CÂMARA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE PROCURADORIA PROC. Nº 1073/10 PLL Nº 047/10 PARECER PRÉVIO É submetido a exame desta Procuradoria, para parecer prévio, o Projeto de Lei, em epígrafe, de iniciativa parlamentar que estabelece condições à concessão e à renovação do alvará de localização e funcionamento no qual se exerça atividade de cabeleireiro, pedicuro ou manicuro, no Município de Porto Alegre. O projeto em questão propõe que a concessão do alvará de localização e funcionamento para estabelecimento no qual se exerçam as atividades acima referidas seja condicionada à apresentação de: I- diploma ou certificado de realização de curso no qual o SINCA-RS registre ou declare a habilitação para o exercício da atividade; e II comprovante de recolhimento da contribuição sindical devida, conforme as disposições da CLT. É proposto ainda que a renovação do alvará seja condicionada a apresentação do comprovante referido no item II. A exigência do item I, portanto, alcançaria apenas os novos empreendimentos ou estabelecimentos. vejamos. Tais condicionantes são, ao nosso ver, inconstitucionais. Se não
Estabelece o art. 5º, inc. XIII da Constituição Federal que é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. Trata-se de norma de eficácia contida. Ou seja, o princípio é o da liberdade que só pode ser restringido por lei que exija determinadas qualificações profissionais. Advertindo-se que só lei federal poderá dispor a respeito, nos termos do art. 22, XVI da CF, que diz que compete privativamente à União legislar sobre:(...) condições para o exercício de profissões. Desse modo, o projeto em questão em seu art. 1º, inc. I acaba por invadir a competência da União, uma vez que condicionando a concessão de alvará de localização e funcionamento a apresentação de diploma ou certificado de realização de curso determina que só os profissionais que tenham realizado tais cursos possam exercer regularmente a profissão de cabeleireiro, pedicuro ou manicuro. Sendo que inexiste lei federal regulamentando a profissão de cabeleireiro, manicuro ou pedicuro. Aliás, o condicionamento em si à realização de tais cursos, já seria de constitucionalidade duvidosa mesmo que veiculada por lei federal, uma vez que o princípio é o da liberdade, de modo que apenas quando a atividade exija aptidão qualificada requerida pelo interesse superior da coletividade, para que esta não seja exposta a danos irreparáveis 1, é que esta autorizada restrição à liberdade profissional. Este, aliás, foi um dos fundamentos apresentados no veto, não derrubado, a projeto de Lei Federal 2 que pretendia regular a atividade de profissional de cabeleireiro autônomo, nos seguintes termos: Quando a Constituição Federal estabeleceu no inciso XIII, do art. 5º, que "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer", procurou restringir esta liberdade apenas às profissões cujo exercício esteja intimamente ligado à vida, à saúde, à liberdade, á educação, à honra e à segurança do cidadão, facultando ao legislador ordinário a adoção de determinadas condições de capacidade para o exercício de atividades ligadas a estes fins, o que não se vislumbra no presente caso. Donde se conclui que a sanção da proposição em pauta acarretaria violação do direito individual de exercício da atividade de cabeleireiro, malferindo o disposto no inciso XIII, do art. 5º da Constituição Federal, estando, portanto, eivado de inconstitucionalidade." 1 A respeito vide o RE 511.961/SP em que se pode ver bem a posição do STF, que se mantém atenta a cláusula de restrição só a admitindo em caso de razoável e justificada necessidade de qualificação profissional. 2 PL 107/92.
Da mesma forma, é inconstitucional condicionar a concessão ou a renovação do alvará de localização e funcionamento à exibição de comprovante da quitação contribuição sindical. Conforme visto a Constituição Federal consagra a liberdade de exercício profissional (art. 5º, XIII da CF) que só pode sofrer restrições ligadas a qualificação profissional. Ademais, é assegurado a todos o livre exercício de atividade econômica (art. 170, parágrafo único). É certo que o projeto nada mais faz do que repetir exigência já contida no art. 608 da CLT 3. Ocorre que tal dispositivo não foi recepcionado pela Constituição Federal exatamente por ir contra a liberdade profissional e o livre exercício de atividade econômica que esta assegura, conforme referido acima. Sobre o descabimento de tal exigência tem se pronunciado o TJ/RS, conforme os seguintes precedentes: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. PERMISSIONÁRIO DE TÁXI. REALIZAÇÃO DE VISTORIA E RENOVAÇÃO DO ALVARÁ DE TRÁFEGO. COMPROVAÇÃO DO RECOLHIMENTO DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. DESCABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATICIOS. REDUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Não pode a EPTC condicionar a realização da vistoria e a renovação do alvará de tráfego do permissionário de táxi à comprovação do recolhimento da contribuição sindical, porquanto tal exigência viola a norma constitucional que estabelece o livre exercício de qualquer atividade econômica. Eventual crédito oriundo da contribuição sindical deve ser cobrado por meio de ação própria e por quem tem legitimidade para tanto. 2. Não há falar em redução da verba honorária, quando estabelecida dentro dos parâmetros legais (art. 20 e parágrafos do CPC). APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70033648239, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Arno Werlang, Julgado em 10/03/2010) APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. TÁXI. VISTORIA MECÂNICA. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL PELA EPTC. DESCABIMENTO. Indevida a exigência da EPTC de comprovação 3 Art. 608 As repartições federais, estaduais ou municipais não concederão registro ou licenças para funcionamento ou renovação de atividades aos estabelecimentos de empregadores e aos escritórios ou congêneres dos agentes ou trabalhadores autônomos e profissionais liberais, nem concederão alvarás de licença ou localização, sem que sejam exibidas as provas de quitação da contribuição sindical, na forma do artigo anterior.
do prévio pagamento da contribuição sindical, prevista no artigo 608 da CLT, para a realização da vistoria mecânica ou renovação de alvará de tráfego por permissionário de táxi do Município de Porto Alegre, tendo em vista que inviabiliza o livre exercício da profissão. RECURSO PROVIDO. VOTO VENCIDO. (Apelação Cível Nº 70034068577, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 20/01/2010) No mesmo sentido, conforme registrou o Ministro Celso de Melo, no RE 374.981-RS, (...) o Supremo Tribunal Federal, tendo presentes os postulados constitucionais que asseguram a livre prática de atividades econômicas lícitas (CF, art. 170, parágrafo único), de um lado, e a liberdade de exercício profissional (CF, art. 5º, XIII), de outro - e considerando, ainda, que o Poder Público dispõe de meios legítimos que lhe permitem tornar efetivos os créditos tributários -, firmou orientação jurisprudencial, hoje consubstanciada em enunciados sumulares (Súmulas 70, 323 e 547), no sentido de que a imposição, pela autoridade fiscal, de restrições de índole punitiva, quando motivada tal limitação pela mera inadimplência do contribuinte, revela-se contrária às liberdades públicas ora referidas (...). Isso posto, com a inconstitucionalidade do art. 1º do projeto de lei em questão, conforme exposto acima, as demais disposições, por decorrência lógica, perdem a razão de ser prejudicando todo o projeto. É o parecer que submeto à apreciação superior. Em 15 de abril de 2010. Fábio Nyland Procurador OAB/RS 50.325