Determinação da Entalpia de Decomposição do Peróxido de Hidrogênio: Uma Prática Experimental no Ensino de Físico- Química

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Transcrição:

Determinação da Entalpia de Decomposição do Peróxido de Hidrogênio: Uma Prática Experimental no Ensino de Físico- Química Adriane Röedel Hirdes 1* (PQ), Paulo Henrique Guadagnini 2 (PQ), Vania Elisabeth Barlette 3 (PQ) 1* adrianerhirdes@unipampa.edu.br, 2 pauloguadagnini@unipampa.edu.br 3 vaniabarlette@unipampa.edu.br Palavras-Chave: Calorimetria, Entalpia de Reação, Ensino de Química. RESUMO: Este trabalho tem por objetivo descrever uma atividade prática experimental de calorimetria para medida da entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio em solução aquosa utilizando materiais e equipamentos acessíveis, de baixo custo, e sem geração de resíduos tóxicos. São apresentados os detalhes construtivos de um calorímetro simples que foi utilizado nas determinações de entalpia de reação de decomposição do peróxido de hidrogênio utilizando-se fermento biológico como catalisador. Foram utilizados três tipos de termômetros nas medidas experimentais, um deles do tipo líquido em vidro (termômetro de mercúrio comum), outro com sensor de platina (PT100) e um terceiro que utiliza um termistor como sensor de temperatura. Os resultados indicam que o uso de termômetros que utilizam sensores (PT100 e termistor) permitem reduzir significativamente os erros experimentais e obter medidas de entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio com um desvio relativo menor que 0,8% em relação ao valor adotado que é reportado na literatura. A proposta de experimento foi aplicada em uma turma de alunos dos cursos de licenciatura em química e engenharia química da disciplina de físico-química experimental da Universidade Federal do Pampa. Avaliamos que a proposta de atividade experimental mostra-se adequada para ser utilizada tanto por professores da Educação Básica como por docentes do Ensino Superior. Introdução A calorimetria estuda os processos de medida de variações de energia envolvidas nos processos físicos e químicos. A determinação destas variações de energia geralmente é realizada utilizando um calorímetro, que é um instrumento utilizado para a medição de variações de energia em processos que envolvam variações de temperatura. Neste trabalho, descreve-se uma atividade prática experimental e equipamentos para medição da entalpia molar de reação de decomposição do peróxido de hidrogênio em solução aquosa. A solução aquosa de peróxido de hidrogênio conhecida como água oxigenada, é um oxidante versátil muito utilizado em diversas áreas. Atualmente o peróxido de hidrogênio, além de suas aplicações do uso pessoal e cosméticos, é reconhecidamente citado como o oxidante mais eficiente na conversão de SO 2 em SO 4 2-, um dos maiores responsáveis pela acidez das águas de chuva, entre outras diversas aplicações de controle de poluição ambiental por promover a degradação rápida de vários compostos poluentes (MATTOS et al., 2003). O peróxido de hidrogênio é um poderoso oxidante, e sua solução aquosa é instável, decompondo-se em H 2 O e O 2 através de uma reação exotérmica. Sua decomposição é lenta à temperatura ambiente e quando as suas soluções são diluídas. A reação de decomposição é a seguinte: H 2 O 2(aq) H 2 O (l) + ½ O 2(g) + Energia

A decomposição do peróxido de hidrogênio pode ser acelerada pelo aquecimento ou pela adição de um catalisador, tal como o dióxido de manganês, iodeto de potássio, nitrato férrico, permanganato de potássio, entre outros. Neste trabalho, utilizamos o fermento biológico em pó e o dióxido de manganês como catalisadores. No trabalho publicado por Braathen et al. (2008), é apresentada uma proposta de atividade experimental didática para determinação da entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio em soluções aquosas utilizando um calorímetro simples de isopor, sem recipiente interno de vidro. Na proposta de atividade descrita foram efetuadas modificações na proposta de Braathen et al. (2008) objetivando obterem-se resultados mais acurados que os obtidos por este autor, mantendo a simplicidade dos equipamentos e procedimentos. Efetuou-se também um estudo detalhado da influência de diferentes tipos de termômetros na acuracidade (exatidão) das medidas experimentais de entalpia de reação. Descreve-se também os detalhes de construção de um calorímetro simples que utiliza um béquer com um revestimento externo de isopor, permitindo o seu uso com uma grande variedade de soluções e solventes e facilitando a sua limpeza. A atividade experimental de calorimetria proposta foi idealizada para ser utilizada no ensino superior, especificamente na disciplina de físico-química experimental, e representa uma atividade alternativa às usuais determinações de entalpia de neutralização de ácidos e bases fortes ou de entalpia de dissolução de sais. Construção do calorímetro utilizado como um recurso na atividade didática Descreve-se abaixo a construção de um calorímetro de baixo custo com materiais acessíveis e que pode ser utilizado com soluções aquosas e solventes por incluir com recipiente interno de vidro, que pode ser um béquer ou copo de vidro. Este recipiente de vidro também facilita a sua limpeza. A Figura 1 mostra fotos de um dos protótipos que foram construídos e utilizados nas medidas experimentais de entalpia de reação de decomposição do peróxido de hidrogênio. Os materiais utilizados na construção do calorímetro foram: Recipientes de isopor utilizado como isolante térmico para latão de cerveja e garrafa de cerveja (porta latão e porta garrafa); Câmara de pneu facilmente obtida em borracharias; Fita isolante; Estilete; Pistola e bastão de cola quente; Alfinetes ou tachinhas; Tampa de vidro de conserva (parte interna da vedação da tampa) ou alumínio das latas de bebidas que são fáceis de cortar, porém mais frágeis para uso contínuo; Béquer de 250 ml ou 300 ml ou outro copo de vidro que possa ser adaptado; Furadeira e alicates de corte (para fazer os furos). Em relação à construção do calorímetro, evidencia-se a seguir mais alguns detalhes mais específicos. A parte inferior do porta garrafa serviu como tampa do calorímetro e o porta latão como isolamento térmico do calorímetro. Ao cortar o fundo do porta garrafa deve-se

atentar para a altura da tampa do calorímetro para que o mesmo fique bem vedado. A fita isolante em volta da parte superior do porta latão serve como proteção mecânica para o isopor. Utilizou-se uma borracha na parte superior da tampa do calorímetro para proteção mecânica, tendo em vista a fragilidade do isopor e o fato dele ser utilizado no laboratório didático de química. Esta proteção também atua contra substâncias ou líquidos corrosivos que podem danificar o isopor. Para a fixação da borracha na parte superior da tampa do calorímetro utilizou-se cola quente, tachinhas e a fita isolante em torno da tampa para não ficar soltando ou forçando a borracha. A tampa de vidro de conserva é facilmente adaptada à parte interna da tampa do calorímetro por possuir diâmetros bem semelhantes. Outra opção que também foi utilizada em alguns protótipos de calorímetros foi o alumínio das latas de bebidas, mas esta não se demonstrou eficaz pois após a primeira atividade realizada já começou a soltar e tiveram que ser substituídas. O furo na borracha tem que ser feito com alicate de corte e no isopor e na tampa interna (vedação da tampa) com furadeira. Na Figura 1, podemos perceber que foram feitos 2 furos na tampa, um para o termômetro e o outro para a saída de gases que podem ser liberados na reação, mantendo a pressão constante no interior do calorímetro. Se não for necessário esse furo adicional, ele pode ser perfeitamente isolado com rolhas de borracha ou cortiça. Figura 1: Detalhes do calorímetro construído Atividade experimental de Calorimetria Os materiais e reagentes utilizados neste experimento estão descritos abaixo e são ilustrados na Figura 2: Solução de peróxido de hidrogênio 3% (preparada pelo pesquisador ou professor). Outra opção é utilizar a água oxigenada comercial a 10 volumes; Dióxido de manganês em pó; Fermento biológico em pó; Calorímetro construído; Termômetro (de mercúrio ou álcool ou digital); Rolha de borracha com furo para auxiliar o manuseio com o termômetro e também a sustentação (para que o termômetro não ficar encostado na parte inferior do

béquer, ou solto dentro dele) principalmente quando for necessário utilizar uma barra magnética para agitação durante a reação. Funil de vidro pequeno para adição do catalisador, evitando a abertura do calorímetro para adição dos reagentes; Espátula; Proveta de 100 ml ; Figura 2: Materiais e reagentes utilizados Na Figura 3, demonstramos os três tipo de termômetros utilizados na atividade, o termômetro de líquido em vidro de 0 a 100 o C (1), o termômetro digital com sensor de platina PT100 (2) e o termômetro eletrônico com sensor de temperatura do tipo termistor (3 e 4). Figura 3: Foto dos termômetros utilizados

Determinação da constante calorimétrica do calorímetro A determinação da constante calorimétrica do calorímetro, conforme Atkins (2003), deve ser a primeira etapa a ser realizada em uma determinação calorimétrica. O procedimento experimental sugerido para a determinação da capacidade calorífica consiste em: a) Mede-se 50,0 ml de água com uma proveta a temperatura ambiente e adiciona-se ao calorímetro. Monitora-se a temperatura com o termômetro e aguarda-se até a temperatura estabilizar. Mede-se a temperatura da água, (T 1 ); b) Aquece-se cerca de 70 ml água até aproximadamente 70 C em um béquer. Preenche-se uma proveta com 50,0 ml desta água aquecida. Monitora-se a temperatura da água da proveta por alguns segundos até que seja obtida uma leitura estável e mede-se a temperatura da água aquecida, (T 2 ). c) Adiciona-se rapidamente a água aquecida no calorímetro; d) Agita-se suavemente o calorímetro por alguns instantes, monitorando-se a variação de temperatura. Aguarda-se até que a temperatura se estabilize e anota-se o valor da temperatura final da mistura, (T mistura ). e) Calcula-se a diferença de temperatura entre a mistura e a água a temperatura ambiente, segundo T a = T mistura T 1 ; f) Calcula-se a diferença de temperatura entre a água aquecida e a mistura, segundo T b = T 2 T mistura. As variações de temperatura ( T a e T b ) permitem calcular a constante calorimétrica, (C cal ), do calorímetro. De acordo com o procedimento descrito acima, a constante calorimétrica do calorímetro pode ser calculada considerando que a quantidade de energia térmica cedida por uma amostra de água aquecida é igual à soma das quantidades de energia térmica transferida para a água a temperatura ambiente e pelo próprio calorímetro, segundo a Equação 1. m H2 O(aquecida)c H2 O T b = m H2 O(ambiente)c H2 O T a + C cal T a (1) Em que c H2 O = 4,18 J/(g oc) é a capacidade calorífica da água e m H2 O(aquecida) = m H2 O(ambiente) = 50,0 g é a massa das amostras de água. Realizou-se a determinação da constante calorimétrica para cada calorímetro construído, em triplicata, visto que é uma propriedade específica de cada calorímetro. Para a determinação da constante calorimétrica dos calorímetros utilizou-se as médias das variações das temperaturas da água, obtidas da triplicata de cada ensaio. Os ensaios foram realizados utilizando os três tipos de termômetros descritos. Com base nos dados obtidos durante os ensaios com os calorímetros construídos e com o procedimento experimental descrito acima, obtive-se um valor típico de 105 J/ C para a constante calorimétrica. O Quadro 1 apresenta um exemplo de coleta de dados para o cálculo da capacidade calorífica de um dos calorímetros construídos. Quadro 1: Exemplo da coleta de dados experimentais para o cálculo da constate calorimétrica de um dos calorímetros construídos T 1 ( C) T 2 ( C) T mistura ( C) T a ( C) T b ( C) 25,26 70,31 42,68 17,42 27,63 26,07 73,52 43,99 17,92 29,53 26,36 72,25 43,67 17,31 28,58 Valores médios: 17,55 28,58

O quadro 2 apresenta os dados medidos para a determinação da constante calorimétrica do calorímetro, obtidos utilizando os diferentes termômetros testados. Verificou-se que o uso dos termômetros com sensores PT100 e termistor possibilitam uma coleta de dados com maior resolução de leitura de medição da temperatura (0,01 C). Por resolução de medida entende-se a menor diferença de leitura que é possível medir-se com o instrumento. Quadro 2: Dados experimentais obtidos utilizando diferentes termômetros Termômetro T 1 ( C) T 2 ( C) T mistura ( C) T a ( C) T b ( C) PT100 25,89 69,91 43,23 17,33 26,68 Thermistor 26,14 69,66 43,52 17,06 25,45 Líquido em vidro 24,0 70,0 42,0 18,0 28,0 O termômetro de líquido em vidro possui menor resolução (1 C), e se mostrou mais suscetível a erros de medida devido à necessidade de ser retirado do calorímetro para efetuar as leituras, o que não ocorre com os termômetros com sensores que são mantidos imersos no interior do calorímetro durante as leituras. Determinação da entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio O procedimento sugerido para a determinação da entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio consiste em: a) Posiciona-se o elemento sensor do termômetro próximo do fundo do calorímetro, porém sem que ele encoste no fundo do mesmo; b) Adicionar-se 100,0 ml de solução de H 2 O 2 a 3% m/v no interior do calorímetro; c) Aguarda-se a temperatura da solução estabilizar e anota-se a sua temperatura inicial (T i ); d) Adiciona-se uma espátula de fermento biológico (com o auxílio de um funil pequeno) no interior do calorímetro; e) Agita-se levemente o calorímetro em movimentos circulares; f) Os valores de temperatura são lidos e acompanhados em função do tempo. A temperatura final, T f, após o término da reação, será a temperatura máxima observada após a adição do catalisador. Após o final da reação de decomposição, a temperatura da solução no interior do calorímetro tende a diminuir devido ao isolamento térmico imperfeito do calorímetro, que tende a lentamente ao equilíbrio térmico com o ambiente externo. As temperaturas medidas no procedimento descrito acima (T i e T f ), e a constante calorimétrica, (C cal ) obtida a partir da Equação 1, nos permitem calcular a quantidade de energia térmica transferida para a vizinhança e resultante da decomposição do peróxido de hidrogênio, segundo equação 2: q = c H2 Om H2 O T + C cal T (2) em que, q é o calor envolvido no processo de reação, e T = T f T i.

Calculamos a quantidade de energia térmica transferida para a vizinhança (calorímetro e 100 ml de meio reacional), resultante da reação de decomposição do peróxido de hidrogênio, de modo que a variação de entalpia de reação será numericamente igual (mas com sinal oposto) ao calor envolvido na reação a pressão constante, segundo a equação 3: H = q (3) A entalpia de reação é calculada utilizando as equações 2 e 3, além da constante calorimétrica obtida na primeira fase do experimento. Para tratamento dos dados, assume-se que o meio reacional possui a densidade e a capacidade calorífica da água, o que é uma aproximação aceitável considerando que a solução é diluída (3%). Nos ensaios experimentais realizados para a medida da entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio, foram utilizados diferentes tipos de termômetros, e os resultados são apresentados no Quadro 3. Quadro 3: Resultados experimentais para entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio utilizando diferentes termômetros Entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio/ (kj/mol) Ensaio Termômetro com Termômetro com Termômetro sensor PT100 sensor termistor de líquido em vidro 1-93,96-93,75-87,35 2-94,02-93,86-87,35 3-94,14-93,98-81,53 Média -94,04-93,86-85,41 Desvio padrão 0,05 0,07 1,94 Desvio relativo 0,58% 0,77% 9,71% Os erros relativos percentuais demonstrados no Quadro 3 foram calculados utilizando o valor adotado reportado na literatura para a entalpia de decomposição do peróxido de hidrogênio de 94,66 kj/mol, obtido das entalpias padrão de formação do H 2 O 2 (aq), H 2 O(l) e O 2 (g) (MARZZACCO, 2008). Percebe-se que o termômetro de líquido em vidro apresentou o maior desvio relativo dentre os termômetros utilizados. As possíveis fontes de erros são relacionadas à menor resolução do termômetro de líquido em vidro e pela necessidade de remoção deste termômetro de dentro da solução (calorímetro) para efetuar as leituras durante o experimento (em geral não é possível visualizar a escala do termômetro comum quando este se encontra imerso na solução que está dentro do calorímetro). Ainda com um desvio relativo próximo de 10%, o uso do termômetro de líquido em vidro não inviabiliza este tipo de experimento em laboratórios didáticos. Para medidas mais acuradas é recomendado o uso de termômetros que possuam sensores que possam permanecer no interior do calorímetro durante as medidas, e que possuam resolução melhor que 0,1 C. A acuracidade do termômetro neste caso é menos importante que a sua resolução, pois os dados de interesse são variações de temperatura. Os dados obtidos nos ensaios realizados indicam que é possível obter-se a entalpia de reação de decomposição do peróxido de hidrogênio com um desvio relativo menor que 0,8% em relação ao valor adotado reportado na literatura, o que pode-se considerar como um excelente desempenho para um experimento cujo procedimento e equipamentos são relativamente simples.

De acordo com os dados obtidos nos ensaios realizados, não foram encontradas diferenças significativa nos resultados quando utilizados o fermento biológico ou o dióxido de manganês como catalisadores, portanto, recomenda-se a utilização do fermento biológico por ser um produto de fácil acesso, baixo custo, maior facilidade de limpeza do calorímetro, e principalmente por não gerar resíduo químico. A proposta de experimento, incluindo o calorímetro descrito neste trabalho, foi aplicada em uma turma de alunos dos cursos de licenciatura em química e engenharia química da disciplina de físico-química experimental da Universidade Federal do Pampa no primeiro semestre de 2015. Os alunos executaram com sucesso as medidas experimentais, obtendo resultados com desvios relativos similares aos descritos neste trabalho. Os protótipos dos calorímetros construídos se mostraram robustos e adequados para utilização no laboratório didático. CONCLUSÕES A proposta de experimento de calorimetria detalhada neste trabalho tem como base materiais de baixo custo e de fácil aquisição, e não produz resíduos tóxicos. Descreveu-se a construção de um calorímetro simples consistindo de um recipiente de vidro com isolamento térmico de isopor, que apresentou excelente desempenho nos ensaios e na aplicação no laboratório didático. Avaliou-se comparativamente a influência do uso de diferentes tipos de termômetros na qualidade dos resultados de entalpia de reação, concluindo-se que é importante que o termômetro tenha elevada resolução de medida para que valores de variações de temperatura, utilizadas nas determinações calorimétricas, possam ser medidas com acuracidade. Além disso, o uso de termômetros que possuam sensores que possam permanecer imersos na solução minimizam os erros de leitura. É possível utilizar o termômetro de líquido em vidro, porém com um desvio relativo mais elevado. Avaliamos que a proposta de atividade experimental, incluindo o calorímetro descrito, mostra-se adequada para ser utilizada em atividades experimentais didáticas, tanto por professores da Educação Básica como por docentes do Ensino Superior. Quando associada a guias de atividade que promovam a reflexão e investigação, a proposta de experimento descrita neste trabalho tem potencial para contribuir no processo de ensino e aprendizagem. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ATKINS, P. W. Físico-Química: Fundamentos. 3. ed. Rio de Janeiro, RJ: LTC Livros Técnico e Científicos Editora, 2003. BRAATHEN, P. C. et al. Entalpia de Decomposição do Peróxido de Hidrogênio: uma Experiência Simples de Calorimetria com Material de Baixo Custo e Fácil Aquisição. Quimica Nova na Escola, v. 29, 2008. MARZZACCO, C. J. The effect a change in the catalyst on the entalpy of decomposition of hydrogen peroxide. Journal od Chemical Education, v. 13, n. November, p. 16 17, 2008. MATTOS, I. L. DE et al. Peróxido De Hidrogênio: Importância E Determinação. Quim. Nova, v. 26, n. 3, p. 373 380, 2003.