CÂMARA DOS DEPUTADOS CONSULTORIA LEGISLATIVA ÁREA XXII - DIREITO PENAL, PROCESSO PENAL E PROCEDIMENTOS INVESTIGATÓRIOS PARLAMENTARES COMISSÃO ESPECIAL PL 4.850/16 ESCLARECIMENTOS DA RELATORIA SOBRE O REPORTANTE A função do reportante não é se dirigir a autoridades investigatórias, ou seja, à Polícia Judiciária e ao Ministério Público, para denunciar a ocorrência de crimes. Se fosse para isso, não haveria sentido se tratar da matéria, porque as leis atualmente em vigor já contêm disposições que prevêem esse mecanismo. 1) A delação sem o necessário contrapeso pode virar um conjunto de denúncias vazias contra pessoas de bem? Não se trata de delação (colaboração premiada), pois o colaborador é, sobretudo, um criminoso que negocia com o Estado o fornecimento de informações para apuração de ilícitos em troca da redução de sua pena e outros benefícios. O reportante não é um criminoso e, somente, realiza o relato de atos ou omissões de que tem notícia. Também não é considerado testemunha, muito embora a proposta lhe estenda a proteção do Programa de Proteção a Testemunhas previsto na Lei nº 9.807, de 1999. 2) Afirma-se que nos Estados Unidos existe um instrumento parecido, mas com punições severas. Por que o relator também não propôs punição exemplar para quem mentir ou não tiver provada a sua denúncia? O substitutivo prevê punições severas ao reportante que apresenta dolosamente informações ou provas falsas, de acordo com o art. 29, 5º. Se comprovada tal apresentação, o reportante perderá o direito às medidas
de proteção do programa, terá levantada a preservação de sua identidade e deverá responder por denunciação caluniosa, falso testemunho ou outros crimes, sem prejuízo de sua responsabilização civil e administrativa. Mencione-se ainda que a preservação da identidade do reportante não é ilimitada. Muito pelo contrário, o art. 29 do substitutivo prevê as hipóteses em que ocorrerá o levantamento da preservação da identidade do reportante: a) quando o levantamento contribuir para afastar dano ou perigo de dano ao meio ambiente, à saúde e à segurança públicas, ou a consumidores (art. 29, 1º); b) o reportante houver apresentado provas obtidas ilícitos (art. 29, 2º, II); c) for comprovada a falsidade de informação ou prova apresentada pelo reportante (art. 29, 2º, III). 3) A questão central para quem vive de imagem pública é: como fica o interregno entre a delação, monetariamente premiada, e o esclarecimento dos fatos? Primeiramente, não se trata de delação, como já exposto em resposta anterior. A sistemática para processamento do relato se dará da seguinte forma: a) a Comissão de Recebimento de Relatos terá o prazo de trinta dias para encaminhar os relatos que atendam aos requisitos formais mínimos e contenham elementos suficientes às autoridades fiscalizatórias e correcionais (art. 14, III e IV; art. 18, II); b) as autoridades fiscalizatórias ou correcionais receberão os relatos e procederão à apuração no prazo de sessenta dias, podendo esse prazo ser prorrogado uma vez por igual período (art. 21, caput); c) a retribuição ao reportante será fixada pela autoridade fiscalizatória ou correcional somente ao final da apuração, e se em razão do relato houver a aplicação de multas ou a determinação de reparação do dano (art. 50, caput); d) a fixação da retribuição ao reportante se dará ao final do procedimento administrativo de apuração, deverá obedecer a critérios objetivos (arts. 51 a 52), e deverá ser homologado pela Comissão de Recebimento de Relatos do Conselho Nacional do Ministério Público, do Conselho Nacional de Justiça ou do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria Geral da União (art. 15).
4) Eventual falsa denúncia será desde o início da acusação divulgada livremente? O Substitutivo prevê que o encaminhamento do relato preservará a identidade do reportante (art. 26, I) e manterá o sigilo do conteúdo do relato até sua chegada às autoridades fiscalizatórias e correcionais (art. 44, caput). No interesse do esclarecimento das informações relatadas, a autoridade fiscalizadora ou correcional, em decisão fundamentada, poderá determinar que a apuração seja conduzida reservadamente pelo prazo de 90 dias, prorrogável uma vez por igual período se houver necessidade devidamente justificada (art. 23, caput). Ademais, a divulgação das informações relatadas a terceiros antes da conclusão do respectivo procedimento fiscalizatório ou correcional não assegurará ao reportante a adoção das medidas de proteção ou incentivo ao programa (art. 24). Por fim, é protegido o sigilo das informações, dados e documentos que constituam indícios ou provas do ilícito relatado, que tenham sido transferidos pelo reportante à Comissão de Recebimento de Relatos (art. 44, caput), sendo mantido e inviolado o sigilo transferido à autoridade fiscalizadora ou correcional que receber a comunicação do relato (art. 44, 1º), e sujeito à responsabilização civil e penal, nos termos da lei, o reportante que após ter transferido dados e elementos sigilosos, divulga-los sem autorização administrativa ou judicial (art. 44, 2º). 5) Como não permitir que terceiros se valham de falsos denunciantes plantados para prejudicar as pessoas que têm vida pública? Conforme resposta da pergunta anterior, até a chegada às autoridades correcionais e fiscalizatórias o relato será mantido em sigilo, podendo-se haver determinação de que a apuração seja conduzida reservadamente pelo prazo de 90 dias, prorrogável uma vez por igual período em caso de necessidade devidamente justificada (art. 23, caput). Ademais, a divulgação das informações relatadas a terceiros antes da conclusão do respectivo procedimento fiscalizatório ou correcional não assegurará ao reportante a adoção das medidas de proteção ou incentivo ao programa (art. 24). Por fim, o art. 29, 5º, prevê a perda das medidas de proteção, o levantamento da identidade e a responsabilização por denunciação caluniosa, falso
testemunho, ou outros crimes, se o reportante apresentar informações ou provas falsas. 6) Estão dizendo que na primeira versão do relatório não havia sequer pena para denunciação caluniosa. Além do mais, na versão original, o reportante seria premiado com estabilidade no emprego e outras benesses mesmo que o relato não se confirmasse. Isso procede? De fato, a primeira versão do substitutivo previu a responsabilização penal do reportante, mas de forma genérica e não expressa. Na Comissão Especial, foi adotada a redação proposta para o art. 29, 5º, do Substitutivo, acolhendo-se a sugestão apresentada pelo deputado Valdir Collatto. A proteção ao reportante somente ocorrerá se o relato for recebido pela Comissão de Recebimento de Relatos e devidamente encaminhado para apuração (art. 25, caput), e subsistirá somente pelo prazo de um ano, contado da data do encerramento da apuração se ao final, se concluir pela inocorrência dos fatos relatados ou não houver a imposição de sanção de qualquer espécie. 6) Se não houver sigilo e punição elevada para quem falar sem provas, corremos o risco de a medida virar uma indústria de denúncia, em que a honra de muita gente boa pode ser destruída. Conforme dito nas respostas anteriores, haverá sigilo na Comissão de Recebimento de Relatos, que só será quebrado quando a autoridade fiscalizatória ou correcional efetuar a apuração das informações relatadas. São autoridades fiscalizatórias aquelas que, no âmbito da administração pública, possuem poder de polícia para realizar atividades de fiscalização. Podemos citar como exemplos o Ibama e a Delegacia da Receita Federal. Por sua vez, as autoridades correcionais são aquelas cujas atividades estão voltadas à correição nos órgãos e entidades públicos. São, por
exemplo, as corregedorias, controladorias e órgãos de correição semelhantes previstos em lei.