GT X Direito Administrativo e o Modelo de Estado Contemporâneo Modalidade da apresentação: Comunicação oral

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Transcrição:

GT X Direito Administrativo e o Modelo de Estado Contemporâneo Modalidade da apresentação: Comunicação oral ANÁLISE DA POSSIBILIDADE DE CELEBRAÇÃO DE CONTRATOS BUILT TO SUIT NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Resumo: O presente artigo busca discutir a possibilidade e a plausibilidade da celebração de contratos built to suit pela Administração Pública, com fundamento nos princípios que regem a atividade administrativa e a partir de uma análise bibliográfica e jurisprudencial de cunho civil e administrativo. Os contratos em questão ainda são pouco utilizados no âmbito da Administração Pública e consistem em um modelo de locação especial no qual o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial de imóvel conforme as necessidades organizacionais especificadas pelo locatário, que o recebe o durante um elevado prazo, o que irá garantir o retorno do investimento realizado pelo locador. Nesse contexto, diante da escassez de recursos necessários para a execução de obras fundamentais à prestação de serviços públicos, a utilização destes contratos pelas pessoas jurídicas de direito público pode apresentar-se como instrumento eficaz de superação de políticas administrativas tradicionais que se apresentem ineficientes. Não obstante a recente previsão de celebração destes contratos trazida pela Lei nº 13.190/2015, cujos dispositivos encontram-se suspensos por decisão monocrática do Supremo Tribunal Federal, a celebração de tais contratos é possível desde que presentes alguns requisitos, a exemplo da realização de licitação; da caracterização da efetiva necessidade do imóvel a ser locado; da inexistência de imóveis disponíveis no âmbito da Administração Pública federal, estadual, distrital ou municipal; da compatibilidade do preço exigido com os valores praticados no mercado; da fundamentação da locação sob medida a partir de estudos técnicos; e da efetiva impossibilidade de suprimento da demanda por outras formas. Palavras-chave: Contratos administrativos. Built to suit. Lei nº 13.190/2015. 1 INTRODUÇÃO No exercício das funções estatais, a Administração Pública utiliza-se de diversos mecanismos de atuação, conforme determina o seu regime jurídicoadministrativo. Nesse contexto, os contratos administrativos apresentam-se como um dos meios na busca da consecução do interesse público, de maneira que consistirá, em linhas gerais, no instrumento pelo qual serão firmados ajustes entre a Administração Pública e particulares. Com efeito, a prestação de serviços públicos muitas vezes exige a elevada mobilização de recursos financeiros para a celebração dos contratos em questão, de maneira que é comum a existência de obstáculos orçamentários para a realização de tais despesas. Por conseguinte, surge para os gestores públicos o desafio da busca

por alternativas que permitam o alcance das finalidades públicas, sempre conforme as exigências legais e em obediência aos princípios que regem a atividade administrativa. Nesta lógica, ganha relevo a interessante discussão acerca da possibilidade de celebração de determinados contratos administrativos, dentre os quais se destaca o contrato built to suit. A partir da utilização desta modalidade de locação, busca-se superar a indisponibilidade imediata de recursos para a aquisição, construção ou adaptação de imóveis para a instalação de órgãos ou entidades públicas, porquanto trata-se de modalidade de locação especial na qual a Administração Pública será locatária de imóvel que supra suas necessidades previamente estabelecidas junto ao locador, pessoa jurídica do ramo de construção civil, em regra. Entretanto, diante do forte apego à legalidade estrita e da alegação de insegurança jurídica por parte dos administradores públicos, os contratos em questão ainda se apresentam de forma insipiente no Brasil, de modo que sua utilização ainda é restrita e pontual. Ademais, com objetivo de regulamentar e dar maior publicidade a esta modalidade de contratação, em dezembro de 2015 foi publicada a Lei nº 13.190/2015, a qual permitiu a celebração desta avença no âmbito da Administração Pública, embora sua eficácia esteja suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). 2 CONTRATOS BUILT TO SUIT: BREVES CONSIDERAÇÕES A expressão built to suit tem origem na língua inglesa e, em tradução literal, significa "construído para servir". No Brasil, os contratos em questão também são denominados de "locação sob encomenda", "locação com obrigação de fazer" ou "contrato de construção ajustada" 1 e apenas obtiveram regulamentação através da Lei nº 12.744, de 19 de dezembro de 2012. Historicamente, os contratos built to suit são espécies contratuais utilizadas com frequência pelas indústrias nos Estados Unidos e na Europa, os quais surgiram a partir da necessidade de suprimento mercadológico que até então era inexistente. Sob a perspectiva econômico-financeira, os contratos de locação sob encomenda ganharam destaque a partir da necessidade percebida pelos empresários do mercado 1 Previsão constante no preâmbulo da Lei nº 12.744, de 19 de dezembro de 2012.

financeiro de que as companhias necessitavam instalar-se em locais que observassem as especificidades de sua atividade empresarial, mas não deveriam imobilizar capital na aquisição do terreno e na construção da unidade produtiva, tendo em vista que tais atividades não fazem parte de seu core business (atividade-fim) (NUNES, 2013, p. 6). Nesse contexto, a criação de novos institutos jurídicos permitiu o aperfeiçoamento dos mecanismos de financiamento imobiliário que possibilitaram a utilização desta espécie contratual, que, conforme Gasparetto (2009, p. 31): Trata-se de um negócio jurídico por meio do qual uma empresa contrata outra, usualmente do ramo imobiliário ou de construção, para identificar um terreno e nele construir uma unidade comercial ou industrial que atenda às exigências especificas da empresa contratante, tanto no que diz respeito à localização, como no que tange às características físicas da unidade a ser construída. Uma vez construída, tal unidade será disponibilizada, por meio de locação à empresa contratante, por determinado tempo ajustado entre as partes. Por conseguinte, tais contratos consistem em negócio jurídico por meio do qual o locatário contrata a construção ou a reforma substancial de imóvel conforme as suas necessidades, recebendo-o durante um elevado prazo, geralmente superior a dez anos, o que irá garantir, em tese, o retorno realizado no investimento por parte do locador. Desta maneira, o imóvel objeto deste contrato é construído especialmente para o futuro locatário a partir de critérios pré-estabelecidos, utilizando-se de técnicas adequadas de planejamento que envolvem diversos fatores inerentes ao exercício da atividade do ocupante específico (Cilli, 2005, p. 7). Não obstante a frequente celebração de contratos built to suit no âmbito da iniciativa privada, até o ano de 2012 os contratos em questão sustentavam a natureza jurídica de contrato atípico, tendo em vista a inexistência de tratamento legislativo particular. Entretanto, a Lei nº 12.744/2012 inseriu o art. 54-A na Lei nº 8.245/1991 2 2 Art. 54-A Na locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado por prazo determinado, prevalecerão as condições livremente pactuadas no contrato respectivo e as disposições procedimentais previstas nesta Lei. 1 o Poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo de vigência do contrato de locação. 2 o Em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo final da locação.

(Lei do Inquilinato), de forma que, atualmente, esta modalidade contratual apresentase como contrato especial de locação. 3 DA POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DOS CONTRATOS BUILT TO SUIT PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A discussão acerca da possibilidade de utilização de contratos de locação sob encomenda no âmbito da Administração Pública é recente e ainda incipiente, haja vista o desconhecimento de seus mecanismos e até mesmo de sua existência por parte dos gestores públicos. De outro modo, a observância do princípio da legalidade estrita e o receio de condenações movidas por iniciativa dos órgãos de controle também corroboram para a pouca - ou quase nenhuma - utilização de tal negócio jurídico. Todavia, a possibilidade de celebração de contratos built to suit no setor público mostra-se como interessante meio para o alcance dos fins da Administração Pública. Isso porque parte dos gestores públicos, notadamente os que administram escassos recursos, possui como grande entrave à execução de obras públicas a inexistência de dotação orçamentária suficiente para adquirir terreno e construir o imóvel necessário para a prestação de determinado serviço público. Além disso, outro ponto positivo na utilização dos contratos built to suit referese à possibilidade de realizar investimento a partir da utilização de despesas correntes 3 para o pagamento dos valores relativos à locação, sem a necessidade de utilização de despesas de capital, em regra menos flexíveis. Visando dar maior segurança jurídica aos gestores públicos na celebração destes contratos, foi editada a Lei nº 13.190 4, de 19 de novembro de 2015, a partir da conversão da Medida Provisória nº 678/2015, de maneira que, atualmente, há 3 De acordo com a Lei nº 4.320/1964, as despesas públicas podem ser classificadas, quanto às categorias econômicas, em correntes e de capitais. No primeiro grupo estão as despesas relacionadas à manutenção das atividades administrativas, a exemplo de despesa de pessoal, aquisição de bens de consumo, aluguéis, dentre outros, desde que não concorram para a ampliação dos serviços prestados. A outro turno, as despesas de capital referem-se à aquisição de máquinas, realização de obras, dentre outras, concorrendo para a expansão das atividades do órgão ou entidade. 4 Além de dispor sobre a celebração de contratos de locação sob medida, a referida lei trouxe inovações no Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) - Lei nº 12.462/2011 - e na Lei de Execuções Penais (LEP) - Lei nº 7.210/1984.

autorização expressa no sentido da possibilidade de realização destas avenças no âmbito do setor público. No entanto, a novidade legislativa proposta foi tímida e conteve-se a trazer normas gerais que dificilmente facilitarão o uso destes contratos pela Administração Pública: Art. 47-A. A administração pública poderá firmar contratos de locação de bens móveis e imóveis, nos quais o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial, com ou sem aparelhamento de bens, por si mesmo ou por terceiros, do bem especificado pela administração. 1 o A contratação referida no caput sujeita-se à mesma disciplina de dispensa e inexigibilidade de licitação aplicável às locações comuns. 2 o A contratação referida no caput poderá prever a reversão dos bens à administração pública ao final da locação, desde que estabelecida no contrato. 3 o O valor da locação a que se refere o caput não poderá exceder, ao mês, 1% (um por cento) do valor do bem locado. Inicialmente, cumpre asseverar que a eficácia da Lei nº 13.190/2015 encontrase suspensa por decisão monocrática do Min. Luis Roberto Barroso, do STF, nos autos do Mandado de Segurança nº 33.889. Na decisão em questão foi determinada a suspensão do trâmite do Projeto de Lei de Conversão nº 17/2015, exceto naquilo que corresponde ao acréscimo dos incisos VI e VII ao art. 1º da Lei nº 12.642/2011, o que corresponde ao texto original da Medida Provisória 5. Entretanto, antes mesmo da sanção presidencial, a liminar em questão, datada de 23/11/2015, determinou que, caso o projeto fosse sancionado, a eficácia destes dispositivos estaria suspensa até posterior deliberação pelo plenário do STF. A suspensão deve-se, em linhas gerais, em virtude da ocorrência do que o STF denomina de "contrabando legislativo", prática inconstitucional que consiste na inclusão de emendas legislativas com matérias estranhas ao objeto de Medida Provisória, durante o seu trâmite. Não obstante a suspensão do dispositivo legal que disciplina os contratos built to suit no âmbito da Administração Pública, a discussão referente a sua celebração, seus limites e possibilidades demonstra-se necessária, principalmente quando se tem 5 O texto original da MP 678/2015 apenas previa a inclusão dos dois incisos citados. Entretanto, recebeu setenta e duas emendas parlamentares de matérias estranhas ao propósito original, dentre as quais está a previsão constante no art. 47-A da Lei nº 12.642/2011.

em vista a possível difusão deste modelo de locação a partir de sua previsão expressa em lei. Neste sentido, diante da frequência com a qual a Administração Pública utilizase da locação ou da cessão de imóveis, modalidades precárias que apresentam custos crescentes e permanentes, insta necessário por parte do gestor público a superação do modelo de políticas administrativas tradicionais. Por conseguinte, a partir da conjugação de institutos de direito público e de direito privado, é possível a consecução do interesse público sem afastar a obediência aos princípios administrativos, notadamente o da eficiência. Com efeito, a utilização destes contratos no setor público justifica-se pela inexistência de elevadas dotações orçamentárias para a aquisição do terreno e a construção de imóvel, pelo alto custo das reformas realizadas em imóveis de particulares alugados pela Administração Pública sem devolução posterior, pelo locador, dos valores não amortizados e pela ausência, junto ao mercado imobiliário, de imóveis que atendam às necessidades de estruturação operacional dos órgãos e entidades públicas (BRASIL, 2013). Primeiramente, a celebração de contratos sob encomenda pela Administração Pública era possível antes mesmo da edição das Leis nº 12.744/2012 e 13.190/2015, haja vista que a celebração de contratos administrativos atípicos não é vedada pelo ordenamento jurídico pátrio. Uma das características dos contratos administrativos é a necessidade de obediência à forma prescrita em lei, como forma de permitir maior controle quanto à legalidade, o que não é óbice à celebração de contratos atípicos. Não obstante, as normas trazidas pela Lei nº 8.666/93 apenas tratam de questões atinentes ao aspecto formal, notadamente aqueles que dizem respeito à fatores que devem ser observados quando da celebração do contrato. Assim, desde que obedecidos os critérios gerais trazidos pela Lei nº 8.666/93, não há óbices para a celebração de tais avenças. Neste sentido, deve o contrato em questão ser precedido de licitação, em regra (Lei nº 8.666/93, art. 2º); deve haver a formalização por instrumento lavrado em cartório de notas, haja vista tratar-se de direito real sobre imóvel (Lei nº 8.666/93, art. 60); deve ser determinado o seu prazo de vigência (Lei nº 8.666/93, art. 57, 3º); deve haver previsão orçamentária no Plano Plurianual, porquanto tais contratos possuem elevada duração e, por conseguinte, ultrapassam o exercício financeiro; dentre outras cláusulas consideradas necessárias, conforme o art. 55 da Lei de Licitações.

Interessante ressaltar que o Tribunal de Contas da União (TCU) foi provocado a manifestar-se sobre a possibilidade de celebração de contratos built to suit pela Administração Pública, assim como sobre a aplicação do art. 24, X, da Lei nº 8.666/93 6, que trata da dispensa de licitação, a partir de consulta formulada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT). Na oportunidade, manifestou-se a corte de contas pela possibilidade de celebração de contratos built to suit por pessoas jurídicas de direito público, ao passo que traçou algumas diretrizes que podem auxiliar o gestor público diante da possibilidade ou necessidade de tais contratações. Neste sentido, para a legitimidade destes contratos é necessário: a) caracterização da efetiva necessidade do imóvel a ser locado, demonstrando-se a impossibilidade de readequação de imóvel existente ou o não atendimento deste ao interesse público; b) inexistência de imóveis disponíveis no âmbito da Administração Pública federal, estadual, distrital ou municipal, de acordo com as "Orientações para destinação do Patrimônio da União"; c) compatibilidade do preço exigido com os valores praticados no mercado a partir de laudo de avaliação a ser emitido pela Caixa Econômica Federal à época da efetiva locação do imóvel; d) fundamentação da locação sob medida a partir de estudos técnicos, pareceres e demais documentos aptos a justificar tal opção de contrato, assim como a demonstração da efetiva impossibilidade de suprimento da demanda por outras formas, de modo que a locação sob encomenda se mostre inequivocamente mais favorável sob o ponto de vista econômico. No entanto, também merece reflexão a possibilidade de previsão contratual que trate da reversão dos bens à Administração Pública ao final da locação, conforme o art. 47-A, 2º, da Lei nº 13.290/2015. Neste caso, ganha especial relevo a fase de planejamento da licitação, pois torna-se necessária a realização de estudos estratégicos que, a partir da natureza do serviço público a ser prestado e da projeção 6 Art. 24. É dispensável a licitação: (...) X - para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia;

de demanda futura, pode apontar para a economicidade e a eficiência na reversão destes bens. A despeito do maior valor a ser gasto pela Administração Pública nestes casos, haja vista a necessidade de amortização de maiores investimentos realizados pelo particular, a cláusula de reversão de bens ao Estado deve ser utilizada sempre que demonstrada a eficiência deste instituto. Entretanto, tratando-se de construção de bem imóvel em terreno público ou de reforma substancial em imóvel de propriedade do Estado, a existência de cláusula contratual que determina a reversão dos bens é obrigatória, visto que, após o término do contrato e, por consequência, da cessão dos direitos de superfície, o Estado passará a ter a propriedade plena sobre a construção, conforme a regra do art. 1.375 do Código Civil. Outro ponto merece destaque. Em caso de celebração de contratos de locação sob encomenda na modalidade reforma, é fundamental que as alterações a serem realizadas sejam, na dicção das Leis nº 12.744/2012 e 13.190/2015, substanciais, ou seja, profundas, vultosas e consideráveis. Neste caso, também é dever do administrador público a demonstração de que a reforma a ser realizada ultrapassa a mera realização de reparos de pequeno e médio porte, o que desaconselharia a locação convencional ou a realização de licitação para a contratação de pessoa jurídica para a realização das obras em questão. Por fim, em conformidade com o 3º do art. 47-A da Lei nº 13.190/2015, o valor a ser pago a título de aluguel não deve superar, ao mês, 1% (um por cento) do valor do imóvel a ser locado, o que irá determinar, ainda que indiretamente, na elevada duração do contrato. Ademais, posicionou-se o TCU no sentido de ser possível, em relação aos contratos built to suit, realizar a contratação direta com fundamento no art. 24, X, da Lei nº 8.666/93, desde que presentes todos os requisitos constantes no dispositivo em questão, quais sejam: que as necessidades de instalação e de localização condicionem a escolha de determinado imóvel que a Administração pretende buscar a locação; que haja avaliação prévia; e que o preço da locação seja compatível com o valor praticado no mercado. Por fim, dispõe o referido acórdão que o fato de a locação sob medida envolver a realização adicional e concomitante de obra pública não proíbe, por si só, o emprego da dispensa de licitação fundada no art. 24, X, Lei nº 8.666/1993, não só porque, no caso da locação sob encomenda, a aludida obra

apresenta-se como acessória ao serviço de locação, que se configura como o objeto principal, mas também porque, no caso de obra autônoma, o pagamento ocorre de modo integral, ao passo que, no de obra acessória à locação sob medida, o pagamento ocorre de modo diferido segundo a parcela de utilidade auferida em cada período de efetivo uso da atividade de locação, enquadrando-se, pois, na definição de serviço dada pelo art. 6º, II, da Lei nº 8.666/1993 (BRASIL, 2013). Todavia, conforme acertada interpretação constante no voto-revisor, ainda há outro ponto a ser discutido. Como demonstrado, a celebração de contratos sob encomenda pode se dar tanto em relação a terreno de propriedade de órgão ou entidade pública quanto em terreno de propriedade de particular. No primeiro caso (bem público), a possibilidade de competição entre os eventuais interessados em edificar o bem é, em regra, possível, o que impõe o dever de realizar licitação, afastando-se a possibilidade de aplicação do art. 24, X, da Lei nº 8.666/93. De outra forma, tratando-se de terreno particular, em tese haverá inviabilidade de competição passível de dispensar a licitação. Demais disso, a celebração de contratos de locação sob encomenda já era experimentada antes mesmo da regulamentação da Lei nº 13.190/2015, seja com a realização de procedimento licitatório, como o realizado no âmbito de municípios principalmente para a construção de escolas e unidades de saúde e pela Justiça Federal a exemplo da instalação das subseções judiciárias de Itaboraí e Campo Mourão no estados do Rio de Janeiro e do Paraná, respectivamente; seja através de dispensa de licitação, de acordo com contratos celebrados no âmbito do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região para a construção do Fórum Trabalhista de Guarapari/ES (TCU, 2013). Com efeito, a partir da singela regulamentação trazida pela Lei nº 13.190/2015 e da utilização destes contratos em pequena escala já em período anterior à inovação legislativa, é provável que nos próximos anos a Administração Pública experimente novos desafios na utilização de contratos built to suit. Nesse contexto, surge a necessidade de um maior controle administrativo a ser realizado pelos órgãos responsáveis, notadamente os Tribunais de Contas, com enfoque nos controles prévio e concomitante, visando coibir o possível desvirtuamento na celebração destes contratos, fato que pode, inclusive, configurar ato de improbidade administrativa.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS A celebração de contratos de locação sob encomenda pela Administração Pública é uma realidade recente e ainda desconhecida por parte dos gestores públicos. Nesse contexto, a Lei nº 13.190/2015 buscou trazer maior segurança jurídica para a celebração de tais contratos, haja vista as vantagens advindas deste modelo peculiar de locação. Não obstante encontrar-se com sua eficácia suspensa, o diploma legislativo trouxe tímidas mas importantes perspectivas que permitem ao administrador público contornar dificuldades financeiras e orçamentárias quando da necessidade de adquirir ou reformar substancialmente imóveis fundamentais à prestação de serviços públicos. De mais a mais, conforme demonstrado, antes mesmo da edição da referida lei já era possível - e utilizado em restrita escala - a celebração dos contratos em tela, com base na legislação civil. Desta forma, os contratos built to suit podem ser utilizados no âmbito da Administração Pública, desde que precedidos de licitação, em regra, e obedecidos determinados requisitos fundamentais para legitimá-la e para diminuir os riscos de lesão ao interesse público. De outro lado, a dispensa de licitação para a celebração dos contratos em questão é concebível de modo excepcional, desde que presentes os requisitos do art. 24, X, da Lei nº 8.666/93, possibilidade ratificada pelo TCU. Por fim, a possível difusão deste modelo de locação exigirá intensa fiscalização por parte dos órgãos de controle, notadamente os Tribunais de Contas, com o objetivo de impedir a violação aos princípios administrativos ou quaisquer lesões ao interesse público que podem ocorrer em virtude da sucinta regulamentação legal e da pouca experiência administrativa acerca do tema. REFERÊNCIAS BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 1.301. Rel. André Luiz de Carvalho. Diário Oficial da União. Brasília, 2013. CILLI, Fábio. Empreendimentos do tipo build-to-suit: arbitragem do valor da locação em editais de concorrência. São Paulo: 2005. Disponível em: http://www.poliintegra.poli.usp.br/library/pdfs/d85c518006124af6d8fd86d8e5bd9aa6. pdf. Acesso em 20/02/2016.

GASPARETTO, Rodrigo Ruede. Contratos built to suit: um estudo da natureza, conceito e aplicabilidade dos contratos de locação atípicos no direito brasileiro. São Paulo: Scortecci, 2009. NUNES, Cláudia Ribeiro Pereira. Contrato Built to Suit como instrumento de construção ou reforma do estabelecimento empresarial na Era Contemporânea: definição, características, natureza jurídica e a emissão dos Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI). Congresso Anual da ABDE, Brasil, set. 2013. Disponível em: <http://www.congresso.abde.com.br/index.php/abde/vi_abde/paper/view/107/51>. Data de acesso: 29 Dez. 2015.