianos; e com Cassandra, que negou seu dom profético e submeteu-se à escravidão. Ao mesmo tempo, a peça traz o relato das ações e dos crimes de Agamêmnon, subtendendo suas conseqüências. É a manifestação da lei da dike que prende o rei ao seu destino e à morte. Por outro lado Coéforas é pintada com outras cores. Orestes é destinado a cometer o matricídio e à perseguição das Eríneas. Mas não existe culpa em Orestes. Seu pecado é ser

virtuoso e nascer sob o destino de assassinar Clitemnestra. Ele é o inocente condenado à desgraça pela ordem cósmica. A ordem como se encontra não é mais capaz de trazer os ensinamentos de Zeus. Eumênides representa o fim dessa ordem. Sua narrativa pode ser dividida em duas partes, na primeira um conflito entre duas ordens divinas é bem determinado. Apolo, representando a nova ordem e os deuses do Olimpio, e as Eríneas, representando a ordem antiga e os deuses primordiais. Cada qual defende a vigência de uma dike. Na segunda parte, Atena é mediadora deste conflito. Como representante de Zeus ela entrega aos homens a decisão de qual ordem será vitoriosa e Areópago deve votar pela condenação ou salvação de Orestes. O final da Orestéia combina a delegação do cumprimento da dike aos homens organizados na pólis e às Eríneas, agora transformadas em Eumênides. Seu enredo é construído a partir dos conflitos de duas ordens distintas, incompatíveis entre si. A justiça compreendida como vingança individual e familiar é revelada como ciclo de violência indiscriminada. Disso demanda o estabelecimento de uma nova compreensão de dike, que só é possível a partir do estabelecimento de uma nova ordem. Nela a justiça estará ligada ao julgamento racional e refletivo, e somente a partir disso se estará cumprindo a dike. Nisto reside a mensagem de Ésquilo: deve-se prezar pela nova ordem divina estabelecida por Zeus, cumprindo-se com a justiça que foi delegada aos homens a partir de sua organização política. Este conflito de ordens representa o próprio conflito entre as noções de justiça. Na pólis ateniense deve-se respeitar a nova dike e temer as Eumênides. Essa perspectiva também desloca a virtude de preservar e praticar a dike para o âmbito da pólis. O homem só pode ser dikaion se estiver inserido na organização das cidades-estado. Em Hamlet o conflito acerca da justiça é diferente. Em seu contexto, não há a afirmação de ordens e leis conflitantes como na Orestéia. A tragédia de Ésquilo não tem dúvidas quanto ao significado de justiça; apresenta a dike em dois sentidos diferentes, mas bem determinados e coerentes de acordo com sua ordem correspondente. Já a narrativa de Shakespeare se constrói a partir da incerteza de qualquer sentido do que é o justo. A ordem estabelecida pela tradição já não corresponde com as demandas trazidas no enredo. Orestes aceita seu destino, cumpre a vingança e seu dever de justiça e é salvo pelo estabelecimento de um novo conjunto de leis divinas e uma ordem cósmica transformada. Hamlet encara o destino de vingar a morte do pai, percebe a incoerência da ordem estabelecida e é incapaz de agir sobre os acontecimentos. A ausência de respostas sobre o que é justiça leva à hesitação, à dúvida e à morte. Não há nova ordem e a única forma de aprendizado dos homens passa pela compreensão do que há de trágico em Hamlet.

Na narrativa, o príncipe Hamlet descobre sobre o assassinato por intermédio do fantasma de seu pai. O rei Hamlet fora morto envenenado pelo seu irmão, que se casa com a rainha e passa a governar a Dinamarca. O fantasma impõe a Hamlet a incumbência de agir pela sua honra e dignidade. O processo de instituição do dever de vingança não parte de uma decisão Hamlet, mas da demanda de seu pai e de uma tradição estabelecida. Várias partes do enredo colocam o príncipe contra seu destino, que no exercício do livre arbítrio decide por não cometer o matricídio. Todas as suas decisões são tomadas em meio ao questionamento da tradição. Hamlet se recusa a agir de acordo com as normas de conduta que a cultura lhe impõe, sem lhes conferir qualquer racionalidade. Escolhe buscar por si próprio a noção de justiça. A peça de Shakespeare possui um seqüencial de provocações mentais sobre os significados de quase todas as questões humanas: da vida, da morte, da eternidade, dos relacionamentos, da hipocrisia, da verdade e da existência de Deus. Hamlet debate a organização geral da sociedade. Na reflexão e no pensamento crítico implode a própria narrativa a justiça compreendida como vingança não pode mais ser pensada como mero dever, sem qualquer base racional construída e a partir do questionamento da tradição. Hamlet foi apresentado em torno do ano de 1600, em pleno Renascimento Inglês, mas antes do que ficou conhecido como a modernidade. Muito da tradição cristã ainda estava estabelecido, mas logo se estaria enfrentando a Reforma Protestante. É um claro período de transição, e Shakespeare foi capaz de retratar em sua peça as grandes reflexões que tomariam conta da sociedade, mas que já se formava na mentalidade daquele período. O herói trágico e o ethos tradicional: Apenas a figura isolada do herói trágico não é capaz de transmitir a mensagem da obra. A personagem e suas características têm sentido dentro do contexto narrativo, ela é o que precisa ser para que a tragédia seja compreendida. No entanto, como parte da peça e pedra angular de sua mensagem, o herói da tragédia vislumbra o todo narrativo em certos aspectos. Então, sem desviar-se da unidade narrativa, a análise particular do herói permite resultados interessantes e complementares à compreensão do todo da peça. Da mesma forma, é possível realizar um estudo comparativo entre tragédias ligado a partir das semelhanças e divergências de seus heróis. A primeira vista as principais diferenças entre Orestes e Hamlet passa pela aceitação ou não de seu destino. Orestes cumpre sua vingança sob o estandarte da dike, enquanto

Hamlet hesita por toda a narrativa ao refletir a própria noção de justiça. A partir da filosofia moral encontra-se outra distinção. Ambas as ordens retratadas na Orestéia compreendem a organização cósmica a partir de uma ordem harmônica. Orestes é virtuoso justamente por aceitar seu destino e cumprir o dever de preservar a dike e a ordem de Zeus. Qualquer valor, como a própria justiça, estará de acordo com esta ordem. As questões de justiça e de tratamento igual a todos estarão inseridas no âmbito ético daquilo que é bom para o cidadão e para toda a comunidade. Isso reflete uma sociedade cujo ethos compartilhado na tradição permite a padronização de valores e instituições. Este ethos responderá às demandas de motivos e orientações da ação da comunidade, ao passo que planificam normas de conduta e normas políticas. Todo bom cidadão tem o dever de justiça para com o outro, e a justiça está intimamente ligada à manutenção da comunidade. Uma justiça que deixou de pertencer ao âmbito privado e passou ao âmbito público da cidade. A pólis forma um laço que mantém a orientação comum mínima dos interesses dos cidadãos, e desloca para si a autoridade que antes era relegada à família e aos laços de parentesco. De outra forma, em Hamlet as respostas éticas não se fazem suficientes. Não basta para Hamlet um agir de acordo com o que é bom para si. A reflexão dos próprios valores éticos demonstra a incapacidade do ethos tradicional em responder às demandas de justiça. Cumprir a vingança como demanda de justiça não pode ser amparado por noções daquilo que se é ou pretende ser como indivíduo ou comunidade. A reflexão crítica sobre tradição estabelecida dá a Hamlet um potencial emancipatório de perceber questões de justiça a partir de contornos morais, daquilo que se pretende e se espera de todos. O exercício da virtude arcaica e antiga (como herdeira das sociedades heróicas) depende de uma estrutura social específica, enquanto a moralidade da mentalidade moderna amarra-se na pretensão de universalidade. Uma pretensão é requisitada na medida em que os conflitos éticos tornam a tradição e o ethos compartilhado cada vez mais incapaz de responder à demandas de justiça e direitos inerentes à condição humana. Shakespeare apresenta em sua tragédia uma personagem que contrapõe a atividade reflexiva de Hamlet. Laertes é colocado frente ao mesmo destino, porém toma como inquestionável seu dever de vingança. Ele age irracionalmente em prol da vingança contra Hamlet, ainda que as circunstâncias exijam que ele perceba a posição e as intenções do outro. Fica cego aos apelos racionais e aos argumentos morais. Seus atos, praticamente irracionais, revelam as incongruências da tradição quando confrontada com a necessidade de encarar o subjetivismo e o individualismo humano. Mas independente da mente crítica de Hamlet ou da

reprodução indiscriminada da tradição por parte de Laertes, o destino lhes apresenta inevitável. A morte de um é trazida pelas mãos do outro. 4 CONCLUSÃO Este trabalho pretendeu trazer um debate historiográfico da obra literária a partir das grandes mudanças que alteraram a forma de pensar a história e o trabalho do historiador. Mudanças trazidas pela Nova História, que têm o mérito de emergir as questões acerca da natureza da atividade historiográfica e repensar os seus métodos. Diz-se fazer e construir a história porquanto o historiador assume seu papel de interprete e deixa para trás a inocência da imparcialidade. Os estudos e as pesquisas da história foram enriquecidos pelo contato com as demais ciências sociais, e a história reafirma-se como disciplina na medida em que integra cada vez mais o campo de outros estudos. Pode-se dizer que o passado tornou-se um mistério ainda mais interessante. A própria noção de passado foi aos poucos reconstruída. E graças a abertura às pesquisas em novas fontes, a partir de novas demandas e questões, novos métodos e muitos autores, a história enriqueceu. A história das mentalidades, mais madura, mas ainda polêmica, abriu espaço para discussões literárias da história. Debates intensos são desenvolvidos a partir das grandes obras, dos textos mais antigos aos mais recentes. A tragédia clássica pode falar em sua linguagem cultural, ética e política, para além do discurso artístico, e abrir-se cada vez mais para fascinar as novas gerações. Na defesa de um potencial hermenêutico próprio do enredo trágico a partir de sua aproximação com o público e com do pano de fundo da sociedade em que foi projetada. Os traços mais sutis do pensamento do autor e de seus contemporâneos criam um mapa fascinante das sociedades, construído a partir da interpretação do historiador e sua conformidade com as outras fontes de conhecimento histórico. Estudar a tragédia, em qualquer de seus ângulos, é fazer falar a obra de arte que tem muito a dizer. O estudo comparativo das tragédias de Ésquilo e Shakespeare, de tempos tão diferentes e distantes, permite também a percepção de sua proximidade, na medida em que apresentam faces particulares daquilo que é humano. Mas o campo de debate sobre o método historiográfico ainda é amplo, e a própria disciplina da história ainda está afirmando suas bases em determinados campos. A história como ciência do estudo do passado, renova-se a cada geração, a partir da percepção do presente sobre os acontecimentos que lhe deram origem. E a cada novo estudo verificam-se

novas visões não apenas sobre as sociedades e os conflitos humanos, mas também do próprio homem. Independente do período que se destaque, o passado abre-se para emitir novas perspectivas a depender do ângulo que os novos historiadores trazem, seja com novas teorias ou a partir da releitura dos grandes filósofos, sociólogos e historiadores da tradição que se formou. O estudo do passado não é a via pela qual é permite-se ao tempo presente sua própria compreensão, um aprendizado construído naquilo que aqueles que nos antecederam nos deixaram de mais valioso, a continuação de suas vidas e de sua história. REFERÊNCIAS ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 2. Ed. Bauru/SP: Edipro, 2007. ARISTÓTELES. Os Pensadores: Ética a Nicômaco, Metafísica I e II, Poética. São Paulo: Abril S.A. Cultural, 1984. BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929 1989): a revolução francesa da historiografia. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1997. CARR, Edward Hallet. O que é história? Conferências George Macaulay Trevelyan proferidas por E. H. Carr na Universidade de Cambridge, janeiro-março de 1961. 3. ed. Linhares/RJ:Paz e Terra, 1982. ÉSQUILO, 525-455 a. C. Orestéia I: Agamêmnon. São Paulo: Iluminuras, 2004. v.1. ÉSQUILO, 525-455 a. C. Orestéia II: Coéforas. São Paulo: Iluminuras, 2004. v.2. ÉSQUILO, 525-455 a. C. Orestéia III: Eumênides. São Paulo: Iluminuras, 2004. v.3. FLORY, Alexandre Villibor. A literatura como espaço para a historiografia e para o debate sobre criação identitária: algumas anotações sobre a Áustria. Disponível em: http://www.pph.uem.br/cih/anais/trabalhos/488.pdf. Acesso em: 26 mar. 2010. JAEGER, Werner. Paidéia: a formação do homem grego. São Paulo: Martins Fontes, 2003. KITTO, H. D. F. Tragédia Grega. Estudo Literário (I Volume). 3. ed. Coimbra: Arménio Amado, 1972.

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