Desgaste do polietileno nas artroplastias do quadril

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DESGASTE DO POLIETILENO NAS ARTROPLASTIAS DO QUADRIL Desgaste do polietileno nas artroplastias do quadril FERNANDO PINA CABRAL 1, PAULO JOSÉ SILVA RAMOS 2, JORGE LUIZ PENEDO 3, EMÍLIO FREITAS 3, SÉRGIO CORTES DA SILVEIRA 3, ROBERTO FERES JUNIOR 4 RESUMO Os autores avaliaram 79 pacientes submetidos a artroplastia total do quadril utilizando próteses de Charnley, AML e Parhofer, entre 1978 e 1992, quanto ao desgaste linear do polietileno. A técnica não digitalizada, utilizada pelos autores, permite erros em torno de 20%, o que é compatível com a literatura. O ângulo de inclinação acetabular parece ser prognóstico quanto ao desgaste do polietileno, assim como o off-set. SUMMARY Polyethylene wear in hip arthroplasties Seventy-nine patients were submitted to hip replacement during the period of 1978 and 1992 with Charnley, AML and Parhofer implants to evaluate linear polyethylene wear. The authors used a non-digitized technique and found errors of 20%, which is consistent with the literature. The abduction angle and off-set seems to be relevant to predict wear. INTRODUÇÃO O desgaste de polietileno produz a liberação de micropartículas dentro da articulação do quadril, levando a um processo biológico de reabsorção óssea (osteólise) ao redor dos componentes femoral e acetabular, podendo causar o afrouxamento dos mesmos. Nos anos 60, Charnley desenvolveu sua primeira prótese com a utilização de teflon, que mostrou ser um desastre pela dissolução do mesmo, passando posteriormente ao uso dos polietilenos (UHMWPE) (2). 1. Chefe do Grupo de Quadril do HTO. 2. R4 do Serviço de Ortopedia do HTO, Rio. 3. Membro do Grupo de Quadril do HTO. 4. R2 do Serviço de Ortopedia do HTO. Nos anos 70, acreditava-se que o cimento ósseo (polimetilmetacrilato) fosse o responsável pela formação de debris, doença do cimento, levando a osteólise (9,10). Na década de 80, iniciou-se a utilização de implantes, que não eram empregados com o cimento ósseo, com isso evitando-se a doença do cimento, mas mesmo assim a formação de debris ocorria (5,8). Nos dias atuais, novas superfícies de contato, cerâmica/ polietileno, superiores a metal/polietileno e, mais recentemente, na Europa, metal/metal, em testes laboratoriais, mostram-se superiores. Esta última baseada em conceitos antigos, como o de McKee-Farrar (12) (Thompson/cup metálico), que por construção mecânica errônea levava freqüentemente ao afrouxamento, entretanto sem desgaste. O objetivo a que nos propomos é de correlacionar alguns fatores tais como: sexo, tipo de implante, fatores mecânicos e biológicos, com maior ou menor desgaste do polietileno. O ângulo de inclinação acetabular, assim como o off-set, parece ser prognóstico quanto ao desgaste. MATERIAL E MÉTODOS Foram avaliados 79 pacientes, que se submeteram a artroplastia total de quadril neste serviço, entre 1978 e 1992, sendo distribuídos em três grupos: AML (30 pacientes), Charnley (24 pacientes) e Parhofer (25 pacientes). Os pacientes pesquisados deviam ter um mínimo de cinco anos de tempo de seguimento e terem sido operados neste serviço primariamente. O número de pacientes foi escolhido aleatoriamente; este não corresponde ao número total de artroplastias realizadas neste serviço. Quanto ao sexo, nossa casuística foi de 44 homens e 57 mulheres. Quanto ao lado, 47 direito e 31 esquerdo. O tempo de seguimento médio foi de sete anos e seis meses para os três tipos de próteses, sendo de nove anos e nove meses para as próteses de Charnley, seis anos e um mês para a AML e seis anos e sete meses para a de Parhofer. Utilizamos para análise os exames radiográficos realizados no pós-operatório imediato ou até três meses após a ci- Rev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 10 Outubro, 1998 787

F.P. CABRAL, P.J.S. RAMOS, J.L. PENEDO, E. FREITAS, S.C. SILVEIRA & R. FERES JR. Fig. 1 Círculos concêntricos Figs. 3 e 4 Representação esquemática da marcação dos pontos na radiografia e medição do desgaste linear do polietileno Fig. 2 Paquímetro digital rurgia e na última consulta para avaliação deste estudo. A incidência foi a panorâmica da pelve em ântero-posterior. Avaliamos o desgaste linear como descrito no trabalho de Griffith et al. (6,11). Somente calculamos o desgaste linear total. As variações diárias, mensais e anuais foram estimadas matematicamente, não levando em conta se este desgaste aumenta relativamente com o passar do tempo. Tomamos a última radiografia e marcamos o centro da cabeça com o auxílio de uma transparência (por nós confeccionada) com círculos concêntricos (figura 1), com intervalos entre eles de 2mm, variando de 18 a 40mm. Assim, determinamos o tamanho da cabeça femoral nesta radiografia, compensando a amplificação ocorrida durante o processo radiográfico. O centro da cabeça foi designado como ponto C. Utilizando-se um compasso (figura 3), circulamos a própria cabeça, para termos certeza de estar no seu centro. Com isso também verificamos o centro da cabeça em implantes como a AML, que são radiopacos. Traçamos um novo arco, na interface cup acetabular-osso ou cup-cimento, sendo que este arco deve tangenciar o ponto mais próximo ao centro da cabeça, determinando assim a distância C B. Entre estes dois pontos, após traçarmos uma linha unindo ambos, obtivemos a distância B B, que é a espessura do polietileno nesse local (figura 4). Esta foi medida com a utilização de um paquímetro digital (figura 2) com precisão de centésimo de milímetro (Calliper Ultra-Call Mark III, Fowler Co., Inc., Newton, MA, USA). A direção do desgaste foi medida através de uma linha que passa pelo centro da cabeça femoral e perpendicular a uma tangente que cruza ambas as tuberosidades isquiáticas ou gota de lágrima ou os foramens obturadores (figura 5). O valor angular obtido foi transferido para a radiografia inicial, para medição da espessura. Com isso obtivemos o valor da espessura do polietileno final e o inicial, já corrigidos através da fórmula abaixo. Subtraímos o valor do desgaste final do desgaste inicial para obtermos o valor do desgaste total. Espessura corrigida = Fig. 5 Medição do valor angular da direção do desgaste do polietileno Tamanho original da cabeça x Espessura medida Tamanho medido da cabeça Avaliamos o ângulo de inclinação acetabular somente na radiografia inicial. A osteólise foi avaliada no acetábulo e fêmur através das classificações de DeLee/Charnley (3) e Gruen (7), respectivamente. 788 Rev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 10 Outubro, 1998

DESGASTE DO POLIETILENO NAS ARTROPLASTIAS DO QUADRIL Fig. 6 Radiografia inicial do caso 10, demonstrando as linhas traçadas para avaliação do desgaste AML Fig. 8 Radiografia inicial do caso 9, demonstrando as linhas traçadas para avaliação do desgaste AML. Obs.: Radiografia fotografada em espelho inadvertidamente. Note prótese e número 33 invertido. Fig. 7 Do mesmo caso 10, demonstrando o menor desgaste (0,0085mm) AML Relacionamos o desgaste anual e total entre os três tipos de implante utilizados (AML, Charnley e Parhofer) e entre os possíveis fatores que influenciariam no desgaste, assim como sexo, etiologia, tempo de seguimento, material do implante (cabeça: inox, CrCo, cerâmica), espessura do polietileno, presença ou não de cimento, off-set (AML). Fig. 9 Do mesmo caso 9, demonstrando o maior desgaste (4,5903mm) AML RESULTADOS Quanto ao desgaste total, a prótese de Charnley foi a que apresentou maior desgaste, seguida pela AML e por último a de Parhofer (gráfico 1). As figuras 6 a 11 ilustram três casos de como a mensuração foi realizada e mostram os desgastes nestes casos. O caso 10, AML (figuras 6 e 7), apresenta o menor desgaste neste tipo de prótese. As figuras 8 e 9 ilustram o maior desgaste neste mesmo tipo de prótese (caso 9). Gráfico 1 Desgaste total do polietileno em função das próteses avaliadas Rev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 10 Outubro, 1998 789

F.P. CABRAL, P.J.S. RAMOS, J.L. PENEDO, E. FREITAS, S.C. SILVEIRA & R. FERES JR. Fig. 10 Radiografia inicial do caso 46 demonstrando as linhas traçadas para avaliação do desgaste Charnley Fig. 11 Do mesmo caso 46, demonstrando o maior desgaste (3,2177mm) Charnley As figuras 10 e 11 ilustram o caso 46, que apresentou maior desgaste nas artroplastias tipo Charnley. Quanto à etiologia, na grande maioria dos casos foi de osteoartrose primária (78%), seguida das diversas outras patologias (tabela 1). A inclinação acetabular média foi de 49º para as próteses de Charnley, 46º para a AML, e 47º para as de Parhofer. O desgaste, quando a inclinação era maior do que 40º, para a AML, foi de 1,31mm e quando menor do que 40º era de 0,69 mm; estes valores eram estatisticamente significativos. Dois pacientes, casos 19 (61º) e 21 (72º), apresentaram inclinação acetabular muito elevada, mas, mesmo excluindo estes dois casos, a diferença continuava em torno do dobro, 1,30mm (gráfico 2). Já para a prótese de Charnley e Parhofer, os valores para o desgaste do polietileno com inclinação maior que 40º ficaram muito próximos para aqueles com inclinação menor que 40º. Gráfico 2 AML Gráfico 3 AML TABELA 1 Etiologia do processo patológico primário das artroplastias do quadril Osteoartrose primária 60 78,00% Necrose asséptica da cabeça femoral 6 7,80% Fratura-luxação central de acetábulo 3 3,90% Anquilose coxofemoral 2 2,60% Espondilite anquilosante 2 2,60% Pseudartrose colofemoral 2 2,60% Artrodese coxofemoral 1 1,30% Sinovite vilonodular 1 1,30% Total 77 100% Gráfico 4 AML Gráfico 5 Parhofer 790 Rev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 10 Outubro, 1998

DESGASTE DO POLIETILENO NAS ARTROPLASTIAS DO QUADRIL Gráfico 6 AML Gráfico 7 Parhofer Quanto ao off-set (AML), quanto maior era este, menor foi o desgaste (gráfico 3). Quanto ao tamanho do cup acetabular, para a AML (gráfico 4), Parhofer (gráfico 5), os valores para o desgaste ficaram muito próximos, não mostrando diferença estatisticamente significativa. Quanto ao tamanho da haste femoral, para a AML (gráfico 6), Parhofer (gráfico 7), os valores para o desgaste ficaram muito próximos, não mostrando diferença estatisticamente significativa. Nas artroplastias tipo Charnley, não foi possível serem feitas as avaliações quanto ao tamanho do cup e haste femoral, visto que os prontuários não estavam completos. DISCUSSÃO A prótese de Charnley foi a que apresentou maior desgaste, mas com maior tempo de seguimento. Somente isso já poderia explicar o fato, pois nas demais o seguimento foi em torno de 1/3 menor. A prótese de Parhofer apresentou o menor desgaste, mas o afrouxamento do cup acetabular foi o maior, em um menor tempo de seguimento. Com isso não conseguimos definir se a configuração desta prótese é responsável por este menor desgaste ou se o afrouxamento entre si é responsável por uma diminuição da mobilidade na interface cabeça/polietileno, fazendo com que o cup se articule com o neoacetábulo, ou se ainda, por uma menor solicitação daquele quadril devido à dor, seria responsável por um menor desgaste. Pareceu-nos que este último seria a explicação mais plausível. O afrouxamento neste tipo de prótese é maior porque esta apresenta uma superfície de contato com o osso lisa, no componente acetabular, como demonstrado por Cabral et al. (1). Somente foi possível avaliarmos os pacientes com off-set +0 e +3, já que com +5 e +8 o número de pacientes era muito pequeno para que fosse estatisticamente significativo, mas apesar disso este mesmo padrão pode ser observado. Com um maior off-set, há aumento no braço de alavanca dos abdutores, diminuindo biomecanicamente o vetor da cabeça contra o acetábulo, o que implicaria um menor desgaste do polietileno. Quanto à inclinação acetabular, nas artroplastias tipo AML, quando esta era menor do que 40º o desgaste médio foi de 0,69mm por ano; quando era maior do que 40º, o desgaste foi maior, 1,31mm por ano. Nossa casuística com este tipo de implante foi de apenas 25 casos; assim, acreditamos ser necessário novo estudo com número bem maior de casos, para que possamos avaliar este fator como sendo real, de modo a tornar-se previsível quanto ao desgaste. Shaver et al. (13) demonstraram que através da análise digitalizada o erro de mensuração decresce em torno de sete vezes. Esses autores obtiveram um resultado de desgaste linear de 0,1547mm/ano (média). Se compararmos com nossos resultados para todos os casos, obtivemos desgaste médio de 0,1810mm/ano, o que nos coloca em um percentual em torno de 20% de acréscimo, que é em torno do valor por eles encontrado. CONCLUSÃO Analisando todos os fatores incluídos em nosso trabalho, algumas conclusões ficaram claras: 1) Quanto à combinação de materiais, o melhor resultado foi a associação entre cerâmica e polietileno (Parhofer), apesar de nossas próteses terem apresentado afrouxamento precoce importante. 2) Quanto à técnica cirúrgica, as próteses acetabulares com inclinação normal (40º) foram as que apresentaram menor desgaste (AML). 3) Nas artroplastias que foram realizadas com maior offset (AML), obtivemos menor desgaste. REFERÊNCIAS 1. Cabral, F.P., Rondinelli, P.C., Freitas, E.H. et al: Acetábulo rosqueado de Parhofer. Rev Bras Ortop 30: 452-454, 1995. 2. Charnley, J., Kamangar, A. & Longfield, M.D.: The optimum size of prosthetic heads in relation to the wear of plastic sockets in total replacement of the hip. Med Biol Eng 7: 31-39, 1969. Rev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 10 Outubro, 1998 791

F.P. CABRAL, P.J.S. RAMOS, J.L. PENEDO, E. FREITAS, S.C. SILVEIRA & R. FERES JR. 3. DeLee, J.G. & Charnley, J.: Radiological demarcation of cemented sockets in total hip replacement. Clin Orthop 121: 20-32, 1976. 4. Devane, P.A., Robinson, E.J., Bourne, R.B. et al: Measurement of polyethylene wear in acetabular components inserted with and without cement. J Bone Joint Surg [Am] 79: 682-689, 1997. 5. Engh, C.A., Bobyn, J.D. & Glassnan, A.H.: Porous-coated hip replacement. The factors governing bone ingrowth, stress shielding, and clinical results. J Bone Joint Surg [Br] 69: 45-55, 1987. 6. Griffith, M.J., Seidenstein, M.K., Williams, D. & Charnley, J.: Socket wear in low friction arthroplasty of the hip. Clin Orthop 137: 37-47, 1978. 7. Gruen, T.A., Mcneice, G.M. & Amstutz, H.C.: Models of failure of cemented stem type femoral components. Clin Orthop 241: 17-27, 1979. 8. Hidley, A.K., Gruen, T.A., Borden, L.S. et al: Two year follow-up of the PCA noncemented total hip replacement, in The hip, Proceedings of the Fourteenth Open Scientific Meeting of The Hip Society, St. Louis, C.V. Mosby, 1987. p. 225-250. 9. Jones, L.C. & Hugerford, D.S.: Cement disease. Clin Orthop 225: 192-206, 1987. 10. Lennox, D.W., Schofield, B.H., McDonald, D.F. & Riley, L.H., Jr.: A histologic comparison of aseptic loosening of cemented, press-fit, and biologic ingrowth prostheses. Clin Orthop 225: 171-191, 1987. 11. Livermoore, J., Strup, D.H. & Morrey, B.: Effect of femoral head size on wear of the polyethylene acetabular component. J Bone Joint Surg [Am] 72: 518-528, 1990. 12. McKee, G.K. & Chen, S.C.: The statistics of the McKee-Farrar method of total hip replacement. Clin Orthop 95: 26-33, 1973. 13. Shaver, S.M., Brown, T.D., Hillis, S.L. & Callaghan, J.J.: Digital edgedetection measurement of polyethylene wear after total hip arthroplasty. J Bone Joint Surg [Am] 79: 690-700, 1997. 792 Rev Bras Ortop _ Vol. 33, Nº 10 Outubro, 1998