A ORDEM NOBRE MEDIEVAL E SUA RELAÇÃO COM O PODER E A SABEDORIA. MEDIEVAL NOBLE ORDER AND ITS RELATION WITH THE POWER AND WISDOM.

Documentos relacionados
Os antecedentes do Estado de Direito e as matrizes clássicas. Profa. Nina Ranieri 2017

PREPARATÓRIO ESPCEX HISTÓRIA GERAL. Aula 4 O Absolutismo

ABSOLUTISMO E MERCANTILISMO. Profª Viviane Jordão

Origens do Estado-Nação

Estratificação, Classes Sociais e Trabalho. Sociologia Profa. Maria Thereza Rímoli

O ANTIGO REGIME AS RAÍZES DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

FEUDALISMO. CONCEITO: Modo de Produção que vigorou na Europa Ocidental durante a Idade Média e que se caracteriza pelas relações servis de produção.

ORGANIZAÇÃO INDUSTRIAL. Prof. Carla Hammes

1. Formação do Feudalismo

1. FEUDALISMO. Páginas 04 à 15.

Fim dos regime feudal

Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Departamento de História

Prof. José Augusto Fiorin

A alta Idade Média e a formação do Feudalismo (Séc. V Séc. X) Prof. Rafael Duarte 7 Ano

HISTÓRIA GERAL AULA 7

A Europa Feudal. Professor Ulisses Mauro Lima historiaula.wordpress.com

Política. Como o poder se realiza? Força (violência) Legitimação (consentimento) - carisma, tradição e racionalização.

O PERFIL POLÍTICO DO INFANTE D. PEDRO NA PROSA DA DINASTIA DE AVIS.

O ESTADO COMO FORMA ESPECÍFICA DE SOCIEDADE POLÍTICA. Profa. Dra. Nina Ranieri TGE I 2017

Sociedade. O homem é, por natureza, um animal político Aristóteles.

RENASCIMENTO CULTURAL

Idade Média (século V ao XV)

HISTÓRIA MEDIEVAL. Unidade II O Fim do Mundo Antigo

O PODER NA VISÃO DE FOUCAULT E DE MARIA LUCIA DE ARRUDA ARANHA

HISTÓRIA DO BRASIL. Absolutismo Monárquico - Mercantilismo Prof. Admilson Costa.

TIPOS DE ESTRUTURAS ORGANIZACIONAIS

ORIGEM DO ESTADO E FORMAS DE ORGANIZAÇÃO POLÍTICA. Prof. Elson Junior Santo Antônio de Pádua, Junho de 2017

Estudo Dirigido História -6 o ano Luciana Corrêa

Fortalecimento do poder dos reis

Os povos bárbaros. Povos que não partilhavam da cultura greco-romana. Bárbaros. Estrangeiros. Para os romanos

Filosofia e Política

Estratificação social e poder político nas sociedades de Antigo Regime. Jorge Penim de Freitas

OS BÁRBAROS A IDADE MÉDIA

Estado: conceito e evolução do Estado moderno. Santana do Livramento

Indústria cultural. O termo foi empregado pela primeira vez em 1947, por Adorno e Horkheimer.

A formação dos Estados Modernos

CARACTERÍSTICAS GERAIS OS POVOS BÁRBAROS O FEUDALISMO O IMPÉRIO CAROLÍNGEO ou REINO CRISTÃO DOS FRANCO O IMPÉRIO BIZANTINO: O IMPÉRIO ÁRABE

Periodização Oficial 476.dC último Imperador Império Romano do Ocidente Odoacro, Hérulos d.c - Tomada de Constantinopla pelos Turcos

A Formação dos Estados Nacionais. Prof. André Vinícius

A consolidação das monarquias na Europa moderna

Idade Média Século V - XV

Idade Média (século V ao XV)

BÁRBAROS Para os romanos, bárbaros eram todos aqueles que não tinham a cultura romana, que estavam fora das fronteiras do Império.

Colégio FAAT Ensino Fundamental e Médio

FEUDALISMO P R O F E S S O R R O D R I G O AL C A N T A R A G AS P A R

O feudalismo foi um sistema econômico, social político e cultural predominantemente na Idade Média. ORIGEM e CARACTERÍSTICAS: O processo de

Aula Estratificação Social. A palavra estratificação refere-se à existência de camadas ou níveis sociais.

ABSOLUTISMO MONÁRQUICO MERCANTILISMO

Um abraço fraterno. Prof. Marcelo Simões PROGRAMA DA PROVA DE RECUPERAÇÃO:

Segundo Rousseau, o que impediu a permanência do homem no Estado de natureza?

A Ordem Feudal Na Europa Ocidental

ORIGEM DO ESTADO E FORMAS DE ORGANIZAÇÃO POLÍTICA

O feudalismo foi um sistema econômico, social político e cultural predominantemente na Idade Média.

O ESTADO MODERNO SÃO AS GRANDES NAÇÕES EUROPÉIAS ( países da Europa hoje )

Origem na palavra Politéia, que se refere a tudo relacionado a Pólis grega e à vida em coletividade.

A FORMAÇÃO DOS ESTADOS NACIONAIS

Atividade de Classe 1 os anos Lucas ago /13. Nome: Nº: Turma:

Idade Média Século V - XV

Conceito de Soberania

CURSO DE DIREITO Autorizado pela Portaria no de 05/12/02 DOU de 06/12/02 PLANO DE CURSO

Portugal nos séculos XIII e XIV: Sociedade Portuguesa. História e Geografia de Portugal

I. Introdução A. Três tópicos fundamentais dos Estudos Pastorais B. Quatro Grandes categorias nos Estudos Pastorais

Universidade Federal Fluminense Instituto de Ciências Humanas e Filosofia Departamento de História História Medieval

DIREITOS HUMANOS. Direito Internacional dos Direitos Humanos. Evolução Histórica dos Direitos Humanos Parte 2. Profª.

O exercício comunitário de poderes concelhios; a afirmação política das elites urbanas

IDADE MÉDIA ALTA IDADE MÉDIA (SÉC. V X) 1 CARACTERÍSTICAS GERAIS:

EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO

INSTRUMENTOS DE TORTURA UTILIZADOS CONTRA AS HERESIAS, CONSOLIDANDO O TRIBUNAL DA INQUISIÇÃO

Foi um movimento intelectual que surgiu durante o século XVIII na Europa, que defendia o uso da razão (luz) contra o Antigo Regime (trevas) e pregava

Trabalho de Regulação 1 bimestre

1- As matrizes clássicas do Estado de Direito - Características comuns 2- O Rule of Law Britânico

AS ORIGENS DO PENSAMENTO MODERNO E A IDÉIA DE MODERNIDADE

Michel Foucault. A Governamentalidade. In: FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. 11ª Ed. Rio de Janeiro: Graal, 1993.

Prof. Me. Renato R. Borges

DECLARAÇÃO DE FÉ das Assembleias de Deus. Ministrante: Pastor Professor Alberto

Jean-Jacques Rousseau

BAIXA IDADE MÉDIA. Professora: Schirley Pimentel FATORES: GRANDE FOME; PESTE NEGRA; GUERRAS MEDIEVAIS; REVOLTAS CAMPONESAS;

PROVA DAS DISCIPLINAS CORRELATAS TEORIA DO ESTADO

Revisão de sociologia Avaliação Bimestral - 1º anos Identidade Social, Estratificação e Mobilidade Social

O soberano não representava mais seus príncipes e condes, passando a encarnar diretamente a representação do povo submetido ao seu poder!

FILOSOFIA MEDIEVAL: ESCOLÁSTICA 3ªSÉRIE DO ENSINO MÉDIO DRUMMOND 2017 PROF. DOUGLAS PHILIP

Thomas Hobbes: natureza humana, Estado absoluto e (falta de) cidadania

Quem eram os humanistas? Thomas More

Território e gove go r ve n r o

Produção do espaço, Formação Econômica e Social, e o Estado-nação. Geografia Humana Prof. Raul

A Dimensão do Ser. Espírito - Alma - Corpo Informação que gera felicidade Fernando Teodoro

Sociologia Jurídica. Apresentação 2.1.b Capitalismo, Estado e Direito

Correção Ficha Formativa - 5 -

Linha do Tempo. Linha do Tempo

REVISIONAL DE FILOSOFIA Questões de 1 a 10

OS ATRIBUTOS DE DEUS A solidão de Deus. Estudo do livro de A. W. Pink

Teoria das Formas de Governo

A justiça como virtude e instituição social na organização da sociedade grega.

O CONCEITO DOS DONS ESPIRITUAIS

PODER E JUSTIÇA EM FERNÃO LOPES: AS CRÔNICAS DO REI D. PEDRO I EM CONTEXTO PORTUGUÊS TARDO MEDIEVAL

ABSOLUTISMO REGIME AUTORITÁRIO

L E G A L E 1.ª FASE

Baixa Idade Média 1 CARACTERÍSTICAS GERAIS:

Transcrição:

A ORDEM NOBRE MEDIEVAL E SUA RELAÇÃO COM O PODER E A SABEDORIA. MEDIEVAL NOBLE ORDER AND ITS RELATION WITH THE POWER AND WISDOM. Amanda Lopes Blanco 1. RESUMO Este artigo se propõe analisar as obrigações de um Rei medieval da Dinastia de Avis. Como material de pesquisa foi utilizado o livro da Virtuosa Benfeitoria do Infante D. Pedro. O objetivo de tal livro é conciliar o poder do monarca com a sabedoria de governar o povo. O monarca aproveita a justificativa divina para obter favores de seus súditos. Nesse contexto, existe uma relação de reciprocidade entre o Rei, os aristocratas e o povo. Com isso, observa-se uma dependência simultânea dos aristocratas com o Rei. Onde há uma distribuição de poder que obedece a graus de hierarquização. Dessa forma a nobreza medieval é constituída na Dinastia de Avis. PALAVRAS CHAVE: sabedoria, poder, nobreza. ABSTRACT This article if considers to analyze the obligations of a medieval King of the Dynasty of Avis. As research material Peter was used the book of the Virtuous Improvement of Infant D. Pedro. The objective of such book is to conciliate the power of the monarch with the wisdom to govern the people. The monarch uses to advantage the divine justification to get 1 Graduanda do curso de História- UFRRJ/IM.

favors of its subjects. In this context, a relation of reciprocity between the King, the aristocrats and the people exists. With, a simultaneous dependence of the aristocrats with the King is observed. Where it has a distribution of being able that it obeys the hierarquy degrees. Of this form the medieval nobility is constituted in the Dynasty of Avis. So in conclusion its how the power used in this time. KEY- WORDS: Wisdom, power, nobility. DIVISÃO SOCIAL NO PERÍODO MEDIEVAL A sociedade medieval representava a si mesma como dividida em três ordens: os oratores, os bellatores e os laboratores. A razão da divisão trifuncional é motivo de estudo entre os pesquisadores, muitos querem saber o motivo da separação da sociedade em três divisões. Tal mentalidade tripartida surgiu no feudalismo e perdurou durante séculos, atuando nos antigos regimes monárquicos. Georges Duby justifica as três ordens dizendo que o clero, diante de uma sociedade que se transformava no séc XI, precisava de divisões hierarquizadas, procurando dar sentido e equilíbrio.assim, tal discurso insistia no fato de que em uma sociedade é necessário possuir ordem, pois até mesmo a sociedade celestial seria perfeitamente hierarquizada. 2 A constante comparação que o homem faz com os seres celestiais pode justificar a divisão tripartida, visto que a mais perfeita divisão está em três: Pai, Filho e Espírito Santo. Dentro desse contexto, também é comparada a hierarquia celestial com seus anjos e arcanjos. 2 DUBY, Georges, 1982. 2

Em uma sociedade também é necessário haver disciplina, pois segundo os princípios medievais, sempre irá existir o senhor e os servos, existirá sempre alguém para governar e alguém para obedecer. Com isso, é possível afirmar que a disciplina gera a desigualdade, onde o povo da Idade Média encontra-se em desvantagem. Estabelecendo a disciplina estão as ordens medievais. Essas encontram-se de forma hierarquizada, onde o Clero se apresenta no topo do triângulo social. A questão principal do artigo é abordar uma dessas três ordens: A Nobreza. AS FUNÇÕES ARISTOCRÁTICAS Como chefe soberano desta ordem está o rei e em seguida estão distribuídas as outras funções aristocráticas. Assim, por meio destas divisões e subdivisões multiplicadas,se faz das diversas ordens uma ordem geral (e eis a inflexão que conduz às três funções) e de vários estados um Estado bem dirigido, onde existe perfeita harmonia e consonância e uma correspondência de relações do mais baixo para o mais alto, de forma a que, enfim, por meio da ordem, uma ordem inumerável culmine na unidade. 3 Com essas divisões, a Nobreza se forma. Todos com seu grau de importância e relação de interdependência. Ao observar tais subdivisões é possível identificar a importância de micro poderes descritos por Michel Foucault. Apesar de Foucault ter analisado outro tipo de sociedade 4. Nesse contexto existe um entrelaçamento de práticas de poder onde todos se auxiliam e se completam. Nessa relação de força, existem alguns lugares preponderantes que produzem o efeito de supremacia. Essa difusão do poder foucaultiana pode ser considerada também uma característica da sociedade feudal, visto que houve uma fragmentação do poder real, onde o rei concedia 3 DUBY, Georges, 1982, pág. 15. 4 Sociedade capitalista. 3

terras para obter a fidelidade dos senhores. Com isso, surgiam novas relações de poder, todas obedecendo a graus de hierarquia. Assim, muito rapidamente, à hierarquia entre os indivíduos corresponde uma outra hierarquia, a dos direitos sobre a terra devida a uma fragmentação extrema dos direitos de propriedade. Por último, dada a fragmentação do próprio poder público, existe em cada país uma hierarquia de instâncias autônomas que exercem e proveito próprio poderes normalmente detidos pelo Estado. 5 monárquica. Assim, os aristocratas atuavam em conjunto com o rei, constituindo a ordem OBRIGAÇÕES INDIVIDUAIS DO REI Para analisar as obrigações do rei foi utilizado o Livro da Virtuosa Benfeitoria- Obras dos Príncipes de Avis escrito por D. Pedro. Nessa obra, existe uma relação entre poder e sabedoria. Segundo o livro, a bondade traz o saber, as boas obras são práticas do poder, tais atitudes precisam ser voluntárias, ou seja, o rei precisa nascer com a vontade de ajudar e não apresentar cansaço. O rei não pode ser mesquinho, não deve guardar o seu patrimônio e sim distribuir suas terras para aqueles que precisam. Os que recebem serão sempre gratos e devedores de favores. O recebedor possui a missão de ajudar a quem o bem lhe faz. Para exercer tal poder, o governante utiliza a justificativa teológica em que o cargo foi dado por Deus. E para aqueles que se esquecem das benfeitorias feitas pelo rei, D. Pedro em seu livro apresenta respostas bíblicas e filosóficas, como exemplo no livro de Josué, onde está escrito que aqueles que se esquecem das benfeitorias feitas por Deus, perecem. 5 GUY, Fourquin, 1987, pág. 11. 4

Deste modo, o recebedor será sempre grato e devedor ao rei:... e os recebedores verdadeyramente maginem que tal pagamento fazem por o bem que ouveram, que sempre em mais ficam devedores. 6 Com isso, solidifica-se a relação entre poder e sabedoria do rei, onde ele distribui seus bens e recebe em troca favores. E para a manutenção de sua autoridade, também conta com o apoio das subdivisões da nobreza formando a ordem hierarquizada da nobreza medieval. BIBLIOGRAFIA DUBY, Georges. As Três Ordens ou o Imaginário do Feudalismo.Lisboa: Estampa, 1982. FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Tradução Roberto Machado. Rio de Janeiro, Graal, 2005. FOURQUIN, Guy. Senhorio e Feudalidade na Idade Média. Lisboa: Edições 70, 1987. O Livro da Virtuosa Benfeitoria. In: As Obras dos Príncipes de Avis. HALP, n. 07, Séc. XV, setembro, 1998. 6 Virtuosa Benfeitoria, 1998, pág. 11. 5