Perfil dos pacientes e gastos com Psoríase e Artrite Psoriásica em Minas Gerais:

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Perfil dos pacientes e gastos com Psoríase e Artrite Psoriásica em Minas Gerais: 2010-2013 RESUMO Lívia Lovato Pires de Lemos 1 Juliana de Oliveira Costa 2 Alessandra Maciel Almeida 3 Felipe Ferre 4 Francisco de Assis Acurcio 5 Justificativa: A artrite psoriásica (AP) é uma espondiloartropatia que afeta articulações e ligamentos e está relacionada à psoríase, doença que acomete principalmente a pele. Desde 2002 o SUS fornece por meio do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF) acritretina e ciclosporina para psoríase. Em 2010, o metotrexato foi incorporado, e para AP, os medicamentos modificadores do curso da doença (MMDC) sintéticos e biológicos (adalimumabe, etanercepte e infliximabe). Não existia Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) para estas doenças no período de 2010 a 2013. Objetivos: Caracterizar o perfil dos usuários atendidos pelo CEAF e os gastos com medicamentos para psoríase e AP, em Minas Gerais. Metodologia: Coorte de usuários (março/2010 a fevereiro/2013) desenvolvida a partir do pareamento determinístico-probabilístico do banco de dados da APAC-SIA/SUS. Os pacientes foram acompanhados por no mínimo 12 meses. Os valores dos medicamentos foram obtidos em bancos de preços e atualizados para janeiro/2014. Os gastos foram apresentados por doença e tipo de medicamento no início do acompanhamento. Resultados: Foram atendidos 1.623 pacientes com psoríase e 218 pacientes com AP, sendo que 76 iniciaram o tratamento no CEAF com MMCD sintéticos e 142 com 1 Mestre. Programa de Pós Graduação em Medicamentos e Assistência Farmacêutica. Departamento de Farmácia Social, Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais. 2 Mestre. Centro Colaborador do SUS Avaliação de Tecnologias e Excelência em Saúde. Departamento de Farmácia Social, Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais. 3 Professora doutora. Departamento de Medicina Preventiva e Social. Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais. 4 Doutor. Programa de Pós Graduação em Medicamentos e Assistência Farmacêutica. Departamento de Farmácia Social, Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais. 5 Professor doutor. Programa de Pós Graduação em Medicamentos e Assistência Farmacêutica. Departamento de Farmácia Social, Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Minas Gerais.

biológicos. O gasto total foi de R$3.438.798,00, R$531.925,00 e R$6.481.738,00, respectivamente. A distribuição entre sexos foi próxima de 1:1 para ambas as doenças. 74,7% dos pacientes entraram na coorte no último ano. O medicamento sintético indicado como primeira linha de tratamento para ambas as doenças é o metotrexato, entretanto ele não foi o mais utilizado, indicando que os pacientes possam ter custeado o medicamento do próprio bolso, já que para psoríase não era fornecido em formulação oral e que ele apresentou preço até 16x inferior ao da leflunomida - o medicamento sintético mais utilizado por AP; e devido à longa duração do trâmite do CEAF. O biológico mais utilizados foi o etanercepte, enquanto que no Registro Brasileiro de Biológicos o mais utilizado foi o infliximabe. Supõe-se que o infliximabe tenha sido solicitado pelos pacientes como portadores de artrite reumatoide, já que este é liberado para essa doença desde 2002. O gasto total com pacientes com AP que iniciaram o tratamento no CEAF com anti-tnf foi 2,0x superior ao gasto com psoríase, sendo que sua população foi 7,4x menor, demonstrando o alto gasto com biológicos. Não houve diferença entre os biológicos quanto ao gasto médio total e por ano de seguimento. Houve queda de 43,4% no valor de aquisição de adalimumabe e de 31% para etanercepte e infliximabe durante o período avaliado. Conclusões: Os gastos com o tratamento foram elevados, especialmente com os biológicos para AP. Mais pacientes entraram na coorte em 2011 que em 2010, sugerindo aumento do acesso, de forma que mesmo com a diminuição dos preços, prevê-se aumento dos gastos com biológicos. Isso salienta a importância da adoção de estratégias para garantir o uso com qualidade dos medicamentos e racionalizar os gastos do SUS, dentre elas negociações com as indústrias, o estabelecimento de critérios mais rigorosos para o fornecimento de medicamentos e a divulgação entre os prescritores das evidências disponíveis. PALAVRAS-CHAVE: Sistema Único de Saúde; Psoríase; Artrite Psoriásica; Medicamentos Biológicos; Gastos INTRODUÇÃO

A psoríase é uma doença cíclica cuja principal manifestação é a inflamação crônica da pele caracterizada por placas eritematosas escamosas. A artrite psoriásica (AP) é uma doença do grupo das espondiloartropatias caracterizada pela associação com psoríase, artrite, e enrijecimento dos tendões e ligamentos (GOTTLIEB et al., 2008). A AP afeta de 0,3 a 1,0% da população mundial e até 30% dos indivíduos acometidos pela psoríase, doença que ocorre em 2,5% da população brasileira (GLADMAN et al., 2005; SBD, 2006). O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza desde 2002 acitretina e ciclosporina para o tratamento de psoríase (BRASIL, 2002). Em 2010 o elenco de medicamentos sintéticos para essa doença foi ampliado, e a AP foi contemplada, com medicamentos sintéticos e os medicamentos bloqueadores do fator de necrose tumoral (anti-tnf) adalimumabe, etanercepte e infliximabe. Todos esses medicamentos são fornecidos por meio do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF) (BRASIL, 2009). Nesse Componente a dispensação dos medicamentos ocorre mediante preenchimento eletrônico da Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade (APAC), com validade de três meses e gerada para fins de repasse (ACURCIO et al., 2009). Os gastos do Ministério da Saúde com medicamentos fornecidos pelo CEAF superaram a marca de R$1,4 bilhão em 2007 (CARIAS et al., 2011). Com relação à artrite reumatoide (AR), coorte histórica (2003 a 2006) revelou que o gasto com medicamentos correspondeu a 69% do gasto total com o tratamento da doença, e que o infliximabe, único anti-tnf fornecido à época, foi responsável por 70% dos gastos (COSTA et al., 2014). O alto custo com o tratamento de AR leva a supor que o custo envolvido no tratamento das demais doenças reumáticas também seja elevado. OBJETIVOS Para uma melhor compreensão da situação, é relevante determinar o número de usuários atendidos pelo CEAF por diagnóstico e por medicamento, bem como delinear a sua trajetória no SUS. Neste trabalho caracterizaram-se os gastos com medicamentos e o perfil dos usuários com artrite psoriásica e psoríase moderada à grave atendidos pelo Componente em Minas Gerais.

METODOLOGIA Trata-se de uma coorte histórica, no período de março de 2010 a fevereiro de 2013, com período de entrada de março de 2010 a fevereiro de 2012, abrangendo usuários do CEAF em Minas Gerais. A coorte foi desenvolvida a partir do banco de dados de Autorização de Procedimentos de Alta Complexidade do Sistema de Informação Ambulatorial (APAC/SIA-SUS), por meio da técnica de relacionamento determinísticoprobabilístico. Essa técnica é utilizada para combinar informações de indivíduos a partir de fontes variadas, nas quais os usuários podem não estar identificados de maneira unívoca (COELI E CAMARGO JR., 2002; ACURCIO et al., 2009). A data de entrada na coorte foi definida pela menor data entre o primeiro registro de cobrança da APAC e a data registrada do início de tratamento. Foram incluídos os pacientes que receberam um ou mais medicamentos para o tratamento da AP ou psoríase, com 18 anos de idade ou mais, diagnosticados com as doenças de acordo com a décima revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-10): Artropatia psoriásica interfalangiana distal (M07.0); outras artropatias psoriásicas (M07.3); psoríase vulgar (L40.0); psoríase pustulosa generalizada (L40.1); psoríase gutata (L40.4); e outras formas de psoríase (L40.8). A análise de gasto adotou a perspectiva do SUS. Os valores monetários de cada medicamento por mês foram obtidos de bancos de preços oficiais e ajustados para janeiro de 2014 por meio do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os gastos médios per capita foram calculados por meio da (i) soma dos gastos individuais; (ii) cálculo da média de gasto individual (gasto médio por dispensação); (iii) soma das médias individuais; e (iv) média do valor obtido no item (iii). Os resultados foram apresentados conforme a doença e o tratamento no início do acompanhamento (psoríase; AP MMDC sintéticos; AP anti-tnf). Os dados de variáveis demográficas e clínicas foram descritos segundo a distribuição de frequências. O gasto per capita foi descrito a partir de medidas de tendência central (média, desvio padrão, mediana). Como os gastos não apresentaram distribuição normal segundo o teste de Kolmogov-Smirnov, foi escolhido para comparação de médias o

teste não-paramétrico de Mann Whitney. O nível de significância adotado foi de 5%. Utilizou-se o software SPSS 17 para as análises estatísticas. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais, parecer ETIC 0069.0.203.000-11. RESULTADOS No período de março de 2010 a fevereiro de 2013 foram atendidos 1.623 pacientes com psoríase e 218 pacientes com artrite psoriásica, sendo que a maioria (74,7%) iniciou o tratamento no CEAF no segundo ano de entrada. Para ambas as doenças, 50% da população apresentava de 40 a 59 anos de idade. A proporção entre os sexos foi de 1 homem para cada 0,8 mulheres para psoríase, e 1:1,1 para AP. Para psoríase o diagnóstico mais frequente foi de psoríase vulgar, o medicamento mais utilizado foi a acitretina (Tabela 1). Vinte e um pacientes que iniciaram o tratamento como portadores de psoríase desenvolveram AP, dos quais 18 solicitaram anti-tnf. Para artrite psoriásica o diagnóstico mais comum foi de outras artropatias psoriásicas, sendo que a maioria (65,1%) dos pacientes iniciou o tratamento no CEAF com anti-tnf. Dentre eles, a maioria iniciou o tratamento com etanercepte. Dos pacientes que iniciaram o tratamento com MMCD sintético, a maioria iniciou com leflunomida (Tabela 1). Tabela 1. Características da coorte de usuários com psoríase e artrite psoriásica atendidos pelo Componente Especializado da Assistência Farmacêutica. Minas Gerais: março/2010 a fevereiro/2013 Psoríase Artrite Psoriásica Características (1.623) (218) n % n % Sexo F 711 43,8 114 52,3 M 912 56,2 104 47,7 Idade (anos) (média±dp) 50±15 49±14 Faixa etária (anos) 18-29 181 11,2 17 7,8 30-39 245 15,1 37 17,0 40-49 369 22,7 48 22,0 50-59 414 25,5 67 30,7 60-69 236 14,5 38 17,4 70-79 144 8,9 9 4,1 80 ou mais 34 2,1 2 0,9

Diagnóstico (CID-10*) Psoríase vulgar 1387 85,5 - - Psoríase pustulosa generalizada 81 5,0 - - Psoríase gutata 42 2,6 - - Outras formas de psoríase 113 7,0 - - Artropatia psoriásica interfalangiana distal - - 78 35,8 Outras artropatias psoriásicas - - 140 64,2 Medicamento à entrada Acitretina 1.523 93,8 - - Ciclosporina 86 5,3 3 1,4 Metotrexato 14 0,9 22 10,1 Leflunomida - - 46 21,1 Sulfassalazina - - 5 2,3 Adalimumabe - - 57 26,1 Etanercepte - - 68 31,2 Infliximabe - - 17 7,8 *Centro Colaborador da OMS para a Classificação de Doenças em Português. Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde - CID-10. Disponível em: <http://www.datasus.gov.br/cid10/v2008/cid10.htm>. Acessado em: 14 de novembro de 2013 DP: desvio-padrão O gasto total com medicamentos para os pacientes que iniciaram o tratamento no CEAF como portadores de psoríase foi de R$3.438.798,00, e o gasto com os pacientes com AP que iniciaram o tratamento no CEAF com MMDC sintéticos foi de R$531.925,00. O gasto médio mensal per capita foi crescente ao longo do período de acompanhamento, entretanto o aumento foi maior para AP. O gasto total com os pacientes que iniciaram o tratamento no CEAF com anti-tnf foi de R$6.481.738,00. Para adalimumabe e etanercepte o gasto médio mensal per capita foi decrescente. Para infliximabe a média do gasto aumentou ligeiramente do primeiro para o segundo ano de acompanhamento. Ao comparar os medicamentos, o gasto com infliximabe foi o maior no período como um todo e em cada ano de acompanhamento (p<0,001). Na comparação entre adalimumabe e etanercepte, o primeiro apresentou maior gasto por ano e total (p<0,05) (Tabela 2). Tabela 2. Distribuição dos gastos per capita mensal e total segundo ano de acompanhamento. Minas Gerais: março/2010 a fevereio/2013 Gasto (R$) Ano n Média DP Mediana Gasto total Psoríase 1 1.623 212,63 113,64 211,64 2.136.268,00

2 852 251,89 289,07 224,48 1.143.912,00 3 125 274,11 412,52 197,99 158.129,00 Todos 1.623 222,80 157,58 218,34 3.438.798,00 AP - sintéticos 1 76 378,62 662,98 190,84 220.280,00 2 45 705,59 1.060,94 176,60 275.721,00 3 9 1.134,92 1.157,26 296,21 35.901,00 Todos 76 440,82 736,53 186,61 531.925,00 AP - adalimumabe 1 57 3.410,96 698,17 3.356,42 1.812.938,00 2 44 2.575,27 420,59 2.549,41 818.717,00 3 13 2.040,55 704,50 2.180,57 110.598,00 Todos 57 3.076,32 545,79 3.123,12 2.742.274,00 AP - etanercepte 1 68 2.998,20 386,60 2.997,06 1.803.493,00 2 55 2.521,56 555,16 2.599,99 1.032.544,00 3 11 2.439,60 209,87 2.468,59 142.009,00 Todos 68 2.823,79 284,05 2.837,81 2.978.079,00 AP - infliximabe 1 17 3.569,87 275,92 3.627,63 447.692,00 2 15 3.589,58 327,61 3.691,49 269.083,00 3 2 3.185,78 746,38 3.185,78 44.600,00 Todos 17 3.535,76 245,80 3.598,93 761.385,00 AP: artrite psoriásica DISCUSSÃO E CONCLUSÃO Foram acompanhados 1.623 pacientes com psoríase e 218 pacientes com AP atendidos pelo CEAF. Para ambas as doenças a distribuição entre os sexos aproximou-se do esperado na literatura, sendo próximos de 1:1, assim como a idade para os pacientes com AP (GUDJONSSON E ELDER, 2007; GOLDENSTEIN-SCHAINBERG et al., 2012). Os pacientes de psoríase foram mais velhos que o esperado, já que os sintomas de psoríase geralmente surgem entre os 15 e 30 anos de idade, podendo ser detectados do nascimento até a oitava ou nona décadas de vida (GUDJONSSON E ELDER, 2007). No Registro Brasileiro de Biológicos o medicamento mais prescrito em 2009 foi o infliximabe (TITTON et al., 2011). Já no presente estudo, a maioria dos pacientes de AP utilizou etanercepte. Pode-se supor que pacientes com AP possam ter solicitado infliximabe à SES/MG, inadequadamente, na condição de portadores de AR, uma vez

que se estima que 25% dos pacientes com AP apresentem acometimento poliarticular semelhante à AR soronegativa (GOLDENSTEIN-SCHAINBERG et al., 2012) A European League Against Rheumatism recomenda o metotrexato como primeira linha de tratamento para a AP (GOSSEC et al., 2012). A Sociedade Brasileira de Dermatologia recomenda o metotrexato ou a acitretina para psoríase (TAKAHASHI et al., 2006). Nesse estudo observou-se maior uso de leflunomida e acitretina, em detrimento ao metotrexato. Para AP, o menor uso do metotrexato pode estar relacionado ao baixo preço desse medicamento, com custo inferior em até 16 vezes comparado a leflunomida. Além disso, em Minas Gerais a duração do trâmite do CEAF, da solicitação até o fornecimento do medicamento, pode ser de até 60 dias (SIGAF, 2014). Esses fatos sugerem que o metotrexato pode ter sido custeado pelos pacientes, desestimulados a buscar esse medicamento junto ao SUS. Para psoríase isso pode estar relacionado ao fato de que no período do estudo não estava disponível o metotrexato oral, apenas o injetável. Isso também pode explicar a idade dos pacientes com psoríase da coorte, superior a observada na literatura, indicando a possibilidade de os pacientes mais jovens terem utilizado metotrexato oral por custeio próprio. O fornecimento de medicamentos pelo CEAF demanda a abertura de um processo de solicitação que é avaliado conforme critérios de inclusão e exclusão dos PCDT. Durante o período do estudo não havia Protocolo Clínicos de Diretrizes Terapêutica (PCDT) para psoríase e para AP, de forma que a avaliação quanto ao fornecimento dos medicamentos se baseou na experiência dos profissionais avaliadores. Esse fato também pode ter contribuído para as diferenças observadas entre a população deste estudo e a literatura. O gasto total com pacientes com AP que utilizaram anti-tnf foi 2,0 vezes superior ao gasto com psoríase, sendo que sua população foi 7,4 vezes menor, evidenciando o alto gasto com medicamentos biológicos. Para os pacientes com AP que iniciaram o tratamento no CEAF com anti-tnf o gasto médio mensal per capita foi maior com o infliximabe durante todo o período de acompanhamento.

Como já mencionado, a utilização de bases administrativas para a avaliação do cuidado prestado ao paciente apresenta algumas limitações importantes. Alguns aspectos estruturais, como as lacunas de informação clínica e o caráter de faturamento, restringem as possibilidades de avaliações mais aprofundadas. Apesar disso, destaca-se a grande potencialidade dos dados administrativos em traçar a trajetória do usuário nos serviços de saúde, e a sua importância para a avaliação de políticas públicas. Conhecer o perfil dos pacientes atendidos no SUS, bem como os gastos e seus fatores relacionados é parte importante da avaliação do impacto da incorporação de tecnologias. Esse estudo permitiu a caracterização do perfil e dos gastos do CEAF com o tratamento de AP e psoríase, demonstrando o alto gasto especialmente com os medicamentos biológicos e ressaltando a importância de se estabelecer critérios bem definidos para o fornecimento dos medicamentos. Recentemente foi lançado o PCDT para psoríase e o PCDT para AP estava em consulta pública até março de 2014 (BRASIL, 2013; 2014). Entretanto, algumas doenças atendidas pelo CEAF ainda carecem de protocolo, o que pode levar ao gasto indevido do recurso público e ao atendimento indevido dos usuários (CAMPOS NETO et al., 2012). Além da criação dos PCDT, é necessário adotar estratégias para a sua disseminação, que auxiliem no uso com qualidade do medicamento, tais como o detalhamento acadêmico, a monitorização da prescrição e a criação e centros de referência. REFERÊNCIA ACURCIO, F. A. et al. Perfil demográfico e epidemiológico dos usuários de medicamentos de alto custo no Sistema Único de Saúde. Revista Brasileira de Estudos de População, v. 26, n. 2, p. 263-282, jul/dez. 2009. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria n.º 1.318 de 23 de julho de 2002. Define, para o grupo 36, medicamentos, da tabela descritiva do sistema de informações ambulatoriais do Sistema Único de Saúde - SIA/SUS, a forma e a redação estabelecidas no anexo desta portaria. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 24 jul 2002. Seção 1.

BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria nº 2.981 de 26 de novembro de 2009. Aprova o Componente Especializado da Assistência Farmacêutica. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, de 01 dez. 2009. Seção 1, p. 31. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Portaria nº 1.229, de 5 de novembro de 2013. Aprova o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Psoríase. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 06 nov 2013b. Seção 1, p. 52. BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Consulta Pública n 2, de 4 de fevereiro de 2014. Torna pública, nos termos do art. 34, inciso II, c/c art. 59 do Decreto nº 4.176, de 28 de março de 2002, minuta de Portaria que aprova, na forma do Anexo, o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas - Artrite Psoríaca. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 05 fev de 2014. Seção 1, p. 31. CARIAS, C. M. et al.medicamentos de dispensação excepcional: histórico e gastos do Ministério da Saúde do Brasil. Revista de Saúde Pública, v. 45, n. 2, p.233-240. 2011 CAMPOS NETO, O. H. et al. Médicos, advogados e indústria farmacêutica na judicialização da saúde em Minas Gerais, Brasil. Revista de Saúde Pública, v. 46, n. 5, p.784-90. 2012 COELI, C. M. E CAMARGO JR., K., R. Avaliação de diferentes estratégias de blocagem no relacionamento probabilístico de registros. Revista Brasileira de Epidemiologia, v. 5, p. 185-95. 2002 GLADMAN DD, ANTONI C, MEASE P, et al. Psoriatic arthritis: epidemiology, clinical features, course, and outcomes. Annals of Rheumatic Disiases, 64 suppl 2:ii14-ii17. 2005 GOLDENSTEIN-SCHAINBERG, C.; FAVARATO, M. H.; RANZA, R. Conceitos atuais e relevantes sobre artrite psoriásica. Revista Brasileira de Reumatologia, v. 52, n. 1, p. 98-106. 2012.

GOSSEC, L. et al. European League Against Rheumatism recommendations for the management of psoriatic arthritis with pharmacological therapies. Annals of Rheumatic Diseases, v. 71, p. 4-12. 2012. GOTTLIEB, A. et al. Guidelines of care for the management of psoriasis and psoriatic arthritis: Section 2. Psoriatic arthritis: overview and guidelines of care for treatment with an emphasis on the biologics. Jounal of the American Academy of Dermatology, v. 58, n. 5, p. 851-864, mai. 2008. GUDJONSSON, J.; ELDER, J. Psoriasis: epidemiology. Clinics in Dermatology, v. 25, n. 6, p. 535-546. 2007. SISTEMA INTEGRADO DE GERENCIAMENTO DA ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA (SIGAF). Versão 2. Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais: Superintendência de Assistência Farmacêutica. Disponível em: <http://sigaf2.saude.mg.gov.br/> (acesso restrito). Acesso em: 30 de abril de 2014. SOCIEDADE BRASILEIRA DE DERMATOLOGIA (SBD). Perfil nosológico das consultas dermatológicas no Brasil. Anais Brasileiros de Dermatologia, v. 81, p. 549-558, 2006. TAKAHASHI, M., D., F. et al. Consenso brasileiro de psoríase e guias de tratamento. Sociedade Brasileira de Dermatologia, Rio de Janeiro; 2006. p 3-14. TITTON, D., C. et al. Registro Brasileiro de Biológicos: processo de implementação e resultados preliminares do BiobadaBrasil. Revista Brasileira de Reumatologia, v. 51, n. 2, p.145-160. 2011