Edyene Moraes dos Santos



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Transcrição:

INDEPENDÊNCIA, PODERES LOCAIS E A ORGANIZAÇÃO DO Edyene Moraes dos Santos (mestranda pela UFPB) Resumo: A organização de um Estado Nacional pós-independência vinculou-se à reorganização das elites nacionais em torno das novas estruturas administrativas o qual o poder central procurou implementar nas primeiras décadas pós-22. No Maranhão, a participação de setores da elite colocava em destaque não apenas a rivalidade política e ideológica entre portugueses e nacionais, mas situava também em campos opostos a jurisdição do Estado recém emancipado diante dos poderes locais. As disputas em torno da centralização/ descentralização do poder, assim como o monopólio do Estado diante da liberdade privada foram a tônica dos debates a partir do vácuo de poder estabelecido pela Independência, evidenciando o nascimento de um Estado em constante confronto com as elites locais. A experiência da emancipação 1 política, embora consistisse de um caráter muito mais conceitual que prático, exigiu a construção de uma base administrativa que coadunasse os interesses dos setores da elite envolvidos no processo de Independência 2, assim como toda a estrutura operacional estabelecida e alicerçada durante o período colonial. O discurso de construção de um Estado Nacional proferido para e pelas elites dirigentes edificava um 1 O conceito de emancipação significou pós-1822 a qualidade jurídica do Brasil a partir de 1815 como emancipada do estatuto de colônia a partir da elevação a reino (OLEIRA, 2006: 390). 2 Para as elites o sentido de Independência ganhava um contorno diferenciado, uma vez que, antes de 1822 indicava o poder da sociedade para elaborar leis que deveriam estabelecer as relações políticas e mercantis entre os homens livres (OLEIRA, 2003: 390). Apenas após 1822 esse termo passou a designar o rompimento com a metrópole. 1

sentido de ressurgimento ou renascimento de uma nova nação, cujo percurso deveria ser traçado na direção oposta de sua condição jurídica anterior. A idéia de mudança, agregada ao ideal de liberdade, fora largamente proclamada pósemancipação, reforçando a construção (ao menos teoricamente) de projeto político-administrativo distinto da organização política portuguesa, uma vez que:... O Brasil distinto por esforços de todos os gêneros, e por aquela tenacidade, e varonil obstinação, que constitui o grande caráter dos movimentos políticos, mudou repentinamente a sua organização social 3, e mostrou à posteridade por lições terríveis, e tocantes, que ele era digno de representar no Teatro do Mundo, como Nação livre, e ele é irrevogavelmente (ARQUO, 1973: 21) De um território sob jurisdição portuguesa, cuja transferência do modelo administrativo lusitano, assim como política e social, fora implantado e adaptado de acordo com os caracteres locais e com a estratégia de ocupação e exploração das terras conquistadas, a possibilidade de que a nova Nação pudesse mudar repentinamente sua organização social, exacerbava não só a viabilidade dessa transformação de fato, mas também o sincero desejo das elites dirigentes de que isso viesse a acontecer na prática. Uma mudança radical de todas as esferas institucionais representava, dentro de um contexto político-administrativo pré-estabelecido, perdas de várias formas para os setores dirigentes nas primeiras décadas do século XIX. O caráter heterogêneo dessas elites nacionais no que se refere às suas posições políticas, condições econômicas, espaço jurisdicional e defesa ideológica levavam para o debate da construção do novo Estado a partir das cinzas da administração colonial (CARVALHO, 1996: 178) a discussão quanto ao nível de fragmentação de interesses e a dificuldade de alicerçamento do mesmo, e que para tanto, segundo Dolhnikoff: 3 Grifo meu 2

... a unidade e a construção do Estado foram possíveis não pela ação de uma elite bem formada, articulada ao governo central, mas graças a um arranjo institucional que foi resultado de embates e negociações entre as várias elites regionais que deveriam integrar a nova nação (DOLHNIKOFF, 2003:432). Desse modo, diante dos resquícios da administração colonial, o ato de negociação com as aleites regionais demonstrava política e socialmente um reaproveitamento das forças já estabelecidas pós-1822, procurando uma readequação ao momento político em andamento. Nesse contexto, no Maranhão, o discurso de mudança encabeçado por essas mesma elites possuía um sentido diverso (mas não exatamente contrário) da idéia de substituição total dos alicerces políticos a partir de implementação de novíssimas estruturas. A idéia de mudança configura-se, dentro da perspectiva que quem participara ativamente do processo, mais próximo ao sentido de liberdade, de reconquista, de maturidade política (ARQUO, 1973:26), considerando que, em geral, eram as mesmas elites nacionais do período colonial que reivindicavam seu espaço na recém-emancipada nação. A formulação dessa idéia de liberdade/mudança recaía na necessidade de demonstração do nível de preparo e responsabilidade diante de sua nova condição:... a nossa emancipação, ou declaração de nossa maioridade é filha da natureza, e frisa tanto com as nações, quanto frisa com os homens, que e marcada quadra da vida deixam os tetos paternos, e formam novas famílias (...). O Brasil, antiga feitoria de Portugal, assaz tem sofrido em silencio por longos anos os crassos erros, insolência do antigo governo, e hoje ensinará ao mundo inteiro que ele sabe prezar a liberdade, e a reassumir os seus direitos (ARQUO, 1973:26) 4 Produzido em 11 de agosto de 1823, na Vila de Santo Antônio de Alcântara (atual município de Alcântara), o documento supracitado desvirtua a 4 Grifos meus 3

idéia de tempo em favor de uma concepção de mudança/liberdade que nega a organização político-administrativa e social anterior convocando novos tempos prefigurados no advento do Império. O que é demonstrado como antiga feitoria e o antigo governo remontam a apenas um pouco menos de um ano após a data oficializada da emancipação: o antigo e o novo separados por um espaço de tempo efêmero e resignificado. Note-se, no entanto, que a negação do passado enquanto lembrança do Brasil como antiga feitoria revela-se somente em um nível discursivo, uma vez que boa parte das instituições coloniais são mantidas, agora apenas sob o auspício de que deveriam, em tese, ter um caráter nacional (leia-se a determinação da exclusão dos portugueses dos cargos eletivos). Havia, portanto, necessidade de manutenção da unidade do novo Estado pós-22 e a coesão das elites nacionais em torno de um projeto político que articulasse a presença e fortalecimento do poder central em consonância com os interesses dos setores da elite envolvidos no processo. De modo geral, para um melhor empreendimento da centralização do Império, medidas foram tomadas no tocante à administração provincial enunciadas dentro do conjunto de mudanças alardeadas para a construção de um novo Estado. Assim, os antigos governadores das capitanias ganharam o título de presidente de província (também em substituição das Juntas Provisórias Governativas), auxiliado pelo vice-presidente e pelo Conselho de Província. O Conselho de Província em sua organização era constituído por membros das principais famílias da província, de onde, por sua vez, era escolhido o vice-presidente. Com exceção do presidente provincial, designado pelo governo central e geralmente originário de outra província, todos os demais membros do Conselho constituíam a elite local cuja influência tinha raízes desde o período colonial. (ASSUNÇÃO, s/d). Tentava-se criar uma nova estrutura, porém assentada em bases antigas. A diferenciação encontrava-se na relação com o 4

poder central, nesse momento e a partir da Carta Constitucional de 1824, de maior centralização das atribuições administrativas em torno do imperador: A Carta outorgada seria e exemplificação do esgarçamento de quaisquer reivindicações sociais de cunho revolucionário, manifestando pretensões absolutistas do governante e um consenso entre elites coloniais e portugueses radicados na América após 1808 em torno de projeto de reinado conservador, tributário em grande parte da heranças políticas e institucionais legadas pelos treze anos de permanência da Corte de Bragança no Rio de Janeiro (OLEIRA, 2006:47). No poder local manteve-se a estrutura formada pelas Câmaras Municipais, os juízes e os chefes militares e a polícia (ASSUNÇÃO, s/d). No tocante às atribuições da Câmara, desde o período colonial tangenciava as funções político-administrativas, judiciais, fazendárias e de polícia (ARQUO, 1985:69). De acordo com sua forma de organização: As Câmaras eram formadas através de processo eleitoral, de que participavam, como eleitores e candidatos aos cargos, apenas os homens bons da localidade. As eleições efetuavam-se a cada três anos e nelas eram escolhidos os que, durante um ano, alternadamente, serviriam nos cargos de juízes ordinários, vereadores, procuradores, tesoureiros e juiz de órfãos, este último em apenas alguns municípios (ARQUO, 1985: 70). Composta pelos principais membros das elites locais, as Câmaras conviviam com os resquícios da administração colonial, agora adaptada às novas perspectivas dos grupos dirigentes nacionais em torno do espaço de poder aberto pela ausência (ao menos maciçamente) dos grupos portugueses. A reforma liberal de 1828 tencionou a descentralização e fortalecimento das justiças locais, ampliando, portanto, o poder dos grupos familiares locais, ampliando a tentativa de associação dos interesses dos grupos políticos locais e o projeto político Imperial, possibilitando a unidade e 5

afastando as ameaças de revoltas populares. Segundo proposta semelhante, o Ato Adicional de 1834, agregava os interesses envolvidos, reforçando a idéia de manutenção do espaço de atuação do Imperador, embora respeitando a autonomia provincial: Justamente porque no modelo consagrado a partir da década de 1830 (...), a autonomia convivia com um centro de força suficiente para garantir unidade é que se pode atribuir a esse regime características federalistas, considerando que o federalismo é, como define Preston King, um arranjo institucional adotado como estratégia de construção do Estado, cuja principal característica é a coexistência de dois níveis autônomos de governo (regional e central), definidos constitucionalmente. Enquanto o centro assume a responsabilidade do governo nacional, as instâncias regionais respondem pelos assuntos locais. Além disso os grupos regionais têm capacidade de interferir nas decisões do centro, mediante sua participação em uma das duas câmaras que compõem o parlamento. Todos esses elementos estavam presentes no modelo adotado e m 1834, quando foi provada a emenda constitucional que o consagrava, o chamado Ato Adicional (DOLHNIKOFF, 2003: 433-434). O debate em torno da centralização/ descentralização ocupou as discussões políticas dos primeiros momentos pós- 1822 e, uma vez que a ameaça de recolonização e de retorno dos portugueses aos principais postos de mando 5 já não preocupava, era agora necessário garantir a participação mais efetiva das elites nacionais no contexto político do Império. Nesse sentido, a nova nação deparava-se com algumas questões a serem contempladas: a preservação de uma unidade sob a insígnia de um Estado forte e centralizado que, ao mesmo tempo, respeitasse as autonomias regionais, preservando ainda os interesses particulares. Diante da experiência monárquica, as elites estavam 5 No Maranhão, a documentação oficial logo após a emancipação demonstra certo temor das elites locais quanto ao retorno dos portugueses aos seus postos nos cargos eletivos. Em documento produzido pela Junta Provisória Governativa contendo instruções para as eleições objetivando a composição de um governo civil, há a expressa proibição de elegibilidade de portugueses. Somente eram admitidos como votantes aqueles lusitanos que comprovadamente tivessem jurado a Independência e o Império. 6

preocupadas, com a extensão do poder público e com as repercussões da intervenção do Estado nas liberdades individuais e na esfera de atuação privada (OLEIRA, 2006:48). As articulações precisas entre Estado instituído, liberdades/ interesses individuais e a preservação das autonomias regionais representou a tônica dos debates em torno da pronunciada mudança, e que, de certa forma, serviu para enfatizar a adequação do Estado a uma base de poder já firmemente estabelecida, configurada nas elites nacionais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIA ASSUNÇÃO, Mathias Rohring. Estruturas de Poder e evolução política (1800-1841). Mimeo. ARQUO, Conselho Federal de Cultura. As Câmaras Municipais e a Independência. Província do Maranhão. Vol. I, 1973. ARQUO. Fiscais e Meirinhos: administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem. Rio de Janeiro: UFRJ, 1996. DOLHNIKOFF, Miriam. Elites regionais e a construção do Estado Nacional. In: JANCSÓ, István. (org.). Brasil: formação do Estado e da Nação. São Paulo: Hucitec; Ed. Unijú; Fapesp, 2003. OLEIRA, Cecília Helena de Salles. Tramas políticas, redes de negócios.. In: JANCSÓ, István. (org.). Brasil: formação do Estado e da Nação. São Paulo: Hucitec; Ed. Unijú; Fapesp, 2003.. Teoria política e prática de governar: o delineamento do Estado imperial nas primeiras décadas do século XIX. In: OLEIRA, 7

Cecília Helena de Salles et all (orgs). A história na política, a política na história. São Paulo: Alameda, 2006. FONTE CONSULTADA MAPA demonstrativo dos Distritos e Assembléias Paroquiais com suas respectivas populações para guiar próximas eleições de Deputados para Assembléia Geral Constituinte Legislativa do Brasil. 24-09-1823. Anotações da Junta provisória indispensáveis às mesmas eleições e instituições para instalação do novo governo civil. Maranhão, 30-09-1823. 03 fls. 8