Desenvolvimento e validação de um software para avaliação da maturidade óssea - EasyTW Gláucia Londero de Oliveira 1, Ana Maria Marques da Silva 2, Gustavo P. Noal 3, Carlos A. A. Schmitz 3, Paulo S. P Antunes 3, Leris S. B. Haeffner 3 1 Curso de Ciência da Computação, UFSM, 97105-900, Santa Maria, RS, Brasil 2 Faculdade de Física, PUCRS, 90619-900, Porto Alegre, RS, Brasil 3 Hospital Universitário de Santa Maria, UFSM, 97105-900, Santa Maria, RS, Brasil oliveira@inf.ufsm.br, anasilva@pucrs.br 1 Introdução A avaliação maturidade óssea é um importante tópico em pediatria, utilizada principalmente na análise de distúrbios do crescimento e no acompanhamento de tratamentos. Durante o crescimento normal, alguns ossos sofrem um processo de ossificação (transformação da cartilagem em osso) tornando-se visíveis na radiografia em diferentes idades cronológicas. Os estágios de ossificação de certos conjuntos de ossos, como a mão e pulso, podem determinar o grau de maturidade óssea do indivíduo (Tanner et al, 2000). Os métodos mais utilizados para avaliação da maturidade óssea são o Greulich-Pyle (GP) e o Tanner-Whitehouse (TW). Ambos utilizam a comparação visual entre a radiografia de mão-punho do paciente com imagens obtidas de crianças em vários estágios de desenvolvimento, contidas em um atlas impresso. O método GP é provavelmente o mais utilizado dentro da rotina clínica, devido à facilidade de aplicação. Neste método, a maturidade óssea depende da seqüência de ossificação, do grau de interação e da forma dos diferentes núcleos, avaliados de forma visual global. É um método de baixa precisão, não possuindo correlação com a idade cronológica e apresentando dificuldades no estabelecimento da maturidade óssea em virtude do assincronismo com que os núcleos epifisários aparecem, além da população de controle utilizada ter sido da década de 30(Greulich & Pyle, 1959). O método TW é considerado o mais preciso e mais reprodutível, quando utilizado por diferentes observadores. A avaliação é realizada através da avaliação visual de 20 ossos individualmente, de acordo com suas características de forma e textura. Cada osso recebe uma pontuação de acordo com seu estágio de desenvolvimento. O somatório das pontuações de todos os ossos é correlacionado com uma tabela de idades cronológicas, dependente de fatores raciais e nutricionais. Diversas ferramentas têm sido propostas para facilitar a avaliação da maturidade óssea dentro da rotina clínica. Alguns sistemas propõem a utilização de técnicas de inteligência artificial e processamento de imagens para avaliação da maturidade óssea (Cabello e Estrada, 1999; Tanner et al, 2000, Gibbons et al, 1994; Da Silva et al, 2000a; Pietka et al,1995). O aplicativo RUS Bone Age Utility, que acompanha a última versão impressa do atlas, realiza os cálculos necessários para a correlação dos somatórios das pontuações com a idade cronológica. Ele possui uma interface bastante simplificada e necessita do atlas para a avaliação dos ossos. Para utilizar o aplicativo, o médico deve realizar a avaliação visual, anotar as pontuações de cada osso e depois digitá-las na tabela do programa, que calcula a maturidade óssea correspondente. Em 2001, o Hospital Universitário de Santa Maria iniciou a construção de um atlas digital para estimativa da idade óssea com imagens de radiografia de mão e punho de crianças brasileiras (Da Silva et al, 2000b). A construção do atlas brasileiro, que prevê inicialmente a realização de cerca de 1400 imagens radiológicas da mão e punho esquerdos, está em fase de
aquisição das imagens. A necessidade de avaliar um grande número de imagens tornou imperativa a construção de uma ferramenta que tornasse a tarefa de cálculo da maturidade óssea pelo método TW menos árdua e tediosa. O software EasyTW foi desenvolvido para diminuir o tempo gasto na utilização do método TW e simplificar sua utilização na rotina clínica através da realização dos cálculos associados ao método e da disponibilização de ferramentas de processamento de imagens para auxiliar a avaliação. Este trabalho apresenta o desenvolvimento da interface, a descrição da ferramenta, um relato sobre a avaliação da interface e um estudo para verificação da validade da utilização do software EasyTW, quando comparado ao método tradicional. 2 Metodologia O desenvolvimento do EasyTW, realizado em Delphi 6.0, foi centrado no usuário (médico) e na tarefa que ele deveria desempenhar. Muitas das decisões de desenvolvimento da interface foram tomadas como reflexo das atitudes e opiniões do médico, que esteve presente durante todo o desenvolvimento da ferramenta. 2.1 Estrutura do EasyTW Para melhorar a eficiência do processo de avaliação, a ferramenta EasyTW foi desenvolvida concentrando a atenção do radiologista na classificação dos estágios de desenvolvimento dos ossos. Como pré-requisito básico, a ferramenta deveria contemplar todas as funcionalidades apresentadas no atlas impresso utilizado na avaliação, isto é, deveria conter, pelo menos, as imagens dos estágios de desenvolvimento dos ossos, as imagens-exemplo e os textos descritivos das características dos estágios de desenvolvimento. A interface foi dividida em sete regiões (Figura 1): espaço para visualização da imagem; botões de ação; imagem de referência; dicas de auxílio ao usuário; espaço para visualização dos estágios de desenvolvimento dos ossos; miniatura da radiografia em avaliação e ferramenta para escolha do método (TW-20, TW-RUS, ou TW-Carpo). Para facilitar o controle dos ossos em avaliação, uma imagem de referência foi idealizada como a metáfora de uma mão, onde as mudanças de tonalidade nos ossos assinalam aqueles que já foram analisados (branco), os ossos que ainda devem ser analisados (marrom) e o osso que está sendo avaliando no momento (vermelho). Outra facilidade desenvolvida para a utilização do programa foi a inclusão de dicas ou lembretes sobre a ação que deve ser realizada, em um espaço acima da imagem de referência, como forma de diminuir a carga cognitiva. Os lembretes exibidos também variam com a posição do cursor sobre a interface. O espaço disponível para visualização da radiografia na tela (553 X 593 pixels) é, normalmente, menor do que o número de pixels das imagens radiológicas (as imagens de teste possuem 1576 X 1976 pixels). Para solucionar o problema de visualização da imagem inteira e facilitar a localização dos ossos, existe uma miniatura da imagem no canto inferior direito da tela. A miniatura contida em uma área de 184 X 339 pixels é calculada automaticamente, ajustando qualquer tamanho de imagem a esta área. Ao se clicar nessa miniatura, a radiografia é reposicionada, facilitando a visualização da região de interesse. Para a estimativa da maturidade óssea, utilizando o método TW, é necessário analisar individualmente cada osso. Tal procedimento também é realizado na utilização do EasyTW, onde o médico seleciona o osso que será analisado e são apresentados desenhos dos estágios
referentes àquele osso, na parte inferior da tela. Cada osso no método possui uma seqüência de imagens associada que condizem com o estágio de desenvolvimento ósseo (A, B, C, D, E, F, G, H ou I). Ao se clicar em cada um dos estágios, é apresentada a descrição das características do estágio e imagens de exemplo da área de interesse, conforme consta no atlas impresso do método. Foram implementadas ferramentas de ajuste de contraste e brilho para realçar a visualização das imagens, que somente são habilitadas se uma imagem tiver sido carregada. Para melhorar a visualização da área de interesse, é possível ampliá-la 2, 4, 6 ou 8 vezes. O zoom é obtido clicando-se sobre qualquer ponto da imagem. Somente após a análise de todos os ossos, é possível calcular a estimativa da maturidade óssea. Se todos os vinte ossos foram avaliados, as três modalidades do TW são calculadas. Caso contrário, visualiza-se o resultado do método que possua todos os ossos avaliados. O resultado é apresentado em uma tela que contém as informações sobre o paciente e o avaliador, sendo possível visualizar as pontuações parciais e os estágios avaliados para cada osso (Figura 2). Radiografia Botões de Ação Método Dicas Miniatura da Radiografia Imagem de Referência Estágios de Desenvolvimento Figura 1: Estrutura da interface do EasyTW Figura 2: Resultado da avaliação 3 Avaliação da Interface Muitas vezes a avaliação é realizada em etapas finais do desenvolvimento, conduzindo a uma aprovação ou reprovação, mas a natureza cíclica do projeto de interfaces, no qual propostas são continuamente desenvolvidas, têm conduzido a avaliação para dentro do processo de desenvolvimento. No desenvolvimento da ferramenta apresentada, buscou-se manter a interface sobre constante avaliação, tentando identificar as dificuldades do usuário e maneiras de saná-las ou amenizá-las. Através de avaliações contínuas foram identificados problemas na interface e soluções foram sugeridas. As principais mudanças acrescidas ao EasyTW são: dicas para orientação do usuário para aumentar a comunicabilidade da ferramenta; a inclusão da imagem miniatura, com acesso à região de interesse através da ação do usuário de clicar; aumento da janela de zoom; incorporação dos estágios de desenvolvimento em uma posição fixa; inclusão de uma ferramenta para ajuste de brilho e contraste; disponibilização de um relatório da avaliação da maturação óssea para uso do médico; alé m da geração de uma arquivo oculto de monitoramento do sistema descrevendo as ações do usuário, permitindo uma análise posterior da usabilidade da ferramenta.
4 Validação dos Resultados Um estudo comparativo foi realizado para determinar a confiabilidade da ferramenta EasyTW em comparação com o método TW tradicional, utilizando o atlas impresso. Era necessário determinar se a utilização da ferramenta computacional influenciava no resultado do diagnóstico. Para o estudo foram utilizadas 20 imagens radiográficas de teste, de crianças do sexo masculinos e femininos, adquiridas com um equipamento de radiologia computadorizada Fuji (ACR-3), com 1576 X 1976 pixels, cujo tamanho do pixel é 150µm. Três médicos avaliaram todas as imagens separadamente, com o método TW-20, utilizando a ferramenta EasyTW e o método TW manual, com o atlas impresso. Para verificar as diferenças estatísticas nos resultados de maturidade óssea, foi utilizado o teste não paramétrico Kruskal-Wallis (Bunchaft & Kellner, 1999), utilizando o software Statistica 1. Com a aplicação do teste estatístico, comprovou-se que não houve diferença estatística entre os resultados da maturidade óssea quando o software EasyTW ou o método TW convencional era utilizado. 5 Conclusão Neste artigo foi apresentado o desenvolvimento e validação de uma ferramenta computacional - EasyTW - para estimativa da maturidade óssea através do método Tanner- Whitehouse, que inclui recursos de processamento de imagens digitais. A ferramenta EasyTW reproduz todas as características do método TW tradicional, com a visualização dos desenhos dos estágios de maturação dos ossos, a existência de um texto auxiliar com a descrição das características dos ossos e imagens-exemplo. Verificou-se que o uso da ferramenta computacional não altera o resultado do diagnóstico médico, diminuindo o tempo gasto nas avaliações. As etapas de desenvolvimento do sistema de apoio ao diagnóstico apresentado contaram com a participação do usuário médico durante todo ciclo de vida do projeto. As avaliações realizadas permitiram um aumento da comunicabilidade e maior facilidade de aprendizado e uso da ferramenta em sua forma final. Modificações estão previstas para a melhoria da ferramenta, tais como a compatibilidade do sistema como padrão DICOM de intercâmbio de imagens médicas e a melhoria da emissão de relatórios das avaliações. 6 Referências Bunchaft, E.; Kelnner, S. R. O. (1999). Estatística sem mistérios. Volume 4, Editora Vozes. Cabello, A. S.; Estrada, R. C. (1999). Automated system of bone maturity evaluation applied to the Tanner-Whitehouse 2 method, An. Esp. Pedriatr., Unidad de Endocrinologia Pediatrica, Hospital Universitario Reina Sofia, Faculd de Medicina, Córdoba. Da Silva A. M. M.; Olabarriaga, S. D.; Dietrich, C. A.; Schmitz, C. A. A. (2001a).On Determing A Signature for Skeletal Maturity, Proceedings of XIV Brazilian Symposium on Computer Graphics and Image Processing, p.246-251,ieee Computer Society, Los Alamitos, CA. Da Silva, A. M. M.; De Oliveira, G. L.; Schmitz C. A. A.; Haeffner, L. S. B.; Noal, G. P.; (2001b). Desenvolvimento de um atlas digital para a estimativa da idade óssea, In: 31a Jornada Paulista de Radiologia, abril de 2001,São Paulo, Brasil. Gibbons, R. D., Tanner, J. M. (1994). A computerized image analysis system for estimating Tanner- Whitehouse 2 bone age. Hormone Research, 42, 282-287. Greulich, W. W.; Pyle, S. I. (1959). Radiographic atlas of skeletal development of hand and wrist, First Edition, Stanford, California, Stanford University Press. 1 Statistica v.6, StaticSoft Inc. (http://www.statsoftinc.com).
Pietka E. (1995) Computer assisted bone age assessment based on features automatically extracted from a hand radiograph. Computerized Medical Imaging Graphics May, 19:3, 2519. Tanner, J.; Whitehouse, R.; Cameron, N.; Marshall, W. A.; Healy, M. J. R. and Goldstein, H. (2001). Assessment of Skeletal Maturity and Prediction of Adult Height, 3rd. ed., WB Saunders.