PROJETO MIRACEMA: ESTRUTURAÇÃO E FUNCIONAMENTO Jucélia Linhares Granemann Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus de Três Lagoas juclia313@yahoo.com.br Eixo Temático: Rede de apoio na constituição do processo escolar inclusivo Palavras-chave: Brinquedoteca. Criança. Hospital 1 Introdução A hospitalização é um processo complexo para qualquer indivíduo, pois pode afastá-lo de sua vida cotidiana, do ambiente familiar e promover um confronto com a dor, a limitação física e a passividade, aflorando sentimentos de culpa, punição e medo da morte. A literatura norte-americana explica que, até 1930, a assistência mundial à criança hospitalizada tinha por finalidade exclusivamente de curar doenças com um tratamento rigoroso. Hoje, porém, muitas mudanças já foram concretizadas. A transformação no conceito de criança, agora vista como um serem crescimento e desenvolvimento, não só com necessidades biológicas, mas também psicológicas, sociais, cognitivas e emocionais, é um dos grandes exemplos. Outro marco observado nessa rede de assistência foi a publicação do Relatório Platt (Ministry Of Health), em 1959, na Inglaterra. Esse documento trouxe à tona a preocupação com o bem-estar da criança internada em instituições hospitalares e levou pais e profissionais a discutirem e analisarem o processo de hospitalização, procurando alternativas para humanizar essa experiência (LIMA; ROCHA; SCOCHI, 1999). Anteriormente, já pensando nessa problemática, em 1935, Henri Sellier, em Paris, funda a primeira escola para crianças inadaptadas (termo na época empregado para se referir aos alunos que apresentavam deficiências e/ou demais limitações nas diversas áreas de seu desenvolvimento). Seguidamente, esse atendimento expandiu-se para a Alemanha, a França e os Estados Unidos, com a finalidade de suprir as dificuldades escolares em crianças em tratamento de tuberculose. Pode-se dizer, no entanto, que a partir da Segunda Guerra Mundial é que esse atendimento às crianças e aos adolescentes mutilados e impossibilitados de frequentar a escola teve origem oficial e esses atendimentos, gradativamente, foram se alocando nas brinquedotecas e nas chamadas classes hospitalares. No Brasil, o Ministério da Educação e Cultura implantou, a
partir da Política Nacional de Educação Especial (1994), o serviço de classe hospitalar, que garante, com professores formados e capacitados, a continuidade escolar do aluno da educação infantil, do ensino fundamental e médio. Nessa perspectiva, o art. 214 da Constituição federal de 1988 afirma, além disso, que as ações do Poder Público devem conduzir à universalização do atendimento escolar. Entretanto, diversas circunstâncias podem interferir na permanência escolar ou nas condições do conhecimento ou, ainda, impedir a frequência, temporária ou permanente. Por outro lado, o direito à saúde, segundo a Constituição (BRASIL, 1988, art. 196), deve ser garantida mediante políticas econômicas e sociais que visem ao acesso universal e igualitário às ações e aos serviços, tanto para a sua promoção, quanto para a sua proteção e recuperação. Concomitantemente, a exigência do reconhecimento do direito à educação especial para o conjunto das crianças que, em algum momento de sua escolaridade, requerem apoio adicional ou recurso especial, de forma temporária ou contínua, partiu de uma intensa luta política internacional pelo reconhecimento do direito fundamental de toda criança à educação e à oportunidade de atingir e manter um nível adequado de aprendizagem, que culminou na Declaração de Salamanca, em 1994, sobre princípios, política e prática em educação especial. Nela encontramos alicerçada a defesa do acesso à educação para toda e qualquer criança, independentemente de quaisquer condições temporárias ou contínuas que apresentem. Já na Política Nacional de Educação Especial (PNEE) (BRASIL, 1994), a educação em hospital aparece como modalidade de ensino e de onde decorre a nomenclatura de classe hospitalar. Sua oferta educacional não se resume às crianças e aos adolescentes com transtornos do desenvolvimento como foi no passado (de 1950 a 1980), mas também àqueles em situação de risco no lar, uma vez que a hospitalização impõe limites à socialização e às internações, o afastamento da escola, dos amigos, da rua e da casa, além de regras sobre o corpo, a saúde, o tempo e os espaços. Em função de tais intercorrências, o direito à continuidade dos estudos escolares durante a internação hospitalar foi também reconhecido pela Declaração dos Direitos da Criança e do Adolescente Hospitalizados (BRASIL, 1995), e o Ministério de Educação (MEC), por intermédio da Secretaria Nacional de Educação Especial, propiciou o atendimento educacional deles nos hospitais, criando como já citado, o serviço de classes hospitalares (BRASIL, 2002). De modo geral, essa exigência do reconhecimento do direito à Educação no Brasil em enfermarias pediátricas partiu de uma das principais associações científicas brasileiras na área
da pediatria - a Sociedade Brasileira de Pediatria. Esse procedimento, que teve ampla repercussão nas organizações não governamentais de luta pelos direitos da criança, foi matéria de deliberação específica dos direitos da criança e do adolescente hospitalizado, pela Resolução n 41, de 13 de outubro de 1995, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, com a chancela do Ministro da Justiça (BRASIL, 1995). Esse documento dispõe que a criança internada deve receber amparo psicológico, quando necessário, e desfrutar de alguma forma de recreação, de programas de educação para a saúde e de acompanhamento do currículo escolar de acordo com a fase cognitiva, durante sua hospitalização. A Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996, de Diretrizes e Bases da Educação, define a educação especial como uma modalidade da Educação Escolar, um conjunto de recursos e procedimentos específicos do processo de ensino e aprendizagem colocados à disposição dos alunos com necessidades especiais, em respeito as suas diferenças, para que eles tenham acesso ao currículo e, consequentemente, conquistem sua integração social (BRASIL, 1996). A mesma Lei, em seu capítulo V, art. 58 2, determina que: "O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular" (BRASIL, 1996). 2 Objetivos Nessa organização, será buscado, por meio da participação de acadêmicos, matriculados nos cursos de licenciaturas da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, construir um modelo pedagógico-educacional para atuar na brinquedoteca e nos leitos do Hospital Auxiliadora, localizado na cidade de Três Lagoas, Estado de Mato Grosso do Sul, utilizandose de jogos, brincadeiras, atividades escolares e recreativas, previamente planejadas por esses acadêmicos. 3. Metodologia Nessa perspectiva, esse projeto parte do pressuposto de que toda deficiência, quanto qualquer patologia, seja qual for, pode caracterizar-se como uma condição de risco ao
indivíduo, pois sua instalação o predispõe a uma série de dificuldades para a adaptação e evolução escolar, nesse e após esse período. Estudar e/ou entender tais situações, torna-se imprescindível para que profissionais lotados nas áreas de educação, da saúde e/ou de áreas afins, além de acadêmicos em formação, possam através da operacionalização de diversos projetos, reuniões de estudos, formações e/ou demais discussões, mapear um quadro mais autêntico desse processo, bem como indicar estratégias para avaliar e minimizar seus impactos na escolaridade, como também nas demais áreas do desenvolvimento. 4. Resultados e Discussões Por intermédio de estudos e discussões, construiu-se no hospital um programa educacional-pedagógico, onde pode-se verificar que a hospitalização em nada impede que novos conhecimentos e informações possam ser adquiridos pela criança ou pelo jovem e venham a contribuir tanto para seu desenvolvimento escolar quanto para amenizar sua doença e para recuperar sua saúde. Nesse processo, a criança deve ser trabalhada integralmente de modo a dispor de um atendimento que corresponda a seu ciclo vital de desenvolvimento e de aprendizagem, levando-a a um desejo de cura (FONSECA, 2003). Nesse processo, Porto (2007) explica que essa aprendizagem possui uma função integradora, estando diretamente relacionada ao desenvolvimento psicológico, denotando as possibilidades de interação e adaptação da pessoa à realidade ao longo da vida, sofrendo múltiplas influências de fatores ambientais e individuais. Nessa trajetória, em muitas vezes, as crianças não são capazes de expressar nem de reproduzir o que as faz temer, desenvolvendo angústias, fazendo surgir depressão, revolta ou desespero, ou ainda a possibilidade de regressão no nível de desenvolvimento. Mais uma vez, o professor fará a diferença, observando, avaliando e trazendo o sentimento de valorização da vida, amor próprio, autoestima, aceitação e segurança, recuperando esses prazeres e garantir a construção dos conhecimentos que estariam acontecendo em ambiente escolar. Pois, segundo Appel (2000, p. 15), "ter um aluno nessas condições gera também no docente, diversas reações. Haverá momentos em que este não se sentirá apto para trabalhar e se deprime com a situação da criança. 5. Conclusões
Nesse processo, ao a criança compartilhar suas preocupações com outros membros da escola, assistentes sociais, psicólogos, médicos pode ajudar a diminuir a angústia. Então, em sua relação com o ambiente é que ele aprende, modifica seu comportamento, e esse aprendizado ocorre com as consequências de sua resposta, mesmo sem estar sendo ensinado formalmente. Gonçalves e Valle (1999) referem que, realizando as atividades pedagógicoeducacionais propostas pelas classes hospitalares, se atenuam as expectativas de prejuízos causadas por uma internação hospitalar, que na infância é bastante significativa. Esse projeto, em geral tem amenizado ao aluno, o impacto da doença, diminuindo o estresse dela e da hospitalização e as dificuldades de aprendizagem e de escolarização, colaborando nos processos de formação e capacitação de profissionais atuantes na área e/ou com essa clientela. Referências APPEL, S. Siempre es tiempo de aprender. Declarado do Interés Educativo. Mansilla, Argentina; Buenos Aires, Capital Federal: Ministerio del Interior Subsecretaria de Relaciones con la Comunidad; Ministerio de Cultura y Educacion de la Nación, 2000. BRASIL. Constituição (1988). República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 16. ed. atual. ampl. São Paulo: Saraiva, 1998.. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, dez. 1996.. Ministério da Educação e Cultura. Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente Resolução n 41, de 13 de outubro de 1995. Direitos da criança e do adolescente hospitalizados. Brasília: Imprensa Oficial, 1995... Política nacional de educação especial. Brasília: MEC/SEESP, 1994. Livro 1... Secretaria de Educação Especial. Classe hospitalar e atendimento pedagógico domiciliar: estratégias e orientações. Brasília: MEC; SEESP, 2002. FONSECA, E. S. Educador em plantão: aulas em hospitais asseguram continuidade dos estudos e desempenham papel fundamental na recuperação de alunos internados (entrevista). Revista Educação, v. 6, n. 7, p. 18-22, 2003. GONÇALVES, C. F.; VALLE, E. R. do. A criança com câncer na escola: a visão das professoras. Acta Oncológica Brasileira, 1999. LIMA, R. A. G.; ROCHA, S. M. M.; SCOCHI, C. G. S. Assistência à criança hospitalizada: reflexões acerca da participação dos pais. Rev. latino-am. enfermagem, Ribeirão Preto, v. 7, n. 2, p. 33-39, abr. 1999. PORTO, O. Psicopedagogia institucional: teoria, prática e assessoramento psicopedagógico. São Paulo: Wak Editora, 2007.