Atendimento de urgência frente ao traumatismo alvéolo dentário - relato de caso clínico



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Transcrição:

Relato de caso clínico PIVA F; POTTER IG; SARI GT; JUNIOR CAK; SOUZA FHC Atendimento de urgência frente ao traumatismo alvéolo dentário - relato de caso clínico Recebido em: jul/13 Aprovado em: set/13 Urgent care outside the tooth injuries - case report Fabiane Piva Mestrado em Odontopediatria - Professora adjunta do curso de Odontologia da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) - campus Cachoeira do Sul/RS Isabel Garcia Pötter Graduação em Odontologia pela Ulbra - campus Cachoeira do Sul/RS - Cirurgiã-Dentista. Gilberto Timm Sari Mestre em Odontopediatria - Professor adjunto do curso de Odontologia da Ulbra - campus Cachoeira do Sul/RS Celso Afonso Klein-Júnior Doutor em Ciências dos Materiais - Professor adjunto do curso de Odontologia da Ulbra - campus Cachoeira do Sul/RS Fábio Herrmann Coelho-de-Souza Doutor em Dentística - Professor adjunto do curso de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)/RS Termo de consentimento livre e esclarecido assinado pelo paciente e enviado à Revista Autor para correspondência: Fabiane Piva Rua Martinho Luterero, 301 Universitário - Cachoeira do Sul - RS 96501-595 Brasil fabipiva@ibest.com.br Resumo Os traumatismos dentários são situações de urgência odontológica que impõem ao profissional um atendimento rápido, porém minucioso. Apesar da agilidade no primeiro atendimento, na maioria das vezes é necessário o acompanhamento do paciente por um longo período. O objetivo deste trabalho é relatar o caso de um menino que compareceu ao atendimento de urgência da Clínica Infantil da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) - campus Cachoeira do Sul/RS - Brasil, com várias lesões decorrentes de uma queda de bicicleta. O paciente chegou 24 horas após o trauma com várias lacerações faciais que já haviam sido suturadas no hospital anteriormente. Os dentes envolvidos, o 11, 12, 13, 21, 22 e 23, apresentavam lesões de fratura coronária, subluxação e luxação extrusiva. Realizou-se uma radiografia da região e não se detectou fratura radicular ou da tábua óssea vestibular. No primeiro atendimento, optou-se pela confecção de uma contenção semirrígida mantida por três semanas, pois alguns dentes estavam com grande mobilidade. Desde o atendimento de urgência o paciente vem sendo acompanhado e tratado na Universidade. Podemos concluir que o tratamento de urgência é bastante complexo, uma boa anamnese, um bom exame clínico e exames complementares são indispensáveis na instituição de um plano de tratamento rápido e adequado. O prognóstico é muitas vezes duvidoso, podendo envolver várias especialidades odontológicas e se torna mais favorável quando o profissional tem conhecimento, agilidade no tratamento de urgência e faz o encaminhamento correto do paciente quando necessário. Descritores: traumatismos dentários; emergências; condutas terapêuticas Abstract Dental injuries are emergencies that require the dental professional a fast, but thorough. Despite the agility in primary care, most often it is necessary to monitor the patient for a long period. The objective of this study is to report the case of a boy who attended the emergency care of the Children s Clinic Lutheran University of Brazil (Ulbra) - campus Cachoeira do Sul/RS - Brazil, with multiple injuries resulting from a fall from a bike. The patient arrived 24 hours after the trauma with multiple facial lacerations that had been sutured to the hospital previously. The teeth involved, 11, 12, 13, 21, 22 and 23, had lesions of coronary fracture, extrusive luxation and subluxation. Was held radiography of the region was not detected root fracture or buccal bone plate. In the first visit, it was decided for the construction of a semi-rigid containment maintained for three weeks, because some teeth were highly mobile. From the urgent care the patient has been followed and treated at the University. We can conclude that emergency treatment is quite complex, a good clinical history, a good clinical examination and exams are essential in establishing a plan for prompt and appropriate treatment. The prognosis is often uncertain, may involve various dental specialties and becomes more favorable when the professional s knowledge, speed in emergency treatment and makes the correct routing of the patient when needed. Descriptors: tooth injuries; emergencies; therapeutics 224 Artigo 04 - Atendimento de urgência frente ao traumatismo alvéolo dentário - fluxo 838.indd 224 08/10/13 15:03

Odontopediatria Relevância Clínica Este relato de caso demonstra a complexidade da abordagem de um paciente com traumatismo alvéolo dentário e descreve detalhadamente o tratamento das diferentes injúrias sofridas pelo mesmo. Além disso, tem como objetivo orientar o clínico geral a realizar a primeira abordagem do paciente com traumatismo alvéolo dentário, relatar os diferentes tipos de traumatismos que podem estar associados num mesmo evento traumático e suas condutas clínicas além de enfatizar a importância do correto diagnóstico, tratamento e acompanhamento do caso ao longo do tempo. Introdução Traumas dentários são muito frequentes em adolescentes e adultos jovens, principalmente na faixa etária dos 10 aos 24 anos de idade, por decorrência de quedas, brigas, lutas, acidentes esportivos, automobilísticos e maus tratos. 1 O sexo masculino geralmente é mais afetado que o feminino e os fatores de risco comumente associados são: overjet aumentado, selamento labial incompetente, protrusão dos incisivos superiores e obesidade. 2 Em um estudo realizado para avaliar a prevalência do trauma dental em crianças de 12 a 15 anos de idade, foi possível observar que de um total de 183 dentes traumatizados, 89,9% foram incisivos centrais superiores. Apenas 10,9% das injúrias ocorreram nos dentes inferiores. 2 O traumatismo é considerado atualmente como um dos principais problemas de saúde bucal na população jovem, visto que sua incidência tem ultrapassado a de doenças como a cárie dental e doença periodontal. 2,1 As consequências físicas das injúrias aos tecidos envolvem os dentes, a porção alveolar e os tecidos moles adjacentes. 3 Classificam-se lesões traumáticas dentárias desde uma simples fratura em esmalte até a perda definitiva do elemento dentário. 4 Dentre os vários tipos de lesões, as fraturas de esmalte e dentina são os tipos mais comuns de fraturas coronárias na dentição permanente. 5 Nestes casos, o tratamento consiste em recobrir o esmalte e dentina com compósitos adesivos para evitar a penetração bacteriana quando não há exposição da polpa. Quando há contaminação e exposição pulpar, indica-se a pulpotomia ou endodontia do elemento dentário. 6 A luxação extrusiva, caracterizada pelo deslocamento parcial do dente para fora do seu alvéolo, é menos comum, porém, quando ocorre deve-se tentar o reposicionamento do elemento dentário e a confecção de uma contenção semirrígida por três semanas. 5 Tendo em vista a complexidade da abordagem do paciente que apresenta traumatismo alvéolo dentário, o presente relato de caso tem por objetivo mostrar uma conduta de urgência e proservação frente a um caso de traumatismo alvéolo dentário juntamente com uma terapêutica reabilitadora. Relato de caso Paciente S.A., 12 anos, gênero masculino, leucoderma, estudante, compareceu à urgência da Clínica Infantil da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) - campus Cachoeira do Sul - à procura de tratamento para as sequelas decorrentes de traumatismos alvéolo-dentário múltiplos, frutos de uma queda de bicicleta. O traumatismo havia ocorrido em ambiente contaminado há cerca de 24 horas antes da consulta na universidade. Os responsáveis pelo paciente relataram que imediatamente após o trauma o menino recebeu atendimento hospitalar, no qual foi submetido à antissepsia da região afetada, sutura de corte labial, prescrição de analgésico, antibiótico e radiografia póstero-anterior de face, não apresentando alterações nesta. Ao exame físico foi observado grande edema no lábio inferior e ferimentos já suturados no hospital (Figura 1). No exame clínico, foi observada fratura coronária de esmalte dentário nos elementos 13 e 23, fratura coronária de esmalte e dentina sem exposição pulpar e luxação lateral para palatino no elemento 12 com pequena mobilidade, fratura coronária de esmalte e subluxação no elemento 22 com pequena mobilidade, fratura coronária de esmalte e dentina sem exposição pulpar e luxação lateral para palatino no elemento 11 sem mobilidade, e fratura coronária de esmalte e dentina com exposição pulpar e luxação extrusiva no elemento 21 com grande mobilidade (Figura 2). No exame radiográfico, foi observado o espaço entre a raiz e a parede óssea alveolar, indicando o deslocamento parcial do dente para fora do seu alvéolo (Figura 3). Diante dos achados clínicos e radiográficos, optou-se como terapêutica emergencial a instalação de uma contenção semirrígida com fio de nylon 0,80 por 21 dias. Procedeu-se a anestesia local do elemento 21 prévia à reposição digital do dente a sua posição original no alvéolo (Figura 4), profilaxia prévia a instalação de contenção semirrígida, condicionamento ácido das superfícies vestibulares para colagem do fio de contenção (Figura 5) e adaptação do fio de nylon e colagem com porções de resina composta (Figura 6), reposição do dente estruído com pressão digital antes da polimerização da resina de fixação do fio, fixação final do fio de contenção e remoção de excessos e polimento das porções de resina composta utilizadas para a colagem (Figura 7). Duas semanas após a instalação da contenção, realizou-se o recobrimento da dentina exposta no elemento 11 com resina composta. Após o período estimado, 21 dias, removeu-se a contenção semirrígida. Prosseguiu-se com o acompanhamento do paciente e testes de vitalidade durante oito semanas após o trauma, no qual foi detectada resposta pulpar negativa no dente 21, sugerindo necrose pulpar. Após esta constatação, iniciou-se a endodontia. Posteriormente a conclusão do tratamento endodôntico (Figura 8), iniciou-se a terapêutica reabilitadora, moldou-se a arcada superior e inferior do paciente para confecção dos modelos de estudo e enceramento dos elementos 11 e 21. Confeccionou-se uma guia de silicone (silicona de adição) (Figura 9), e realizaram-se as restaurações através da técnica da guia de Silicona7(Figuras 10, 11, 12, 13). Após 30 dias, foi realizada uma consulta de controle do traumatismo e dos procedimentos realizados (Figura 14) e não foi diagnosticada nenhuma alteração, sendo agendada nova manutenção. 225 Artigo 04 - Atendimento de urgência frente ao traumatismo alvéolo dentário - fluxo 838.indd 225 08/10/13 15:03

PIVA F; POTTER IG; SARI GT; JUNIOR CAK; SOUZA FHC figura 1 Vista frontal do paciente 24 horas após o traumatismo figura 4 Anestesia na região de fundo de sulco ântero-superior para o reposicionamento do dente 21 e colagem da contenção semirrígida figura 2 Fotografia intrabucal dos traumatismos alvéolos dentários sofridos pelo paciente figura 5 Condicionamento ácido com ácido fosfórico a 37% figura 3 Imagem radiográfica do paciente 24 horas após o traumatismo figura 6 Procedimento de colagem da contenção 226 Artigo 04 - Atendimento de urgência frente ao traumatismo alvéolo dentário - fluxo 838.indd 226 08/10/13 15:03

Odontopediatria figura 7 Contenção semirrígida com fio de Nylon 0,80 e reposicionamento do dente 21 já realizados figura 10 Restauração do dente 11 realizada e anatomia do dente 21 sendo realizada figura 8 Exame radiográfico após a realização da endodontia do dente 21 figura 11 Restauração do dente 21 utilizando a técnica da silicona figura 9 Modelo de gesso com os dentes 11 e 21 reanatomizados e com a guia de silicona posicionada figura 12 Anatomia do dente 21 em processo de finalização e dente 11 pronto Artigo 04 - Atendimento de urgência frente ao traumatismo alvéolo dentário - fluxo 838.indd 227 227 08/10/13 15:03

PIVA F; POTTER IG; SARI GT; JUNIOR CAK; SOUZA FHC figura 13 Fotografia intrabucal após as restaurações realizadas figura 14 Vista frontal do paciente 30 dias após o traumatismo Discussão O traumatismo alvéolo dentário é uma situação de grande incidência nos consultórios dentários, principalmente dos odontopediatras. Muitas vezes acometendo não somente os dentes, mas também a face, mucosa bucal, osso alveolar e estruturas dento-alveolares relacionadas. 8 Além da dor, os traumas dentários acabam gerando estresse, medo e ansiedade nos pacientes e em todo o núcleo familiar. É necessário, antes de qualquer procedimento, acalmar os pais e o paciente para que se consiga chegar a um diagnóstico correto e partir para o tratamento de urgência, o mais rápido possível. Na luxação extrusiva, o dente está deslocado axialmente para fora do seu alvéolo e, com a mobilidade extremamente aumentada. Tanto o ligamento periodontal quanto o suprimento neurovascular da polpa são rompidos. Apenas as fibras gengivais palatais impedem que o dente seja avulsionado. Radiograficamente é possível de ser observado o espaço entre a raiz e a parede óssea alveolar. 5 O tratamento da extrusão dentária baseia-se no reposicionamento do dente, após, procede-se com contenção semirrígida com resina composta por três semanas, fato semelhante foi realizado no referido caso. 5 Nos casos em que ocorre fratura da tábua óssea com luxação/avulsão dos dentes envolvidos é necessária uma fixação rígida para um adequado reparo ósseo, os métodos mais utilizados são através de fios ortodônticos e barras de Erich. 9 A necrose pulpar é comumente esperada nos dentes que sofreram extrusão, aproximadamente 64%, já a reabsorção radicular é rara neste caso, apresenta-se mais frequente nas luxações laterias. 10 O prognóstico depende do correto posicionamento dental e do estágio de desenvolvimento radicular. 10 O ideal é realizar o controle clínico e radiográfico do paciente em 15, 30, 60 e 120 dias. 11 No entanto, sabe-se que o teste de sensibilidade efetuado logo após o traumatismo é questionado por não traduzir a real condição pulpar, uma vez que respostas negativas podem ser momentâneas devido ao comprometimento do suprimento sanguíneo por inflamação pulpar, pressão e tensão dos nervos apicais. 12, 13, 14 A real condição pulpar poderá ser determinada somete oito semanas após o trauma por meio de testes que identifiquem a vitalidade ou necrose da polpa. 15 No caso apresentado, o paciente foi submetido ao teste de sensibilidade pelo uso do frio aos 14, 21, 28 e 60 dias após o trauma, quando se manteve a resposta pulpar negativa no elemento 21, sugerindo necrose pulpar. Assim, a indicativa do melhor momento para o início do tratamento endodôntico foi após o segundo mês decorrido do trauma. Outro aspecto clínico que sugeriu a presença de necrose pulpar no dente 21 foi a leve modificação de sua coloração no exame clínico prévio após 60 dias, sugerindo tal alteração irreversível pulpar. Quanto às lesões mais comuns dos tecidos duros, as fraturas de esmalte e dentina em dentes permanentes são as mais prevalentes. Estas, geralmente, exigem um selamento ou restauração para retornar a forma anatômica do dente, a fim de evitar a penetração bacteriana e possível contaminação através dos túbulos dentinário. 6 Quando se consegue o fragmento dental, a colagem é a melhor escolha terapêutica, dependendo da boa adaptação do mesmo, uma vez que esse tratamento permite a restauração da anatomia original do dente, principalmente em pacientes jovens, pois possuem a anatomia dentária complexa e difícil de ser reproduzida, possibilitando a reabilitação da função e da estética. 13 Porém, quando o fragmento é perdido no trauma, procuramos soluções reabilitadoras o mais conservadora possível, fato que foi realizado neste caso, a restauração direta com resina composta através da técnica da guia de silicone. 7 Conclusão Os casos mais severos de traumatismo alvéolo dentário em pacientes infantis implicam em danos às estruturas dentárias e de suporte de difícil solução. O tratamento de urgência é bastante complexo, assim, uma boa anamnese, um exame clínico detalhado e a solicitação de exames complementares são de extrema importância na instituição de um plano de tratamento rápido e adequado. Também, deve-se levar em consideração que esta situação de urgência promove um abalo emocional bastante significativo, que envolve além do paciente atingido, todo o seu núcleo familiar. Nestas circunstâncias, a decisão imediata e correta está diretamente relacionada com o prognóstico do caso que muitas vezes é duvidoso, podendo envolver várias especialidades 228 Artigo 04 - Atendimento de urgência frente ao traumatismo alvéolo dentário - fluxo 838.indd 228 08/10/13 15:03

Odontopediatria odontológicas. Outro aspecto a ser considerado para o sucesso da abordagem do traumatismo é o conhecimento e agilidade do profissional para realizar o atendimento imediato e dar o suporte e manutenção do caso por um longo período de tempo. Neste caso, o paciente irá permanecer em acompanhamento para verificar periodicamente a vitalidade pulpar dos demais dentes envolvidos no traumatismo, encaminhar para uma intervenção ortodôntica e realizar novas reabilitações estéticas. Aplicação Clínica Este relato de caso pretende orientar o clínico geral na conduta inicial de casos de urgência decorrente de traumatismo alvéolo dentário complexos, além da abordagem dos diferentes tipos de lesões que podem estar associados em um mesmo evento traumático. Além disso, ressaltar a importância do correto diagnóstico, tratamento e acompanhamento do paciente ao longo do tempo. REFERÊNCIAS 1. Andersson L. Epidemiology of Traumatic Dental Injuries. Pediatr Dent 2013; 35(2):102-105. 2. Kumar A, Bansal V, Veeresha KL, Sogi GM. Prevalence of Traumatic Dental Injuries Among 12- to 15-year-old Schoolchildren in Ambala District, Haryana, India. Oral Health Prev Dent 2011;9(3):301-305. 3. Bücher K, Neumann C, Thiering E, Hickel R, Kühnisch J. Complications and survival rates of teeth after dental trauma over a 5-year period. Clin Oral Investig 2012;17(5):1311-8. 4. Sanabe ME, Cavalcante LB, Coldebella CR, Abreu-e-Lima FCB. Urgências em traumatismos dentários: classificação, características e procedimentos. Rev Paul Pediatr 2009; 27 (4):447-51. 5. Vasconcellos RJH, Marzola C, Genu PR. Trauma Dental: Aspectos Clínicos e Cirúrgicos. Revista de Odontologia da ATO 2006;6(12):774-796. 6. Andreasen JO, Lauridsen E, Andreasen FM. Contradictions in the treatment of traumatic dental injuries and ways to proceed in dental trauma research. Dent Traumatol 2010;26(1):16-22. 7. Coelho-de-Souza FH. Restaurações diretas em dentes anteriores com resina composta. In: Coelho-de-Souza FH. Tratamentos Clínicos Integrados em Odontologia. 1ª.ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2012:181-216. 8. Melo REVA, Vítor CMA, Silva MBL, LUN ALA, Firmo ACB. Traumatismo dentoalveolar. International Journal of Dentistry 2003;2(2):266-272. 9. Vieira EH, Gabrielli MAC, Rêgo RD, Ramos RQ. Fixação interna rígida em fratura alvéolo- -dentária na maxila. Rev Assoc Paul Cir Dent 1998;52(6):471-473. 10. Andreasen FM, Andreasen J.O. Diagnosis of luxation injuries: The importance of standardized clinical, radiographic and photographic techniques in clinical investigations. Endod Dent Traumatol 1985;1(5):160-169. 11. Kramer PF, Feldens CA. Traumatismo na dentição decídua: Prevenção, Diagnóstico e Tratamento. 1ª.ed. São Paulo: Santos; 2005. 12. Fountain SB, Camp JH. Traumatismo dentário. In: Cohen S, Burns RC. Caminhos da polpa. 6ª ed. Rio de Janeiro:Guanabara Koogan;1997:339-487. 13. Castro JCM, Poi WR, Manfrin TM, Zina LG. Analysis of the crown fractures and crown-root fractures due to dental trauma assisted by the Integrated Clinic 1992 to 2002. Dent Traumatol 2005;21(3):121-126. 14. Bhaskar SN, Rappaport HM. Dental Vitality test and pulp status. J Am Dent Assoc 1973;86(2):409-411. 15. Özçeliz B, Kuraner T, Kendir B, Asan E. Histopathological evaluation of the dental pulps in crown fractured teeth. J Endod 2000;26(5):271-273. 16. Rappelli G, Massaccesi C, Putignano A. Clinical procedures for the immediate reattachment of a tooth fragment. Dent Traumatol 2002;18(5):281-284. 17. Josgrilberg EB, Cordeiro RCL. Aspectos psicológicos do paciente infantil no atendimento de urgência. Odontologia Clín Científ 2005;4(1):13-18. 229 Artigo 04 - Atendimento de urgência frente ao traumatismo alvéolo dentário - fluxo 838.indd 229 08/10/13 15:03