Geoprocessamento aplicado à observação da sazonalidade das larvas da mosca Dermatobia hominis no município de Seropédica - RJ

Documentos relacionados
Fábio Silva de Souza, Maria Clara da Silva Negreiros Botelho, Raquel Silva Lisbôa

F.S. de Souza, M.C.S.N. Botelho*, R.S. Lisbôa*

Souza et al., Revista Brasileira de Higiene e Sanidade Animal (v. 9, n.1) p (2015)

Dias et al., Revista Brasileira de Higiene e Sanidade Animal (v.12, n.4) p out dez (2018)

Archives of Veterinary Science, v.13, n.2, p.85-92, 2008

EPIDEMIOLOGIA DE Dermatobia hominis (L. JR. 1781) (DIPTERA: CUTEREBRIDAE) EM BOVINOS NA REGIÃO DE SÃO CARLOS, ESTADO DE SÃO PAULO

IDENTIFICAÇÃO DE ÁREAS SUSCEPTÍVEIS A EVENTOS DE ALAGAMENTO NO MUNICÍPIO DE NITERÓI RJ

ÁREAS DE RISCO AO USO/OCUPAÇÃO DO SOLO NA SUB-BACIA DO CÓRREGO DO SEMINÁRIO, MUNICÍPIO DE MARIANA MG. COSTA, R. F. 1 PAULO J. R. 2

DETERMINAÇÃO DO RISCO DE INCÊNDIOS NO MUNICÍPIO DE VIÇOSA-MG, UTILIZANDO SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA E ÍNDICE CLIMÁTICO.

BERNE: DISTRIBUIÇÃO SAZONAL, LOCALIZAÇAO NO HOSPEDEIRO E SUSCEPTIBILIDADE DE BOVINOS MESTIÇOS NA REGIÃO DE UBERABA, MINAS GERAIS*

Archives of Veterinary Science v.7, n.1, p.21-25, 2002 Printed in Brazil ISSN: X

Tecnologia do Consórcio Probiótico (TCP) no Controle de Carrapatos em Gados

Categoria Trabalho Acadêmico / Resumo Expandido Eixo Temático - (Saúde, Saneamento e Meio Ambiente)

DISTRIBUIÇÃO SAZONAL DE ESPÉCIES DE SIPHONAPTERA EM CÃES DAS CIDADES DE BAGÉ E PELOTAS NO RS

Cartografia Temática

Epidemiologia e controle da mosca-dos-chifres (Haematobia irritans irritans) no Brasil LUÍSA NOGUEIRA DOMINGUES

Maria Fernanda de Lima Ribeiro Marques Estudante de Engenharia Sanitária e Ambiental da UCDB

MAPEAMENTO GEOMORFOLÓGICO DO MUNICÍPIO DE ARAXÁ MG, UTILIZANDO TÉCNICAS DE GEOPROCESSAMENTO ROCHA, M. B. B. 1 ROSA, R. 2

MUDANÇAS DE COBERTURA VEGETAL E USO AGRÍCOLA DO SOLO NA BACIA DO CÓRREGO SUJO, TERESÓPOLIS (RJ).

UFRRJ INSTITUTO DE VETERINÁRIA CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS VETERINÁRIAS DISSERTAÇÃO

USO DA IVERMECTINA NO COMBATE DO BERNE (Dermatobia hominis) EM NOVILHAS DE CRUZAMENTO INDUSTRIAL

MAPEAMENTO CORPORAL QUANTO A PRESENÇA DE LARVAS DE Dermatobia hominis (LINNEAUS JR., 1781) (DÍPTERA: CUTEREBRIDAE) EM BOVINOCULTURA LEITEIRA ORGÂNICA*

ECA_2ª etapa. 2. Observe os gráficos a seguir: Página 1 de 6

Population variations of Dermatobia hominis (Linnaeus Jr., 1781) (Diptera: Cuterebridae) and correlation with variable climate in southeast Brazil

ANÁLISE COMPARATIVA DA ATUAÇÃO DO FENÔMENO EL NIÑO /OSCILAÇÃO SUL ENTRE AS CIDADES DE RIO GRANDE E PELOTAS-RS PARA O PERÍODO DE

A GEODIVERSIDADE DO MUNICÍPIO DE VOLTA REDONDA, RIO DE JANEIROi

OROGRAFIA DE SOLEDADE-RS COMO CAUSA DOS ALTOS VALORES PLUVIOMÉTRICOS OCORRENTES NO LOCAL

Jackson Victor de ARAUJO' RESUMO

NÍVEIS DE RISCO GEOLÓGICO A MOVIMENTOS DE BLOCOS ROCHOSOS EM ENCOSTAS DA REGIÃO DE IBITIPOCA, MG

DISTRIBUIÇÃO SAZONAL DA PRECIPITAÇÃO PLUVIOMÉTRICA NO MUNICIPIO DE SÃO MATEUS/ES

USO DE SIG PARA DETERMINAÇÃO DE ÁREAS POTENCIAIS PARA MECANIZADA DA CULTURA DE CAFÉ ARÁBICA NA REGIÃO DE NOVA PONTE-MG 1

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E SAZONAL DA FAVORABILIDADE CLIMÁTICA À OCORRÊNCIA DA SARNA DA MACIEIRA NO BRASIL

PREVALÊNCIA DE Dermatobia hominis EM BOVINOS ABATIDOS NO MUNICÍPIO DE ANCHIETA, ESPÍRITO SANTO

VARIABILIDADE SAZONAL DA PRECIPITAÇÃO NA REGIÃO SUL DO BRASIL

INFLUÊNCIA DE LA NIÑA SOBRE A CHUVA NO NORDESTE BRASILEIRO. Alice M. Grimm (1); Simone E. T. Ferraz; Andrea de O. Cardoso

4 Área de Estudo e Amostragem

3 Características dos locais estudados

Uso de SIG para confecção de um mapa de uso e ocupação do solo do município de Bambuí-MG

ÁREAS CRÍTICAS DE EROSÃO DO SOLO NO MUNICIPIO DE VOLTA REDONDA - RJ 1

ANÁLISE DA DISTRIBUIÇÃO DA FREQUÊNCIA DE PRECIPITAÇÃO EM DIFERENTES INTERVALOS DE CLASSES PARA ITUPORANGA SC

2 Área de Estudo Meio Físico Localização e características gerais

MAPEAMENTO DA INSTABILIDADE GEOMORFOLÓGICA DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO PEQUENO/PR

Dípteros fanídeos vetores de ovos de Dermatobia hominis em Campo Grande, Mato Grosso do Sul 1

USO DO GEOPROCESSAMENTO PARA IDENTIFICAÇÃO DE POTENCIALIDADE PARA PRODUÇÃO DE CAFÉ DE QUALIDADE ATRAVÉS DAS CLASSES DE ALTIMETRIA*

²Universidade do Estado do Rio de Janeiro / Faculdade de Formação de Professores -

XII Congresso Brasileiro de Meteorologia, Foz de Iguaçu-PR, 2002

Geoprocessamento na Agricultura de Precisão

COMPORTAMENTO DO VENTO NO LITORAL SUL DO BRASIL

DIAGNÓSTICO DO MEIO FÍSICO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO CÓRREGO DA VEREDA, RIO EMBU MIRIM, SP.

Observação da influência do uso de séries temporais no mapeamento de formações campestres nativas e pastagens cultivadas no Cerrado brasileiro

Fase parasitária e alterações clínicas em bovinos infestados experimentalmente com larvas de Dermatobia hominis (Diptera: Cuterebridae)

A INFLUÊNCIA DE ALGUMAS VARIÁVEIS ATMOSFÉRICAS A EXTREMOS DE PRODUTIVIDADE DE TRIGO NO RIO GRANDE DO SUL.

Ciclo diurno das chuvas intensas na Região Metropolitana de Belo Horizonte entre 2007 e 2010.

ESTUDO DE CASOS DE LEPTOSPIROSE NO HOSPITAL VETERINÁRIO DA UNIJUÍ 1 CASE STUDY OF LEPTOSPIROSIS IN THE UNIJUÍ VETERINARY HOSPITAL

ANÁLISE ESPACIAL DE LEISHMANIOSE VISCERAL CANINA (LVC) EM URUGUAIANA, RIO GRANDE DO SUL, BRASIL ( ).

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS DA TERRA DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA GEOMORFOLOGIA BÁSICA E ESTRUTURAL - GB 128 TEMA 1

ESTUDO PLUVIOMÉTRICO E FLUVIOMÉTRICO PRELIMINAR NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO EMBU-GUAÇU, SP.

Variação espaço-temporal do transporte de sedimentos do Rio Santo Anastácio, Oeste Paulista

ELABORAÇÃO DE MAPA GEOMORFOLÓGICO DO MUNICÍPIO DE PRESIDENTE PRUDENTE SP.

OBJETIVO. Analisar a dinâmica dos níveis potenciométricos de aquífero aluvial intensamente monitorado, no Agreste Pernambucano; Relacionar com:

IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE RISCOS UC - PT

. 01Questão: (UFRJ-RJ) O texto a seguir se refere aos grandes conjuntos climatobotânicos.

REPRESENTAÇÃO ESPACIAL DAS TEMPERATURAS MÉDIAS DAS MÉDIAS, MÉDIAS DAS MÍNIMAS E MÉDIAS DAS MÁXIMAS MENSAIS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL 1

GEOGRAFIA FÍSICA DO BRASIL

O CARACTERIZAÇÃO DA VELOCIDADE E DIREÇÃO PREDOMINANTE DOS VENTOS MENSAIS PARA A LOCALIDADE DE RIO DO SUL-SC 1

GEOGRAFIA DO BRASIL Relevo e Solo

BIOECOLOGY OF Dermatobia hominis (LINNAEUS Jr., 1781) EM PALOTINA, PARANÁ, BRASIL

AS ESTIAGENS NO OESTE DE SANTA CATARINA ENTRE

EFEITO DO PRODUTO DIFLY S3 NO CONTROLE DO CARRAPATO BOOPHILUS MICROPLUS EM BOVINOS DA RAÇA GIR, MESTIÇA E HOLANDESA

ESTUDO DE VARIABILIDADE DAS PRECIPITAÇÕES EM RELAÇÃO COM O EL NIÑO OSCILAÇÃO SUL (ENOS) EM ERECHIM/RS, BRASIL.

Tempo & Clima. é o estado físico das condições. atmosféricas em um determinado momento e local, podendo variar durante o mesmo dia.

Caracterização da Ecorregião do Planalto Central

ÁREAS DE RISCOS DE ENCHENTES NO MUNICÍPIO DE VOLTA REDONDA: UMA APLICAÇÃO POR GEOPROCESSAMENTO

DISCIPLINA: GEOMORFOLOGIA ESCULTURAL E APLICADA - GB 060. PROF. DR. LEONARDO JOSÉ CORDEIRO SANTOS

INFLUÊNCIA DOS FENÔMENOS EL NIÑO E LA NIÑA SOBRE O RENDIMENTO DO TRIGO NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

COMPORTAMENTO ESPAÇO-TEMPORAL DA PRECIPITAÇÃO NO RIO GRANDE DO SUL ENTRE E

PERFIL TRIMESTRAL, MENSAL E HORÁRIO DA VELOCIDADE E DIREÇÃO DO VENTO AS MARGENS DA BAIA DE CAXIUANÃ, MELGAÇO, PA: ESTUDO DE CASO.

MAPEAMENTO DAS FORMAS E DA DISSECAÇÃO DO RELEVO

Desiree Alves Celestino Santos¹, Juliet Oliveira Santana 2, Erika do Carmo Cerqueira 3, Dária Maria Cardoso Nascimento 4

42º Congresso Bras. de Medicina Veterinária e 1º Congresso Sul-Brasileiro da ANCLIVEPA - 31/10 a 02/11 de Curitiba - PR 1

Epidemiologia da Febre Maculosa Brasileira no Estado de São Paulo

O USO DO GEOPROCESSAMENTO NO ESTUDO AMBIENTAL DE BACIA HIDROGRÁFICA

Modelagem estatística da ocorrência de granizo no município de São Joaquim/SC

Criação de banco de dados estatístico espacial em nível municipal para o estado de Goiás

COMUNICAÇÃO CIENTÍFICA

ESTUDO DA VARIABILIDADE CLIMÁTICA NO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, ATRAVÉS DAS REPETIÇÕES DE ANOMALIAS DE TEMPERATURAS MÍNIMAS DIÁRIAS

DISSECAÇÃO DO RELEVO NA ÁREA DE TERESINA E NAZÁRIA, PI

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL E TEMPORAL DA PRECIPITAÇÃO PLUVIAL E EROSIVIDADE MENSAL E ANUAL NO ESTADO DO TOCANTINS

Verminoses dos bovinos: percepção de pecuaristas em Minas Gerais, Brasil

MAPEAMENTO COSTEIRO COM APOIO DE IMAGENS DE SATÉLITES THEOS E WORLDVIEW

GEOMORFOLOGIA ANTRÓPICA E RISCOS GEOMORFOLÓGICOS NA MICROBACIA DO CÓRREGO ÁGUA FRIA, ANÁPOLIS (GO) Andrelisa Santos de Jesus 1 ; Homero Lacerda 2

ESTUDO DA PRECIPITAÇÃO EM CATOLÉ DO ROCHA-PB UTILIZANDO A TEORIA DA ENTROPIA

Análise da Susceptibilidade a Processos Erosivos, de Inundação e Assoreamento em Itajobi-SP a Partir do Mapeamento Geológico- Geotécnico

Escola Estadual Senador Filinto Müller. Tipos De Clima

Avaliação de métodos de classificação para o mapeamento de remanescentes florestais a partir de imagens HRC/CBERS

HIDROGRÁFICA DO MAUAZINHO, MANAUS-AM.

Ano VI Número 11 Julho de 2008 Periódicos Semestral BABESIOSE BOVINA

LISTA DE EXERCÍCIOS 2º ANO

Figura 42 Imagem de satélite mostrando a presença de floresta junto as drenagens. Fonte Google Earth de 2006

Geografia. Climas do Brasil. Professor Thomás Teixeira.

Transcrição:

Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.59, n.4, p.889-894, 2007 Geoprocessamento aplicado à observação da sazonalidade das larvas da mosca Dermatobia hominis no município de Seropédica - RJ [Geoprocessing applied to the seasonality of Dermatobia hominis larvae in the municipality of Seropédica, Rio de Janeiro] F.S. Souza 1,5, A.H. Fonseca 2, M.J.S. Pereira 2, J.X. Silva 3,4, M.H.B. Goes 4 1 Aluno de pós-graduação - UFRRJ Seropédica, RJ 2 Departamento de Parasitologia Animal - UFRRJ Seropédica, RJ 3 Departamento de Geografia - UFRJ Rio de Janeiro, RJ 4 Departamento de Geociências - UFRRJ Seropédica, RJ 5 Bolsista do CNPq. RESUMO Associações espaço-temporais entre os fatores envolvidos na distribuição sazonal das larvas da mosca do berne - Dermatobia hominis (Linnaeus Jr., 1781) (Diptera: Cuterebridae) - em bovinos foram analisadas por geoprocessamento, utilizando-se o sistema de análise geoambiental da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no município de Seropédica, RJ. Na primavera, 50% da área do município foi muito favorável ao desenvolvimento dessa miíase. Esse grau de favorabilidade reduziu-se para 35%, 23% e 12% no verão, outono e inverno, respectivamente. Palavras-chave: bovino, berne, Diptera, sistemas de informação, epidemiologia ABSTRACT Space-temporal associations between factors involved in the seasonal distribution of Dermatobia hominis (Linnaeus Jr., 1781) (Diptera: Cuterebridae) fly larvae in cattle were analyzed by geoprocessing using the geo-environment system of the Universidade Federal do Rio de Janeiro, in the municipality of Seropédica, RJ. In the spring, 50% of the area was favorable, reducing its extension to 35% in the summer, to 23% in the fall and to 12% in the winter. Keywords: cattle, Diptera, larvae, information systems, epidemiology INTRODUÇÃO Dermatobia hominis (Linnaeus Jr., 1781) (Diptera: Cuterebridae), díptero conhecido vulgarmente no Brasil como mosca do berne, está presente em várias regiões do país. Infesta um número relativamente grande de hospedeiros, sendo os bovinos os mais acometidos. A larva dessa mosca, uma vez presente na pele desses animais, causa a chamada miíase furuncular ou dermatobiose, determinando perdas econômicas à indústria coureiro-calçadista pela depreciação do couro (Oliveira, 1983). As condições ambientais são fatores importantes para o desenvolvimento da D. hominis, logo, o estudo da variação sazonal do berne permite conhecer a época de maior intensidade parasitária, assim como correlacionar os fatores atuantes no crescimento populacional das larvas (Bellato et al., 1986). Na região Sudeste do Brasil, os meses de primavera e verão - período chuvoso - são os mais favoráveis à ocorrência de larvas de Dermatobia sobre os bovinos (Magalhães e Lima, 1988; Maio et al., 1999). As menores Recebido em 1 de agosto de 2005 Aceito em 7 de janeiro de 2007 Endereço para correspondência (corresponding address) Rua Nove, 95 26015-260 Nova Iguaçu, RJ E-mail: souzamedvet@ig.com.br

Souza et al. infestações ocorrem nos meses de outono e inverno, período de menor precipitação pluvial. Creighton e Neel (1952) e Neel et al. (1955) relacionaram as variações altimétricas entre 400 e 1.500 metros como as mais favoráveis à dermatobiose. No Brasil, a ocorrência da Dermatobia já foi registrada em altitudes inferiores a 400 metros (Maia e Guimarães, 1985; Ribeiro et al., 1989). Os sistemas geográficos de informação (SGI) podem ser utilizados para mostrar e analisar a territorialidade dos fenômenos neles representados. A aplicabilidade dos SGI na epidemiologia tem sido bem sucedida em estudos na área de saúde pública, como os realizados por Cruz Marques (1987) e Brooker (2002). Em medicina veterinária, Cringoli et al. (2001) e Diersmann et al. (2001 e 2002) aplicaram o geoprocessamento no estudo de áreas de risco e prevalência de filariose em cães na Itália e na análise epidemiológica do carrapato Boophilus microplus no Brasil, respectivamente. O sistema de análise geoambiental/ufrj (SAGA/UFRJ ) permite, por meio da função avaliação ambiental, a superposição de mapas temáticos digitais, gerando resultados que, analisados pela função assinatura, produzem relatórios em percentual, pixels e hectares (Xavier-da-Silva, 2001). O objetivo deste trabalho foi delimitar, no município de Seropédica-RJ, áreas favoráveis à ocorrência da dermatobiose, quantificar, em percentagem, as áreas de maior favorabilidade e discriminar os fatores ambientais presentes nessas áreas por estação do ano. MATERIAL E MÉTODOS O município de Seropédica, com área de 48.600 hectares, foi escolhido devido à disponibilidade da base de dados georreferenciados por Goes (1994). Usou-se o sistema de informação SAGA/UFRJ do qual foram utilizadas as funções avaliação ambiental e assinatura. Inicialmente foi realizado um inventário das condições ambientais vigentes no município para selecionar os fatores relevantes à ocorrência das larvas da mosca D. hominis. Na hierarquização dos fatores, construção da árvore de decisão, atribuição de pesos aos fatores (Fig. 1) e notas às categorias (Tab. 1 e 2), aplicou-se o procedimento de avaliação por multicritérios, sugerido por Xavier-da-Silva (2001). Cada mapa temático foi constituído por categorias que receberam notas de zero a 10. A nota zero representou a menor participação da categoria no evento. O intervalo de notas de 1 a 4 foi atribuído às categorias julgadas não favoráveis à ocorrência da Dermatobia; as notas 5 e 6, às categorias pouco favoráveis; 7 e 8 às favoráveis e 9 e 10 àquelas muito favoráveis. Notas de 11 a 23 foram usadas para representar nos mapas temáticos as categorias que não fizeram parte da análise. As avaliações foram realizadas conforme indicado na árvore de decisão. O fator natural foi elaborado a partir da avaliação dos mapas temáticos de solo e de geomorfologia, o fator geoambiental da análise dos mapas dos fatores naturais e cobertura vegetal e o fator topográfico da avaliação dos mapas temáticos de declividade e de altitude (Fig. 1). Os mapas de favorabilidade à dermatobiose por estação do ano resultaram de avaliações usando os fatores geoambientais, topográficos e climáticos produzidos. Os pesos atribuídos aos fatores geoambiental e topográfico e as notas de categorias que os compõem foram mantidos fixos para as quatro estações do ano, enquanto as notas das categorias que compõem os fatores climáticos variaram (Tab. 3). Os quatro mapas, um para cada estação do ano, resultantes das avaliações foram submetidos a assinaturas, para quantificar o percentual dos diferentes graus de favorabilidade para a área total do município. Em seqüência, também foram realizadas assinaturas nas áreas de maior favorabilidade para discriminar as categorias dos fatores ambientais selecionados presentes em cada área por estação do ano. 890 Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.59, n.4, p.889-894, 2007

Geoprocessamento aplicado à observação... solo geomorfologia fator natural fator cobertura vegetal altitude peso=40 declividade peso=60 fator topográfico peso=20 fator climático peso=30 fator geoambiental favorabilidade à dermatobiose Figura 1. Árvore de decisão com os pesos atribuídos aos fatores, em percentagem, segundo sua importância na ocorrência da dermatobiose. Tabela 1. Mapas dos grupos de fatores geoambientais e topográficos segundo categorias e notas atribuídas Mapa de solo Mapa de geomorfologia Mapa de altitude Categoria Nota Categoria Nota Categoria Nota Podzólico 1 10 Borda dissecada de planalto estrutural 6 0-40m 10 Podzólico 2 10 Patamar dissecado em colinas e vales estruturais. 8 0-20m 10 Cambissolo 1 7 Encostas de Talus 10 20-40m 10 Cambissolo 2 7 Colinas estruturais de piemonte 10 40-80m 10 Planossolo 5 Colinas aplainadas/depressões assoreadas 5 80-120m 10 Gley húmico 0 Colinas isoladas/ilhas estruturais 8 120-160m 10 Gley pouco húmico 2 Rampas de colúvio 7 160-200m 10 Gley indiscriminado 3 Planície colúvioaluvionar 4 200-320m 10 Solo Aluvial 4 Planície aluvionar de cobertura 4 320-400m 10 Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.59, n.4, p.889-894, 2007 891

Souza et al. Tabela 2. Mapas dos grupos de fatores geoambientais e topográficos segundo categorias e notas atribuídas Mapa de declividade Mapa de cobertura vegetal Categorias que não fizeram parte da análise Categoria Nota Categoria Nota Categoria Nota Classe entre 0-2,5% 4 Mata de altitude 10 Área fora de análise 11 Classe entre 2,5%-5% 5 Macega e sítios rurais 8 Rede de drenagem 12 Classe entre 5%-10% 10 Veg. herb. higrófita 2 Auto-estrada 13 Classe entre 10-20% 10 Reflorestamento 8 Estrada pavimentada 14 Classe entre 20-40% 8 Pastagem 10 Estrada não pavimentada tráfego permanente 15 Classe >40% 7 Cultivo 8 Estrada não pavimentada tráfego periódico 16 Sítio urbano ou industrial 0 Caminho 17 Extrativismo mineral 0 Ferrovia 18 Afloramento de rocha 0 Áreas urbanas 19 Área institucional 0 Dique 20 Toponímia 21 Rio Guandu 22 Limite municipal 23 Tabela 3. Categorias dos mapas e notas atribuídas aos fatores geoambientais, topográficos e climáticos para a avaliação que gerou os graus de favorabilidade à ocorrência de dermatobiose em bovinos, no município de Seropédica, RJ Fator geoambiental Fator topográfico Fator climático Categoria Nota Categoria Nota Categoria Nota Nota 2 4 Nota 6 6 Primavera 10 Nota 3 4 Nota 7 8 Verão 9 Nota 4 4 Nota 8 8 Outono 8 Nota 5 6 Nota 9 10 Inverno 6 Nota 6 6 Nota 7 8 Nota 8 8 Nota 9 10 RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados das associações entre os fatores envolvidos na distribuição sazonal das larvas da mosca D. hominis são mostrados em um mapa digital (Fig. 2, 3, 4 e 5), segundo a estação do ano e o grau de favorabilidade à ocorrência do evento. Na Tab. 4 encontram-se os resultados que quantificaram as áreas de ocorrência da dermatobiose. As assinaturas realizadas nos gradientes mais favoráveis por estação do ano permitiram a quantificação e a discriminação das categorias dos mapas temáticos componentes. Em altitudes abaixo de 80m na primavera, verão, outono e inverno, estão concentradas 82%, 76%, 95% e 90% das áreas muito favoráveis, respectivamente. Em declividades inferiores a 10%, estão 70%, 60%, 77% e 55% dessas áreas. O solo podzólico predomina nas áreas mais favoráveis, nas quatro estações do ano. Esse solo caracteriza-se por ser de fácil drenagem, não hidromórfico, dando condições à fácil penetração de larvas de Dermatobia e seu conseqüente desenvolvimento. As feições geomorfológicas onde se concentram as áreas muito favoráveis coincidentes nas quatro estações são as colinas aplainadas com depressões assoreadas com 25%, 26%, 34% e 28% na primavera, verão, outono e inverno, respectivamente. Deve-se ressaltar a presença de 31% de áreas muito favoráveis na primavera e de 23% no outono, ocupadas por planícies colúvioaluvionares e, ainda, áreas de 22%, 31% e 45%, com colinas estruturais de piemonte no verão, outono e inverno, na seqüência. 892 Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.59, n.4, p.889-894, 2007

Geoprocessamento aplicado à observação... Figura 2. Dermatobiose em bovinos na primavera. Município de Seropédica. Resolução de 25 metros. Figura 3. Dermatobiose em bovinos no verão. Município de Seropédica. Resolução de 25 metros. Figura 4. Dermatobiose em bovinos no outono. Município de Seropédica. Resolução de 25 metros. Figura 5. Dermatobiose em bovinos no inverno. Município de Seropédica. Resolução de 25 metros. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.59, n.4, p.889-894, 2007 893

Souza et al. Tabela 4. Áreas de ocorrência de dermatobiose em bovinos, por grau de favorabilidade (%), segundo a estação do ano, em Seropédica RJ Estação Muito Pouco Favorável favorável favorável Primavera 50 38 12 Verão 35 52 13 Outono 23 60 17 Inverno 12 58 30 A predominância de áreas de ocorrência do grau muito favorável foi assinalada na primavera, com 50%, e verão, com 35%, períodos em que são registradas as maiores médias de temperatura, precipitação pluvial e umidade relativa. Maio et al. (1999) consideraram esses fatores como decisivos para a infestação de bernes em bovinos nessa região. Estes resultados assemelham-se aos observados para a região Sudeste do Brasil, onde os meses de primavera e verão, período chuvoso, são os mais favoráveis à ocorrência de larvas de Dermatobia em bovinos (Magalhães e Lima, 1988; Maio et al., 1999). Como observado neste trabalho, as menores infestações foram assinaladas nos meses de outono (23%) e inverno (12%). Pode-se destacar a versatilidade desse díptero em ajustar-se a diferentes características climáticas, adaptando-se às condições mais favoráveis dentro de cada clima, como mencionado por Creighton e Neel (1952). Portanto, a análise exploratória dos componentes das áreas muito favoráveis sugere haver interação entre estes, colaborando para formar um sistema propício a altas infestações durante as diferentes épocas, favorecendo o ciclo da Dermatobia. A metodologia empregada neste estudo mostrouse eficiente para a análise epidemiológica da dermatobiose, pois constitui importante elemento de apoio à tomada de decisões e é mais uma ferramenta para a elaboração de programas de controle integrado dessa ectoparasitose. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BELLATO, V.; PALOSCHI, C.G.; SOUZA, A.P. et al. Variação sazonal das larvas da mosca do berne em bovinos no Planalto Catarinense. EMPASC - Comunicado Técnico, 101, 1986. 7 p. BROOKER, S. Schistosomes, snails and satellites. Acta Trop., v.82, p.141-149, 2002. CREIGHTON, J.T.; NEEL, W.W. Biologia y combate del torsalo o nuche, Dermatobia hominis (L. Jr.): Reseña bibliográfica. Turrialba, v.2, p.59-65, 1952. CRINGOLI, G.; RINALDI, L.; VENEZIANO, V. et al. A prevalence survey and risk analysis of filariosis in dogs from the Mt. Vesuvius area of southern Italy. Vet. Parasitol., v.102, p.243-252, 2001. CRUZ MARQUES, A. Human migration and the spread of malaria in Brazil. Parasitol. Today, v.3, p.166-170, 1987. DIERSMANN, E.M.; FONSECA, A.H.; PEREIRA, M.J. Uso de sistema de informação geográfica na análise epidemiológica de Boophilus microplus uma alternativa viável. In: JORNADA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UFRRJ, 11., 2001. Anais... Rio de Janeiro: UFRRJ, 2001. v.11. p.259-260 (Resumo expandido). DIERSMANN, E.M.; FONSECA, A.H.; PEREIRA, M.J. Análise espacial e temporal do Boophilus microplus (CANESTRINI, 1887) (ACARI: IXODIDAE) através de um SGI. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PARASITOLOGIA VETERINÁRIA, 12., 2002, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro, 2002. 1 CD-ROM. GOES, M.H.B. Diagnóstico ambiental por geoprocessamento do Município de Itaguaí (RJ). 1994. 744f. Tese (Doutorado) Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, SP MAGALHÃES, F.E.P.; LIMA, J.D. Freqüência de larvas de Dermatobia hominis (L. Jr.) em bovinos de Pedro Leopoldo, Minas Gerais. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.40, p.361-367, 1988. MAIA, A.A.M.; GUIMARÃES, M.P. Distribuição sazonal de larvas de Dermatobia hominis (Linnaeus Jr. 1781) (Díptera: Cuterebridae) em bovinos de corte na região de Governador Valadares, Minas Gerais. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.37, p.469-475, 1985. MAIO, F.G.; SOUZA, W.M.; GRISI, L. et al. Distribuição sazonal das larvas de Dermatobia hominis (Linnaeus Junior, 1781) em bovinos leiteiros no município de Seropédica, Rio de Janeiro, Brasil. Rev. Univ. Rural, Série Ciênc. Vida, v.21, p.25-36, 1999. NEEL, W.W.; URBINA, O.; VIALE, E. et al. Ciclo biológico del torsalo (Dermatobia hominis L. Jr.) en Turrialba, Costa Rica Turrialba, v.5, p.91-104, 1955. OLIVEIRA, G.P. Fatores que afetam economicamente a produção de couro de bovinos. Arq. Biol. Tecnol., v.26, p.353-358, 1983. RIBEIRO, P.B.; COSTA, P.R.P.; BRUM, J.G.W. et al. Flutuação populacional de Dermatobia hominis (L. Jr., 1781) sobre bovinos no município de Pelotas, R.S. Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.41, p.223-231, 1989. XAVIER-DA-SILVA, J. (Ed). Geoprocessamento para análise ambiental. Rio de Janeiro. Bertraud Brasil, 2001. 228p. 894 Arq. Bras. Med. Vet. Zootec., v.59, n.4, p.889-894, 2007