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Transcrição:

Fls. PROCESSO: 811939 NATUREZA: CONSULTA CONSULENTE: Helder Freire Cardoso (Diretor do Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Pirapora/MG) PROCEDÊNCIA: Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Pirapora/MG RELATÓRIO Cuidam os autos de Consulta encaminhada a este Tribunal de Contas pelo Sr. Helder Freire Cardoso, Diretor do Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Pirapora/MG, autarquia municipal, cujo questionamento envolve, em última análise, as hipóteses de alteração do contrato administrativo de fornecimento de combustível e os instrumentos para a recomposição da equação econômico-financeira da relação contratual. É, em síntese, o relatório. À Secretaria do Pleno. Incluir em pauta. Tribunal de Contas, em / /2010. RL Conselheiro Antônio Carlos Andrada Relator 1

Fls. PROCESSO: 811939 NATUREZA: CONSULTA CONSULENTE: Helder Freire Cardoso (Diretor do Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Pirapora/MG) PROCEDÊNCIA: Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Pirapora/MG PRELIMINAR Verifico, nos termos constantes da petição inicial, que o Consulente é parte legítima para formular a presente Consulta e o seu objeto refere-se a matéria de competência desta Corte, sendo certo, ainda, que a indagação por ele formulada comporta pronunciamento em tese, nos termos do parágrafo único do art. 210 do RITCMG - Resolução nº 12/08. Portanto, conheço desta Consulta. MÉRITO A resposta da presente Consulta suscita o estudo de três pontos referentes ao tema da equação econômico-financeira do contrato administrativo: conceito, causas de desequilíbrio e instrumentos de recomposição. O conceito de equação econômico-financeira pode ser encontrado na doutrina de Diogenes Gasparini 1, que a define como: a relação de fato, fixada pelas partes na celebração do contrato, entre os encargos do contratado e a remuneração devida pela Administração Pública, em razão da execução da obra, prestação do serviço, fornecimento de bens, prestação de serviço público ou qualquer outro que seja seu objeto. 1 GASPARINI, Diogenes. Reajuste, revisão e repactuação. Informativo de Licitações e Contratos - ILC, n.123, p.416-425, maio 2004. 2

Fls. Essa relação entre os encargos do contratado e a remuneração devida pela Administração Pública começa a ser projetada com a elaboração do instrumento convocatório, em que se estabelece o objeto da licitação, os direitos e obrigações das partes e as condições de execução do contrato. A concretização da equação econômico-financeira do contrato administrativo ocorre, no entanto, no momento em que a proposta do licitante é aceita pela Administração contratante, configurando, assim, a mais vantajosa para o Poder Público. A partir de então, a própria Constituição da República passa a proteger o equilíbrio da relação contratual formalizada, como se verifica na norma contida no inciso XXI do seu artigo 37, in verbis: Art. 37....... XXI ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações; (Grifo nosso.)... A Lei de Licitações, no mesmo sentido, prevê, na alínea d do inciso II do seu art. 65, que o contrato administrativo pode ser alterado, mediante acordo, para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato. Ao se interpretar mencionada regra presente na Lei nº 8.666/93 com base no dispositivo constitucional transcrito, infere-se que a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro, eventualmente rompido durante a execução contratual, consiste em obrigação legal relativa à gestão do contrato administrativo, não podendo ser considerada mera faculdade ao dispor dos contratantes. Por ser pertinente, peço vênia para registrar lição esclarecedora do jurista Carlos Ari Sundfeld 2 : 2 SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e contrato administrativo de acordo com as leis 8.666/93 e 8.883/94. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 239. 3

Fls. As obrigações de pagamento devem atender às condições efetivas da proposta feita pelo particular na licitação (ou fora dela nas hipóteses de inexigibilidade e dispensa). Assim, alterando-se a situação à vista da qual foi formulada, haverá também de alterar-se a remuneração, em igual medida; caso contrário, não estariam atendidas as condições efetivas da proposta. Feitas essas considerações iniciais acerca do conceito de equação econômico-financeira do contrato administrativo e da proteção que o ordenamento jurídico pátrio lhe confere, passo agora ao estudo das causas que podem desequilibrar a relação estabelecida na formalização da avença. Com o intuito de facilitar a compreensão da matéria, haja vista a precípua função orientadora exercida por esta Corte de Contas ao apreciar as consultas formuladas pelos jurisdicionados, importante salientar que, neste ponto, optou-se por classificar as referidas causas em três grupos, quais sejam, álea ordinária, álea administrativa e álea extraordinária 3. A álea ordinária remete a eventos afetos ao comportamento do contratado, pelos quais não responde a Administração Pública. Trata-se do risco do próprio negócio, resultado da oscilação comum do mercado ou da má gestão empresarial do agente privado. Essas causas, que em geral estão relacionadas à busca do lucro, finalidade inerente à iniciativa privada de mercado, não autorizam a alteração do contrato administrativo, embora possam interferir no equilíbrio econômico-financeiro da relação contratual. Um exemplo de evento que pode ser classificado como álea ordinária é o erro de cálculo do particular ao elaborar sua proposta na licitação. A falha no planejamento e na quantificação dos encargos relativos à execução do contrato não pode servir de argumento para se pleitear o aumento da remuneração devida pela Administração, que, como dito alhures, não responde por tal desídia do particular. 3 Classificação baseada na doutrina de Carlos Ari Sundfeld (1994), Diogenes Gasparini (2004) e Marçal Justen Filho (2008). SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e contrato administrativo de acordo com as leis 8.666/93 e 8.883/94. São Paulo: Malheiros, 1994. GASPARINI, Diogenes. Reajuste, revisão e repactuação. Informativo de Licitações e Contratos - ILC, n.123, p. 416-425, maio 2004. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentário à lei de licitações e contratos administrativos. 12 ed. São Paulo: Dialética, 2008. 4

Fls. A álea administrativa, por sua vez, decorre do comportamento da Administração Pública e pode ser subdividida em fato da administração e fato do príncipe. O primeiro consiste em atuação da própria Administração Pública contratante que, de alguma forma, prejudica a execução do pactuado e onera os encargos do contratado. Assim, incide diretamente sobre o contrato administrativo, o que pode levar à alteração do instrumento e até mesmo à indenização do particular por eventuais prejuízos sofridos. Como exemplo, pode ser citado um atraso na liberação do terreno em que será realizada a obra licitada. Já o fato do príncipe constitui medida lícita e regular, proveniente de autoridade pública, seja ela a pessoa estatal contratante ou não, que atinge indiretamente o contrato, autorizando a recomposição da equação econômico-financeira. O 5º do artigo 65 da Lei nº 8.666/93 disciplina a mais clássica hipótese de fato do príncipe, que é a elevação da carga tributária. Não obstante, mister se faz destacar que, conquanto atinja apenas de forma reflexa a relação contratual, o fato do príncipe deve estar diretamente relacionado com o aumento ou a diminuição dos encargos do contratado, caso contrário não autoriza a alteração da avença. Por fim, a álea extraordinária remete às causas estranhas à vontade das partes que alteram a equação econômico-financeira do contrato administrativo. Com base na literatura sobre o tema, agruparemos esses eventos nos gêneros caso fortuito ou força maior, fatos supervenientes imprevistos e sujeições imprevistas. O caso fortuito ou força maior pode ser definido como um evento excepcional relacionado a fatos da natureza ou decorrente de processos sociais em que não seja possível imputar a conduta a um agente determinado, como ressalta Marçal Justen Filho 4. É o caso de chuvas torrenciais não previstas que prejudicam a realização da obra ou a prestação dos serviços. Os fatos supervenientes imprevistos, também chamados de álea econômica, são alterações mercadológicas imprevisíveis, ou previsíveis, mas de consequências incalculáveis, as quais prejudicam a execução contratual pelo particular nas condições originalmente avençadas. O exemplo mais comum é a inflação. As sujeições imprevistas, a seu turno, constituem obstáculos materiais anteriores à contratação que só se revelam em momento posterior, não sendo possível a sua verificação antes da execução contratual. Tal fato impõe a reestruturação da relação entre os encargos do particular e a remuneração devida pela Administração Pública. Exemplo usualmente citado pela doutrina é de um terreno rochoso ou falha geológica verificados somente após o início da execução da obra. 4 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentário à lei de licitações e contratos administrativos. 12 ed. São Paulo: Dialética, 2008, p. 720. 5

Fls. Em síntese, são essas as causas comumente indicadas pela doutrina que podem desequilibrar a equação econômico-financeira do contrato administrativo. De acordo com a análise aqui proposta, cabe, então, trabalhar os instrumentos aptos a recompor o equilíbrio da relação contratual eventualmente alterado 5. O reajuste ou reajustamento é utilizado para compensar os efeitos da inflação. Adota-se, usualmente, o índice inflacionário do setor da economia em que se enquadra o objeto do contrato administrativo. A sua aplicação exige o decurso de um ano contado da data de apresentação da proposta que serviu de base para a contratação ou do anterior reajustamento, nos termos dos arts. 2º e 3º da Lei nº 10.192/2001. A atualização monetária busca corrigir monetariamente a prestação, desde a data final do período de adimplemento de cada parcela da obrigação contratual até a do efetivo pagamento, baseando-se em índices gerais de inflação 6. A revisão, recomposição ou realinhamento de preços, em linhas gerais, é utilizada em razão de alteração extraordinária nos valores, desvinculada da inflação, que impõe modificação nos encargos do contratado. O instrumento resulta da aplicação da cláusula rebus sic stantibus ou teoria da imprevisão, no sentido de que as obrigações contratuais devem ser atendidas à luz das condições vigentes quando de sua constituição (SUNDFELD, 1994, p. 238). Cabe ressaltar que não há exigência de prazo para a aplicação da revisão, visto que ela decorre de evento imprevisível ou, se previsível, de efeitos incalculáveis, buscando recompor a relação contratual na exata medida de sua alteração. Um exemplo de causa que justifica a revisão do contrato administrativo, quando relacionada diretamente com o objeto executado, é a alteração da carga tributária. A repactuação, por fim, assemelha-se ao reajuste no sentido de ser prevista para ocorrer a cada doze meses, mas aproxima-se da revisão de preços no que toca ao seu conteúdo, visto que se trata de negociação entre as partes sobre as variações 5 Também com base na doutrina de Carlos Ari Sundfeld (1994), Diogenes Gasparini (2004) e Marçal Justen Filho (2008). SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e contrato administrativo de acordo com as leis 8.666/93 e 8.883/94. São Paulo: Malheiros, 1994. GASPARINI, Diogenes. Reajuste, revisão e repactuação. Informativo de Licitações e Contratos - ILC, n.123, p. 416-425, maio 2004. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentário à lei de licitações e contratos administrativos. 12 ed. São Paulo: Dialética, 2008. 6 Marçal Justen Filho assevera que na sistemática original da Lei nº 8.666, atualização monetária e reajuste de preços eram figuras distintas, mas a alteração das condições posteriores tende a eliminar a diferenciação. [...] Em tese, essa distinção permanece existindo. Mas a figura da atualização financeira deixou de ser praticada, passando aludir-se apenas a reajuste de preços (MARÇAL, 2008, p. 731). 6

Fls. efetivamente ocorridas nos encargos do contratado. Não se procede à simples e automática aplicação de um indexador de preços, examinando-se a real evolução dos custos do particular. É aplicada aos contratos que tenham por objeto a prestação de serviços executados de forma contínua, como conservação, limpeza, segurança e transporte. Com respaldo nessa breve abordagem teórica em torno de aspectos referentes à equação econômico-financeira do contrato administrativo, volto-me aos termos da indagação do consulente. Em tese, o contrato administrativo de fornecimento de combustíveis pode ser revisto caso se verifique evento relativo à álea administrativa ou extraordinária que desequilibre a relação entre os encargos do contratado e a remuneração devida pela Administração Pública. O gestor público deve verificar, no entanto, se a causa do pedido de revisão não se refere a eventos relacionados à álea ordinária, pela qual não responde a Administração Pública, como a proposta de preços do fornecedor elaborada, na licitação, abaixo dos valores de mercado. Ressalta-se, ademais, que a alteração contratual deve ser formalizada por meio de termo aditivo devidamente justificado, conforme disposto no caput do artigo 65 da Lei nº 8.666/93, exigindo-se a identificação do fato que fundamenta a revisão do contrato. Na oportunidade, registra-se que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis ANP disponibiliza, em seu endereço eletrônico 7, levantamento de preços e de margens de comercialização de combustíveis em várias regiões do país. 7 <http://www.anp.gov.br> 7

Fls. CONCLUSÃO Pelas razões elencadas acima, respondo a esta Consulta, em suma, nos seguintes termos: O contrato administrativo de fornecimento de combustíveis pode ser revisto para a recomposição da equação econômico-financeira, caso se verifique a ocorrência de eventos que desequilibrem a relação inicialmente estabelecida entre os encargos do contratado e a remuneração devida pela Administração Pública, excetuando-se os fatos correspondentes à álea ordinária, pelos quais responde apenas o particular contratante. É o parecer que submeto à consideração dos Srs. Conselheiros. Tribunal de Contas, em 26/05/2010. Conselheiro Antônio Carlos Andrada Relator RL 8