Lymphedema Faculdade de Medicina do ABC s angiology and vascular surgery discipline patient analysis

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Transcrição:

Linfedema Análise dos pacientes acompanhados no ambulatório de linfologia da disciplina de angiologia e cirurgia vascular da Faculdade de Medicina do ABC * Lymphedema Faculdade de Medicina do ABC s angiology and vascular surgery discipline patient analysis Andréa Paula Kafejian-Haddad**, Sidnei José Galego***, João Antônio Correa***, Rafael Vilhena de Carvalho Fürst****, Maria Carolina Cozzi Pires Dias****, Tatiana Aline Steiner****, Simone Lordani****, Ohannes Kafejian***** Resumo Introdução: Linfedema é uma doença crônica decorrente da insuficiência da drenagem linfática que geralmente acomete membros e evolui com aumento do volume deste, diminuição de sua imunidade e limitação funcional. Pouco se sabe sobre a incidência do linfedema em nosso meio, bem como sua distribuição etiológica e suas formas clínicas. Objetivo: Descrever a incidência e distribuição de linfedema quanto à etiologia e às formas clínicas entre os doentes acompanhados no ambulatório de linfologia da Disciplina de Angiologia e Cirurgia Vascular da FMABC no Hospital de Ensino Padre José Anchieta. Casuística e métodos: Analisados 53 pacientes portadores de linfedema que foram classificados quanto a etiologia, o local de acometimento, o tempo de evolução da doença e sua forma clínica. Resultados: Em nossa análise, 54,71% dos pacientes apresentaram linfedema primário e 45,29%, secundário. A maioria apresentou acometimento dos membros inferiores (apenas 9,43% de membros superiores) e grau II. A causa mais freqüente de linfedema secundário foi após-infecção. Conclusão: Avaliação dos portadores de linfedema permite um melhor acompanhamento ambulatorial, que reflete no controle da evolução da doença. Em nosso estudo, as extremidades mais acometidas foram as inferiores e o grau II da forma clínica o mais freqüente. Dentre as causas de linfedema secundário, a mais freqüente foi após infecção; o linfedema primário acometeu mais o sexo feminino que o masculino. Unitermo Linfedema. Abstract Introduction: Lymphedema is a cronic disease due to lymphatic insufficiency of the extremities, presented by swelling, functional limitation and predisposition to the development of cellulitis. There s no data about the incidence and etiologic distribution of lymphedema in brazilian literature. Objective: Present data describes the incidence and distribution of lymphedema considering it s etiology and clinical presentation among patients with previous diagnostic of lymphedema in our ambulatory. * Trabalho realizado pela Disciplina de Angiologia e Cirurgia Vascular da Faculdade de Medicina do ABC. ** Assistente da Disciplina de Angiologia e Cirurgia Vascular da Faculdade de Medicina do ABC e Chefe do Serviço de Linfologia. *** Assistente da Disciplina de Angiologia e Cirurgia Vascular da Faculdade de Medicina do ABC. **** Acadêmicos da Faculdade de Medicina do ABC. ***** Professor Titular da Disciplina de Angiologia e Cirurgia Vascular da Faculdade de Medicina do ABC. Endereço para correspondência: Andréa Paula Kafejian-Haddad Rua Bom Pastor, 1238, CEP 04203-001 São Paulo, SP E-mail: apkh@uol.com.br 41

Casuistic and methods: We studied 53 patients with previous diagnostic of lymphedema, followed between january/2000 and may/2002 at the ABC Medical School Angiology and Vascular Surgery Discipline ambulatory at Padre Jose Anchieta Hospital. Those patients were classified according to lymphedema etiology and clinical presentation. Results: We found 54,71% of primary lymphedema and 45,29% of secondary. The majority had the lower extremity form (only 9,43% had upper extremity swelling) and were at stage II of clinical presentation. The most frequent cause of secondary lymphedema was previous infections of the extremity. Conclusion: Lymphedema valuation allows a better clinical care of these patients, that avoid the disease s evolution. In our study, lower extremities were the most affected and clinical stage II the most common. Secondary lymphedema had previous infections of the extremity as the most frequent cause. Primary lymphedema was more frequent in females. Keyword Lymphedema. Introdução Linfedema é uma doença crônica caracterizada pelo acúmulo de líquido intersticial com alta concentração protéica, decorrente de insuficiência da drenagem linfática por anormalidades congênitas ou adquiridas do sistema linfático 1,2,3. Geralmente acomete as extremidades e causa desde um discreto edema do membro, nas fases iniciais da doença, até o aumento do volume e a deformidade em grau extremo, o que caracteriza a elefantíase 3,4. Se não diagnosticada e tratada a tempo, a evolução da doença leva incapacidade funcional, restrições sociais e psicológicas o paciente 2,5,6. Além disso, a insuficiência do sistema linfático acarreta diminuição da imunidade do membro, tornando-o mais susceptível a infecções bacterianas e fúngicas recorrentes 3,4,5. Forma-se um ciclo vicioso de inflamação crônica e conseqüente piora da drenagem linfática 4,5. O linfedema, quanto a sua etiologia, pode ser classificado em primário, decor rente de alterações congênitas como, aplasia, hipoplasia ou hiperplasia dos vasos linfáticos 1,2,6. Os primários podem ser divididos de acordo com a idade de manifestação da doença em congênito (até 1 ano de idade), precoce (até 35 anos) ou tardio (acima de 35 anos) 1,2,3,6.Classifica-se em secundário, quando há alterações adquiridas do sistema linfático, em virtude trauma, infecções, cirurgias, radioterapia, insuficiência venosa crônica, entre outras causas 1,2,3,6. O diagnóstico do linfedema é basicamente clínico 2. Exames subsidiários são utilizados para afastar edemas de outras etiologias, confirmação diagnóstica em caso de dúvida e para determinar o grau de acometimento dos vasos linfáticos 7,8. Atualmente o exame de escolha é a linfocintilografia que permite avaliação anatômica e funcional detalhada da drenagem dos membros 2,5,7,8. Pouco se sabe sobre a incidência e a distribuição do linfedema na população brasileira. O diagnóstico não é feito e o tratamento específico é pouco conhecido, o que leva o portador da doença a uma má qualidade de vida 6. O objetivo de nosso estudo é avaliar os pacientes atendidos pela Disciplina de Angiologia e Cirurgia Vascular da FMABC no ambulatório de Linfologia do Hospital de Ensino Padre José Anchieta. Descrevendo fatores relacionados a sua etiologia e o estágio da doença. Enfatizamos em nosso meio, a importância da doença, o diagnóstico e o tratamento precoce. Este estudo só foi possível após agruparmos os pacientes portadores de linfedema em um único ambulatório, a partir de janeiro de 2000. Esses doentes são tratados de forma específica e acompanhados clinicamente, analisando a melhora da qualidade de vida. Casuística e método De janeiro de 2000 até maio de 2002, foram analisados 53 pacientes portadores de linfedema, no Ambulatório de Linfologia do Hospital de Ensino Padre Anchieta da Faculdade de Medicina do ABC. O estudo foi prospectivo por meio de protocolos específicos (Anexo 1) para portadores de linfedema. Foi possível a análise quanto a faixa etária, a topografia, a etiologia do linfedema, o tempo de evolução da doença e o grau de acometimento clínico. Os pacientes foram numerados de 1 a 53. O linfedema foi classificado em primário, quando o paciente apresentava história de surgimento da doença sem fator desencadeante, e secundário, quando relacionado a diversas causas (após surtos de infecção de repetição, após cirurgias, após radioterapia, após trauma, após insuficiência venosa crônica) 1,2,3. Quanto ao grau da forma clínica, utilizamos a classificação de Mowlem:3 Grau I: linfedema reversível com elevação do membro e repouso no leito durante 24-48 horas: edema depressível com a pressão. Grau II: linfedema irreversível mesmo com repouso prolongado, fibrose moderada a grave, edema não depressível com a pressão. Grau III: linfedema irreversível com fibrose acentuada no tecido subcutâneo e aspecto elefantiásico do membro. Os dados foram tabelados para avaliação. Resultados Foram analisados 53 pacientes, sendo 38 (71,69%) do sexo feminino (F), 15 (28,31%) do sexo masculino (M), com idades variando de 12 a 80 anos (média de 48,75 anos). Desses, 29 (54,71%) eram portadores de linfedema primário, 24 (45,29%) de linfedema secundário. O tempo de evolução da doença variou de 7 dias a 45 anos. F UNDAÇÃO ABC 42

Anexo 1 Protocolo de linfedema Disciplina de cirurgia vascular da FUABC Identificação: Endereço Fone: RG Idade: Sexo: M ( ) F ( ) Cor: B ( ) N ( ) P ( ) QD Antecedentes de história: MID Linfedema ( ) S/N [sim, não, especificar abaixo] Erisipela ( ) Trauma ( ) Pós-cirúrgico ( ) Pós-radioterapia ( ) Espontâneo ( ) MIE Linfedema ( ) S/N [sim, não, especificar abaixo] Erisipela ( ) Trauma ( ) Pós-cirúrgico ( ) Pós-radioterapia ( ) Espontâneo ( ) MSD Linfedema ( ) S / N [sim, não, especificar abaixo] Erisipela ( ) Trauma ( ) Pós-cirúrgico ( ) Pós-radioterapia ( ) Espontâneo ( ) MSE Linfedema ( ) S / N [sim, não, especificar abaixo] Erisipela ( ) Trauma ( ) Pós-cirúrgico ( ) Pós-radioterapia ( ) Espontâneo ( ) [Obs.: especificar quantas erisipelas, tipo do trauma, tipo de cirurgia e, no espontâneo, idade do surgimento.] 43

Antecedentes familiares de linfedema ( ) S/N Doenças associadas: ( ) HAS ( ) D.M ( ) Outras Hábitos: ( ) Etilismo ( ) Tabagismo Medicamentos em uso: Exame físico: MSE MID MIE MSD Linfedema S/N ( ) ( ) ( ) ( ) Grau ( ) ( ) ( ) ( ) Pulsos distai N/AL ( ) ( ) ( ) ( ) Micose interdigital S/N ( ) ( ) ( ) ( ) Onicomicose S/N ( ) ( ) ( ) ( ) Sinais de insuficiência S/N ( ) ( ) ( ) ( ) Venosa crônica S/N ( ) ( ) ( ) ( ) Varizes simples S/N ( ) ( ) ( ) ( ) Lesão ulcerada S/N ( ) ( ) ( ) ( ) Infecção aguda S/N ( ) ( ) ( ) ( ) Outras alterações [Obs.: N/AL = normal ou alterado, S/N = sim ou não Grau do linfedema Classificação de Mowlem: Fase I Linfedema reversível com a elevação do membro e repouso no leito durante 24 a 48 horas, edema depressível com a pressão. Fase II Linfedema irreversível mesmo com o repouso prolongado, fibrose moderada a grave, edema não depressível com a pressão. Fase III Linfedema irreversível, com fibrose acentuada no tecido subcutâneo e aspecto elefantiásico do membro. Classificação etiológica: 1- Linfedema primário A Congênito (até 1 ano) ( ) 1 Não familiar ( ) 2 Familiar ( ) B Precoce (1 a 35 anos) ( ) 1 Não familiar ( ) 2 Familiar ( ) C Tardio (> 35 anos) 1 Não familiar ( ) 2 Familiar ( ) 2 Linfedema secundário A Filariose ( ) B Excisão cirúrgica de gânglios ( ) + Radioterapia ( ) C Tumor invasivo D Infecção ( ) E Trauma ( ) F Outros F UNDAÇÃO ABC 44

Estudo linfocintilográfico: Local onde foi realizado: EPM HSP ( ) HC ( ) Data do exame Substância utilizada: Dextran marcado com Tecnécio 99m ( ) Albumina marcada com Tecnécio 99m ( ) Linfocintilografia de MM II ( ) Laudo: Linfocintilografia de MMSS ( ) Laudo: 45

Dos 29 pacientes portadores de linfedema primário, 2 eram congênitos (Quadro 2), 17 precoces (Quadro 3) e 10 tardios (Quadro 4). Os dados foram tabelados quanto a extremidade acometida de ambos os membros inferiores (MMII), ou ambos os membros superiores (MMSS), quanto ao lado da extremidade acometida: membro inferior direito (MID), membro inferior esquerdo (MIE), membro superior direito (MSD), ou membro superior esquerdo (MSE). Quadro 1 Classificação geral dos pacientes N o de pacientes Tempo de Grau I Grau II Grau III M F com a doença evolução da doença Linfedema primário 29 7 meses a 45 anos 1 26 2 5 24 Linfedema secundário 24 7 dias a 22 anos 4 17 3 10 14 Quadro 2 Pacientes portadores de linfedema primário congênito 1 F 12 anos MID 12 anos II 21 M 17 anos MIE 17 anos II Quadro 3 Pacientes portadores de linfedema primário precoce 3 F 42 anos MMII 13 anos II 4 F 46 anos MID 16 anos II 5 F 45 anos MIE 20 anos II 6 M 32 anos MMII 8 anos II 7 F 46 anos MMII 26 anos II 8 F 26 anos MID 3 anos II 9 F 60 anos MMII 45 anos II 10 F 30 anos MMII 5 anos II 11 M 39 anos MID 33 anos III 12 F 63 anos MMII 40 anos II 13 F 70 anos MMII 30 anos III 14 F 70 anos MMII 40 anos II 15 F 41 anos MMII 20 anos II 16 F 26 anos MIE 12 anos II 17 F 31 anos MMII 10 anos II 18 F 32 anos MID 20 anos II 19 F 25 anos MIE 7 meses II Quadro 4 Pacientes portadores de linfedema primário tardio 20 F 53 anos MID 6 anos I 21 F 70 anos MMII 16 anos II 22 F 58 anos MMII 12 anos II 23 F 52 anos MMII 5 anos II 24 F 64 anos MMII 8 meses II 25 F 60 anos MSE 3 anos II 26 F 80 anos MMII 30 anos II 27 M 39 anos MMII 1,5 ano II 28 F 67 anos MMII 2 anos II 29 M 41 anos MIE 3 anos II F UNDAÇÃO ABC 46

Os portadores de linfedema secundário (24 pacientes) apresentaram as seguintes causas desencadeantes: 1) após infecção (erisipela): 10 pacientes; 2) após trauma: 3 pacientes; 3) após cirurgia e/ou radioterapia: 7 pacientes (3 após mastectomia e radioterapia; 1 após cirurgia oncológica pélvica e radioterapia; 2 após cirurgia ortopédica e 1 após safenectomia); 4) Após-insuficiência venosa crônica: 4 pacientes. Os dados de cada paciente quanto ao lado da extremidade acometida, ao tempo de evolução da doença e grau clínico estão nos quadros abaixo: Em nossos resultados observamos pequeno número de pacientes portadores de linfedema de MMSS: 5 (9,43%) pacientes, entre os quais 1 é portador de linfedema primário tardio, 1 de linfedema secundário após erisipela e 3 de linfedema secundário após mastectomia, seguida de radioterapia. Portanto, entre os linfedemas de membros superiores predominaram os secundários à mastectomia, seguida de radioterapia e câncer de mama, todos unilaterais, acometendo mulheres entre 38 e 80 anos (idade média de 59,7 anos). Discussão A freqüência do linfedema é bem menor que a das arteriopatias e das flebopatias 3. Contudo, é uma doença que não é incomum, sua incidência e prevalência em nosso meio ainda não foi determinada. Não foi encontrado Quadro 5 Pacientes portadores de linfedema secundário após infecção de repetição (erisipelas) 30 M 31 anos MIE 1 mês I 31 M 30 anos MSD 7 dias II 32 F 65 anos MID 5 anos II 33 F 58 anos MMII 5 anos I 34 F 68 anos MID 3 anos II 35 M 55 anos MMII 9 meses III 36 M 55 anos MID 5 anos I 37 F 35 anos MIE 20 anos II 38 M 34 anos MID 5 anos II 39 M 68 anos MID 7 anos III Quadro 6 Pacientes portadores de linfedema secundário após trauma 40 M 56 anos MID 5 anos II 41 F 38 anos MID 6 anos II 42 M 41 anos MIE 22 anos III Quadro 7 Pacientes portadores de linfedema secundário após cirurgia e/ou radioterapia 43 F 43 anos MMII 2 anos I 44 F 80 anos MSD 12 anos II 45 F 70 anos MID 5 anos II 46 F 61 anos MSD 3 anos II 47 F 71 anos MMII 3 anos II 48 F 38 anos MSE 2 anos II 49 F 61 anos MID 11 anos II Quadro 8 Pacientes portadores de linfedema secundário após insuficiência venosa crônica (IVC) 50 M 25 anos MIE 4 anos II 51 F 70 anos MMII 10 anos II 52 F 42 anos MMII 5 anos II 53 M 52 anos MID 6 anos II 47

nenhum trabalho com esse objetivo em nosso país. É fundamental que se conheça a incidência e o tratamento do linfedema, pois quando não conduzido de maneira correta pode trazer graves seqüelas, chegando a impossibilitar uma vida normal. Em nosso estudo, os casos foram classificados em linfedema primário e secundário, em seus graus clínicos (I, II, III), incidência segundo o sexo, extremidade acometida e causas desencadeantes. Foram analisados dados de literatura que se basearam nos mesmos critérios de divisão 5,9. Encontramos 54,7% de linfedema primário e 45,29% de linfedema secundário. A maioria dos pacientes, 81,13% apresentou linfedema de grau II, com fibrose moderada. A doença, via de regra, em sua fase inicial é assintomática. Quando atinge o grau II, os sintomas tornam-se evidentes 10. É nesta fase que o diagnóstico deve ser feito o mais precoce possível, pois o tratamento tem boa resposta e evita que o linfedema evolua para grau III. O tratamento consiste em medidas de cuidados com a pele, redução e manutenção do volume do membro 6. Poucos pacientes apresentaram grau I, pois nesta fase, pouco sintomática, o diagnóstico é difícil. Em nosso estudo, observamos que 82,75% dos portadores de linfedema primário eram do sexo feminino. Este predomínio do sexo feminino também foi observado em outros estudos 3,11. Dos casos de linfedema secundário, 58,33% dos pacientes eram do sexo feminino. Em nossos achados, houve um pequeno predomínio de linfedema unilateral 46,29% em relação ao bilateral 43,39%. Alguns dados de literatura mostram um predomínio maior de linfedema unilateral com 58,3% com relação ao bilateral de 41,6% 5. Dos pacientes portadores de linfedema secundário, 41,66% apresentaram infecção prévia do membro, sendo esta a causa mais comum. Em nosso meio, a infecção é considerada a causa mais freqüente do linfedema secundário 3. Na Europa, infecções bacterianas e fúngicas representam fatores etiológicos menos freqüentes 12. Ainda em relação ao linfedema secundário, encontramos dentre os pós-cirúrgicos maior prevalência de pósmastectomia e radioterapia, porém representam um pequeno número (5 pacientes). Nos EUA e Europa, a causa mais freqüente de linfedema secundário é tratamento cirúrgico e irradiação para tratamento de câncer, principalmente de mama 13,14. O pequeno número de pacientes portadores de linfedema secundário a cirurgias oncológicas deve-se a nosso ambulatório de linfedema ser recente; acreditamos que o tempo e a maior divulgação aumentarão esta demanda. A insuficiência venosa crônica foi apontada como causadora de 16,66% dos casos e o trauma ficou em torno de 12,5%. Na Europa, essas são causas, também pouco freqüentes 11. Somente a conscientização, no meio médico, da necessidade do diagnóstico e do tratamento precoce do linfedema melhorará a qualidade de vida dos doentes acometidos. Outros trabalhos sobre a incidência do linfedema serão necessários, bem como a continuação deste estudo para detecção da real incidência de portadores de linfedema em nosso meio. Conclusão O presente estudo de 53 pacientes portadores de linfedema de extremidades nos permitiu concluir que: 1. A incidência de linfedema primário foi maior no sexo feminino que no sexo masculino. 2. O linfedema do grau II foi o de maior incidência, e as extremidades inferiores as mais acometidas. 3. Ocorreu um discreto predomínio da incidência de linfedema primário. Referências bibliográficas 1. Roesler R, Araujo LRR, Rippel R, Prestes MA, Mesquita- Jr N, Coelho L et al. Doença de Meige (linfedema precoce) - relato de caso e revisão da literatura. Rev Soc Bras Cir Plast 14(3)69-78, 1999. 2. O diagnóstico e tratamento do linfedema periférico. Cir Vasc Angiol 12:6265, 1996. 3. Degni M, Nunes P. Linfedema. In: Maffei FHA, ed. Doenças vasculares periféricas. 2 ed. MEDSI, 1995, p. 1083-109. 4. Kinmonth JB, Wolfe JN. Fibrosis in the lymph nodes in primary lymphedema. Ann R Coll Surg Engl 62:344-54, 1980. 5. Cestari SCP, Petri V, Castiglioni MLV, Lederman H. Linfedema dos membros inferiores: estudo linfocintilográfico. Rev Assoc Med Bras 40(2)93-100, 1994. 6. Bernas MJ, Witte CL, Witte MH. The diagnosis and treatment of peripheral lymphedema: draft revision of the 1995 Consensus Document of the International Society of Lymphology Executive Committe for discussion at the September 3-7, 2001, XVIII International Congress of Lymphology in Genova, Italy. Lymphology 34(2):84-91, 2001. 7. Cambria RA, Gloviczki P, Naessens JM, Wahner HW. Noninvasive evaluation of the lymphatic system with lymphocintigraphy: a prospective, semiquantitative analysis in 386 extremities. J Vasc Surg 18:773-82, 1993. 8. Collins OS, Villavicencio JL, Gómez ER, Coffey JA, Connaway C, Salander JM et al. Abnormalities of lymphatic drainage in lower extremities: a lymphocintigraphic study. J Vasc Surg 9:145-52, 1989. F UNDAÇÃO ABC 48

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