Tópicos em Física do Estado Sólido 1. Joniel Alves Departamento de Física, Universidade Federal do Paraná, Curitiba

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Transcrição:

Tópicos em Física do Estado Sólido 1 Joniel Alves Departamento de Física, Universidade Federal do Paraná, Curitiba jcfa06@fisica.ufpr.br Fevereiro 2014

2 Vamos estudar um pouco da física de semicondutores, em particular, o objetivo será entender alguns aspectos relacionados a estrutura eletrônica dos materias assim classificados. Entendendo a estrutur eletrônica de um sólido, nos permite entender o que significa ser bom condutor ou mal condutor (que chamamos de isolantes). Para tal, precisamos entender a o que muda na estrutura eletrônica de um átomo (ou molécula) quando esse é constituinte de um sólido.

Capítulo 1 Estrutura Eletrônica Quando dizemos estrutura eletrônica de um átomo (ou molécula), estamos nos referindo ao comportamento dos elétron pertencentes ao tal átomo(ou molécula). Um átomo (ou molécula) é um sistema puramente quântico. Segue que, para conhecer a estrutura eletrônica, devemos resolver a equação de Schrödinger 1 desse sistema ħ2 2m 2 ψ( r) +V ( r)ψ( r) = Eψ( r). (1.1) Se consideramos um átomo de hidrogênio, que é o sistema mais simples, esta equação dá a dinâmica do elétron no átomo. V ( r) é o potencial coulombiano de atração entre o elétron e o próton, ψ( r) é a função de onda do elétron, que é a função matemática que contém todas as informações necessárias sobre o comportamento do elétron nesse sistema. Uma ressalva, é que para resolver esse problema mudamos o referencial para as coordenadas relativas e do CM, então m na equação será a massa reduzida do sistema. Entretanto, uma vez que a massa do próton é muito maior que a do elétron, a interpretação dada acima, mesmo que aproximada, é válida. Na equação acima ainda temos a energia E do sistema, que nesse caso, aparece como um parâmetro. Uma das características marcantes dos sistemas quânticos, que também justificam esse nome, é o fato de que em sistemas ligados, como é o caso do elétron em um átomo (ou molécula), a energia do sistema não pode assumir qualquer valor. Dizemos que a energia é quantizada e o índice n é chamado de número quântico principal. Exemplo: Para o caso do átomo de hidrogênio, E n = 13,6 ev, (1.2) n2 que produz o espectro do átomo de hidrogênio Fig. (1.1), Em física quântica, os estados do sistema são determinados por um conjunto de números quânticos. Os estados menos energéticos têm n = 1, porém, existem outros números quânticos associados ao momento angular e ao spin Fig. (1.2). Como vimos acima, a energia depende apenas do número quântico principal n, mas o estado é determinado pela função de onda ψ n,l,ml,m s ( r) que depende de todos os números quânticos. Para o caso de átomos com mais de um elétron Fig. (1.3), entra em cena um princípio chamado princípio de exclusão de Pauli, que expressa uma interação de natureza quântica. O Princípio de Pauli diz que férmions, sistemas com spin semi-inteiro, não podem ocupar estados com mesmo número quântico. 1 Como estamos interessados no sistema estacionário e não perturbado, escrevemos a versão independente do tempo 3

4 CAPÍTULO 1. ESTRUTURA ELETRÔNICA Figura 1.1: Espectro do átomo de hidrogênio mostrando os primeiros níveis energéticos permitidos ao elétron. A partir deste diagrama é possível entender como se dão os processos de absorção e emissão de radiação. Na figura são mostradas as principais linhas espectrais. Figura 1.2: Números quânticos. Os números quânticos n, l e m não são independentes, e sua relação é mostrada na tabela. 1.1 Sólidos O exemplo do átomo de hidrogênio vale para a fase gasosa, ou seja, estamos supondo que não há interação do átomo com outro átomo, o que pode ser pensado como válido para o caso onde a distância entre os átomos é muito maior que o tamanho típico da extensão da função de onda do átomo. Este é o caso de um gás. Entretanto, ao aproximarmos dois átomos ele irão interagir, podendo até fomar uma ligação caso seja energéticamente favorável. Vamos imaginar o caso de dois átomo, ambos em seu estado fundamental, se aproximando para formar uma ligação. Desde que os átomos são idênticos, os elétrons em cada átomo estão em estados quânticos idênticos, ou seja, possuem os mesmos números quânticos. Devido a interação de Pauli, o novo sistema formado pelos dois átomos não pode possuir elétrons nos mesmos estados quânticos. Essa interação origina então dois outros estados, que são misturas dos estados dos átomos isolados, chamados de orbitais moleculares Fig.(1.4). No caso de um sólido, temos da ordem de 10 23 átomos formando o sólido, nesse caso, os estados dos átomos isolados se desdobram em um número de estados da ordem do número de átomos, porém, com a mesma dispersão energética, ou seja, o sólido deve possuir da ordem de 10 23 estados na mesma faixa de energia. Esse número é tão grande, que a diferença energética entre estados adjacentes acaba sendo tão pequena que parece formar um região energética de estados contínuos, que denominamos bandas

1.1. SÓLIDOS 5 Figura 1.3: Exemplo do átomo de cobre que possui 29 elétrons. (a) Se os elétrons fosse bósons, o estado de mínima energia do sistema seria aquele para o qual todos ocupassem o estado menos energético. (b) Como os elétrons são férmions, não podem ocupar estados com mesmos número quânticos, isso leva à distribuição eletrônica mostrada e conhecida como Regra de Hund Figura 1.4: Dois átomos inicialmente isolados são aproximados e as funções de onda dos elétrons interagem formando orbitais moleculares σ ligante e σ* anti-ligante. Fig. (1.5). As bandas são então compostas por um número muito grande estados eletrônicos acessíveis aos elétrons, e muito próximos energeticamente. Entre as bandas existem regiões com energias proibidas, ou seja, não existem estados eletrônicos com essas energias, formando uma lacuna energética entre bandas acessíveis. A diferençã energética entre o estado mais energético ocupado (chamado de banda de valência) e o próximo estado acessível (chamado de banda de condução) é conhecido como gap de energia ou simplesmente gap 2.. 1.1.1 Condução elétrica A classificação dos materias como bons condutores ou maus condutores é dada de acordo com o gap de energia. Em um metal, por exemplo, existe uma banda semi-preenchida, ou seja, o gap de energia é praticamente nulo, de modo que qualquer acréscimo de energia (como vibrações térmicas) é capaz de promover os elétrons a estados mais energéticos, produzindo condução elétrica com facilidade. 2 As distâncias energéticas, larguras de bandas, etc, são convenientemente dadas na escala de ev=1,6 10 19 J. Uma escala típica é kt=25mev para temperatura ambiente.

6 CAPÍTULO 1. ESTRUTURA ELETRÔNICA Figura 1.5: A esquerda uma célula unitária típica de um sólido regular que é a menor porção do sólido que repetida gera o sólido inteiro. A interação entre os átomos do sólido leva ao desdobramento dos níveis em bandas. Essa interação ocorre com todos os elétrons do átomo, entretanto, a interação é maior entre os elétrons mais externos. Isolantes Materiais isolantes são tais que possuem uma gap de energia muito grande entre as bandas de valência e de condução Fig. (1.6). Apesar de não haver exatamente um valor de gap a partir do qual os materiais podem ser chamados isolantes, pode-se adotar como isolantes, materias com E g > 3eV. Figura 1.6: Diagrama de bandas de um isolante típico a T=0. Os níveis até a banda de valência estão todos preenchidos. A diferença entre o topo da banda de valência e o mínimo da banda de condução é o gap, e a energia de Fermi se encontra entre as banda de valência e de condução. Metais Quando a banda de valência não estiver completamente preenchida, haverá estados com energias muito próximas acessíveis aos elétrons, ou seja, não há nenhum gap energético entre os elétrons mais energéticos e os próximos estados acessíveis Fig. (1.7). Dessa forma, se houver um campo elétrico externo, mesmo que muito pequeno, será suficiente para que os elétrons ganhem momento para produzir corrente elétrica. Semicondutores Quando os materias possuem um gap modesto entre as bandas de valência e de condução (< 3eV), obviamente não podem ser classificados como condutores. Entretanto, como os elétrons da banda de

1.1. SÓLIDOS 7 Figura 1.7: Diagrama de bandas de um metal típico a T=0 apresenta uma banda semi-preenchida, de modo que não há gap entre os estados de valência e condução. valência precisam de pouca energia para serem promovidos à banda de condução, mesmo estes sendo isolantes, podem se tornar condutores em situações específicas Fig. (1.8). Figura 1.8: Diagrama de bandas de um semicondutor típico a T=0. O diagrama é idêntico ao de um isolante, a menos do gap de energia ser pequeno. Note que os semicondutores não são bons condutores pois, mesmo que pequeno, ainda possuem um gap de energia a ser vencido para promover a condução. Outro fator relevante para que haja bom transporte, é a concentração de portadores, que no caso dos semicondutores, é muito menor que nos metais Fig. (1.9). A despeito de possuirem uma estrutura de bandas de um isolante, apresentam uma resistividade muito menor que de um isolante ordinário. Além disso, a resistividade é muito menor que de um isolante e aumenta com a temperatura, diferente dos metais Fig. (1.10). Entetanto há uma técnica capaz de aumentar significantemente a concentração de portadores nos semicondutores, de forma controlada, conhecida como dopagem. É a partir desta técnica que os semicondutores se tornaram o principal material para aplicações tecnológicas do século 20. 1.1.2 Semicondutores dopados Um dos principais materiais semicondutores é o silício, cuja distribuição eletrônica é 1s 2 2s 2 2p 6 3s 2 3p 2.

8 CAPÍTULO 1. ESTRUTURA ELETRÔNICA Figura 1.9: A tabela mostra os valores do gap de energia e concentração de portadores para alguns dos principais materiais semicondutores para T=0. Figura 1.10: Tabela comparativa mostrando características gerais de sólidos metálicos, isolantes e semicondutores. O silício é tetravalente, ou seja, possui 4 elétron na camada de valência. A técnica de dopagem consiste em diminuir o grau de pureza do mateiral semicondutor. No caso de um cristal de silício, por exemplo, o que se faz é substituir alguns átomos de silício por átomos das famílias imediatamente vizinhas, ou seja, átomos que sejam trivalentes ou pentavalentes. Esse procedimento altera a estrutura eletrônica do sistema de forma particular, deixando o material com caráter condutor. A concentração de impurezas pode variar, mas tipicamente se tem algo da ordem de 1 átomo de impureza para cada 10 7 átomos de silício, por exemplo. Semicondutores tipo n Se dopamos um cristal de silício com um material pentavalente, ou seja, um átomo que possua 5 elétrons de valência, então esse material formará as 4 ligações com os elétrons de valência dos átomos de silício vizinhos, sobrando um elétron sem fazer ligação 3. Esses dopantes são chamados de doadores. Como a banda de valência está cheia, esse elétron vai ocupar estados introduzidos pela estrutura eletrônica do átomo de impureza. Esses estados não formam uma banda porque a densidade de átomos de impureza é muito pequena comparada ao número de átomos do semicondutor. Esses são estados localizados, que ficam energéticamente próximos a banda de condução Fig. (1.11). Semicondutores tipo p Se dopamos um cristal de silício com um material trivalente, ou seja, um átomo que possua 3 elétrons de valência, então esse material formará 3 ligações com os elétrons de valência dos átomos de silício vizinhos, faltando um elétron sem fazer ligação. Esses dopantes são chamados de aceitadores. A falta de elétron pode ser entendida como um buraco, positivo, que fica livre no mateiral e que também de- 3 Note que o material continua neutro. Esse elétron adicional fica mais fracamente ligado ao átomo devido às propriedades dielétricas do semicondutor.

1.2. JUNÇÃO P-N 9 Figura 1.11: Exemplo de um crital de silício dopado com fósforo. Os elétrons extras ocupam estados muito próximos em energia ao fundo da banda de condução. sempenha um papel importante no transporte eletrônico 4. Esses são estados localizados, que ficam energéticamente próximos ao topo da banda de valência, e mais uma vez o semicondutor fica com caráter metálico. Entretanto, o transporte agora se dá por buracos e acontece na banda de valência. Figura 1.12: Representação bidimensional da rede cristalina do silício dopado com Bóro.Os elétrons extras ocupam estados muito próximos em energia ao topo da banda de valência. 1.2 Junção p-n Os dispositivos semicondutores mais utilizados são baseados em estruturas que contém materiais com os dois tipo de condutividade, p e n, em contato. A estrutura mais simples é a chamada de junção p-n. Na junção p-n, temos dois semicondutores com dopagens diferentes em contato, ou seja, em um deles 4 Lembre-se que a corrente elétrica convencional é dada usando-se a equivalência entre o movimento de uma carga negativa para um lado e de uma carga positiva para outro.

10 CAPÍTULO 1. ESTRUTURA ELETRÔNICA há excesso de buracos e no outro, excesso de elétrons. Ao se fazer contato 5 haverá um fluxo de elétrons para a região p e um fluxo de buracos para a região n. A difusão dá origem a uma carga espacial que produz uma diferença de potencial de contato entre as extremidades dessa região, que é chamada de zona de depleção Fig. (1.13). Figura 1.13: Potencial de contato produzido pela difusao de elétrons e buracos. O potencial da região de carga espacial equilibra a difusão dos elétrons e buracos. Diodo retificador Ao se aplicar uma diferença de potencial em sistema p-n, teremos efeitos diferentes dependendo da polaridade aplicada a cada extremidade. Como vimos, já existe um potencial de contato devido às diferentes condutividades, assim, o potencial externo simplesmente se soma ao potencial de contato. Se o potencial positivo é aplicado no lado n e o negativo no lado p, dizemos que foi aplicada uma polarização inversa. Nesse caso, o lado n vai ter seu potencial aumentado e o lado p terá o potencial diminuido, ou seja, a barreira de potencial aumenta e a resistência à passagem de corrente também. O potencial externo desequilibra o sistema, e a corrente térmica, antes equilibrada pela recombinação, não é mais anulada. Entretanto, essa corrente é muito pequena, apesar de não nula Fig. (1.14a). Se o potencial positivo é aplicado no lado p e o negativo no lado n, dizemos que foi aplicada uma polarização direta. Nesse caso, o lado n tem seu potencial dimuido e o lado p tem seu potencial aumentado, ou seja, a barreira de potencial diminui e a resistência à passagem de corrente também. Nesse caso a corrente térmica é vastamente sobrepujada e a corrente resultando é alta Fig. (1.15b). Isso dá origem ao comportamento típico do diodo retificador, pois, se uma tensão alternada for aplicada à junção p-n, haverá corrente toda vez que a polarização for direta e será praticamente anulada na polarização inversa, ou seja, o diodo transforma a corrente alternada em corrente contínua Fig. (1.15). Light-Emitting Diodo - LED Quando um elétron, em um semicondutor puro 6, é excitado da banda de valência para a banda de condução, este deixa um buraco na banda de valência. Como já discutimos, esse processo de promoção do elétron à banda de condução, é feito através da absorção de energia de um fóton ou de vibrações 5 Aqui estamos imaginando que os semicondutores do tipo p e n são colocados em contato por motivos didáticos, entretanto, tais estruturas são contruídas de outras formas. 6 Não dopado

1.2. JUNÇÃO P-N 11 Figura 1.14: Efeito resultante da polarização inversa (a) e direta (b) em uma junção p-n. Figura 1.15: Efeito resultante da polarização inversa (a) e direta (b) em uma junção p-n. térmicas. Esse par elétron-buraco, chamado de éxciton, interage, pois trata-se de uma carga negativa e uma carga positiva. Se houver a aplicação de um campo externo, esse par será dissociado, dando origem a uma corrente elétrica. Caso não haja um campo externo, o elétron pode voltar para a banda de valência, recombinando com o buraco e liberando a diferença de energia em forma de fóton ou vibração. Em semicondutores como silício e germânio, a diferença de energia é sempre liberada em forma de vibrações da rede 7. Entretanto, é possível produzir luz com semicondutores como o arsenieto de gálio. Se a recombinação acontece com um elétron da extremidade inferior da banda de condução, o comprimento de onda do fóton emitido será λ = E gap hc. (1.3) Para isso precisamos de um semicondutor com uma grande taxa de recombinação, que é possível com uma junção p-n fortemente dopada. Ao se aplicar uma diferença de potencial haverá uma redução da zona de depleção e uma grande quantidade de elétrons do lado n estará nas proximidades de uma grande concentração de buracos do lado p, resultando em uma grande taxa de recombinações, ou seja, uma grande intensidade luminosa Fig. (1.16). 7 Isso acontece porque o mínimo da banda de condução não concide com o máximo da banda de valência nesses cristais.

12 CAPÍTULO 1. ESTRUTURA ELETRÔNICA Figura 1.16: Estrutura típica de um LED e diagrama mostrando recombinação seguida da emissão de um fóton. Fotodiodo Caso a estrutura seja montada de modo que a dissociação seja privilegiada, então um elétron na banda de valência pode absorver um fóton e ao ser promovido para a banda de condução, o par elétron-buraco resultará em corrente elétrica, ou seja, haverá conversão de energia luminosa (radiação absorvida) em energia elétrica. Esse é o princípio de funcionamento dos dispositivos fotovoltaicos (células solares) Fig. (1.17). Figura 1.17: Diagrama dos processos de absorção e dissociação de um éxciton em um dispositivo fotovoltaico.

Capítulo 2 Eletronica Orgânica Na década de 70, Shirakawa, Heeger e MacDiarmid, conseguiram desenvolver polímeros condutores. Polímeros são macromoléculas formadas pela repetição de uma unidade molecular (mero). Por exemplo, o polietileno (CH 3 (CH 2 ) N CH 3 ) tem como mero as moléculas de CH 2, como mostra a Fig. 2.1. O ] Figura 2.1: Exemplo de polímero. Polietileno tem como mero as moléculas de CH 2 número dessas unidades estruturais que formam o polímero é chamado de grau de polimerização, e tipicamente, uma molécula é chamada de polímero se seu grau de polimerização excede 100 unidades. Entre os polímeros, destacam-se os polímeros conjugados, que são baseados em carbono com alternância de ligações duplas e simples ao longo da cadeia polimérica. A figura 2.2 mostra uma cadeia de poliacetileno que é um exemplo simples de polímero conjugado. A marca registrada dos polímeros conjugados é a hibridização sp 2 dos carbonos. Nessa hibridização um orbital s se mistura com dois orbitais p, resultando em ligações σ que dão rigidez estrutural ao polímero, isso deixa um elétron por átomo de carbono no orbital p z. A sobreposição destes orbitais p z de átomos de carbono vizinhos permite a delocalização desses elétrons em orbitais π ao longo da cadeia polimérica. A alternância nas ligações duplas e simples (dimerização) confere ao polímero uma estrutura eletrônica comparável à de um semicondutor, ou seja, um orbital HOMO (orbital molecular ocupado de maior energia) e um LUMO (orbital molecular desocupado de mais baixa energia) com uma separação energética modesta ( 1 2eV) entre eles. Figura 2.2: Exemplo de polímero conjugado. Poliacetileno tem como mero as moléculas de CH 2 Os polímeros conjugados aliam então as propriedades eletrônicas de um semicondutor com as propriedades mecânicas dos plásticos, sendo por isso materiais muito usados nas aplicações em eletrônica orgânica. Várias destas aplicações opto-eletrônicas dos polímeros conjugados, normalmente na forma 13

14 CAPÍTULO 2. ELETRONICA ORGÂNICA de filmes de alta densidade, apareceram nos últimos 20 anos: dispositivos emissores de luz (OLEDs), material ativo de células foto-voltáicas, sensores, etc. ] Figura 2.3: Exempĺos de dispositivos eletrônicos baseados em carbono.