MUDANÇAS NO MUNDO DO TRABALHO E INFORMALIDADE: primeiras aproximações sobre a realidade atual dos ambulantes e camelôs de Natal

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Sobre esta apresentação

Transcrição:

MUDANÇAS NO MUNDO DO TRABALHO E INFORMALIDADE: primeiras aproximações sobre a realidade atual dos ambulantes e camelôs de Natal Brenda Joceli da Silva Cruz 1 Eliana Costa Guerra 2 Resumo: Este artigo tem por objetivo tecer comentários acerca das transformações no mundo do trabalho, abordando, em particular formas alternativas de sobrevivência, expressas no que se designa por informalidade. A partir da revisão de literatura, tratamos da questão do desemprego estrutural e da informalidade no contexto atual de mundialização e flexibilização das relações de trabalho. Neste contexto, ilustramos as novas modalidades de trabalho informal e suas expressões no setor do comércio ambulante. Palavras-chave: mundo do trabalho, flexibilização, desemprego, informalidade, comércio ambulante. NOTES ABOUT THE CHANGES IN THE WORLD OF WORK AND THE INFORMALITY: first approximations on the current reality of stalls and street peddle of Natal Abstract: This article aims to make comments about changes in the world of work, addressing, in particular alternative forms of survival, expressed in termed informality. From the review of literature, we treat the issue of structural unemployment and informality in the current context of globalization and relaxation of employment relationships. In this context, illustrate new informal working arrangements and their expressions business itinerant. Key word: World of work, unemployment, informality, business itinerant. 1 Mestranda. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: brendajoceli155@msn.com. 2 Docente. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. E-mail: elianacostaguerra@hotmail.com

1. INTRODUÇÃO O presente estudo faz parte das reflexões realizadas no mestrado em serviço social, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Tem por objetivo abordar a relação entre as transformações no mundo do trabalho e a expansão da informalidade na atual fase do mundialização capitalista de dominância financeira (CHESNAIS, apud MARANHÃO, 2008). Enfoca o caso do comércio ambulante, no município de Natal, mais especificamente no bairro Alecrim, um dos centros comerciais de maior dinamismo da cidade. Em um primeiro momento nos detemos nas alterações no mundo do trabalho e nas suas conseqüências para o trabalhador, abordando as estratégias adotadas pelo capital na tentativa de superar mais uma de suas crises. Num segundo momento, realizamos uma aproximação com o fenômeno do desemprego na atualidade, como forma de apreender o movimento dinâmico no atual estágio de acumulação capitalista, que incide diretamente na configuração do trabalho informal. No terceiro e último momento, ilustraremos como estas alterações têm se manifestado em um contexto mais específico, a saber, o comércio informal da cidade de Natal e, em particular, no âmbito do comércio ambulante deste município. Consideramos que o estudo da realidade é sempre um processo de contínua aproximação com o movimento do real, a partir de bases teórico-metodológicas. Assim, a pesquisa que ora realizamos ganha relevância no tempo presente e no espaço geográfico delineado como objeto de estudo por seu caráter inédito e por, através do método da econômica política, permitir pôr em evidencia aspectos das configurações atuais do modo de produção capitalista, no momento em que vivenciamos mais uma de suas crises, com repercussões dramáticas, de caráter sistêmico em decorrência do processo de mundialização do capital, que interliga o conjunto das economias globais, atingindo de modo particular determinadas econômicas nacionais e locais. Finalmente, o caso em foco possibilita evidenciar como os trabalhadores que se encontram em condições de maior precariedade aqueles que vivem na informalidade tornam-se mais e mais objeto de interesse e, mesmo, peças importantes para o capital globalizado na sua tentativa precípua de reproduzir-se de forma ampliada, mantendo o ciclo da acumulação a despeito de suas crises. 2. Alterações no mundo do trabalho e informalidade:

Na contemporaneidade, a informalidade parecer dar o tom de parte significativa das alterações verificadas no mundo do trabalho. Ao lado do desemprego crescente, resultado direto dos processos de reestruturação produtiva, destaca-se como um fenômeno antigo, mas de contornos e amplitude nunca dantes vistos. A informalidade em tempos de capital flexível: de intersticial a determinante Dados do IPEA 2005 evidenciam que praticamente metade da força de trabalho no Brasil está empregada no setor informal. Entre 1992 e 2004, o percentual de trabalhadores subcontratados e informais cresceu de 38,3% para a taxa de 51, 2% (PNAD, 2005). Estes dados revelam as transformações em curso no mundo do trabalho, que engendram mudanças significativas não apenas nas relações de produção, mas que envolvem a sociabilidade humana, de modo geral. Esses dados evidenciam a tendência contemporânea a um aumento considerável de trabalhadores sendo expulsos do mercado formal de trabalho e impelidos a buscar formas alternativas de trabalho na informalidade. No contexto atual marcado por mais uma crise do capital, é crescente o contingente de trabalhadores integrando o exercito industrial de reserva. Braz e Netto (2006, p.157) afirmam, que a crise é constitutiva do capitalismo: não existiu, não existe e não existirá capitalismo sem crise, sendo as mesmas inevitáveis. No momento em que entra em crise, o capital utiliza diversas estratégias para seguir se reproduzindo de forma ampliada. Assim, a partir do final dos anos 1970, o capital utiliza-se do receituário neoliberal para conferir nova dinâmica ao processo de produção, buscando superar a crise que então se perfilava. No Brasil, segundo Tavares e Alves (2006, p. 428) a partir da década de 1990, observa-se um grande crescimento da economia informal nas médias e grandes cidades (...), passando a englobar um conjunto heterogêneo de trabalhadores, inseridos em um contexto mais amplo de precariedade. Iamamoto (2000) afirma que as transformações que afetam o mundo do trabalho e da produção em escala global atingem não somente a economia ou a política, mas têm um impacto profundo na esfera da sociabilidade. A autora ressalta que estamos vivendo a sociedade de mercado. Diríamos mesmo que a estamos vivenciando em todo o seu esplendor! Para Antunes (1997), no âmbito da mundialização, podemos observar três dimensões que revelam as alternações no mundo do trabalho, a saber: a flexibilização, o desemprego e a informalidade. Três aspectos de uma mesma realidade, que se entrelaçam

e se interligam no movimento de acumulação capitalista. A respeito dessas transformações, o autor ressalta que: Particularmente nos últimos anos, como respostas do capital à crise dos anos 1970, intensificaram-se as transformações no próprio processo produtivo, por meio do avanço tecnológico, da constituição das formas de acumulação [...] (ANTUNES, 1997, p. 180). No atual momento de flexibilização, são características fundamentais, o amplo enxugamento das empresas, com demissões e contratações temporárias, as terceirizações, a exigência da polivalência, fruto das mudanças nas formas de organizar a produção e consumir a força de trabalho (IAMAMOTO, 2000). Reduz-se a demanda por trabalho vivo. Este processo está apoiado no desenvolvimento tecnológico, na robótica na microeletrônica, na informática, que afetam de maneira direta a produção e as relações sociais. Com efeito, o avanço tecnológico tem contribuído, sobremaneira, para a constituição de uma superpopulação, cujo papel é relevante no processo produtivo, permitindo maior liberdade de reprodução ao capital, além de possibilitar a composição de um amplo setor informal funcional aos processos de produção e circulação de mercadorias. No Brasil, segundo Mota e Amaral (2000), a marca da reestruturação produtiva [...] é a redução de postos de trabalho, o desemprego dos trabalhadores do núcleo organizado da economia e a sua transformação em trabalhadores por conta própria, trabalhadores sem carteira assinada, desempregados abertos, desempregados ocultos por trabalho precário, desalento, etc. ( 2000, p. 35) Para Antunes (2006) nos [...] primeiros anos da década de 1980, a reestruturação produtiva caracterizou-se pela retração de custos, mediante a redução da força de trabalho, especialmente nos setores automobilístico e nos ramos têxtil e bancário. Os anos 1990 foram decisivos para o Brasil sob vários aspectos: as tentativas insistentes de derrubar o recém criado sistema de proteção social brasileiro, que creditava à população uma série de direitos legalmente instituídos, frutos de lutas sociais, a intensificação do processo de reestruturação produtiva e a contra-reforma do Estado, inicialmente com Collor, a partir de 1990, seguindo-se com o plano real encetado por Fernando Henrique Cardoso (FHC), com vistas à chamada estabilidade econômica. Como lembra Antunes (2006), nesse período: Presenciou-se praticas flexíveis de contratação da força de trabalho nos bancos, maior precarização dos empregos e redução de salários, aumentando o processo de desregulamentação do trabalho e de redução dos direitos sociais para os empregadores em geral e de modo ainda mais intenso para os terceirizados (Antunes, 2006, p. 20).

Com efeito, a informalidade, o trabalho informal nos setores produtivos e no comércio, pareciam realidades a serem abolidas com o desenvolvimento das forças produtivas. Os chamados trinta anos gloriosos, vivenciados nos países centrais do capitalismo, pareciam apontar para a perspectiva de integração social pela via da inserção no mundo formal de trabalho do conjunto dos trabalhadores em idade e condições de produzir. O Estado social democrata, com suas políticas de bem estar social assumiu posição de destaque na regulação da economia e da vida social. Mas, o sonho acabou! A crise iniciada nos anos 1970 nestes países evidenciou que tal perspectiva não se sustentava, nem mesmo naquelas economias. Progressivamente, a saída inicial pela via da informalidade, sobretudo, nos países periféricos ou em desenvolvimento, como estratégia de sobrevivência se transforma em modus operandi de um novo regime de acumulação, em que as fronteiras entre o formal e o informal parecem cada dia mais tênues. Mas, o trabalho segue central na organização da vida social. Dito de outro modo, em tempos de reestruturação produtiva, de reordenamento do capital, de crescimento da informalidade o trabalho ainda constitui o eixo fundante do ser social. Desemprego: expressão maior do atual processo produtivo capitalista Nos tempos contemporâneos, o desemprego constitui, um dos principais resultantes dos processos de reestruturação produtiva e de flexibilização. Vasapollo (2006, p. 52) afirma que a globalização neoliberal e a internacionalização do processo produtivo estão acompanhadas da realidade de centenas e centenas de milhões de trabalhadores desempregados e precarizados no mundo inteiro. O caráter estrutural do desemprego, sua funcionalidade para o capital, contribuindo para a constituição de um exercito industrial de reserva sem precedentes na história do capitalismo tem mobilizado pesquisadores e governantes. Para Marx, o advento da maquinaria constitui uma verdadeira revolução no interior do modo de produção em geral fazendo aumentar o número de trabalhadores desocupados. Com a introdução da maquinaria, uma parte dos trabalhadores torna-se desnecessária. Nesse sentido, Marx concluiu ainda no século XIX que uma quantidade determinada de trabalhadores é posta para fora do processo de produção e seus postos de trabalho extintos como sendo, ambos, inúteis à produção de mais-trabalho. Maranhão (2008), afirma que: A incorporação constante de novos maquinários e técnicas empreendeu, desde o surgimento da grande indústria, uma ampliação considerável de sua parte constante

e realizou um gradativo decréscimo de sua parte variável, aumentando a descartabilidade da força de trabalho.(2008, p. 101) Esse grupo de trabalhadores expulsos ou descartados do mundo da produção, faz crescer as taxas de desemprego. Para Maranhão (2008) O mundo industrializado se caracteriza, cada vez mais, pelo desemprego de longa duração, que está privando uma parcela considerável de trabalhadores da possibilidade de sustento. No contingente que compõe o exército industrial de reserva atual estão presentes trabalhadores de longa duração, trabalhadores temporários, trabalhadores que transitam entre os setores formal e informal da economia e toda sorte de trabalhadores precarizados e mesmo aqueles em condições de trabalho semi-escravo ou escravo. Além destes, não se pode esquecer aqueles que compõem o lúmpem proletariado. Verificamos assim, o aumento do tempo médio de procura por trabalho, bem como a ampliação do subemprego e do desemprego. A isso acrescente-se o crescimento dos níveis de desigualdade e de pobreza, não somente nos países periféricos mas também nas economias centrais. O desempregado de longa duração e, sobretudo, aqueles recentemente expulsos dos setores ditos formais da economia compõem a teia complexa de trabalhadores na informalidade. A Informalidade: novos contornos, práticas antigas... na luta pela sobrevivência, a saída encontrada finda por respaldar o ataque às conquistas trabalhistas Para Maranhão (2008), a informalidade tem relaçao direta com a superpopulação relativa criada pelo capital, que corresponde à uma população acima da necessidade imediata de incorporação à produção. Ao contrário de um simples distúrbio, essa superpopulação é necessária à acumulação e ao desenvolvimento da riqueza no sistema capitalista (2008, p. 103). Tavares e Alves (2007) afirmam que a tendência ao aumento das formas de trabalho precarizadas se dá em escala mundial, sendo intensificada no Brasil a partir da década de 1990.. Incluem-se no contingente dos precarizados, os trabalhadores terceirizados, subcontratados, temporários, com sucessivos contratos temporários, trabalhadores por conta própria, desempregados, dentre outros. Os autores consideram ainda : duas categorias de trabalhadores como participantes da informalidade: os assalariados sem registro, que são contratados de forma ilegal e não tem acesso a um conjunto de garantias socais e os trabalhadores por conta própria, que atam na área de prestação de serviços e contém com a ajuda de familiares ou de ajudantes.

Para o estudo da informalidade precisamos compreender o movimento de criação de excedente de trabalhadores, considerados supérfluos para o capital, mas que têm uma função no sistema, que já não consegue absorvê-los em níveis mais expressivos como acontecia nos anos dourados. Na verdade, o capital necessita deste contingente de trabalhadores para exercer pressão sobre salários e sobre seus custos de produção e reprodução. Ao tratarmos da informalidade e, em particular, da questão do comércio ambulante/camelô, com expressões singulares na atual fase de acumulação capitalista, evidenciamos sua função precípua na circulação de mercadorias, com redução significativa dos custos propiciando níveis de lucro mais importantes. Atualmente, presenciamos tipos de informalidade diferente daqueles observamos em fases pretéritas do modo de produção capitalista. Para Coutrim (2007), no mercado informal, há velhos e novos trabalhadores, frutos da dinâmica histórica. Tavares e Alves (2006) elencam nesse contexto, três tipos de trabalhadores informais: os tradicionais, os assalariados sem registro, e os por conta própria. No comércio ambulante observamos mudanças significativas, sobretudo na composição da cesta de mercadorias e na notável versatilidade dos ambulantes em conformidade com o calendário de eventos que mobilizam seus potenciais compradores. Para Lira (2002), a informalidade está associada às ocupações nas quais as relações de trabalho não obedecem à legislação trabalhistas, gerando uma rede de produção de bens e serviços que atendem as necessidades de consumo de grande parte daqueles que vivem e/ou trabalham na informalidade (LIRA, 2002, p.143) Hoje, os novos e velhos ambulantes e camelos, participam de uma dinâmica diferente daquela observada no inicio do século, todavia, não isenta de conflitos e tensões. Desde a década de 1910, no contexto brasileiro, os ambulantes não eram bem vistos (COUTRIM, 2007), eram acusados de sujar as ruas, de serem malandros e concorrerem com o mercado local, (e legal). Havia embates com a policia, o que não difere muitas vezes do que ocorre hoje em muitas metrópoles. O Bairro Alecrim, no município de Natal, se destaca por seu comércio de maior densidade no contexto da capital (COSTA, 2009). Aos fins de semana, o alecrim recebe cerca de 150 mil consumidores, que vão à busca dos mais variados produtos, desde peças automotivas de todas as linhas, confecções, tecidos, calçados, eletroeletrônicos, material de construção de todos os segmentos (Bulhões, 2008). Existe mais de duas mil barracas de camelos,que ocupam as vias das calçadas Atualmente, ali transitam novos e velhos

ambulantes e camelôs, participando de uma dinâmica diferente do inicio do século. Neste bairro a divisão entre o formal e o informal parece cada dia mais tênue, as relações cada dia mais conflitantes. Ali, são comuns os problemas decorrentes da concorrência entre aqueles que pagam impostos e os que não pagam impostos e que escolhem o Alecrim para atuar (camelôs/ambulantes). Ali verificamos ainda uma teia de relações de complementaridade entre o setor dito formal e os trabalhadores informais. Segundo dados do IBGE, o comércio popular do Alecrim figura entre um dos 100 maiores do país, possuindo, cerca de 3 mil empresas e 30 mil comerciários. Dessa forma se constitui em um campo fértil para podermos observar as alterações no mercado e trabalho e como que as tensões verificadas na dinâmica do bairro são explicativas para compreender o processo de desenvolvimento das forças produtivas capitalistas. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS A sociedade capitalista tem vivenciado uma serie de crises, consideradas por autores consultados como partes constitutivas do modo de produção capitalista, sendo inelimináveis de sua estrutura. Como vimos, a introdução da maquinaria teve um papel fundamental na constituição de uma massa de trabalhadores supérfluos. Assim, o modo de produção capitalista tem imposto novas formas de relações trabalhistas e relações sociais, decorrentes, dentre outros fatores, da não-absorção de parcelas cada vez maiores de trabalhadores pelo mundo formal de trabalho. Assim, os trabalhadores têm na informalidade a alternativa (precarizada) de se inserir no mundo do trabalho, em alternativa ao desemprego, ao não emprego. Esta alternativa se apresenta em decorrência do desenvolvimento do modo de produção capitalista, compreendendo parcelas significativas da população, expulsas do mercado formal de trabalho, na constante dinâmica de expulsão/integração pelo capital. O bairro do Alecrim representa um importante campo de observação para compreendermos como vêm se dando as alterações no mundo do trabalho, em particular aquelas que afetam o âmbito da circulação de mercadorias, alimentadas pela reestruturação produtiva produtoras da informalidade, fruto da dinâmica mundial em curso atualmente. As pontuações aqui realizadas evidenciam a pertinência de estudos neste campo e o quanto ainda há a analisar, refletir, e estudar sobre mundo do trabalho, suas constantes

alterações, na busca do sistema capitalista por sua reprodução e hegemonia em nível mundial. 4. REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 10 ed. São Paulo: Cortez, 2005.. (Org.) a era da informatização e a época da informalização: riqueza e miséria do trabalho no Brasil. São Paulo, Boitempo, 2006. BULHÕES. Airton. Francisco Demerval: O Alecrim precisa ser revitalizado. Disponível em: http://tribunadonorte.com.br/noticia.php?id=84355. acesso em 30.04.2009 COSTA. José. A reciclagem do comércio do Alecrim. Disponível http://www.revistafocorn.com/edicao131/economia.htm acesso em 03.05.2009 COUTRIM, Rosa. Ambulantes e camelos. Passado e presente. Ciência Hoje. Vol. 39, nº 234. jan-fev. Campinas, 2007. DEDECCA. Claudio. Setor Informal e informalidade no Brasil. Ciência hoje. Vol. 39. nº 234. jan-fev. Campinas 2007. IBGE. Anuário Estatístico do Brasil/1990. Rio de Janeiro, 1990. LIRA. Izabel. Informalidade: reflexões sobre o tema. In: Serviço Social & Sociedade nº. 69, São Paulo: Cortez, 2002. MARX. KARL. Maquinaria e Trabalho Vivo (Os Efeitos da Mecanização Sobre o Trabalhador). Disponível em: http://www.marxists.org/portugues/marx/1863/05/maquinaria.htm acesso em 30.04.1009. MARANHÃO. Cesar. Capital e superpopulação relativa: em buscadas raízes contemporâneas do desemprego e do pauperismo. In: Trabalho e seguridade social, percursos e dilemas. São Paulo, Cortez, 2008. MESZAROS. István. Desemprego e precarização: um grande desafio para a esquerda. In: Riqueza e miséria d o trabalho no Brasil. São Paulo, Boitempo, 2006. MOTA, Ana; Amaral, Ângela Santana do. Reestruturação do capital, fragmentação do trabalho e serviço social. In: Nova Fábrica de Consensos. São Paulo, Cortez, 2000. NETTO. Jose. BRAZ, Marcelo. Economia política: uma introdução a crítica. Biblioteca básica de serviço social Vol.1. 3ª ed. São Paulo, Cortez, 2007.

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