CARACTERIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO DO RESÍDUO DE ALGODÃO DA INDÚSTRIA TÊXTIL PARA A PRODUÇÃO DE CORPOS FRUTÍFEROS DE Pleurotus ostreatus DSM 1833. Marcos Holtz (Universidade da Região de Joinville - UNIVILLE / texocram@pop.com.br), Márcia Luciane Lange Silveira (UNIVILLE), Elisabeth Wisbeck (UNIVILLE) RESUMO - A espécie Pleurotus ostreatus, quando cultivado em resíduo lignocelulósico, como por exemplo palha de bananeira, produz cogumelos (corpos frutíferos) comestíveis de comprovado valor nutricional e medicinal. O resíduo de algodão de indústria têxtil (cerca de 8% do total do algodão processado) é inconveniente por ocupar grandes espaços e não possuir um destino ecologicamente correto. No presente trabalho, fez-se a caracterização e a utilização de resíduos de algodão provenientes de processos da indústria têxtil para produção de corpos frutíferos de Pleurotus ostreatus DSM 1833, com a conseqüente minimização de um problema ambiental (resíduo). Foram avaliados os teores de cinzas, umidade, hemicelulose, lignina, celulose, nitrogênio total, proteína bruta e fibra bruta dos resíduos ((1)-tecelagem e (2)-fiação). Avaliaram-se também os corpos frutíferos através da eficiência biológica (%) e perda de matéria orgânica (%). O resíduo (2) apresentou maiores teores de celulose (70,04%) e de lignina (7,98%) e o resíduo (1) os maiores teores de hemicelulose (15,39%), fibra bruta (11,77%) e umidade (9,05%). O melhor resultado em termos de eficiência biológica (8,5%) foi proporcionado pelo substrato da mistura 1:1 dos resíduos (1) e (2). A perda de matéria orgânica mais significativa ocorreu no resíduo da fiação (1) com perda de aproximadamente 36%. Palavras-chave: Pleurotus ostreatus, resíduo de algodão, caracterização. INTRODUÇÃO Com a abertura do mercado consumidor mundial, rápidas mudanças vêm exigindo das empresas maior racionalização, competitividade e modernização, tudo em busca de produtos com qualidade, menor custo e ecologicamente corretos. A indústria têxtil nacional vem sendo afetada por estas mudanças. A China, que produz atualmente apenas 17% dos produtos têxteis mundiais, já está ocasionando falência de indústrias, diminuição de vendas no mercado internacional e também no mercado nacional (LAHÓZ e CAETANO, 2005). Nos diversos processos da indústria têxtil são gerados diferentes tipos de resíduos com diferentes composições químicas. Os resíduos de algodão são gerados na fiação e na tecelagem e equivalem aproximadamente a 8% do total do algodão processado (LIMA, 1992) sendo, até então, pouco explorados. O resíduo de algodão é inconveniente por ocupar grandes espaços físicos e representar um sério problema para a indústria têxtil devido ao grande excedente acumulado nos aterros industriais, o que diminui consideravelmente a vida útil do mesmo. Sua utilização como fonte de combustível para caldeiras gera gases tóxicos, necessitando filtros especiais e de custo elevado. Uma alternativa para utilizar grandes quantidades de resíduos de algodão, de forma ecologicamente correta seria a produção de cogumelos comestíveis. Segundo Bonati (2001) o gênero Pleurotus tem-se mostrado eficiente na degradação de resíduos lignocelulósicos. São fungos saprófitos, degradadores de madeira, encontrados principalmente nas regiões tropicais e subtropicais, tendo o Brasil, portanto, um clima propício para seu desenvolvimento. A espécie Pleurotus ostreatus
colonizada em resíduos agroindustriais como, por exemplo, palha de bananeira, resulta em corpos frutíferos comestíveis com sabor característico agradável e comprovado valor nutricional e medicinal (CHANG, 1996). Com base no exposto, este trabalho teve como objetivo caracterizar e avaliar a utilização do resíduo proveniente da indústria têxtil (processo de fiação e de tecelagem) para a produção de Pleurotus ostreatus DSM 1833. Os parâmetros de produção foram avaliados em termos de eficiência biológica (%) e perda de matéria orgânica (%). Os resultados da proposta deste trabalho teve o intuito de gerar alternativas para minimizar um problema ambiental das indústrias têxteis que produzem este resíduo de algodão em grandes quantidades. MATERIAL E METÓDOS Microrganismo e manutenção - O microrganismo utilizado nos experimentos foi Pleurotus ostreatus DSM 1833. A cultura foi mantida em meio TDA (FURLAN et al., 1997). Produção de inóculo - O cultivo do inóculo foi realizado utilizando grãos de trigo como suporte para o crescimento do micélio fúngico (BONATTI, 2001). Preparo do substrato e condições de cultivo - Os fungos foram cultivados nos seguintes substratos: resíduo da fiação (1); resíduo da tecelagem (2); e uma mistura dos dois resíduos na proporção 1:1 (3). Foram preparados 11 pacotes de cada resíduo. Os substratos de algodão foram colocados em sacos de ráfia e imersos em água por 12 horas, posteriormente comprimidos manualmente e embalados na proporção de 150g massa seca de substrato. Cada pacote foi suplementado com 5% de farelo de arroz em relação à massa seca do substrato. Foram então pasteurizados em vapor d água durante um período de 4 horas (SCARIOT et al. 2001), resfriados e inoculados com 20% de inóculo de Pleurotus ostreatus em relação à massa seca de substrato. Os pacotes já inoculados foram incubados na ausência de luz. Após total colonização do fungo no substrato, aproximadamente 15 dias, os pacotes foram perfurados e transferidos para a câmara de frutificação, com controle automático de temperatura (± 25ºC) e iluminação (12 h/dia), sistema de umidificação (UR = 92 a 95%) e troca de ar no ambiente. O ponto de colheita foi realizado quando as margens do píleo dos corpos frutíferos apresentavam-se planas (STURION, 1994). Foi estabelecida a realização de dois fluxos produtivos. Os corpos frutíferos foram pesados para a determinação da massa úmida e desidratados a 40ºC, por 24 horas, para a determinação da massa de corpos frutíferos secos. Métodos de avaliação do desempenho do cultivo - Os parâmetros avaliados foram: eficiência biológica (EB %) e perda de matéria orgânica (PMO %). EB = Massa dos corpos frutíferos secos Massa do substrato seco x 100 PMO = = Massa seca do substrato inicial - Massa seca do substrato residual Massa seca do substrato inicial x 100
Determinação de cinza - O percentual de cinzas foi determinado através da metodologia descrita pela A.O.A.C. (1984), com auxilio da mufla para incineração a 600ºC. Determinação da umidade - O teor de umidade foi obtido pela metodologiada A.O.A.C.(1984), através da secagem definitiva da amostra em estufa a 105ºC até peso constante, em balança analítica. Determinação da hemicelulose - Segundo SILVA (1981), o teor de hemicelulose é calculado pela diferença entre a digestão da amostra em solução de fibra detergente ácido (FDA) e a solução de fibra detergente neutro (FDN). Determinação de lignina - O teor de lignina foi determinado segundo a metodologia proposta por SILVA (1981) para forrageiras. A amostra após ter sido oxidada com solução de detergente ácido (FDA) foi utilizada para análise de lignina. Foi calculado pela perda de massa da amostra em detergente ácido (FDA) em relação à oxidação com permanganato de potássio e solução desmineralizadora. Determinação de celulose - O teor de celulose, segundo metodologia proposta por SILVA (1981) para forrageiras, foi determinado pela diferença de massa entre o resíduo seco gerado através da análise de lignina e este mesmo resíduo calcinado em mufla à 500ºC por 2 horas. Determinação do nitrogênio total - O teor de nitrogênio total foi obtido utilizando-se o método de Kjedahl (semimicro), de acordo com a metodologia proposta pela A.O.A.C. (1984). Para a obtenção do nitrogênio total a análise se divide em três fases distintas: digestão, destilação e titulação. Determinação de proteína bruta - O teor de proteína bruta foi calculado através da multiplicação do teor de nitrogênio total pelo fator de correção de 6,25. Determinação de fibra bruta - O valor de fibra bruta foi obtido pela metodologiada A.O.A.C. (1984). RESULTADOS E DISCUSSÃO Observando-se a tabela 1 verifica-se que apenas nitrogênio total e proteína total não apresentaram diferença significativa entre os resíduos (1) e (2). O resíduo (2) apresentou maiores teores de celulose (70,04%) e de lignina (7,98%), tendo o resíduo (1) os valores de hemicelulose (15,39%), fibra bruta (11,77%), cinzas (4,92%) e umidade (9,05%) mais elevados que o resíduo (2). SCARIOT et al. (2000) ao caracterizarem o resíduo de algodão (pericarpo + fibras + tegumento da semente) obtido da Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas de Maringá (Cocamar), para a produção de Pleurotus ostreatus obtiveram valores em torno de 0,5% de nitrogênio e 2% de proteína, provavelmente devido à espécie de algodão e as condições de cultivo. Os baixos teores de nitrogênio (0,0011%) e proteína total (0,0069%) levaram à suplementação dos resíduos com farelo de arroz. Tabela 1. Caracterização dos resíduos da fiação (1) e da tecelagem (2). (%) Resíduo (1) Resíduo (2) Celulose 56,13 a 70,04 b Hemicelulose 15,39 a 5,03 b Lignina 2,72 a 7,98 b Fibra bruta 11,77 a 8,87 b Nitrogênio total 0,0011 a 0,0011 a Proteína Total (N x 6,25) 0,0069 a 0,0069 a Cinzas 4,92 a 1,88 b Umidade 9,05 a 6,20 b a e b indicam a existência ou não de diferença significativa entre os valores do resíduo (1) e resíduo (2) de acordo com o Teste ANOVA, com 95% de confiança.
Observando-se a Figura 1 é possível verificar os valores de eficiência biológica (%) obtidos por Pleurotus ostreatus nos resíduos (1), (2) e (3). O segundo fluxo produtivo é menor que o primeiro, nos três resíduos testados. O resíduo (3) favoreceu o maior valor de EB (8,5%), em dois fluxos produtivos (total). BONATTI (2001) chegou a 6,34% de eficiência biológica, com Pleurotus ostreatus cultivado em palha de bananeira, também com dois fluxos produtivos. Estas diferenças podem estar relacionadas com a quantidade de celulose (BONATTI, 2001) encontrada na palha de bananeira (48,9%), relativamente inferior a 63,08% obtida para o resíduo (3), através da média entre os resíduos (1) e (2). 10 8 1º Fluxo 2º Fluxo Total 6 EB (%) 4 2 0 Resíduo 1 Resíduo 2 Resíduo 3 Figura 1. Eficiência biológica (EB) para Pleurotus ostreatus com os resíduos (1), (2) e (3). Na Figura 2 estão apresentados os valores de perda de matéria orgânica (PMO) obtidas para Pleurotus ostreatus com os resíduos (1), (2) e (3) como substrato de cultivo. Verifica-se que o resíduo (1) perdeu mais matéria orgânica, 36% aproximadamente, e apresentou o maior crescimento micélial durante a fase de colonização do substrato. No entanto, este resíduo não apresentou maior EB, provavelmente, pelo fato da degradação do substrato ter sido devido ao micélio e não aos corpos frutíferos gerados. 50 45 40 35 30 PMO (%) 25 20 15 10 5 0 Resíduo 1 Resíduo 2 Resíduo 3 Figura 2. Perda de Matéria Orgânica (PMO) com os resíduos (1), (2) e (3).
CONCLUSÕES Os valores de nitrogênio total (0,0011%) e proteína total (0,0069%) são idênticos para os dois resíduos testados, devendo-se adicionar farelo de arroz aos resíduos para suprir a deficiência protéica. O resíduo que apresentou os melhores resultados em termos de eficiência biológica (8,5%), com dois fluxos produtivos, foi o resíduo (3), uma mistura na proporção (1:1) dos resíduos de fiação (1) e tecelagem (2). A maior perda de matéria orgânica (36%) foi obtida quando Pleurotus ostreatus degradou o resíduo (1). CONTRIBUIÇÃO PRÁTICA E CIENTÍFICA DO TRABALHO Diminuir a quantidade de resíduo de algodão da indústria têxtil (proveniente dos processos produtivos) nos aterros industriais e na utilização como fonte de energia (queima) em caldeiras, reutilizando assim o resíduo de forma ecologicamente correto, produzindo cogumelos comestíveis, possibilitando ainda renda e alimento para o pequeno agricultor. Tornar o resíduo depois de colonizado pelo fungo Pleurotus ostreatus digestível e rico em proteínas servindo como alimento para ruminantes. A caracterização do resíduo de algodão servirá de base para o início de novas pesquisas, como por exemplo, a geração de biogás. REFÊRENCIAS BIBLIOGRÁFICAS A.O.A.C. - OFFICIAL METHODS OF ANALYSIS OF THE ASSOCIATION OF ANALYTICAL CHEMISTS INTERNATIONAL. 100 ed. Arlington, 1984 BONATTI, Mariane. Estudo do potencial nutricional de cogumelos do gênero Pleurotus cultivados em resíduos agroindustriais. 2001. Dissertação (Mestrado em Engenharia Química) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. CHANG, S. Functional properties of edible mushrooms. Nutrition Reviews, v. 54, n.11, p.91-93, 1996 FURLAN, S.A.; VIRMOND, L. J.; MIERS, D.A.; BONATTI, M.; GERN, R. M. M.; JONAS, R. Mushroom strains able to grow at high temperatures and low ph values. World Journal of Microbiology Biotechnology, v.13, 1997. LAHÓZ, André; CAETANO, José Roberto. A China vai conquistar o mundo e sua empresa está na mira. Exame, São Paulo, v. 39, n. 9, p.20-35, maio. 2005. LIMA, Jorge José. Controle do processo de fiação. Rio de Janeiro: SENAI/CETIQT, 1992. SILVA, D. J. Análise de alimentos: métodos químicos e biológicos. Viçosa: Universidade Federal de Viçosa, 1981. SCARIOT, Marlei Roling; COSTA, S.M.G.; CLEMENTE, E. Composição química de cogumelos comestíveis cultivados em resíduo de algodão (Gossupium hirsutum L.). Acta Scientiarum, Paraná, v. 22, p.317-320, 2000. STURION, G. L. Utilização da folha de bananeira como substrato para o cultivo de cogumelos comestíveis (Pleurotus spp.). Piracicaba, 1994. 147f. Dissertação (Mestrado em Ciências dos Alimentos). Universidade de São Paulo.