VOLUME DE MADEIRA DE UM HECTARE DE CERRADO SENSU STRICTO EM PLANALTINA DE GOIÁS José Imaña-Encinas¹, Otacílio Antunes Santana¹, José Elias de Paula², Gustavo Silva Ribeiro¹ (¹Departamento de Engenharia Florestal, Universidade de Brasília, Cx. P. 4357, 70919-900 Brasília, DF. e-mail: imana@unb.br) Termos para indexação: Cerrado, Caryocar brasiliense, Kielmeyera coriácea, dendrologia, inventário florestal Introdução Na região do Centro-Oeste a vegetação natural apresenta diversas fitofisionomias das savanas tropicais, sendo que o cerrado sensu stricto é uma delas. Essa fisionomia é constituída de um grande mosaico de comunidades vegetais arbóreas com um dossel bastante aberto e presença de um estrato herbáceo-arbustivo acompanhado de uma camada rasteira graminosa contínua. As árvores do cerrado sensu stricto são caracterizadas por fustes tortuosos com alturas inferiores a 15 m (Ratter et al., 2003). Estudos de índole florística e fitossociológica foram realizados em áreas do cerrado sensu stricto (Felfili et al., 1993; Felfili e Silva Jr, 2001; Felfili et al., 2004) fornecendo informações sobre a sua riqueza florística, número de indivíduos por hectare e área basal ocupada. Em extensa revisão bibliográfica, foram encontradas poucas referências (Scolforo e Silva, 1993; Paula et al., 1998; Oliveira et al., 1998; Imaña-Encinas e Paula, 2003; Batalha e Martins, 2004; Rezende et al., 2006) que tivessem informações relativas ao volume de madeira do cerrado sensu stricto. Deduz-se consequentemente, que o parâmetro volumétrico de madeira para as áreas de cerrado é pouco conhecido, mesmo reconhecendo a existência em várias regiões com vegetação nativa uma intensiva extração madeireira para fins energéticos, principalmente lenha e carvão vegetal. O presente trabalho determinou pela cubagem rigorosa o volume de madeira de um hectare do cerrado sensu stricto, localizado em Planaltina de Goiás.
Material e Métodos A área de estudo está localizada na região de Planaltina de Goiás, próxima ao limite do Distrito Federal, nas coordenadas geográficas 15º27 25,70 S e 47 40 45,77 W (SAD 69). O clima da região corresponde ao tipo Cwa da classificação de Köppen, com uma precipitação de 1.400 a 1.450 mm/ano. A declividade está entre 2 e 3 %, e a altitude próxima a 948 m. O hectare medido ficou dividido em 10 parcelas retangulares de 10x100 m cada uma, perfazendo assim um hectare (10.000 m 2 ) de observação. Coletou-se todo o material botânico fértil das espécies inventariadas. O material botânico recebeu correspondente número de coleta, que após a secagem das exsicatas em estufa, foram incorporadas ao acervo do Herbário da Universidade de Brasília (UB). Todas as árvores com DAP igual ou superior a 5 cm foram medidas e nelas realizou-se a cubagem rigorosa. Em pé foi medido o DAP e altura total da árvore. No fuste das árvores foram consideradas as seguintes variáveis: DAP, D b (diâmetro da base à 20cm do chão), e D sup (diâmetro na altura da primeira bifurcação), medidas estas em cm. Como instrumento de medida empregou-se uma suta de 80 cm. A altura do fuste foi o correspondente comprimento entre o D b e o D sup. Nos galhos efetuaram-se medidas semelhantes: diâmetro na base do galho e diâmetro da base da bifurcação correspondente, e o respectivo comprimento entre esses dois diâmetros. Para o cálculo de volume empregou-se a fórmula de Smalian, transformando os correspondentes diâmetros em áreas transversais (A), e o respectivo comprimento (h) do fuste A1+ A2 ou galho considerado, através da fórmula: V = h 2 Resultados e Discussão Um total de 490 árvores com DAP igual ou superior a 5 cm foram medidas, que ficaram classificadas em 51 espécies, distribuídas em 28 famílias (Tabela 1). As espécies Ouratea spectabilis e Hymenaea stigonocarpa apresentaram os maiores valores em densidade de indivíduos arbóreos, 50 e 45 n/ha respectivamente, correspondendo ambos a 19 % da população amostrada.
Dez espécies (2 %) foram catalogadas com apenas 1 indivíduo arbóreo. A família Leguminosae apresentou-se com o maior número de indivíduos arbóreos e o maior volume de madeira. O cálculo do volume com casca obtida pela cubagem rigorosa forneceu um total de 16,18 m³/ha de madeira, correspondendo a 10,84 m³/ha (67 %) o volume total dos fustes e 5,33 m³/ha (33 %) dos galhos. Batalha et al. (2001) encontraram para o cerrado s.s. da região Santa Rita do Passa Quatro, São Paulo, um volume de madeira igual a 16,479 m³/ha. Rezende et al. (2006) registraram para um cerrado s.s. localizado no Distrito Federal um valor igual a 25,10 m³/ha. As seis famílias com a maior riqueza em indivíduos arbóreos (n = 358) perfizeram 7 da população estudada, concentrou 7,14 m 3 /ha, correspondendo a 44% do total do volume de madeira. Oito famílias não apresentaram volume nos galhos. As espécies que apresentaram maior volume de madeira foram: Caryocar brasiliense (2,14 m 3 /ha com 14 indivíduos), Kielmeyera coriacea (1,91 m 3 /ha com 3 indivíduos), Roupala montana (1,59 m 3 /ha com somente 1 indivíduo) e Qualea grandiflora (1,36 m 3 /ha com 7 indivíduos arbóreos). Essas quatro espécies, com 25 indivíduos arbóreos (5 % da população) perfizeram 43 % do volume total. As espécies Caryocar brasiliense, Miconia fallax e Qualea grandiflora apresentaram maior volume de madeira nos galhos do que no fuste. Doze espécies (23 %) não apresentaram volume dos galhos, uma vez que os respectivos galhos não possuíam o diâmetro mínimo de 5 cm.
Tabela 1. Volume de madeira em um hectare de cerrado sensu stricto. Família n/ha Volume fuste (m³/ha) Volume galhos (m³/ha) Volume total (m³/ha) % Annonaceae 4 0,11779 0,01094 0,12873 0,80 Apocynaceae 27 0,32963 0,04817 0.37781 2,33 Araliaceae 5 0,03298 0,00761 0,04060 0,25 Asteraceae 5 0,01728 0,01728 0,11 Bignoniaceae 1 0,00629 0,00629 0,04 Bombacaceae 1 0,08943 0,00656 0,09600 0,59 Caryocaraceae 14 0,81468 1,33189 2,14658 13,26 Celastraceae 3 0,06919 0,00382 0,07302 0,45 Connaraceae 4 0,10182 0,00510 0,10693 0,66 Erythroxylaceae 1 0,00832 0,00832 0,05 Guttiferae 3 1,25238 0,65758 1,90997 11,80 Hippocrateraceae 8 0,00781 0,00781 0,05 Lauraceae 1 0,38415 0,10818 0,49234 3,04 Leguminosae 143 3,13928 0,98631 4,50321 25,49 Loganiaceae 14 0,34542 0,08543 0,43086 2,66 Lythraceae 1 0,06169 0,06169 0,38 Malpighiaceae 25 0,40382 0,13079 0,53464 3,30 Melastomataceae 16 0,81622 0,35388 1,17010 7,23 Myrsinaceae 4 0,01472 0,00365 0,01838 0,11 Myrtaceae 10 0,01342 0,00146 0,01489 0,09 Nyctaginaceae 44 0,20821 0,02820 0,23642 1,46 Ochnaceae 50 0,02945 0,02945 0,18 Opiliaceae 2 0,01481 0,01481 0,09 Proteaceae 1 1,02028 0,56854 1,58883 9,82 Rubiaceae 3 0,35194 0,11668 0,46863 2,90 Sapotaceae 33 0,05657 0,05657 0,35 Styracaceae 6 0,08014 0,00408 0,08422 0,52 Vochysiaceae 61 1,06509 0,87268 1,93779 11,97 Total 490 10,85281 5,33155 16,18436 100,00 As famílias Ochnaceae e Sapotaceae apresentaram uma densidade populacional elevada, porém em volume de madeira valores muito baixos. Deduz-se que os indivíduos dessas famílias eram de porte bastante pequeno. Em sentido contrário, apenas um indivíduo arbóreo das famílias Lauraceae e Proteaceae respectivamente, apresentaram considerável volume de madeira (Tabela 1).
Esquematicamente mostra-se na Figura 1, a distribuição porcentual da produção madeireira nas famílias constantes de um hectare de cerrado sensu stricto. 1% 5% 2% 1 26% 12% 12% 10% 7% 16 famílias Nyctaginaceae Apocynaceae Loganiaceae Rubiaceae Lauraceae Malpighiaceae Melastomataceae Proteaceae Guttiferae Vochysiaceae Caryocaraceae Leguminosae Figura 1. Famílias botânicas produtoras de madeira em um hectare de cerrado senso stricto na região de Planaltina de Goiás. Conclusões O estrato arbóreo de um hectare de cerrado sensu stricto, na região de Planaltina de Goiás, ficou composto de 490 indivíduos com DAP acima de 5 cm. A riqueza florística mostrou a existência de 51 espécies arbóreas. O cálculo de volume de madeira com casca, determinado através da fórmula de Smalian, identificou um total de 16,1843 m 3 /ha, correspondendo a 10,8528 m 3 /ha do volume dos fustes e 5,3315 m 3 /ha de madeira dos galhos.
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