ELETROTERAPIA NÃO-INVASIVA NO PROCESSO DE REPARAÇÃO ÓSSEA EM DIFERENTES PERÍODOS PÓS-FRATURA: ESTUDO EXPERIMENTAL EM RATOS DA LINHAGEM WISTAR

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Transcrição:

ELETROTERAPIA NÃO-INVASIVA NO PROCESSO DE REPARAÇÃO ÓSSEA EM DIFERENTES PERÍODOS PÓS-FRATURA: ESTUDO EXPERIMENTAL EM RATOS DA LINHAGEM WISTAR Sônia Maria Marques Gomes Bertolini Docente doutora do Departamento de Fisioterapia do Centro Universitário de Maringá - CESUMAR e da Universidade Estadual de Maringá - UEM. E-mail: smmgbertolini@cesumar.br Deisy Carla Cararo Acadêmica do curso de Fisioterapiado Centro Universitário de Maringá-CESUMAR. E-mail: deisycarla@yahoo.com.br Priscila Daniele de Oliveira Acadêmica do curso de Fisioterapia do Centro Universitário de Maringá-CESUMAR. E-mail: prisciladanielefisio@hotmail.come Priscilla da Costa Martins Fisioterapeuta pelo Centro Universitário de Maringá-CESUMAR. RESUMO: Este trabalho teve como objetivo avaliar a eficácia da aplicação da corrente elétrica não-invasiva na osteogênese da tíbia de ratos em diferentes períodos pós-fratura. Foram utilizados 30 Rattus navergicus albinus, variedade Wistar, machos, inicialmente distribuídos em dois grupos de 15 animais e cada grupo foi subdividido em três subgrupos contendo cinco animais. Foi induzida uma fratura em nível da diáfise da tíbia esquerda de todos animais. Os animais do grupo-experimental, após três dias, foram submetidos à eletroestimulação (corrente galvânica). A aplicação da corrente elétrica teve duração de 20 min, estendendo-se por duas, quatro e seis semanas. Os animais foram radiografa-dos após a lesão óssea e no final do experimento. Ao término do experimento, os ani-mais foram sacrificados e procedeu-se ao tratamento histológico. Os resultados da aná-lise histológica mostraram que todos animais do grupo-experimental, sacrificados na 2ª e 4ª semanas (fase colágena e osteogênica, respectivamente), apresentavam um estágio mais avançado no processo de reparo ósseo, quando comparados aos animais do gru-pocontrole. Já nos animais sacrificados na 6ª semana em relação ao grupo-tratado, o local da lesão não revelou diferença estrutural no osso neoformado (fase de remodelação óssea). É possível concluir que a corrente elétrica direta não-invasiva influencia na neoformação óssea, desde a fase fibroblástica, passando pela fase de colágeno até a fase osteogênica, acelerando o preenchimento ósseo em ratos submetidos à lesão de tíbia. PALAVRAS-CHAVE: Eletroestimulação; Fratura; Osteogênese. NON INVASIVE ELECTROTHERAPY IN THE PROCESS OF BONE REPAIR IN DIFFERENT PERIODS AFTER FRACTURE: EXPERIMENTAL STUDY IN WISTAR RATS ABSTRACT:This research had as objective evaluate the effectiveness of the application of a non-invasive electric current in rats tibia osteogenesis, at different periods after broken. Were used 30 Rattus navergicus albinus, Wistar variety, males, distributed, initially, into 2 groups of 15 animals and each group was subdivided into 3 subgroups with 5 animals. A broken on the level of diafisis on the left tibia of every animal was induced on them. The animals of the experimental group, after 3 days, were submitted to the electric-stimulation (galvanic current). The application of the electric current took 20 minutes, extending for 2, 4 and 6 weeks. All the animals were radiographed after the bone injury and at the end of the experiment. At the final of the treatment, the animals were sacrificed and then, the histological treatment had start. The results of the histological and radiological analysis showed that all the animals of the experimental group, no matter the after-breaking period, had showed acceleration in the process of bone consolidation. After 4 weeks since broken, the animals submitted to the electro-stimulation had no signals of injury. Through the histological analysis, at the second week after broken, in the electro-stimulated animals, was possible to identify the spongy bone with bone trabecullas well developed. In the nontreated group, this trabecullas, although found occupying partially the bone fissure, showed an ample intertrabecullar space, filled with fibrocartilaginous tissue. The final results of this research reinforce what is found in the literature, indicating that the use of a non-invasive electric current is efficient on the enhance of the speed on the bone reconstitution. KEYWORDS: Electro-stimulation; Fracture; Osteogenesis.

26 Eletroterapia Não-Invasiva no Processo de Reparação Óssea em Diferentes Períodos... INTRODUÇÃO O osso demonstra propriedades elétricas fascinantes que vêm sendo estudadas desde 1950 (YUSUDA, 1953). Tratamentos para ausência de união e atraso na formação óssea são muito estudados e a eletroestimulação tem sido usada como recurso terapêutico pelos seus efeitos positivos na reparação óssea (ZORLU et al., 1998). Em 1960, alguns pesquisadores demonstraram que a aplicação de uma corrente direta de baixa frequência, semi-invasiva, estimulava a osteogênese de acordo com o posicionamento correto da polaridade no indivíduo (BASSET et al., 1974). Já em 1963, Udupa e Prasad realizaram experimentos químicos e histoquímicos na recuperação de fraturas em ratos. A eletroterapia com campos elétricos e eletromagnéticos potencializa a reparação de tecidos conjuntivos, representando uma alternativa para auxiliar a reparação de fraturas, uma vez que ocasiona a aceleração do processo de cicatrização (SOUZA, 2001). É por meio dessa cicatrização que a síntese de DNA das células osteoprogenitoras sofre aumento, juntamente com o fibroblasto, e acelera a calcificação da matriz cartilaginosa (ZORLU et al., 1998). Ainda, é reforçado por Zorlu et al. (1998) que a corrente elétrica aumenta o número de íons Hidroxila e ph, diminuindo a oxigenação do tecido no local do cátodo, e comprova que a oxigenação em baixa pressão promove formação óssea e aumento da calcificação do tecido lesado. Reuter e colaboradores (1987) e Reuter e colaboradores (1984) reportam o aumento da velocidade da regeneração de 20% a 30% por meio da eletroestimulação, enquanto que Haupt (1984) e Spadaro e colaboradores (1972) acreditam que esse efeito ocorra em 80% dos casos. Para Browner e colaboradores (2000), fratura de um osso é definida como a perda da integridade e continuidade mecânicas e a consolidação de um processo biológico muito interessante, principalmente se considerar que um osso fraturado, ao contrário de qualquer outro tecido que tenha sido rompido ou seccionado, é capaz de reparar-se sem cicatriz, isto é, de reparar-se mais por osso que por tecido fibrótico, regenerando o osso normal (SALTER, 2001). Ainda, no que se refere à consolidação, Prentice e Voight (2003) consideram a reparação de fraturas um processo fisiológico muito complexo e altamente organizado. Diferentemente de outros tecidos que cicatrizam pela formação de cicatriz fibrovascular, na consolidação de fraturas, o tecido ósseo original é regenerado e as propriedades preexistentes do osso são restauradas. Herrera (1987), ao desenvolver um estudo experimental com ratas, constata que dentre diferentes tipos de estimulação elétrica utilizadas, em fraturas recentes, o melhor resultado foi obtido com a corrente contínua a 4,5V por meio da técnica não invasiva. Guirro e Guirro (2002) definem a corrente galvânica ou direta como aquela em que as cargas de mesmo sinal se movem no mesmo sentido, com uma intensidade fixa. O termo contínua refere-se ao valor da intensidade e o sentido serem constantes. Os tecidos biológicos apresentam grandes quantidades de íons positivos e negativos dissolvidos nos líquidos corporais, e um campo elétrico polarizado aplicado à superfície da pele movimenta esses íons e geram consequências físicas e químicas. Nogami e colaboradores (1982) pesquisaram in vitro os efeitos da corrente elétrica contínua no processo de condrogênese, porém verificaram a não-diferenciação de células mesenquimais em condrócitos, mas alguns autores observaram, na região do cátodo, a proliferação de condrócitos pré-existentes. O estímulo elétrico pode ainda desencadear maior vascularização no local lesado, explicando o aumento da osteogênese por meio desse método terapêutico (AARON; CIOMBOR, 1993). Segundo Andrews e colaboradores (2000), os efeitos da imobilização sobre o osso são semelhantes aos observados em outros tecidos conjuntivos. A perda óssea é um achado consistente em resposta à menor sustentação de peso e contração muscular. A resistência óssea diminui uniformemente com a duração da imobilização. Carvalho e colaboradores (2002) constatam que, em alguns casos clínicos, a regeneração óssea ou aumento da massa óssea não ocorre da forma esperada, o que torna necessário o implemento de métodos coadjuvantes para a obtenção dos resultados satisfatórios. Baseados nestes achados, o conhecimento de métodos que estimulem a osteogênese adquire considerável importância. Assim, este trabalho teve como objetivo avaliar a eficácia da aplicação da corrente elétrica não-invasiva na osteogênese da tíbia de ratos da linhagem Wistar em diferentes períodos pós-fratura. 2 MATERIAL E MÉTODOS Para a realização desta pesquisa, foram utilizados 30 Rattus navergicus albinus, variedade Wistar e machos, que foram divididos em dois grupos de 15 animais (grupo-controle - C e grupoexperimental - E) e cada grupo foi ainda subdividido em três subgrupos com cinco animais. Os mesmos permaneceram no biotério do Centro Universitário de Maringá CESUMAR, onde ficaram em caixas de polipropileno com 39 cm de comprimento, 32 cm de largura e 16 cm de altura, forradas com jornal, em ambiente climatizado e controle de período claro/escuro com 12 h de cada. A água e ração ficaram disponíveis diuturnamente. Após a obtenção dos animais, os mesmos foram anestesiados com 45 mg/kg de peso de solução de Tiopental Sódico (1 g) diluído em água destilada (22 ml). E, quando completamente sedados, foram submetidos à tricotomia do membro inferior esquerdo, seguida da lesão óssea do membro em questão. A eletroestimulação, nos animais do grupo-experimental, teve início no terceiro dia pós-fratura. Os animais do grupo-controle foram submetidos aos mesmos procedimentos que os animais experimentais, exceto a eletroestimulação. Para a realização da estimulação elétrica, o grupoexperimental foi anestesiado com uma associação de Cloridrato de xilazina 10 mg/kg e Cetamina 50 mg/kg. Para a emissão da corrente, utilizou-se um aparelho constituído de um circuito gerador de corrente direta (galvânica), em microampéres, controlados por dois multímeros, um determinando a amperagem e outro, a voltagem aplicada. Este possui duas saídas: um polo negativo e outro polo positivo. A técnica realizada é um procedimento não-invasivo e possibilita a utilização de eletrodos de superfície de silicone-carbono (CARREIRA; BERTOLINI, 2003). O procedimento foi realizado uma vez ao dia, com duração de 20 m de eletroestimulação a uma intensidade de 20 microampéres. Antes de cada sessão, o aparelho era testado, colocando-se os dois polos (cátodo e ânodo) em um copo com água, sendo o cátodo o eletrodo correspondente à produção do maior número de bolhas pela reação de redução que ocorre, liberando gás hidrogênio (ROBNSON; SNYDER-MACKELER, 2001).

Bertolini, Cararo, Oliveira e Martins 27 Os animais foram radiografados no Centro Universitário de Maringá, nas incidências ântero-posterior e perfil, semanalmente, para verificação e acompanhamento da evolução das fraturas, utilizando a mesma técnica kv e ma (miliamperagem), com películas periapicais Kodak. A revelação foi feita à temperatura de 22 C, passando por 1 min e 20 segundos de lavagem interna, 10 min no fixador, 20 min de lavagem final, permanecendo ainda 10 min para secagem. Para possibilitar a avaliação do efeito da eletroterapia em diferentes fases do processo de reparação, cinco animais de cada grupo foram sacrificados após as 2ª, 4ª e 6ª semanas pós-fratura (Tabela 1), sendo, respectivamente, as fases colágena, osteogênica e de remodelação, de acordo com o protocolo de Udupa e Prasad (1963). Ao término da aplicação da corrente elétrica, os animais foram sacrificados e, após, procedeu-se à desarticulação do joelho e tornozelo para a coleta do segmento da tíbia com a lesão óssea. Foram dissecadas as estruturas musculares, tendíneas e capsulares de cada segmento de tíbia, restando somente o tecido ósseo com o respectivo periósteo para tratamento histológico. Os segmentos obtidos foram armazenados em formol a 10% por um período de 10 dias. Em seguida, o material foi lavado em solução de salina 0,9% e fixado em Boin, durante 48 h, até o início do tratamento histológico de rotina. Os seguimentos foram descalcificados e submetidos à desidratação em série crescente de álcoois, diafanizados com xileno e incluídos em parafina. Nos blocos de parafina, foram feitos cortes seriados de 5µm de espessura, orientados longitudinalmente em relação ao maior eixo do osso, sendo corados alternadamente e em sequência pelo método de Hematoxilina-Eosina e fixados com resina Permont. As peças assim preparadas foram analisadas em microscópio óptico Olympus BX40 e fotografadas em fotomicroscópio BX50 com equipamento fotográfico PM10AK. Tabela 1 Constituição dos grupos de animais em relação sacrifício pós-fratura 3 RESULTADOS Foi possível estabelecer comparação entre o reparo ósseo dos grupos controle e experimental por meio da análise histológica. - 14 dias: ambos os grupos apresentaram no local da lesão trabéculas ósseas, mais delgadas nos animais do grupo-controle. Neste grupo, o espaço intertrabecular estava preenchido por tecido fibrocartilaginoso. (Figuras 1a e 1b). No grupoexperimental, a neoformação óssea foi maior em todos animais em relação ao grupo-controle. - 28 dias: em ambos os grupos, o tecido neoformado mostrou características da fase osteogênica. As trabéculas ósseas apresentavam-se mais espessas. No grupo-controle, notou-se ainda áreas de tecido fibrocartilaginoso sem diferenciação óssea (Figuras 1c, 1d, 2 e 3), enquanto que no grupo-experimental, o osso neoformado apresentava aspecto semelhante aos dos animais sacrificados após 42 dias pós-fratura. - 42 dias: tanto no grupo-controle como no experimental a fenda óssea estava totalmente preenchida por tecido ósseo neoformado (Figura 1e e 1f).

28 Eletroterapia Não-Invasiva no Processo de Reparação Óssea em Diferentes Períodos... Figura 1 - Fotomicrografia de uma secção longitudinal de 5 µm da lesão óssea da tíbia. a: Grupo C1 14 dias; b: Grupo E1 14 dias; c: Grupo C2 28 dias; d: Grupo E2 28 dias; e: Grupo C3 42 dias; f: Grupo E3 42 dias. Observar: Neoformação óssea ( ). H.E. 50X Figura 2 - Fotomicrografia de uma secção longitudinal de 5 µm da lesão óssea da tíbia observar: Tecido ósseo neoformado (TO) e Tecido fibrocartilaginoso (TF ). H.E. 125X. Figura 3 - Fotomicrografia de uma secção longitudinal de 5 µm da lesão óssea da tíbia. Observar: Tecido ósseo neoformado (TO). H.E. 125X. 4 DISCUSSÃO Os resultados da análise histológica mostraram que todos animais do grupo-experimental, sacrificados na 2ª e 4ª semanas (fase colágena e osteogênica, respectivamente) apresentavam estágio mais avançado no processo de reparo ósseo, quando comparados aos animais do grupo-controle (Figura 1a, 1b, 1c e 1d). Já nos animais sacrificados na 6ª semana em relação ao grupo-tratado, o local da lesão não revelou diferença estrutural no osso neoformado, possivelmente, por se tratar da fase de remodelação óssea (Figura 1e e 1f). Levando em consideração os períodos pós-fratura, diferenças mais evidente entre os grupos (controle e experimental) foram notadas na 2ª semana pós-fratura (Figura 1a e 1b). Estes resultados provavelmente se devam a maior vascularização no local da lesão encontrada na fase um de consolidação óssea, 1ª semana após a lesão, provocada pelo estímulo elétrico (AARON; CIOMBOR, 1993). Os aspectos histológicos do calo ósseo formado em estímulo elétrico (4ª semana pós-fratura), observados na fase osteogênica, diferenciaram do formado espontaneamente (Figura 1c e 1d). Estes resultados sugerem que no grupo-controle mesmo tendo sido constituído por animais adultos jovens e sem pseudoartroses adquiridas ou congênitas, a corrente elétrica acelerou, embora não-quantificada, a cura da fratura, o que também é reportado na literatura por Herrera (1987). O referido autor constatou que a corrente elétrica contínua de 4,5 V reduziu em 50% o tempo de consolidação óssea em fraturas recentes. Aumento significativo na velocidade de regeneração, em torno de 20 a 30%, por meio de estímulos elétricos, também foi descrito por Reuter e colaboradores, (1987) e Reuter e colaboradores, (1984). Na literatura percentual mais elevado, em torno de 80%, é relatado por Haupt (1984) e Spadaro e colaboradores, (1972). Por outro lado, resultados diferentes são encontrados nos estudos de Bose e colaboradores (1988) e Klezzynski (1988). Para estes autores, a estimulação elétrica não acelera a cura das fraturas recentes uma vez que os aspectos histológicos, biomecânicos e radiológicos do calo constituído em estímulo elétrico não diferencia do constituído de forma espontânea. Os resultados obtidos no presente estudo reforçam, no entanto, os achados da literatura mais recente (ZORLU et al., 1998), que indicam a eficácia do uso da corrente elétrica não-invasiva no aumento da velocidade da reconstituição óssea tanto pós-lesão óssea recente, assim como nos casos de pseudo-artroses.

Bertolini, Cararo, Oliveira e Martins 29 5 CONCLUSÃO Com os resultados desta pesquisa é possível concluir que a corrente elétrica direta não-invasiva influencia na neoformação óssea, desde a fase fibroblástica, passando pela fase de colágeno até a fase osteogênica, acelerando o preenchimento ósseo em ratos submetidos à lesão de tíbia. Assim, seu uso apresenta-se como coadjuvante na indução do reparo tecidual. REFERÊNCIAS AARON R. K.; CIOMBOR D. M. Therapeutic effects of eletromagnetic fields in the stimulation of connective tissue repair. Journal of Cellular Biochemistry, v. 52, n. 1, p. 42-46, 1993. ANDREWS, J. R.; HARRELSON, G. L.; WILK, K. E. Reabilitação física das lesões desportivas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000. BASSET, C. A. L.; PAWLUK, R. J.; PILLA, A. A. Argmentation of bone repair by inductively coupled electromagnetic filds. Science, v. 137, p. 575-577, 1974. BOSE, K. et al. Effects of electrical ununited tibial diaphyseal tractures wth pulsing electromagnetic fields. J. Bone Joint Surg, v. 63, p. 511-523, 1988. BROWNER, B. D et al. Traumatismos do sistema músculo esquelético. São Paulo: Editora Manole, 2000. v. 1. CARREIRA, N. P.; BERTOLINI, S. M. M. G. Utilização da eletroterapia não-invasiva como forma de tratamento coadjuvante na aceleração do processo de consolidação óssea. 2003, 27 fls. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Fisioterapia) Centro Universitário de Maringá, Maringá, 2003. CARVALHO, D. C. L. et al. Tratamentos não-farmacológicos na estimulação da osteogênese. Rev. Saúde Pública, v. 36, n. 5, p. 647-654, 2002. GUIRRO, E.; GUIRRO, R. Fisioterapia dermato-funcional. 3. ed. São Paulo: Manole, 2002. HAUPT, A. H. Eletrical stimulation of osteogenisis. South Med J, v. 77, p. 56-64, 1984. HERRERA, A. B. Estimulación elétrica em fracturas recientes. Rev. Cuba Ortop. Traumatol, v. 2, n. 2, p. 17-23, 1987. KLEZZYNSKI, S. Electrical stimulation to promote the of fractures. International Orthopaedics, v. 12, p. 83-87, 1988. NOGAMI, H. et al. Effects of eletric current on hondrogenesis in vitro. Clinical Orthopaedics and Related Research, v. 163, p. 243-247, 1982. PRENTICE, W. E.; VOIGHT, M. L. Técnicas em reabilitação musculoesqueléticas. Porto Alegre: Artmed Editora, 2003. REUTER, U. et al. Modification of boné fracture healing by ultrasound in na animal experimental model. Z Exp Chir Transplant Kunstliche Organe, v. 17, p. 290-297, 1984.. Beeinflussung der Knichen bruchhcilung durch Ultrachall im Thermadell. Z Exp Chir Transpalt Kunstliche Organe, v. 20, p. 294-303, 1987. ROBSON, A. J.; SNYDER-MACKELER, L. Eletrofisiologia clínica. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2001. SALTER, R. B. Distúrbios e lesões do sistema músculoesquelético. 3. ed. Rio de Janeiro: Medsi, 2001. SOUZA, T. D.; DEL CARLO, R. J.; VILORIA, M. I. V. Eletroterapia no processo de reparação da superfície articular de coelhos. Cienc. Rural, v. 31, n.5, p. 819-824, 2001. SPADARO, J. A. Eletrically stimulated bone growth in animals and man. Clin Orthop, v. 122, p. 325-328, 1972. UDUPA, K. N.; PRASAD, G. C. Chemical and histoquemical studies on the organic constituents in fracture repair in rats. The Journal of Bone and Joint Surgery B, v. 458, p. 1-9, 1963. YUSUDA, I. Fundamental aspects of fracture treatment. J. Kyoto. Med. Soc., v.4, p. 395-406, 1953. ZORLU, U. et al. Comaparative study of the effet of ultrasound and electrostimulation on bone healing in rats. Am. J. Phys. Med Rehabil, v. 15. p. 427-432, 1998.