Detecção de Organismos Geneticamente Modificados em Alimentos e Ingredientes Alimentares



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Detecção de Organismos Geneticamente Modificados em Alimentos e Ingredientes Alimentares M. Teresa Barreto Crespo, Cátia M. Peres, Cristina I. Pereira, Fernanda S. Rodrigues Inst. de Biol. Experimental e Tecnológica (IBET) e Instituto de Tecnologia Química e Biológica- Universidade Nova de Lisboa (ITQB-UNL). Apartado 12 2781-901 Oeiras. A detecção de organismos geneticamente modificados (OGM) em alimentos, ingredientes e aditivos é necessária por duas razões principais. Em primeiro lugar porque foi considerado, em muitos países, incluindo toda a União Europeia e o Japão, que os consumidores deviam poder decidir se querem ou não consumir alimentos e ingredientes geneticamente modificados, o que levou à adopção de legislação impondo a rotulagem dos alimentos geneticamente modificados (GM). Em segundo lugar porque se existe legislação é necessário implementar as medidas que garantam que a mesma é cumprida. Regulamentação Em 1996 e 1997 foram colocados no mercado da União Europeia (UE) dois produtos geneticamente modificados, a soja Roundup-Ready e o milho Bt 176 (1, 2). Embora em 1997, vinte e oito produtos de origem vegetal geneticamente modificados estivessem aprovados em todo o mundo (3), na União Europeia os organismos geneticamente modificados deixaram de poder ser comercializados caso não cumprissem os requisitos da legislação dos Novos Alimentos estabelecida pelo Regulamento (CE) N.º 258/97 (4). Para além da avaliação em termos de segurança, esta regulamentação também estabelece as condições de rotulagem de alimentos contendo OGM. Visto que os dois produtos anteriormente mencionados, milho e soja GM, tinham sido aprovados antes da implementação do referido Regulamento, foi então aprovado o Regulamento (CE) N.º 1139/98 que impõe as regras particulares de rotulagem daqueles dois OGM e define que a presença de proteínas ou do ácido desoxiribonucleíco (DNA) resultantes de modificação genética em alimentos e ingredientes alimentares é o critério que melhor cumpre as exigências de rotulagem (5). Mais recentemente o Regulamento (CE) N.º 49/2000 especifica que os alimentos devem ser sujeitos a rotulagem sempre que contenham material derivado de organismos geneticamente modificados, numa proporção superior a 1% dos ingredientes alimentares considerados individualmente (6). Este valor foi adoptado tendo em consideração o problema das contaminações acidentais com OGM que podem ocorrer durante, por exemplo, as operações de cultivo, colheita, transporte, armazenagem e transformação de ingredientes alimentares. A disponibilidade de métodos validados para a detecção e quantificação dos OGM em alimentos, é assim um elemento chave na implementação da Directiva do Conselho N.º 220/90/CEE (7) relativa à libertação deliberada no ambiente de OGM bem como da regulamentação sobre Novos Alimentos. Estratégias para a detecção de OGM em alimentos Detecção baseada na presença de proteínas As novas proteínas que as plantas GM expressam podem ser detectadas por métodos químicos ou imunológicos, quer qualitativa quer quantitativamente. a. Detecção química A detecção química de proteínas transgénicas pode ser realizada utilizando cromatografia gasosa com detecção por espectrometria de massa (gas chromatography mass spectrometry, GC-MS), cromatografia líquida de alta resolução (high pressure liquid chromatography, HPLC) ou electroforese capilar (capillary electrophoresis, CE). b. Detecção imunológica As proteínas expressas podem ser detectadas nas matérias primas e em alguns alimentos processados usando imunoensaios, Western blot ou ELISA (enzyme linked immuno-sorbent assay). No caso do Western blot a proteína é extraída da amostra e imobilizada numa membrana. As proteínas ligadas à membrana são imersas numa solução contendo um anticorpo que reconhece a proteína alvo. O anticorpo liga-se a uma enzima que catalisa a formação de um composto corado cuja intensidade de cor é proporcional à quantidade de proteína (p.e., a proteína CP4 EPSPS expressa pela soja Roundup- Quando este artigo foi escrito, embora já tivesse sido aprovada, ainda não tinha sido publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias a Directiva 2001/18/EC do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados e que revoga a Directiva 90/220/CEE do Conselho. Boletim de Biotecnologia 33

Ready que confere tolerância ao herbicida Roundup) (8). Nos ensaios de ELISA utiliza-se o mesmo princípio mas o anticorpo está ligado ao plástico dos poços das microplacas em vez de se ligar a membranas. Um método para detecção e quantificação de soja GM, em alimentos e fracções alimentares, usando materiais de referência, foi validado através de um ensaio inter-laboratorial, à escala europeia, em que o IBET foi um dos participantes de Portugal (9). Igualmente foi realizado um ensaio interlaboratorial coordenado pela AACC (American Association of Cereal Chemists, Inc.) para detecção e quantificação de milho MON 810 que expressa a proteína insecticida Cry 1 Ab de Bacillus thuringiensis (Bt), por um kit ELISA. O IBET foi um dos participantes de Portugal neste ensaio (10). Em relação aos testes imunológicos, para além dos já mencionados, existe ainda a possibilidade de se utilizar testes rápidos em tira ( strip tests ), que já estão comercializados e que podem ser realizados, por exemplo, no local da colheita do cereal ou num silo. Estes testes são fáceis de utilizar, não são dispendiosos e permitem tomar decisões rápidas (11). Em qualquer dos casos o nível de expressão das proteínas é o factor limitante para a utilização destes métodos mas segundo Stave as proteínas transgénicas estão dentro do limite de detecção dos imunoensaios (12). Nas análises baseadas na detecção de proteínas há ainda que ter em conta que uma proteína transgénica pode não ser expressa (ou sê-lo apenas em níveis muito baixos) pelas partes da planta que são utilizadas em produtos alimentares. Para além disso algumas sequências de DNA introduzidas não expressam proteínas, como nos casos já descritos na literatura de uma variedade de batata e uma variedade de tomate (13, 14). Detecção baseada na presença de DNA Nas amostras em que existe DNA GM, todo o DNA exógeno é, em princípio, susceptível de ser detectado: sequências de promotores, genes de interesse introduzidos, sinais de terminação e genes marcadores usados para selecção das plantas modificadas em laboratório. Na UE, apesar da legislação permitir que a detecção seja baseada na presença de proteínas ou DNA, o DNA foi a molécula eleita para a detecção de OGM. A técnica utilizada nos laboratórios para a detecção do DNA é a PCR (polymerase chain reaction). A extracção de DNA para análise de géneros alimentícios e ingredientes alimentares GM é um ponto crítico para todos os passos analíticos subsequentes, tanto para a detecção qualitativa como para a análise quantitativa. Numerosos métodos de extracção foram já testados. Estes métodos vão desde kits de extracção comercializados a métodos clássicos com maiores ou menores alterações conforme o grau de processamento das amostras (15). Tendo em conta que a reacção de PCR pode ser inibida por substâncias contidas num alimento, como lípidos, ácidos gordos, polissacáridos, entre outros, a escolha de controlos de qualidade é determinante para se evitarem falsos negativos, este controlo pode ser realizado por amplificação com primers universais para plastos vegetais ou específicos para o gene da invertase no milho ou o gene da lectina na soja (16, 17). a. Métodos de detecção por PCR qualitativa para rastreio de alimentos GM Existem diferentes eventos aprovados em diferentes plantas de acordo com a Directiva 90/220/CEE. Assim a possibilidade de implementação de um método de rastreio que permita a detecção destas plantas, independentemente da variedade utilizada é muito importante para as autoridades de controlo. Em 1997 foi publicado um método baseado na detecção de duas sequências reguladoras existentes em 26 plantas transgénicas (18). Estas sequências contêm fragmentos do promotor 35S CaMV (retirado do vírus do mosaico da couve flor) e do terminador NOS proveniente do gene da nopalina sintetase de Agrobacterium tumefaciens. Métodos de detecção qualitativos para rastreio já foram validados por cinco ensaios inter-laboratoriais: dois organizados pelo Joint Research Centre (JRC, Commission of the European Union, Institute for Health and Consumer Protection) (18, 19), dois sob a coordenação do projecto Europeu DMIF-GEN (20), e um sob a coordenação Bundesinstitut für gesundheitlichen Verbraucherschutz und Veterinärmedizin (BgVV) (21). Portugal participou através do IBET em 4 destes ensaios. O IBET validou internamente um método de rastreio baseado na detecção das duas sequências reguladoras acima referidas. b. Métodos de detecção por PCR qualitativa para identificação específica Devido à necessidade de identificar variedades específicas de plantas geneticamente modificadas foram desenvolvidos métodos que permitem aos laboratórios de controlo realizar reacções de PCR com primers específicos para diferentes eventos aprovados (22, 23, 24). O IBET implementou métodos de detecção específica para eventos de milho aprovados pela Directiva 90/220/CEE e para o de soja, para além de um dos eventos de tomate ainda não autorizado. c. Métodos de quantificação por PCR A análise qualitativa dá uma indicação sobre a presença de um OGM autorizado, mas para responder à necessidade de rotulagem é necessário um teste quantitativo subsequente. A rotulagem é necessária se 34 Boletim de Biotecnologia

for possível demonstrar, ao nível do ingrediente, que está presente mais do que 1% de OGM autorizado. Um método de PCR quantitativa competitiva (QC-PCR) foi já testado para análise de alimentos e matérias primas. Este método baseia-se na co-amplificação, no mesmo tubo de reacção, de DNA padrão e de DNA alvo. O DNA padrão consiste num plasmídeo linearizado contendo fragmentos de PCR de um produto GM. Depois da reacção de PCR os produtos são separados em gel de agarose sendo o DNA padrão diferenciável do DNA alvo pelo tamanho do fragmento obtido. Se os critérios de validação forem atingidos, no ponto de equivalência as concentrações do padrão interno e do DNA alvo serão iguais (25). Com este método não se obtêm correlações lineares entre amostras de concentrações conhecidas, mas um conjunto de pontos de calibração com os quais as amostras desconhecidas são comparadas, daí que seja muitas vezes considerado um método semi-quantitativo. Este método, para além de trabalhoso, é baseado na comparação visual ou instrumental de bandas as quais são por vezes difíceis de avaliar (26). Convencionalmente, a análise de produtos de PCR é um passo separado que ocorre depois da reacção de PCR estar concluída. A electroforese em gel de agarose é, nesse caso, utilizada para verificar o tamanho e pureza dos produtos obtidos. A técnica de análise dos produtos de PCR durante a amplificação tornou-se conhecida como PCR em tempo real (Real-Time PCR ou também RT- PCR, não confundir com reverse transcription-pcr ). A forma mais simples de monitorizar a PCR durante a amplificação é utilizando fluorescência. Se se representar a fluorescência versus o número de ciclos, a acumulação de produtos de PCR, pode ser visualizada numa curva de crescimento, semelhante a uma curva de crescimento de uma bactéria. Monitorizar a fluorescência durante cada ciclo é uma forma muito potente de quantificar o número de cópias obtidas. Muitas cópias do DNA molde deslocam a curva para a zona com número baixo de ciclos. A quantificação do DNA alvo é realizada medindo a fluorescência na fase linear logarítmica. A maioria das aplicações de Real-Time PCR requerem unicamente um corante para cadeia dupla de DNA. Contudo, algumas aplicações requerem uma maior especificidade, podendo nesses casos ser utilizadas sondas marcadas com fluorescência para monitorizar a PCR. Essas sondas podem ser de hidrólise ( TaqMan ) ou de hibridização (27). Foram publicados recentemente métodos para quantificação de OGM em alimentos e ingredientes alimentares com soja Roundup Ready e milho Bt 176 utilizando PCR em tempo real (28, 21). Foram já realizados ensaios inter-laboratoriais para PCR competitivo para soja e amostras comerciais contendo soja, sob a coordenação do projecto JRC (26), e sob a coordenação do BgVV (20) tendo o IBET participado em ambos. O BgVV realizou um ensaio-interlaboratorial para PCR em tempo real (21). Da análise dos resultados destes métodos quantitativos verifica-se que são necessários mais dados para desenvolver e validar os métodos, com níveis elevados de precisão e exactidão. Nesta área, as dúvidas estão ainda nas diferenças existentes, ou não, entre os diferentes equipamentos disponíveis no mercado, nos parâmetros de validação, controlo de qualidade analítico para certificação dos métodos, assim como no tipo de material de referência utilizado para realizar as curvas de calibração. O IBET já implementou métodos de análise quantitativa por PCR em tempo real para o milho Bt 176 e para a soja RR. Normalização Um número crescente de laboratórios de controlo de alimentos na Europa utiliza a técnica de PCR para a detecção de GMO, como foi referido anteriormente. Contudo, a normalização de métodos de análise de GMO por protocolos harmonizados ainda está no início. Organismos de normalização como o CEN (Comité Européen de Normalisation) e a AFNOR (Association Française de Normalisation) estão a desenvolver actividades nesta área. Existem já alguns documentos preliminares, no que diz respeito a amostragem e detecção de OGM, muitos deles baseados nos diversos ensaios inter-laboratoriais realizados para validação de métodos qualitativos e quantitativos referidos ao longo do texto. E o número crescente de alimentos GM no mercado O maior desafio que se coloca aos laboratórios de controlo de alimentos é o número de alimentos GM aprovados, acrescido dos que aguardam aprovação. Considerando que é necessário realizar pelo menos uma PCR para cada modificação tornar-se-á cada vez mais difícil examinar todas as possíveis combinações de modificações que podem aparecer num alimento (p.e. só eventos de milho há quatro aprovados na UE). Torna-se, assim, cada vez mais necessário que exista transparência por parte das empresas produtoras, que facultem a informação sobre sequências inseridas nos OGM que produziram e no fornecimento do respectivo material de referência, para que atempadamente possam ser implementados métodos para detecção dos novos produtos GM. Perante este cenário há companhias que estão a desenvolver métodos que simplifiquem o processo analítico usando DNA arrays (DNA arrays são superfícies nas quais muitas sequências de DNA podem ser imobilizadas e analisadas em paralelo). Estes métodos permitirão reduzir o esforço envolvido na análise de OGM pela determinação em simultâneo da presença ou ausência de um grande conjunto de modificações genéticas. Se se combinar esta Boletim de Biotecnologia 35

metodologia com a quantificação unicamente das amostras que dêem resultado positivo o trabalho será mais rápido e muito mais económico, podendo-se cumprir a legislação. Prevê-se que uma nova geração de biochip arrays seja capaz de realizar igualmente quantificação (29). E os alimentos GM não autorizados Para finalizar há ainda a referir que o sistema corrente de detecção depende do produtor fornecer informação acerca das sequências de DNA modificadas. Usando este sistema, produtos alimentares não autorizados provavelmente nunca serão detectados. Isto é um problema real, não só porque estes produtos alimentares poderão nunca vir a ser rotulados, uma vez que escapam aos sistemas de controlo, mas também porque estes alimentos podem não ser seguros para os consumidores. Bibliografia 1. 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Directiva do Conselho Nº 220/90/CEE, de 23 de Abril de 1990, relativa à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados. J. Oficial L 117, 08/05/90, p.0015-0027. 8. Rogan, G.J., Dudin, Y.A., Lee, T.C., Magin, K.M., Astwood, J.D., Bhakta, N.S., Leach, J.N., Sanders, P.R., Fuchs, R.L. 1999. Immunodiagnostic methods for detection of 5-enolpyruvylshikimate-3-phosphate synthetase in Roundup Ready soybeans. Food Control 10: 407-414. 9. Lipp, M., Anklam, E., Stave, J.W. 2000. Validation of a immunoassay for detection and quantitation of a genetically modified soybean in food and food fractions using reference materials: interlaboratory study. J. AOAC Int. 83: 919-927. 10. Stave, J.W., Magin, K., Schimmel, H., Lawruk, T.S., Wehling, P., Bridges, A.R. 2000. AACC collaborative study of a protein method for detection of genetically modified corn. Cereal Foods World 45: 497-501. 11. Stave, J.W., Durandetta, D. 2000. GM crop testing grows amid controversy. 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