POR UMA ESCOLA DE QUALIDADE: o papel dos profissionais da educação no processo ensino-aprendizagem



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Transcrição:

254 POR UMA ESCOLA DE QUALIDADE: o papel dos profissionais da educação no processo ensino-aprendizagem Rosana de Oliveira Nunes Neto 1 RESUMO Pensar a escola na sociedade atual implica pensar nos seus diferentes elementos, instâncias e papéis. Inserida em um contexto político, econômico, social e cultural, a instituição escolar aparece como um espaço possível de inúmeras relações interpessoais. Por um lado, representa historicamente a reprodução das relações de dominação vigentes numa sociedade capitalista e autoritária; por outro, pode representar um espaço rico para a construção de um projeto político pedagógico e para a liberação da cultura do silêncio daqueles continuamente oprimidos na estrutura social vigente. É nesse sentido que o objetivo do presente trabalho é fazer uma reflexão sobre o papel do especialista em educação, apontando para sua ressignificação na articulação do cotidiano escolar com vistas à construção de um projeto político pedagógico de qualidade. Em primeiro lugar é importante fazer uma reflexão sobre a qualidade em educação do ponto de vista histórico, o que significa avaliar o movimento de luta pela educação iniciado no Brasil há mais de vinte anos. Nesse movimento, diferentes concepções e práticas sobre qualidade em educação se confrontam, avançam e recuam. Palavras-chave: Escola, Qualidade, Ensino INTRODUÇÃO A fim de se conhecer, analisar e controlar o que se passa dentro da escola e direcionar as inovações necessárias ao bom desempenho de suas funções, sem que se corra o risco de se tomar posições e medidas unilaterais e exclusivas a alguns setores, em desconsideração ou até em detrimento de outros setores e do conjunto, é preciso examinar a escola por meio de uma concepção sistêmica. Por sua própria função, a escola constitui-se em uma organização sistêmica aberta, isto é, em um conjunto de elementos (pessoas, com diferentes papéis, estrutura de relacionamento, ambiente físico, etc.), que interagem e se influenciam mutuamente, conjunto esse relacionado, na forma de troca de influências, ao meio em que se insere (FREIRE, 1980) 1 Pedagoga, Especialista em Docência do Ensino Superior e Gestão Escolar, Coordenadora Pedagógica da Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal FACIMED.

Dessa forma, qualquer mudança em qualquer dos elementos da escola produz mudança nos outros elementos, mudança essa que provoca novas mudanças no elemento iniciador e assim sucessivamente. A interinfluência será tanto mais forte quando maior proximidade e relacionamento tiverem os elementos. Essa interinfluência ocorre, quer tenhamos consciência dela ou não; e o entendimento de como ela funciona na escola é sobremaneira importante, a fim de que, esta possa exercer equilibradamente sua função educativa. Com referência ao relacionamento de mútua influência com o meio em que está inserida, o que a torna um sistema aberto, e não fechado em si mesmo, sabe-se que a escola tem uma função de promover a melhoria da sua comunidade, pela educação de seus filhos, e que, ao fazê-lo, recebe objetos, programas, métodos e técnicas às suas necessidades. Também aí as mudanças são recíprocas. Portanto, quando se pensar em algum setor da escola, deve-se pensar em suas relações com os demais setores, bem como com a comunidade. Como a escola, por sua vez, é uma unidade de um sistema educacional maior, formando por um conjunto de escolas que se interinfluenciam direta ou indiretamente, a idéia desse conjunto maior deve-se ter em mente ao se enfocar o funcionamento de qualquer área do sistema. Posições e medidas tomadas após esse exame terão melhores condições de ação coordenada e eficaz. Quanto maior e melhor for o entendimento das funções e condições de funcionamento das partes do sistema e de como interagem, maiores serão as probabilidades de se tirar vantagens de seus esforços e resultados. Baseados nesses conceitos, o presente artigo permitirá compreender o papel gestor do profissional da educação dentro de um contexto dinâmico e de constantes atualizações no processo ensino aprendizagem. Este trabalho trata-se de um estudo do tipo exploratório, realizado através da compilação de dados bibliográficos permitindo uma revisão sobre os principais pontos de uma escola de qualidade, bem como do papel do profissional de educação nesse processo democrático de ensino. 255

DESENVOLVIMENTO Segundo Arroyo (1995), as propostas de educação postas hoje são a confluência tensa entre essas concepções e opções. Através desse recorte histórico, o autor procura situar diferentes momentos atravessados pela educação brasileira na busca da qualidade. Segundo ele, nos anos 50 e início dos anos 60, ocorria a luta pela escola pública e pela cultura, buscava-se, sobretudo, a qualidade social e cultural na educação; as reformas dos anos 60-70 e a Lei 5692/71 desqualificam a educação e seus profissionais; no final dos anos 70 inicia-se o movimento de renovação pedagógica visando construir a escola pública e democrática (permitindo um período de férteis discussões em educação); no final dos anos 80 caracteriza-se a qualidade neoliberal reprivatizando o público, e propondo a gestão eficiente da escola desqualificada; e, atualmente, em oposição a esta realidade, busca-se repensar o projeto progressista reafirmando a qualidade sociocultural na educação. É importante ainda destacar que tais momentos são localizados em um determinado tempo como uma referência, porém a articulação desses movimentos foi se desenvolvendo de forma dinâmica com as discussões e contribuições de diferentes segmentos educacionais. As unidades de estrutura social de uma instituição se constituem em papéis sociais. Um papel social corresponde a um padrão esperado de determinada posição em um contexto social. O papel é a expressão da posição que corresponde à localização da pessoa no sistema. A divisão do trabalho corresponde ao agrupamento de funções, seguindo determinados critérios, de forma a permitir que a carga total de trabalho seja desempenhada satisfatoriamente pelas pessoas disponíveis para o seu desempenho. Por uma influência da tecnologia industrial, também em educação, foi adotado o critério de divisão do trabalho por especialização de funções. Assim é que determinada pessoa ou conjunto de pessoas recebe a incumbência de uma parte do processo de ensinoaprendizagem, outra de outra parte, e assim sucessivamente. Em escolas pequenas, cujo volume de trabalho é relativamente pequeno, vários agrupamentos de funções, que poderiam corresponder a papéis diferentes, são naturalmente assumidos por uma ou umas poucas pessoas. É na medida em que as escolas crescem e, na 256

proporção da afluência econômica, que vai ocorrendo a divisão de tarefas entre diferentes pessoas de diferente formação ou treinamento profissional. Observa-se, no entanto, que esse agrupamento especializado de funções e sua atribuição a pessoas diferentes produz situações de conflito no sistema. Ele tende a promover disparidade de interesses e a dificultar a comunicação. Considerações aos princípios de funcionamento do sistema e aplicação de medidas integradoras devem ser preocupação de todos os participantes do sistema, a fim de que o paralelismo e os conflitos gerados pela divisão de trabalho ocorram ao nível mínimo possível. Qualquer papel social é determinado por uma série de fatores interferentes, uns de maior impacto que outros, dependendo das circunstâncias. Esses fatores interferentes são, por exemplo, a avaliação das necessidades e características da escola, a quantidade e formação dos seus recursos humanos, a expectativa mantida por pessoas que participam do mesmo sistema social, a própria concepção do papel, pelo seu ocupante. Sabe-se que, tendo em vista que todos dos demais fatores interferentes são filtrados pela percepção do ocupante da posição à sua importância, esta tem um papel significativo na determinação de papéis; esse é um fator significativo na determinação de papéis enquanto desempenho, paralelamente às expectativas dos co-participantes, que é carreada dia a dia no relacionamento interpessoal mantido. Dentro dessas perspectivas da educação e da qualidade apresentadas historicamente, reformulam-se papéis e funções na escola, bem como o caráter do conhecimento e da participação dos segmentos envolvidos com a prática educativa. Nesse contexto, permeado de relações políticas, sociais, culturais e econômicas, e sofrendo influências de um sistema de produção baseado na divisão do trabalho com a supervalorização do trabalho intelectual sobre o manual -, caracteriza-se na escola uma divisão segundo a qual especialistas são responsáveis sobretudo pelo planejamento e elaboração e propostas educativas enquanto os professores ficam responsáveis por sua execução. Há um distanciamento entre o pensar e o fazer, regulamentando, portanto, a função do especialista em educação. A figura do especialista em educação nasce como um mecanismo de controle e ajustamento dos indivíduos às necessidades de ordem social. Nessa perspectiva, o papel do 257

especialista em educação vem atender os ideais positivistas que pregam e buscam manter a ordem social vigente, de forma a garantir a relação de poder entre classes opostas; vem, portanto, para garantir os interesses e a dominação da classe burguesa. No início da década de 1980, entretanto, a partir dos movimentos e críticas de diferentes autores, os especialistas em educação passam a questionar esse papel. Assim, buscam ser, antes de tudo, educadores, e a finalidade de toda e qualquer ação supervisora ou orientadora fundamenta-se na ação educativa. O educador consciente assume como luta as possibilidades de a escola servir aos interesses reais das classes populares. Ele se incorpora à luta coletiva para a construção de uma escola competente, na qual os alunos, em sua totalidade, se apropriem do saber historicamente acumulado, com o qual desvelarão a temporalidade do sistema sócioeconômico, criando um novo saber sobre a sociedade que pretendem transformam, e sobre as possibilidades reais de a transformarem (GARCIA, 1986). Sendo assim, a escola de qualidade passa a necessitar de educadores e de sujeitos comprometidos com a sua construção. A construção dessa instituição social e histórica implica, necessariamente, transformações profundas tanto em nível interno, considerando o individual e coletivo dos sujeitos envolvidos, como da sociedade como um todo. A educação emancipatória, que, para nós, se traduz numa escola de qualidade, traz consigo a concepção de homem enquanto um ser capaz de refletir sobre a realidade para, então, atuar nela e, ao mesmo tempo, transformar-se. A escola de qualidade, partindo dessa concepção articulada com o contexto histórico-social-econômico-cultural, possibilita uma ação crítica, reflexiva, transformadora, visando a modificar as condições sociais vigentes. Nesta perspectiva, o ato educativo assume uma dimensão política e adquire sentido ao vincular-se às necessidade aos anseios do momento histórico em que ele se realiza. Visualizar a educação em sua dimensão política, estabelecendo a partir daí os seus fins, não reduz o ato educativo à dimensão da formação pessoal, nem à dimensão de transformação social, mas procura a síntese e a superação dessas duas dimensões, na medica em que o projeto de formação se dê integrado ao projeto de transformação da sociedade (STRECK, 1996). Redimensionar o papel do especialista numa perspectiva emancipatória de educação significa ultrapassar as práticas tradicionais, que tentam adaptar o sujeito a uma estrutura 258

arcaica de escola, abandonando o controle, o ajustamento e a divisão do trabalho escolar e passando a assumir o papel de articulador político-pedagógico das diferentes instâncias da comunidade escolar para construção de uma escola mais qualificada. É preciso quebrar a lógica de organização curricular outorgada legalmente e criar novas práticas escolares que atendam às necessidades do aluno real. A experiência dos próprios profissionais demonstra que sonhar com uma nova qualidade em educação sem redefinir a estrutura e a organização do trabalho escolar fica apenas em sonho (ARROYO, 1995). Os papéis são analisados ao nível de generalização. Sua tradução em desempenho ocorre na medida em que os ocupantes das posições percebem o seu papel da mesma forma, e as pessoas ocupando papéis circunstantes mantêm expectativas correspondentes. O papel do professor constitui-se, basicamente, em ajudar o educando a aprender em todos os aspectos, isto é, na aquisição e desenvolvimento de conhecimentos, habilidades, hábitos, atitudes, valores, ideais ou qualquer tipo de aprendizagem ainda não desenvolvida e julgada importante e necessária para o educando tanto pessoal como socialmente. Observa-se que a concepção do papel do professor como agente de educação integral e não apenas como transmissor de conhecimentos ou agente do desenvolvimento de aptidões cognitivas não é recente. Os cursos de formação de professores vêm enfatizando, no entanto, mais os aspectos de conhecimento de áreas ou conteúdos específicos e conhecimentos de prática e procedimentos básicos (métodos e técnicas) em seu currículo. Observa-se que outros aspectos vitais para a promoção de uma educação integral e humanizada são colocados, via de regra, em segundo plano, como por exemplo: conhecimento dos processos de desenvolvimento humano (em termos de exemplificação e aplicabilidade); conhecimento dos processos de aprendizagem (em termos de exemplificação e aplicabilidade); compreensão das influências do ambiente sócio-econômico-cultural sobre o educando; habilidade em manter um relacionamento humano eficaz; habilidade em comunicar-se clara e eficazmente; habilidade em motivar seus alunos; habilidade em selecionar e desenvolver formas de desempenho adequados ao processo de ensino; habilidade em trabalhar cooperativamente; interesse em trabalhar com crianças e em função de suas necessidade. 259

Esses aspectos seriam, em nosso entender, mais importantes que os reforçados nos cursos de treinamentos, pois, conforme já afirmava em 1958 o relatório Rockefeller sobre a melhoria da escola, nenhum sistema educacional será melhor que a qualidade e habilidade de seus professores. A concepção de que o professor é a figura-chave na escola e de que na sua pessoa está centrada a possibilidade de eficácia do processo educativo é veiculada por vários dos seus analistas e teorizadores, como por exemplo Dewey e Bruner. Análises feitas reforçam a idéia de que é a qualidade do relacionamento professor-aluno que tornam o processo educativo e a escola significativos para o educando, e não outros aspectos, como por exemplo métodos e técnicas interessantes, atividades extra-classe variadas, etc. Em síntese, a eficácia do processo educativo centra-se no professor: seus conhecimentos, suas habilidades e suas atitudes em relação ao aluno a quem deve motivar. Torna-se, pois, de vital importância promover, antes de mais nada, o desenvolvimento desse professor, orientá-lo e assisti-lo na promoção de um ambiente escolar e processo educativo significativos para o educando. Como a chave do êxito na educação reside nas pessoas, mudanças curriculares, inovação de métodos e técnicas de ensino ou do próprio currículo não tornarão por si só o processo ensino-aprendizagem repentinamente eficazes. Se este tiver que ser melhorado, terá que ser a partir dos professores, do desenvolvimento de suas atitudes, habilidades e conhecimentos a respeito das mudanças e inovações necessárias. Assumir uma postura de educador comprometido com a formação da pessoa-cidadã e com o desenvolvimento do grupo social traduz-se na construção coletiva de um projeto pedagógico que privilegia a participação de toda a comunidade escolar. Numa concepção libertadora, sujeitos, projeto e organização devem se articular a partir do fundamental, que são as pessoas, construtoras e destinatárias da libertação (VASCONCELLOS, 1995). O desafio para o especialista está em criar espaços que favoreçam novas relações no interior da instituição escolar para que alunos, pais, funcionários e professores tornem-se um coletivo capaz de construir uma escola onde os saberes estejam voltados para as aprendizagens do aluno e sua formação como cidadão comprometido com a transformação da sociedade. Através da criação desses espaços, o especialista, antes de ser o porta-voz da 260

realidade do aluno, proporcionará que este e a comunidade tenham voz para, com participação efetiva, trazer para o espaço escolar sua realidade concreta, seus valores e aspirações. Não haverá educação de qualidade se o projeto político-pedagógico não estiver articulado com o cotidiano. Esse novo papel aponta para a possibilidade de lidar com os espaços de confrontos e discussões que permitirão o conhecimento dos diferentes olhares e concepções de homem e educação que permeiam as relações, o fazer e o conhecimento das pessoas envolvidas na escola. Garcia (1986) afirma ser necessário pesquisar em ação e para a ação, com a participação dos alunos e de suas famílias, agora sujeitos daquilo que lhes diz respeito. Juntos viverão momentos coletivos de descoberta de criação de um novo conhecimento, de emergência de um novo saber, a partir da crítica de verdades superadas no confronto com a realidade presente. Este novo saber, na medida em que vai sendo incorporado transforma-se em novas formas de ação, pois é a ação que dá sentido ao saber. A criação dessa perspectiva pode ser feita mediante a comunicação formal de papéis pela qual os vários setores ou pessoas comunicam suas funções. Este é um esquema convencional e pouco eficiente, dada a sua característica de monólogo e de tendência a reforçar o ponto de vista próprio e não o comum. A realização de reuniões de trabalho, em que são trocadas idéias, analisadas expectativas e depois definidos os papéis e funções são mais eficientes. CONSIDERAÇÕES FINAIS É através da construção e desenvolvimento participativo desse plano que se constrói uma escola autônoma forte e democrática, uma escola que pode se tornar fonte de sucesso para vencer suas questões críticas: reprovação, repetência, evasão, ou seja, o fracasso escolar. A comunidade escolar, enquanto sensibilizada e mobilizada, torna-se participante real e responsável. Aprender a participação real de decisões em parceria garante um processo integrado de ação, que pela abordagem dos eixos, pode ser a resposta para a 261

construção da autonomia e da cidadania responsáveis, através de uma nova escola com qualidade e produtividade. Conclui-se, nessa perspectiva que a construção da escola de qualidade, através de seu projeto político-pedagógico, deverá emergir do todo, dentro de uma visão contextualizada do processo educativo sustentado teoricamente e fundamentando a prática docente e que a (re)significação das relações e dos papéis dos diferentes segmentos da escola contribuem para um salto qualitativo na ação pedagógica de forma a atender as exigências do novo contexto educacional e social, contexto esse que recoloca a função social da escola e dos seus mestres e, principalmente, reafirma a qualidade sociocultural na Educação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Nilda & GARCIA, Regina L. O fazer e o pensar dos supervisores e orientadores educacionais. São Paulo: Loyola, 1986. ARROYO, Miguel G. Qualidade na Educação. In: Paixão de aprender. SMED, Prefeitura Municipal de Porto Alegre, Dez, 1995. DALMÁS, Ângelo. Planejamento participativo na escola elaboração, acompanhamento e avaliação. Petrópolis: Vozes, 1994. FREIRE, Paulo. Conscientização. São Paulo: Moraes, 1980. GANDIN, Danilo. Planejamento como prática educativa. São Paulo: Loyola, 1990. MELO, Sônia Maria Martins de. Orientação educacional: do consenso ao conflito. São Paulo: Papirus, 1994. PELLEGRINI, Marilu Zanella. Administração participativa da teoria à práxis. PUC/Adergs, 1991. PIMENTA, Selam Garrido. O pedagogo na escola pública. São Paulo: Loyola, 1988.. Orientação vocacional e decisão: estudo crítico da situação do Brasil. São Paulo: Loyola, 1991. STRECK, Danilo. Educação básica e o básico da educação. Porto Alegre: Sulina/Unisinos, 1996. 262