CONTRIBUIÇÃO DA TELA METÁLICA PARA O INCREMENTO DA RESISTÊNCIA À TRAÇÃO NA FLEXÃO DE REVESTIMENTOS DE ARGAMASSA G. R. ANTUNES A. B. MASUERO D. H. KLEBER Aluna de Doutorado Profª. Eng.ª Civil Aluno de Graduação NORIE, UFRGS NORIE, UFRGS Eng. Civil, UFRGS Porto Alegre; Brasil Porto Alegre; Brasil Porto Alegre; Brasil engcivil.giselle@gmail.com angela.masuero@ufrgs.br davi.h.kleber@gmail.com RESUMO No cenário brasileiro, muito corriqueiramente, telas metálicas são indicadas em revestimentos de fachadas com a função de melhorar a resistência à tração da argamassa, evitar a formação de fissuras perceptíveis a olho nu e garantir o adequado desempenho do sistema. No sentido de verificar a amplitude do acréscimo de resistência conferido à argamassa através do uso da tela, utilizou-se nesta pesquisa do ensaio de tração na flexão em 4 pontos comparando o desempenho da argamassa sem tela com argamassa armada reforçada com tela metálica. Para tanto, foram moldadas 8 amostras de (15x30) cm², com 5 cm de espessura, sendo 4 contendo a argamassa industrializada e outras 4 com a argamassa armada no meio da espessura por tela metálica eletrossoldada galvanizada, de malha quadrada (25x25) mm² e diâmetro de fio de 1,24 mm. O ensaio proposto mostrou-se capaz de avaliar a contribuição da tela metálica no reforço de revestimentos. 1. INTRODUÇÃO O cenário atual da construção civil brasileira tem se caracterizado pelo uso crescente de novos materiais, componentes e tecnologias construtivas. Simultaneamente, a adoção de novas técnicas em detrimento a pouca abordagem científica e às falhas de projeto, execução e planejamento de obra têm colaborado para a ocorrência de manifestações patológicas. Lamentavelmente, como consequência, tem-se verificado a recorência cada vez maior da perda da estabilidade de revestimentos de argamassa aplicados sobre fachadas, indício preocupante da carência técnica nesta área da tecnologia construtiva. Nestes tempos em que a preocupação com o usuário é um fator decisivo também durante a especificação de materiais e escolha de técnicas construtivas, torna-se indispensável prevenir a incidência de danos sobre os revestimentos externos das edificações, já que estes são a parte mais notável e retrato da qualidade construtiva da mesma. Sabe-se que a condição de carregamento de uma fachada, usualmente, se dá pela ação combinada de esforços intrínsecos às características físicas e mecânicas dos materiais constituintes do revestimento, vedação, estrutura e fatores externos, cuja manifestação pode ser através de movimentos reversíveis ou irreversíveis (figura 1).
Figura 1: Solicitações impostas ao revestimento de fachada das edificações (Fonte: ABCP, 2012). Ribeiro (2006) ressalta que as intempéries destacadas pela variação da temperatura ao longo do dia e eventuais choques térmicos, atuação das chuvas e ventos, têm associados a elas movimentos térmicos e higroscópicos reversíveis (cíclicos). Apresenta como principais movimentos irreversíveis, a EPU (expansão por umidade) das placas cerâmicas, a retração das camadas de argamassa, movimentos da estrutura de concreto (peso próprio, fluência, retração). A capacidade de absorver deformações é uma característica imprescindível para todas as camadas que compõem o revestimento externo, uma vez que a edificação diariamente está sujeita às mais diferentes solicitações (de origem térmica, hidráulica, etc.) que geram, por sua vez, movimentações diferenciais entre os componentes (Das Chagas, 2009). Por outro lado, sabe-se que a argamassa de emboço tem como constituinte principal o cimento que é um material que apresenta elevada rigidez. Existem diversas técnicas construtivas utilizadas como alternativa de reforço e/ou reabilitação, em regiões potencialmente fissuráveis do revestimento, seja ele composto apenas por camadas de argamassa, seja ele revestido com placas cerâmicas. Entre estas técnicas ressalta-se o uso de telas metálicas, com o propósito de agregar propriedades ao mesmo, uma vez que incrementa resistência à tração na argamassa, evita a formação de fissuras perceptíveis a olho nu e garante o desempenho do sistema. Este uso no Brasil é amparado por uma normalização ainda incipiente, cujas recomendações, no entanto, exigem estudos científicos mais aprofundados para a verificação da eficiência deste reforço em argamassa. A NBR 7200 (ABNT, 1998) indica o uso de tela metálica, plástica ou de outro material semelhante na junção da base sempre que ela for composta por diferentes materiais e for submetida a esforços que gerem deformações diferenciais (tais como balanços, platibandas e últimos pavimentos). E a NBR 13755 (ABNT, 1996) que se limita a indicar o uso de tela metálica soldada, constituída de fio com diâmetro igual ou superior a 2 mm e malha com abertura quadrada de (5x5) cm², inserida na camada de argamassa de regularização ou no emboço, e ancorada na estruturasuporte; sempre que a espessura necessária, a partir do chapisco até o tardoz da placa cerâmica, for superior a 25 mm, cuja função é inibir a retração. A resistência por parte da tela aos esforços apresentados por ambas as normas deve ser comprovada, no entanto o tipo de ensaio a ser utilizado para esta comprovação não é explicitado. Para contornar esta lacuna, neste trabalho utiliza-se do ensaio de tração na flexão em 4 pontos elaborado por Antunes et al. (2014), para avaliar o desempenho de argamassas armadas, reforçadas com tela metálica comparadas com argamassas comuns, sem uso de reforço, de modo a verificar a amplitude do acréscimo de resistência conferido à argamassa através do uso da tela. A proposta de ensaio utilizada neste trabalho também contribui para avaliação do requisito de desempenho exposto no item 7.2, da NBR 15575-4 (ABNT, 2013), que trata dos deslocamentos, fissuras e falhas nos sistemas de vedações verticais internas e externas, atendendo a esta exigência recente da normalização brasileira. 2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 2.1 Descrição do ensaio Este trabalho se propôs a avaliar o incremento de resistência à tração na flexão, que representa um dos principais esforços impostos em fachadas, que o uso de tela metálica proporciona a revestimentos de argamassa reforçados com 2
tela metálica. Para tanto, adotou-se a metodologia apresentada por Antunes et al. (2014). Foram moldadas 8 amostras de (15x30) cm² com 5 cm de espessura, sendo 4 contendo argamassa industrializada e outras 4 com argamassa armada no meio da espessura por tela metálica eletrossoldada galvanizada, de malha quadrada (25x25) mm2 e diâmetro de fio de 1,24 mm. (ver figura 2). (a) (b) (c) (d) Figura 2: Moldagem dos corpos de prova para o ensaio de tração na flexão da argamassa reforçada com tela metálica, a) tela metálica cortada, b) fôrma utilizada, c) adensamento da amostra, d) regularização da amostra (Fonte: Próprio autor). Antecedeu-se o ensaio principal pela caracterização em separado dos materiais utilizados para confecção dos corpos de prova do ensaio de tração na flexão: tela metálica e argamassa industrializada, como se observa na figura 3. O corte da tela foi padronizado de forma que, tendo a dimensão de (15x30) cm², todas possuiam 6 fios longitudinais e 11 fios transversais. E a argamassa foi moldada com acréscimo de 5,7 litros de água, para cada 40 kg de argamassa industrializada, conforme indicado pelo fabricante. (a) (b) (c) Figura 3: Ensaios de caracterização da argamassa, a) módulo de elasticidade, b) densidade de massa no estado endurecido, c) ensaio tração na flexão, d) ensaio de compressão (Fonte: Próprio autor) (d) 3
De modo a avaliar a capacidade do sistema de argamassa reforçada com tela metálica resistir à ruptura quando submetido ao esforço de tração na flexão em 4 pontos, adotou-se a velocidade de carregamento igual a 0,05 kn/s, conforme indicado na NBR 13279 (ABNT, 2005), para ensaiar os corpos de prova do ensiao principal deste artigo, ver figura 4. (a) (a) (b) (c) Figura 4: Execução do ensaio de tração na flexão de argamassa reforçada com tela metálica (Fonte: Próprio autor) 3. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS Neste item os resultados obtidos, no ensaio de resistência à tração na flexão da argamassa reforçada com tela metálica são apresentados e seguidos das respectivas discussões. Para melhor avaliação dos resultados obtidos nos ensaios desenvolvidos nesta pesquisa foram utilizados tratamentos estatísticos. No que tange os resultados de caracterização da tela metálica adotada após submetê-la ao ensaio de tração simples conforme Antunes et al. (2013) se registrou uma carga máxima média de 4,50 kn, com desvio padrão de 0,15, e um coeficiente de variação de 3,44%, valores considerados reduzidos em se tratando de ensaios com materiais metálicos. Quanto ao limite de resistência, este foi de 452,86 MPa, com desvio padrão de 31,18 e um coeficiente de variação de 6,89%, evidenciando um rigoroso controle de qualidade na produção da tela (tabela 1). Tabela 1 Caracterização da tela metálica quanto à tração Características quanto à tração da tela metálica Corpo de prova Carga máxima (kn) Limite de resistência (MPa) Quantidade e locais de ruptura 1 4,6 462,92 4 pontos no fio 2 4,2 422,67 5 pontos no fio 3 4,5 452,86 5 pontos no fio 4 4,6 462,92 4 pontos no fio 5 4,6 462,92 4 pontos no fio 6 4,5 452,86 4 pontos no fio Média 4,5 452,86 Rupturas no Rupturas na Desv. Pad.: 0,15 31,18 fio (%) solda (%) CV (%): 3,44 6,89 100 0 *CV=Coeficiente de Variação Neste estudo optou-se pela utilização de argamassa industrializada de modo a reduzir o número de variáveis neste estudo. Em se tratando da caracterização do comportamento da argamassa industrializada utilizada nesta pesquisa, indicada pelo fabricante para múltiplo uso, inclusive revestimento externo, realizaram-se diferentes ensaios considerando os principais parâmetros sugeridos pela normalização brasileira, apresentados na tabela 2. 4
Tabela 2 Caracterização da argamassa industrializada utilizada Ensaio Norma Resultado Desvio médio padrão CV (%) Índice de NBR 13276 283,30 consistência (ABNT, 2005) mm 0,32 1,13 Densidade de massa NBR 13280 1771,91 no estado endurecido (ABNT, 2005) kg/m³ 4,68 0,26 Módulo de NBR 15630 12558,29 elasticidade dinâmico (ABNT, 2009) MPa 124,18 0,99 Resistência à NBR 13279 compressão (ABNT, 2005) 4,99 MPa 0,53 10,62 Resistência à tração NBR 13279 na flexão (ABNT, 2005) 2,42 MPa 0,35 14,41 *CV=Coeficiente de Variação Quanto ao ensaio principal, o de tração na flexão em 4 pontos, para ambos os tipos de corpos de prova, com e sem reforço com tela metálica, a carga foi aplicada sobre eles, continuamente e sem choques, com velocidade constante até a ruptura da argamassa. Em todas as amostras observou-se que o processo fissuratório ocorreu entre os apoios inferiores do dispositivo de ensaio. Procedeu-se com a ruptura dos 4 corpos de prova composto apenas por argamassa industrializada, conforme apresentado na tabela 3. Tabela 3 Caracterização da argamassa sem tela quanto à tração na flexão Corpo de prova Carga de ruptura (N) Tensão de tração na flexão (MPa) 1 3652,00 2,34 2 3751,00 2,40 3 4184,00 2,68 4 3507,00 2,24 P média (N): 3773,50 σtf média (MPa): 2,42 Desv. Pad.: 291,43 Desv. Pad.: 0,19 CV (%): 7,72 CV (%): 7,72 *P=Carga; σtf=tensão de tração na flexão; CV=Coeficiente de Variação Registrou-se para os corpos de prova de argamassa industrializada uma carga máxima de ruptura média de 3773,50 N, desvio padrão de 291,43 N e um coeficiente de variação igual a 7,72%. Quanto à resistência à tração na flexão atingida, esta foi de 2,42 MPa, com desvio padrão de 0,19 MPa e um coeficiente de variação de 7,72%, demonstrando uma reduzida variabilidade do ensaio. A ruptura de todos os corpos de prova ocorreu de forma brusca, como é de se esperar para materiais rígidos. Os resultados de caracterização da argamassa armada com reforço de tela metálica quanto à tração na flexão estão mostrados na tabela 4. Tabela 4 Caracterização da argamassa armada quanto à tração na flexão Corpo de prova Carga de ruptura (N) Tensão de tração na flexão (MPa) 1 6634,00 4,25 2 6621,00 4,24 3 6293,00 4,03 4 6930,00 4,44 P média (N): 6619,50 σtf média (MPa): 4,24 Desv. Pad.: 260,27 Desv. Pad.: 0,17 CV (%): 3,93 CV (%): 3,93 *P=Carga; σtf=tensão de tração na flexão; CV=Coeficiente de Variação 5
Através da observação dos principais parâmetros referentes à caracterização da argamassa reforçada com tela metálica, apresentados anteriormente na tabela 4, registrou-se uma carga máxima de ruptura média de 6619,50N, desvio padrão de 260,27 N e um coeficiente de variação igual a 3,93%. Quanto à resistência à tração na flexão atingida, esta foi de 4,24 MPa, com desvio padrão de 0,17 MPa e um coeficiente de variação de 3,93%, demonstrando uma reduzida variabilidade do ensaio. Nestes casos a fissuração ocorreu gradativamente, e as partes de argamassa nos estágios iniciais em que o esforço era aplicado não se desprendiam do todo, diante da presença da tela metálica. Observou-se que a utilização da tela metálica na argamassa, considerando a tensão de tração na flexão média, promoveu um aumento da resistência média em 1,82 MPa, ou seja, um incremento em torno de 75,21%, que suavizou as tensões responsáveis pela formação de fissuras e evitou o desprendimento de grandes partes da argamassa nos corpos de prova. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Observou-se que o uso da tela metálica aliviou a ruptura dos corpos de prova de argamassa, enquanto que a ruptura dos corpos de prova contendo apenas argamassa industrializada se deu de forma brusca. Levando isso para um uso real de revestimentos de argamassa armada espera-se que o uso de tela metálica, minimize o processo de fissuração, e com a proximidade do fim de vida útil do sistema, mesmo que se tenha dado início ao processo de fissuração, haja tempo hábil para uma intervenção de reparo do mesmo, sem que se desprendam grandes partes do revestimento de argamassa, evitando risco ao usuário. Verificou-se que o uso de tela metálica promoveu um incremento de 75,21% da resistência à tração na flexão da argamassa. Desta forma evidenciou-se a importante contribuição do uso da tela metálica no que tange o desempenho de sistemas de revestimentos de argamassa. Demonstrou-se também a facilidade de aplicação da metodologia adotada como uma alternativa válida, diante da sua reduzida variabilidade, para avaliar o a interação argamassa/tela metálica usada em revestimentos. 5. AGRADECIMENTOS Os autores expressam seus agradecimentos ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES, pelo suporte financeiro. Ao Laboratório de Materiais e Tecnologia do Ambiente Construído LAMTAC pela disponibilização de equipamentos, apoio dos servidores e ao Núcleo Orientado para a Inovação da Edificação NORIE por apoiar estudos e pesquisas desenvolvidas pelo grupo de tecnologia de materiais e sistemas construtivos. 6. REFERÊNCIAS [1] Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP). Curso piloto de informações para operários e encarregados - revestimento de argamassa, 2012. Disponível em: <http://www.comunidadedaconstrucao.com.br/upload/ativos /113/anexo/argamassa.pdf>. Acesso em: 28 de setembro de 2012 [2] RIBEIRO, F. A. Especificação de juntas de movimentação em revestimentos cerâmicos de fachadas de edifícios: levantamento do estado da arte, 2006. São Paulo: Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. [3] DAS CHAGAS, S. V. M. Estudo e proposta de um modelo de resistência à fadiga de argamassa de revestimento em estado plano tridimensional de tensões, 2009. Brasília: Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília, 272 p. [4] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 7200: Execução de revestimento de paredes e tetos de argamassas inorgânicas - Procedimento. Rio de Janeiro, 1998. [5] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 13755: Revestimento de paredes externas e fachadas com placas cerâmicas e com utilização de argamassa colante Procedimento. Rio de Janeiro, 1996 [6] ANTUNES et al., Avaliação do desempenho de argamassa reforçada com tela metálica através do ensaio de tração na flexão, XV Encontro Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído, Maceió, 2014, 10 p. [7] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 15575-4: Edificações habitacionais Desempenho Parte 4: Requisitos para os sistemas de vedações verticais internas e externas SVVIE. Rio de Janeiro, 2013. [8] ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 13279: Argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos Determinação da resistência à tração na flexão e à compressão. Rio de Janeiro, 2005. [9] ANTUNES et al., Estudo comparativo de resistência à tração em telas metálicas Gramado adotadas no reforço de argamassa, 55º Congresso Brasileiro do Concreto, IBRACON, 2013, 10 p. 6