Cirurgia de catarata realizada por residentes: avaliação dos riscos

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Transcrição:

Universidade de São Paulo Biblioteca Digital da Produção Intelectual - BDPI Outros departamentos - FM/Outros Artigos e Materiais de Revistas Científicas - FM/Outros 2010 Cirurgia de catarata realizada por residentes: avaliação dos riscos Revista Brasileira de Oftalmologia, v.69, n.5, p.301-305, 2010 http://producao.usp.br/handle/bdpi/10300 Downloaded from: Biblioteca Digital da Produção Intelectual - BDPI, Universidade de São Paulo

ARTIGO ORIGINAL 301 Cirurgia de catarata realizada por residentes: avaliação dos riscos Cataract surgery performed by residents: risk analysis Jackson Barreto Junior 1 ; Helio Primiano Junior 2 ; Rodrigo França de Espíndola 3 ; Renato Antunes Schiave Germano 4, Newton Kara-Junior 5 RESUMO Objetivo: Avaliar a frequência de complicações nas cirurgias de catarata realizada por residentes de um hospital universitário (segundo e terceiro anos), comparado com as realizadas por cirurgiões experientes (assistentes). Métodos: Análise retrospectiva dos prontuários de todos pacientes submetidos à cirurgia de catarata realizadas nas primeiras quinzenas de março (época do início do aprendizado da técnica cirúrgica) e de novembro (meados do aprendizado da técnica). Foram analisados a época da realização da cirurgia; graduação do cirurgião (residente ou médico assistente); técnica cirúrgica empregada (extração extracapsular ou facoemulsificação) e a ocorrência de complicações per-operatórias e pós-operatórias. Resultados: Foram analisadas 481 cirurgias, destas, 194 (40%) foram realizadas pelos residentes do terceiro ano, 165 (34%) pelos residentes do segundo ano e 116 (26%) pelos assistentes. A complicação mais frequentemente encontrada em todas as cirurgias foi a rotura de cápsula posterior (4,8%). Não houve diferença estatisticamente significativa de complicações entre as cirurgias realizadas em março e novembro (p=0,97), bem como entre os residentes sob supervisão e os assistentes (p=0,08). Conclusão: A rotura de cápsula posterior continua sendo a complicação mais frequentemente encontrada nas cirurgias de residentes em treinamento. Não houve diferença estatisticamente significativa entre as taxas de complicação destes residentes e os assistentes, o que demonstra o importante papel de uma supervisão adequada. Descritores: Facoemulsificação; Catarata; Internato e residência; Complicações intraoperatórias 1 Doutor em Oftalmologia pela Universidade de São Paulo - USP - São Paulo (SP) - Brasil; 2 Pós-graduando (Doutorado) pela Universidade de São Paulo - USP - São Paulo (SP) - Brasil; 3 Estagiário do Setor de Catarata da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) - Brasil; 4 Acadêmico do quinto ano de graduação da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) - Brasil; 5 Livre-docente, Professor Colaborador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Chefe do Setor de Catarata do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP - São Paulo (SP), Brasil. Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP- São Paulo (SP) - Brasil. Recebido para publicação em: 27/4/2010 - Aceito para publicação em 12/7/2010

302 Barreto Junior J; Primiano Junior H; Espíndola RF; Germano RAS, Kara-Junior N INTRODUÇÃO Acatarata é responsável por 50% da cegueira no mundo, com um número estimado de 20 milhões de casos que necessitariam de cirurgia (1). Com o avanço das técnicas cirurgicas, sua correção nos dias de hoje é considerada um dos mais seguros e eficazes procedimentos ambulatoriais (2). Os programas de residência médica fazem parte do currículo de hospitais universitários. Com a disseminação do uso da facoemulsificação, o ensino desta técnica vem sendo inserida no programa de todos os principais centros oftalmológicos do mundo (3-4). As taxas de complicações durante a facoemulsificação realizadas por residentes variam na literatura de 2,0 a 14,7% (4-5). A perda vítrea continua sendo a mais indesejada destas complicações, e estudos mostram que, olhos com perda vítrea não atingem acuidade visual esperada em muitos casos (6-7). Com o objetivo de formar mais cirurgiões habilitados, e incentivados pela necessidade e pelo estímulo à realização de maior número de cirurgias de catarata no Brasil, muitos hospitais universitários elevaram o número de médicos residentes e aumentaram a capacidade de seus centros cirúrgicos (8). Devido a este aumento, poderia se temer que as taxas de complicações operatórias se elevariam, e que a qualidade do serviço prestado não seria adequada. O objetivo deste estudo é avaliar em um hospital universitário a frequência de complicações em cirurgias de catarata, realizadas por médicos em diferentes estágios de treinamento, quando comparados aos procedimentos realizados por cirurgiões experientes. MÉTODOS Trata-se de um estudo retrospectivo em que foram avaliados todos os prontuários das cirurgias de catarata realizadas no centro cirúrgico ambulatorial de um hospital universitário nas primeiras quinzenas dos meses de março (época do início do aprendizado da técnica cirúrgica) e de novembro (meados do aprendizado da técnica cirúrgica). As cirurgias foram realizadas por 3 grupos de cirurgiões: 10 médicos assistentes do serviço de oftalmologia com experiência cirúrgica; 16 residentes do segundo ano (R2); e 12 residentes do terceiro ano (R3). Os R2 utilizaram a técnica da extração extracapsular manual (ECCE), seguida pelo implante de lente intraocular (LIO) rígida de polimetilmetacrilato. Os R3 e os médicos assistentes utilizaram a técnica de facoemulsificação (FACO), seguida pelo implante de LIO acrílica hidrofóbica dobrável. Para a FACO foi utilizado o facoemulsificador modelo Legacy (Alcon Labs). Para ambas as técnicas cirúrgicas foi utilizado microscópio Zeiss III. Todas as cirurgias realizadas pelos residentes contaram com a supervisão de assistentes da clínica oftalmológica. Foram estudadas as seguintes variáveis: época da realização da cirurgia (março ou novembro); graduação do cirurgião (residente ou assistente); técnica cirúrgica empregada (ECCE ou FACO) e a ocorrência de eventos adversos intraoperatórios e pós-operatórios imediatos. Os dados foram analisados pelo programa estatístico - EpiInfo 2002. O teste estatístico utilizado foi o qui-quadrado com correção de Yates para intervalo de confiança de 95%. RESULTADOS Foram avaliadas no total 481 cirurgias de catarata, sendo que destas, 196 (40%) foram realizadas por R3 (FACO), 167 (34%) por R2 (ECCE), e 118 (26%) por médicos assistentes (FACO). Observou-se a ocorrência de 46 (9,6%) complicações intra-operatórias e pós-operatórias imediatas (Tabela 1). Quando foi comparada a ocorrência de complicações em diferentes períodos, observou-se que das 278 cirurgias realizadas em março, houve 26 (9,3%) complicações. Em novembro ocorreram 20 (9,8%) eventos adversos, de um total de 203 cirurgias. Não houve diferença estatística (0,97) entre os dois períodos (Tabela 2). Com relação a frequência de eventos adversos nas cirurgias realizadas pelos R2, observou-se que das 89 ECCE realizadas em março, houve 9 (10,1%) casos com complicações, enquanto que no mês de novembro houve 8 (10,5%) complicações em 76 cirurgias. Não houve diferença estatística (p=0,86) entre os dois períodos (Tabela 3). Quanto à frequência de eventos adversos nas cirurgias realizadas pelos R3, observou-se que das 129 cirurgias realizadas em março houve 13 (10,0%) casos com complicações, enquanto que no mês de novembro houve 10 (15,4%) complicações em 65 cirurgias. Não houve diferença estatística (p=0,39) entre os dois períodos (Tabela 4). Considerando-se o total de cirurgias realizadas, houve 40 (11,1%) casos com complicações de um total de 359 cirurgias realizadas pelos residentes, e 6 (5,1%)

Cirurgia de catarata realizada por residentes: avaliação dos riscos 303 Tabela 1 Eventos adversos nas cirurgias de catarata realizadas pelos 3 grupos de cirurgiões (R2*, R3** e assistentes) Eventos N % Ruptura de cápsula posterior com perda vítrea 23 4,8 Ruptura de cápsula posterior sem perda vítrea 12 2,5 Luxação de fragmentos de cristalino para o vítreo 03 0,6 Diálise de zônula 03 0,6 Incisão anteriorizada 02 0,4 Sangramento de íris 01 0,2 Seidel no primeiro pós-operatório 01 0,2 Endoftalmite 01 0,2 (*) R2 = Residentes do segundo ano; (**) R3 = Residentes do terceiro ano Tabela 2 Frequência total de complicações nas cirurgias realizadas nos meses de março e novembro Março 26 9,4 252 90,6 Novembro 20 9,9 183 90,1 P= 0,97; OR=0,94; IC95%= 0,49 a 1,82 Tabela 3 Frequência de complicações nas cirurgias realizadas pelos R2* nos meses de março e novembro Março 9 10,1 80 89,9 Novembro 8 10,5 68 89,5 P= 0,86; OR=0,96; IC95%= 0,32 a 2,91; (*) R2 = Residentes do segundo ano Tabela 4 Frequência de complicações nas cirurgias realizadas pelos R3* nos meses de março e novembro Março 13 10,0 116 90,0 Novembro 10 15,4 55 84,6 P= 0,39; OR=0,62; IC95%= 0,23 a 1,63; (*) R3 =Residentes do terceiro ano Tabela 5 Frequência de complicações entre residentes (R2* e R3**) e médicos assistentes Residentes 40,0 11,1 319 88,9 Assistentes 6 5,1 110 94,9 P= 0,23; OR= 0,76; IC95%= 0,56 a 1,23; (*) R2 = Residentes do segundo ano; (**) R3 = Residentes do terceiro ano

304 Barreto Junior J; Primiano Junior H; Espíndola RF; Germano RAS, Kara-Junior N casos complicados em 116 cirurgias realizadas pelos assistentes. Não houve diferença estatística (p=0,23) entre os 2 grupos (Tabela 5). DISCUSSÃO O ensino da técnica cirúrgica exige uma série de condições tais como: centro cirúrgico devidamente equipado e disponibilidade de cirurgiões capacitados para supervisionar o treinamento. Estudos mostram que dentre outros fatores, o sucesso da cirurgia de catarata em hospitais onde há residentes em treinamento consiste em uma supervisão feita por cirurgiões experientes (9). Porém, mesmo em uma unidade cirúrgica equipada e com supervisão adequada, algumas cirurgias apresentam complicações, podendo limitar a acuidade visual pós-operatória (10,11). Considera-se que alguns dos principais fatores determinantes para a ocorrência de eventos adversos sejam o treinamento do cirurgião e a técnica utilizada (8,12). A literatura considera a ruptura de cápsula posterior com perda vítrea o evento adverso mais frequente, variando de 1,8 a 10,3% dos casos (13-18). Em nosso estudo esta complicação também foi a mais frequentemente observada (4,8%). Em relação à técnica cirúrgica, muitos estudos sugerem que a técnica de facoemulsificação, quando realizada por cirurgiões experientes, seja mais segura do que a ECCE (19). Entretanto, para residentes em treinamento, alguns estudos demonstraram que as taxas de perda vítrea são maiores durante a FACO (20,22). Nesta pesquisa, observou-se que ambas as técnicas cirúrgicas foram igualmente seguras, quando realizadas por cirurgiões em treinamento sob supervisão, comparadas com as cirurgias realizadas pelos cirurgiões experientes (p=0,23). Outro estudo também demonstrou que quando os cirurgiões iniciantes são bem supervisionados o índice de complicações cirúrgicas não varia significativamente em relação a cirurgiões experientes (15). A frequência de complicações ocorridas neste estudo com os R3 foi maior no final do treinamento do que no início. Esta diferença, embora estatisticamente não significativa, pode ser atribuída ao fato de que em geral, os residentes estão mais autoconfiantes e procuram operar casos com maior grau de dificuldade ao longo do ano. Como na FACO existem mais variáveis relacionadas ao cristalino que podem interferir na cirurgia, em relação a ECCE, como a consistência do núcleo lenticular, a liquefação do vítreo e o grau de dilatação pupilar, a cirurgia nestes casos, muitas vezes, está relacionada à maior taxa de complicações. A incidência total de complicações entre os R3 durante o aprendizado da FACO foi de 13,4%, número semelhante ao encontrado na literatura (4-5,23-25). CONCLUSÃO Nas condições deste estudo, um cirurgião iniciante é capaz de realizar a cirurgia com segurança semelhante a um cirurgião experiente, desde que supervisionado por um cirurgião capacitado e disponha de tecnologia adequada. Assim, na maioria dos hospitais universitários, em que atualmente se dispõe de equipamentos cirúrgicos modernos e de um corpo clínico com cirurgiões capacitados e dispostos a ensinar, a qualidade da cirurgia de catarata oferecida à comunidade deve apresentar uma taxa similar de sucesso do que em instituições privadas. ABSTRACT Purpose: To evaluate the complication's rate of cataract surgery performed by ophthalmology residents (second and third-year) and experienced surgeons at a public teaching hospital. Methods: A retrospective chart review of all patients who had cataract surgery between March (begin of the technique practice) and November (end of the technique practice) was conducted. Results: In 481 cataracts surgeries, 194 (40%) was performed by thirdyear residents, 165 (34%) by second-year residents and 116 (26%) by experienced surgeons. The most frequent complication in all surgeries was the posterior capsule rupture (4,8%). No statistical diference was found between the residents and experienced surgeons complication's rates (p=0,08). Conclusion: The posterior capsule rupture remains the most frequent complication during the cataract surgery learning curve. In this study there was no statistical difference between residents and experienced surgeons, which demonstrates the important role of adequate supervision of the surgeires. Keywords: Phacoemulsification; Cataract; Internship and residency; Intraoperative complications REFERÊNCIAS 1. Management of functional impairment due to cataract in adults. Cataract Management Guideline Panel. Ophthalmology. 1993;100(8 Suppl):1S-350S. 2. Schwab L. Cataract. In: Schwab L. Eye care in developing nations. 3rd ed. San Francisco: Foundation of the American Academy of Ophthalmology 1999. p. 21-52.

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