Anais do X Colóquio de História da UNICAP/ 2016 ESCRAVIDÃO, ABOLIÇÃO E PÓS-ABOLIÇÃO ISSN

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OLINDA DO SÉCULO XVII: A PAISAGEM DA CIDADE PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL DA HUMANIDADE A PARTIR DA PINTURA RUÍNAS DO CONVENTO DO CARMO EM OLINDA DE FRANS POST Maria Vanessa Nunes do Carmo 1 Ricardo Jorge Silveira Gomes 2 RESUMO Normalmente a concepção da paisagem tem atribuições relacionadas pelo visível, relativo ao ponto de vista, uma imagem, e certo tipo de enquadramento, sobre a qual a paisagem é pensada como objetivo. Especialmente a pintura, na composição do artista, desempenhou um papel determinante na construção de códigos, sobretudo, estéticos que levaram as pessoas a olhar a natureza com os olhos a valorizando. O pintor holandês Frans Post tornou-se um dos primeiros pintores a retratar a paisagem e os habitantes do Brasil do século XVII, como podem ser constatadas em muitas de suas pinturas. Na qual, o quadro intitulado Ruínas do Convento do Carmo, chamada na época de Ruínas da Sé de Olinda é objeto de estudo do referido trabalho. O foco da comunicação consiste em retratar e entender a morfologia da paisagem da Olinda do século XVII a partir da Pintura Ruínas do Convento do Carmo em Olinda, de Frans Post. Percebeu-se que Post soube retratar a essência brasileira nas suas obras, todavia a percepção e vivência do artista distorce um pouco a realidade. PALAVRAS-CHAVES: PAISAGEM; FRANS POST; PATRIMÔNIO CULTURAL. 1 Mestranda em Ciências da Religião pela Universidade Católica de Pernambuco UNICAP Graduada em Licenciatura em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco UFPE. Bolsista da CAPES. E-mail: nunes.mariavanessa2@gmail.com 2 Mestrando em Ciências da Religião pela Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Licenciado em História pela Faculdade de Formação de Professores da Zona da Mata Sula (FAMASUL). E-mail: ricardojorgesg@hotmail.com 184

1. INTRODUÇÃO Anais do X Colóquio de História da UNICAP/ 2016 Normalmente a concepção da Paisagem tem atribuições relacionadas pelo visível, relativo ao ponto de vista, uma imagem, e certo de enquadramento, sobre a qual a Paisagem é pensada como objetivo. A Paisagem é muito relacionada ás artes, sobretudo nos poemas e nas pinturas, que trazem, sobretudo, a apreciação da natureza. Especificamente a pintura, na composição do artista, desempenhou um papel determinante na construção de códigos, sobretudo, estéticos que levaram as pessoas a olhar a natureza com outros olhos e a valorizando. Cauquelin (2007, p. 93), afirma que a visualização de um lugar (que seria o território) é feita pela artista, na qual atribui àquilo que é representado de verdade e que o texto, sem si, não permite. A autora afirma ainda que embora o texto não permita visualizar o lugar como a pintura proporciona, existe um conjunto indissociável entre a literatura, pintura e as paisagens: "A paisagem [...] estava inteiramente submetida ás convenções e Literárias; exemplificada sob a forma de quadros, ela dependia, de algum modo, De certo estado da cultura" (CAUQUELIN, 2007, p. 15). A concepção de Paisagem também foi incorporada na poesia e foi expressa na pintura, sobretudo em quadros e pintura que representavam elementos naturais como as montanhas e os cursos d'água. Berque (1996), em seu estudo sobre o Surgimento da Paisagem na china, detêm para esse contexto, abordado que a Paisagem já era retratada, sobretudo em aspectos naturais, no oriente e que somente com o Renascimento Europeu que essa concepção de paisagem chega ao ocidente. As primeiras formas de representação da paisagem no ocidente puderam ser visualizadas nas obras de pintores renascentistas, como do pintor Holandês Frans Post. 185

Durante o período de dominação holandesa do nordeste brasileiro, a comitiva de fidalgo Mauricio de Nassau aportou em solo pernambucano, e juntamente com ele veio o pintor Holandês Frans Post que é considerado o primeiro pintor da paisagem brasileira, assim como o primeiro paisagista das Américas (LAGO, 2006, p.06). Post tornou-se um dos primeiros pintores a retratar a paisagem e os habitantes do Brasil do século XVII, como podem ser constatadas em muitas pinturas. Na qual, o quadro intitulado "Ruinas do Convento do Carmo em Olinda", chamada na época de Ruínas da Sé de Olinda' é o objeto de estudo do referido do trabalho. O foco do trabalho consiste em retratar e entender a morfologia da paisagem da Olinda do Século XVII a partir da pintura Ruínas do Convento do Carmo em Olinda, de Frans Post, Diante disso, o objetivo geral da pesquisa é interpretar a fisionomia e os aspectos da morfologia da paisagem. A qualidade das obras de Post é discutida por vários atores. Humboldt (apud LAGO, 2006, pp 09-10), por exemplo, fala que "Post tem o mérito da invenção em termos de pintura de paisagem e estudo da natureza". Já viera (2010) diz que Post "[...] tornou possível o reconhecimento de localidades nas imagens produzidas, reforçando o sentimento de identidade entre o grupo social e o seu lugar". Inicialmente será apresentada uma síntese da caracterização e localização da área de estudo, destacando o Sitio Histórico de Olinda dentre desse contexto. Em seguida, na seção intitulada por O "Olhar distante" a paisagem na pintura Ruína do Convento do Carmo em Olinda 3 vai 3 Este quadro, desconhecido por Sousa-Leão (1973), ressurgiu em leilão poucos anos após a publicação do seu catalogo, em 1973.sendo conhecida na época por Ruinas da Sé de Olinda, mas assemelha-se mais as composições de quadros conhecidos que também mostram à esquerda as Ruinas do Convento do Carmo 186

trazer as leituras sobre a paisagem na pintura supracitada, retratado e entendendo assim a morfologia da paisagem. Também é parte integrante desta sessão observar o "olhar distante" desse artista. Mais adiante, na sessão intitulada por "A morfologia da Paisagem: conexões sistemáticas dos componentes naturais e das ações humanas" buscou-se a partir de aspectos da Teoria geral dos sistemas, proposta por Sochava (1972), extrair os elementos, interações e componentes modeladores da paisagem retratados na pintura anteriormente citada, salientando que as interações envolvem aspectos físicos e naturais, juntamente com os aspectos humanos. E, por fim, na última sessão, serão apresentadas as considerações finais e recomendações para trabalhos futuros diante da riqueza de elementos presentes na pintura de Frans Post. 2. SINTESE DA CARACTERIZAÇÃO HISTORICA E LOCAZIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO Antigamente capital de Pernambuco é completamente diferente da capital atual. Olinda conserva um expressivo patrimônio arquitetônico, reconhecido pela UNESCO e declarado patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade. Olinda foi também um dos centros mais importantes do período colonial brasileiro graças a cana-de-açúcar. Em 1630 os holandeses conquistaram a cidade, incendiaram e mudaram a capital para Recife. E sua capitania só se recuperaria em meados do século XVII momento em que Olinda foi elevada a categoria de cidade. Durante o período de dominação holandesa, o governador da época, O fidalgo Mauricio de Nassau trouxe uma comitiva de vários artistas para o então Brasil Holandês, dentre eles o pintor Frans Post 187

que das várias representações do Brasil daquela época, também pintou a Olinda do século XVII. 3. O "OLHAR DISTANTE": A PAISAGEM NA PINTURA RUÍNAS DO CONVENTO DO CARMO EM OLINDA DE FRANS POST As Ruinas do Convento do Carmo em Olinda (Figura 01) é uma raríssima vista de Olinda (PE) do século XVII, provavelmente pintada na Europa a partir de esboços e simples anotações feitas pelo artista durante sua estadia aqui em Pernambuco (Instituto Ricardo Brennand IRB). Esta pintura é característica da terceira fase do pintor e passa a repetir a mesma dúzia de temas, neste caso, as ruínas de Olinda, cidade que havia sido incendiada pelos holandeses em 1630 e que permaneceu em grande parte em ruinas no período em que Frans Post morou em Pernambuco (IRB, 2003) (LAGO, 2003). Salientando que as ruínas são do antigo convento de Olinda, tema também de outro quadro muito semelhante e conservado no Museu de Belas Artes, no Rio de Janeiro, intitulado "Ruinas da Igreja dos Jesuítas". Figura 01. Pintura Ruínas do Convento do Carmo em Olinda, feita em guache e têmpera sobre papel (21,1 X 41,2 cm), assinada e datada por Frans Post em 1640. 188

Fonte: http://oolhardefranspostsobreobrasil.blogspot.com.br/2012/08/vista-dasruinas-da-se-de-olinda.html Observando a pintura acima é possível verificar que Post trouxe um olhar que se aproxima da natureza, que procura da forma não apenas ao que é visto, como também ao que experiência pelo observador. Essa afirmação é condizente com a ideia de que para entender a paisagem é Preciso decifra-la a partir de um esforço interpretativo de conhecimento, e que vai, portanto, além da fruição e da emoção (BESSE, 2006). A pintura de Frans Post estabeleceu uma mediação entre o totalmente novo (a realidade brasileira) e aquilo que lhe é família (sua realidade holandesa), atribuindo sentido ao vivenciado. Ou seja, na sua pintura é possível verificar elementos e atributos do seu país de origem, a Holanda, dentro da pintura Ruinas do Convento do Carmo em Olinda, assim como em outras obras dele. E dentre esses elementos, destacam: O nivelamento ao nível do rio, sendo uma observação a ser destacada. O transporte da natureza através da vegetação exótica e frondosa, que diferia da original. A adaptação ao pintar um céu mais baixo e carregado (Nebuloso), quando a realidade dos céus nordestinos é contrária e usada por ele. As superfícies extensas e impassíveis das águas, ou seja, é como se a água do Rio não se alterasse, o que é contrario a realidade devido a influencia das marés naquela localidade. E as sombras e reflexos grossos que dão volume a pintura e a deixam com certo movimento de percepção visual. Outro ponto a ser destacado é referente á luminosidade, segundo Bandeira (2006, p. 03) elementos artísticos como o elemento "LUZ" também são adaptações e modificações necessárias que é capaz de 189

alterar a visão do local. Tal afirmação é condizente com a questão das sombras e reflexos grossos, supracitada. Ao observar a pintura (figura 01) percebem-se ainda á esquerda remanescentes do formato original do Convento do Carmo, ainda que vagamente, assim como restos de "Pedras" ornadas à esquerda, sendo esse um elemento ainda mais raro nas pinturas de Frans Post (IRB, 2003). Na pintura também se observar ao centro, em primeiro plano, a presença de índios e negros que são considerados elementos útil na composição da pintura, sendo característica trazer vegetações atípicas ou exóticas para as pinturas, como no caso do coqueiro no seu repoussoir (à direita). Tais características observadas a partir da pintura dizem respeito a influencia da iconografia europeia na construção da identidade nacional brasileira, seja na tentativa de captar a atmosfera local, seja no delineamento da vegetação ou dos perfis litorâneos. É bom lembrar que essa pintura corresponde à nova abordagem do artista, desenvolvida durante sua 3 fase, na qual uma das características é o abandono do post em suas composições com o compromisso de retratar a realidade no Brasil, ressaltando que esse compromisso era um contrato firmado com a corte holandesa. Segundo VIEIRA (2012), em levantamento bibliográfico a cerca de estudiosos holandeses de Frans Post, identificou que a criação em post estaria diretamente relacionada a uma "analise pictórica da Colônia a partir de imagens documentas" além das imagens serem a reelaboração em gabinete de observações de campo, de forma que teria sido muito pouco provável que as figuras humanas e zoobotânicas dos primeiros planos de suas composições tivessem sido observadas nos mesmos sítios e momentos em que faixas topográficas que aparece nos planos de fundo. "As paisagens de post, ainda que brasileiras, não deixam de ser Holandesas, e suas obras, inquietantes e estranhas para um europeu, Se 190

cotejam e se aproximam formalmente das paisagens de Ruisdael". (ORAMAS, p.220) Provavelmente, tais características, são resultados do fato de que boa parte das obras de Post terem sido pintadas fora de solo brasileiro, isso faz com que o olhar do viajante (do Observador) que parte não é o mesmo do que retorna. 4. A MORFOLOGIA DA PAISAGEM: CONEXÕES SISTÊMATICA DOS COMPONETES NATURAIS E DAS AÇÕES HUMANAS. Na pintura Post observa-se uma interação entre o homem e o meio, as representações do elemento natural (rio, céu, mata e relevo suave) juntamente com a representação do elemento humano (o negro, as senhoras de engenho e a edificação) que dão a configuração e a "aura" da pintura da paisagem. Em nível mais local, do geossistemas podem diferenciados pelas relações entre o relevo. Na qual esse elemento natural pode visualizado na pintura de post. Segundo Sochava (1978, p. 292), um geossistema é uma dimensão do espaço terrestre onde os diversos componentes naturais encontram-se em conexões sistêmicas uns com os outros, apresentando uma integridade definida, interagindo com a esfera cósmica e com a sociedade humana. A partir da observação da Figura 01, um elemento notável nas obras desses pintor é o uso do recurso da percepção e da topografia, ou vista topográfica, na representação da paisagem. Segundo VIEIRA (2010): A paisagem como vista topográfica teve um importante papel na cultura visual da Holanda do século XVII. Esse mesmo autor afirma ainda que: As vistas topográficas apareciam em mapas murais, em gravuras vendidas nos Mercados e mesmo em quadros que decoravam as casas tanto dos ricos como dos menos abastados. Quando 191

essas composições são comparadas com a da gravura de Frans Post, é possível perceber que ele representou as localidades do Brasil com o mesmo tratamento dado ás cenas pátrias. Em síntese, apesar da interação entre homem e meio, na pintura de post, o fator topográfico na concepção de relevo, não é condizente com a realidade da localidade, visto o terreno é significativamente acidentado e especificamente na pintura em que questão houve um nivelamento acentuado a nível topográfico, provavelmente devido a iconografia europeia. 5. CONSIDERAÇÕES E RECOMENDAÇÕES FINAIS Olhar europeu no Brasil teve papel fundamental na construção da identidade, todavia a percepção e vivencia do artista distorce um pouco a realidade. E no do nordeste foi composta por elementos da realidade holandesa nas pinturas de Post. Post soube retratar a essência brasileira nas suas obras, sobretudo os elementos naturais que eram desconhecidos para os europeus. Na pintura de Post o fator topográfico na concepção de relevo é um elemento presente, embora não seja condizente com a realidade da localidade. E, por fim, recomenda-se para trabalhos futuros, observar a paisagem nas pinturas a partir da percepção sentida pelos observadores (Curadores de museu, estudantes, profissionais acadêmicos turistas, passantes entre outros) ao visualizar as pinturas de Frans Post em contraponto com a realidade dos dias atuais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS BANDEORA, j. Jean-Baptiste Debret: Caderno de viagem. Rio de Janeiro: Sextante, 2006. 192

BERGUE, Augustin. El nascimento del paisaje in China. In: El paisaje. Huesca: arte y naturalesa. Actas del Segundo Curso, Huesca, 1996; editando por la Diputación de Huesca, Espana, 1997. BESSE, Jean-Marc. Ver a Terra: Seis ensaios sobre a paisagem. Editora Perspectiva 2006. 120p. CAUQUELIN, Anne. A invenção da Paisagem. Tradução Marcos Marcionilo. São Paulo: Martions, 2007, p. 196. INSTITUTO RICARDO BRENNAND IRB. Frans Post e o Brasil Holandês na coleção do instituto Ricardo Brennand. Catálogo da exposição. 2a Edição. Rio de Janeiro: Capivara, 2003, p.114. LOGO. P. &. B. C. do. Os Quatro de Post pintados no Brasil. In: O Brasil e os Holandeses (1930-1954) org. Paulo Herkenhoff. Rio de Janeiro: Sextante Artes. 1999. 271p. MARTINS, Luciana de Lima. O Rio de Janeiro dos VIajantes: o olhar britanico de 1800-1850. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001. 207p. ORAMAS, Luiz Perez. Frans Post, invenção e "aura" da paisagem. Org. Paulo Herkennoff. Rio de Janeiro: Sextante Artes, 1999. 30p. SOCHAVA, V.B. Joaquim. Frans Post: 1612-1680. Livraria Kosmos Editora. Rio de Janeiro, 1973, 177p. VIEIRA, Daniel de Souza Leão. Topografia Imaginaria: A Paisagem Politica do Brasil Holandês em Frans Post, 1637-1669. Universiteit Leiden, 2010. VIEIRA, Hugo Coelho; et al. Brasil Holandês: historia, memória e patrimônio compartilhado. São Paulo: Alameda, 2012. 338p. 193