Medicamentos biológicos e biossimilares e suas normas regulatórias. Cartilha para pacientes

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Transcrição:

Medicamentos biológicos e biossimilares e suas normas regulatórias Cartilha para pacientes 1

SUPERVISÃO Antônio Britto Presidente-executivo COORDENAÇÃO-GERAL Octávio Nunes Diretor de Comunicação Selma Hirai Coordenadora de Comunicação Paula Lazarini Analista de Comunicação Tel.: (55 11) 5180 3476 paula.lazarini@interfarma.org.br PROJETO EDITORIAL Nebraska Composição Gráfica IMPRESSÃO Ativaonline Editora e Serviços Gráficos IMAGENS Banco de imagens Interfarma CONSULTORIA CIENTÍFICA Dr. Valdair Pinto CURTA, PARTICIPE E COMPARTILHE: www.facebook/inovacaoesaude www.twitter.com/inovacaoesaude www.youtube/inovacaoesaude 2013 SOBRE A INTERFARMA Interfarma Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa A Interfarma é uma entidade setorial, sem fins lucrativos, que representa empresas e pesquisadores nacionais ou estrangeiros responsáveis por promover e incentivar o desenvolvimento da indústria de pesquisa científica e tecnológica no Brasil voltada para a produção de insumos farmacêuticos, matérias-primas, medicamentos e produtos para a saúde. Fundada em 1990, a Interfarma possui atualmente 48 empresas associadas. Hoje, esses laboratórios são responsáveis pela venda, no canal farmácia, de 79% dos medicamentos de referência do mercado e também por 38% dos genéricos produzidos por empresas que passaram a ser controladas pelos laboratórios associados. Dentre seus principais objetivos, está o de disseminar o conceito de inovação como indutora do desenvolvimento econômico, buscando criar um ambiente seguro, estável e propício para os investimentos. Além disso, a Interfarma promove a interação e o estreitamento das relações com os diversos agentes, principalmente autoridades de saúde, para discutir temas de interesse do mercado, como pesquisa clínica, sistema regulatório, acesso e financiamento à saúde, biotecnologia, ética e informalidade. 2

APRESENTAÇÃO Os medicamentos biológicos, derivados da moderna biotecnologia, também chamados de biofármacos, tornaram-se recentemente a maior fonte de inovação da indústria de pesquisa e estão criando uma nova dinâmica no mercado farmacêutico global. Diante deste cenário, discutir sobre os aspectos científicos, regulatórios e econômicos destes produtos é imprescindível neste momento de transformação. Com relação aos efeitos econômicos, maiores investimentos serão necessários em decorrência da complexidade de produção e dos recursos tecnológicos a serem empregados. Diferentemente dos sintéticos, os medicamentos biológicos dependem de uma série de variáveis, a começar pela própria fase de pesquisa e desenvolvimento que eleva consideravelmente o insucesso nas fases iniciais dos estudos, aumentando os riscos dos investimentos. Entretanto, estima-se que os medicamentos biotecnológicos representem cerca de 20% do setor farmacêutico global, crescendo a uma velocidade cinco vezes maior que este mercado. Neste admirável mundo novo, os medicamentos biológicos são tidos hoje como um dos mais importantes avanços da ciência para a expansão de tratamentos para mais doenças e, assim, levar esperança e novas perspectivas, em outras palavras, a chance de cura para milhares de pessoas no Brasil e no mundo. Antônio Britto Presidente-Executivo 3

4

Nos últi timos 150 an os a ind ndús tria far arma cêutica contribuiu enormemente para o prog resso da Med edic icina, por mei o da des esco cobe rta e desenvol vime nto de medicamentos eficaze zes para inú númeras doenças. Antibióticos, medicamentos cardiovas- culares e psicofármacos são alguma s classes de produtos que foram modeladas, sintetizadas e desenvo volv idas de forma cada vez mais específica, eficaz e segur a. A partir da décadada de 1980, e com maior intensidade nos anos recentes, a plataforma tecnoló gica da indústria farmaca êutica de pesquisa apresentou uma inflexão importante com o adve nto dos medicamentos bioló gicos. A via sintética deu lugar à biologia molecular originando os modernos produtos de- rivados da tecnologi a do DNA recombinante. Esta tecnologia permite cortar ge nes, recombi bina nar pedaço s de diferentes fontes e transferir o material genético modificado par a a uma célu la hospedeira que passa a fabricar uma proteína para a qua l foi reprogra rama mada. Em 1982 o mund o conh ec eu o p rime meiro produto farmacêutico desenvolvido por me io desta tec ecno nolo logi a, a ins ulin ina huma na produzida em cultura da bactéria Es cherichi hia coli gene neti ca me nte modi fica da. Em 1985 esta mesma tecnolo- 5

gia produziu hormônio de crescimento humano e em 1986 foi desenvolvido primeiro produto biológico destinado a prevenir a rejeição de transplantes. Medicamentos biológicos ou biofármacos são medicamentos produzidos em sistemas vivos por meio de processos biotecnológicos. São em geral proteínas, moléculas grandes, de alta complexidade e fundamentalmente diferentes dos medicamentos tradicionais chamados de sintéticos, muito menores e mais simples. A classe dos medicamentos biológicos assumiu nas últimas duas décadas uma grande importância no tratamento de inúmeras doenças, algumas delas inabordáveis pelos medicamentos sintéticos tradicionais. Atualmente é possível produzir medicamentos biológicos altamente específicos e dirigidos a qualquer alvo molecular, como marcadores de células las cancerosas, 6

substâncias endógenas, enzimas e receptores. Os chamados anticorpos monoclonais funcionam como mísseis teleguiados que localizam a substância contra a qual foram produzidos de forma muito precisa e específica. Assim, podem marcar ou destruir células tumorais, inativar enzimas, estimular ou silenciar receptores, ligar ou desligar funções fisiológicas e interromper processos patológicos. Estes produtos passaram a oferecer soluções inovadoras para muitas patologias até então não tratadas pelas terapêuticas tradicionais. Diversas formas de câncer, doenças autoimunes, rejeição de transplantes, fenômenos tromboembólicos estão entre as condições médicas onde importantes revoluções terapêuticas ocorreram. 7

Câncer de mama, câncer colorretal, algumas formas de leucemia, artrite reumatóide, esclerose múltipla, psoríase, diabetes, hepatites, infarto e derrames estão entre as doenças atualmente tratáveis de forma eficiente por meio dos medicamentos biológicos. Estes medicamentos constituem uma classe heterogênea de produtos, mas têm como principal característica em comum, a complexidade. Os medicamentos sintéticos tradicionais são moléculas pequenas, bem conhecidas, sintetizadas a partir de precursores bem definidos e por isso facilmente reprodutíveis. Os biológicos, ao contrário, são moléculas grandes, complexas, com milhares de átomos, em alguns casos com estrutura apenas parcialmente conhecida e por consequência dificilmente reprodutíveis. Os medicamentos sintéticos podem ser produzidos com um grau de pureza quase absoluto, enquanto que os biológicos sendo produzidos por sistema vivos, a partir de insumos variáveis, estão sujeitos ao que se chama de microheterogeneidade. Esta variabilidade é muito dependente do processo produtivo, significando que pequenas modificações destes processos podem produzir alterações no produto, muitas vezes com consequências clínicas relevantes. Por esta razão os medicamentos biológicos são referidos pelo paradigma o processo é o produto para indicar a importância do processo de manufatura na definição da identidade e qualidade do produto final. 8

Os biossimilares O conceito de genéricos não se aplica aos medicamentos biológicos pela razão fundamental de que estes produtos não podem ser replicados de forma idêntica. A grande dependência dos processos de fabricação faz com que cópias legais dos medicamentos biológicos sejam sempre diferentes dos produtos originais e tais diferenças podem ter repercussão na eficácia e segurança do produto. Os produtos tradicionais sintéticos geralmente são protegidos por uma única patente, a da substância ativa. Os produtos biológicos são objeto de múltiplas patentes cobrindo não somente a substância ativa, mas também os vários processos envolvidos na produção. São patenteáveis, por exemplo, as células geneticamente modificadas, os métodos utilizados na purificação e formulação etc. Muitos elementos do processo de produção permanecem indisponíveis mesmo após o vencimento da patente do medicamento biológico. O produtor da cópia legal necessita desenvolver outras técnicas e procedimentos o que certamente terão impacto no produto final, tornando-o sempre diferente do produto original. Para indicar que os medicamentos biológicos desenvolvidos em semelhança a um produto original não são idênticos, são referidos como biossimilares e esta biossimilaridade necessita ser demonstrada por estudos que evolvem comparações com o produto original quanto à qualidade, eficácia e segurança. 9

Normas regulatórias internacionais É consenso de praticamente todas as autoridades regulatórias dos diversos países que as regras para aprovação de genéricos não são aplicáveis aos produtos biológicos. Tecnicamente, biossimilares são cópias autorizadas dos medicamentos biológicos que passaram pelo exercício de comparabilidade quanto à qualidade, segurança e eficácia clínica. O advento dos biossimilares é um fator de redução de custos, mas também uma preocupação médica e regulatória quanto a segurança dos pacientes. Nos últimos anos, as autoridades regulatórias dos diversos países desenvolveram ou revisaram suas normas para aprovação dos biossimilares. Pioneira neste processo foi a agencia da Comunidade Europeia (EMA European Medicine Agency) que cunhou o termo biossimilar e, desde 2005, vem estabelecendo normas e princípios científicos para a avaliação destes produtos. Com base nos mesmos fundamentos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou em 2009 suas recomendações para o escrutínio regulatório dos produtos biossimilares. 10

Segundo a OMS, os elementos básicos para a aprovação dos biossimilares são o exercício da comparabilidade quanto à qualidade e parâmetros pré-clínicos e clínicos, uma eficiente supervisão quanto a riscos potenciais, avaliação dos possíveis efeitos imunogênicos e estudos clínicos com metodologia própria para conferir sensibilidade em detectar diferenças. Ressalta-se também que produtos eventualmente autorizados sem uma completa comparação com produto de referência não podem ser denominados de biossimilares. São cópias cujas diferenças em relação ao original são desconhecidas. Nos Estados Unidos, a denominação biossimilar também passou a ser adotada a partir da nova lei aprovada em 2010 e a agência regulatória americana (FDA) também passou publicar suas recomendações para a aprovação dos biossimilares. Em geral as grandes agências e a OMS compartilham os mesmos princípios, ou seja: o conceito de genérico não é aplicável aos biológicos e as cópias destes produtos somente devem ser autorizadas a mediante o exercício de comparabilidade. 11

Princípios-chave das diretrizes da OMS 1 A demonstração de biossimilaridade é feita por meio do exercício de comparabilidade de forma escalonada e iniciando pelos aspectos de qualidade (detalhes de manufatura, identidade molecular, impurezas, estabilidade, etc.). A similaridade em termos de qualidade é pré-requisito para a redução dos requerimentos préclínicos e clínicos. 2 A base para aprovação do produto é a demonstração de similaridade em termos de qualidade e parâmetros préclínicos e clínicos. 3Se diferenças relevantes são encontradas em qualquer das etapas, o produto pode não ser qualificado como biossimilar. Poderá ser considerado para registro, mas deverá ser suportado por um conjunto não-reduzido de dados e não será considerado biossimilar. 12

4Produtos eventualmente aprovados sem o exercício de comparabilidade não deverão ser referidos como biossimilares. 6Assim como outros produtos biológicos, os biossimilares requerem uma eficiente supervisão regulatória para o gerenciamento de riscos potenciais. 5Os biossimilares não são medicamentos genéricos, dos quais diferem em muitos aspectos quanto ao processo de aprovação regulatória. 13

As normas brasileiras No Brasil, as normas vigentes para estes produtos são também recentes e publicadas como uma Resolução da ANVISA de dezembro de 2010. Note-se que na Europa e nos Estados Unidos as determinações regulatórias nesta área foram precedidas por bases legais aprovadas no Parlamento Europeu e no Con- 14

gresso Americano. De qualquer forma, a Resolução 55 da ANVISA está orientada pelas recomendações da OMS, mas com algumas inovações que têm sido motivo de confusões e algumas críticas. A primeira refere-se à nomenclatura, para a ANVISA os produtos biológicos são classificados em produtos biológicos novos (isto é, os já existentes, inovadores ou de referência) e as cópias legais destes que são chamados de produtos biológicos. Assim, a expressão produto biológico (sem qualificativo) pode significar toda a classe ou somente as cópias, ficando a desambiguação a critério do contexto. A decisão de não adotar o termo biossimilar, denominação internacional e também já assimilada no mundo acadêmico, aparentemente deveu-se ao fato de que a ANVISA não considera a biossimilaridade como pré-condição para autorização de uma cópia de produto biológico. Cópias não-biossimilares podem, sob certas circunstâncias, serem autorizadas e, para isto, foi criada uma via regulatória para aprovação independente do exercício de comparabilidade, chamada na Resolução da ANVISA de via de desenvolvimento individual. No Brasil existem no mercado varias cópias de produtos biológicos que foram autorizadas antes da Resolução de 2010 e que não passaram por critérios científicos de comparabilidade. Para estes produtos, não são conhecidas as diferenças em relação aos produtos de referência nem o impacto clínico destas diferenças. 15

O problema da intercambialidade A intercambiabilidade entende-se a situação onde dois produtos farmacêuticos podem ser permutados um pelo outro sem risco significativo para a eficácia e segurança do tratamento. A substituição é dita automática quando está autorizada a troca de um produto por outro, mesmo sem a autorização explícita do médico prescritor. A substituição é legalmente aceitável somente quando os produtos são intercambiáveis. Estas práticas constituem tema de grande controvérsia e constante discussão. Considerações científicas, médicas e éticas são frequentemente confrontadas com as visões econômicas dos financiadores do sistema de saúde e, muitas vezes, as diferentes posições são conflituosas e, quase sempre, prevalecem os critérios econômicos. A formulação científica da questão é relativamente simples. Os genéricos e os produtos de referência têm substâncias ativas idênticas e quando fabricados corretamente são bioequivalentes e, por consequência, intercambiáveis. Os biossimilares e os produtos de referência são inegavelmente distintos, as diferenças podem ter impacto na eficácia e segurança e, portanto, não devem 16

ser intercambiáveis. A própria agência europeia (EMA) reconhece que as diferenças entre os produtos biológicos, inovador e biossimilar, são somente conhecidas em toda sua extensão, após uma maior exposição ao uso com a comercialização. Esta é principal razão da necessidade do mandatório plano de farmacovigilância. Além disso, a substituição ou alternância de um produto pelo outro torna a farmacovigilância mais difícil, uma vez que as relações de causalidade não podem ser estabelecidas de forma inequívoca. Este assunto foi recentemente revisto pelos reguladores nos EUA e a nova legislação aprovada naquele país, em 23 de março de 2010, define claramente este polêmico assunto. De forma exemplar e compatibilizando princípios científicos e objetivos econômicos, o Biosimilar Act como foi chamado o novo regulamento, cria o conceito de duas categorias de produtos: os biossimilares e os produtos biológicos intercambiáveis. Estes últimos correspondem a um subconjunto dos primeiros, com atributos adicionais e devem satisfazer a condição de produzir os mesmos efeitos clínicos que o produto de referência. Os riscos associados à segurança ou diminuição de eficácia, devido a alternância ou troca de tratamentos entre o biossimilar e referência, não são maiores que os riscos associados ao uso do produto de referência sem alternância ou troca. Desta forma, biossimilares podem ser aprovados para o uso sem a condição de intercambiabilidade e esta somente será endossada pelo FDA com a apresentação de dados adicionais. 17

Este assunto tem sido objeto de discussões entre médicos e associações médicas pois existem riscos reais para os pacientes. No Brasil, estes riscos podem ser maiores devido a existência de produtos aprovados sem o critério da biossimilaridade e pelo fato de que a intercambialidade, ou a substituição de um produto pelo outro, é prática corrente e independente da decisão médica. Material elaborado por Valdair Pinto, consultor em medicina farmacêutica; ex-professor de bioestatística da Faculdade de Medicina da Universidade do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG; exdiretor médico internacional da Pfizer Inc., Nova York, EUA. 18

Preparado para Interfarma, destinado à comunicação com pacientes Junho, 2013 19

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