PROPOSTA DE METODOLOGIA PARTICIPATIVA PARA A ELABORAÇÃO DOS PLANOS DE BACIA HIDROGRÁFICA. Adriana Luchini de Mello

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Transcrição:

PROPOSTA DE METODOLOGIA PARTICIPATIVA PARA A ELABORAÇÃO DOS PLANOS DE BACIA HIDROGRÁFICA Adriana Luchini de Mello Palavras-chave: Planos; Metodologia; Participação. Resumo: Este artigo tem por objetivo propor uma metodologia participativa para a elaboração dos planos de bacia. O estudo propõe a criação de fóruns de desenvolvimento, em substituição às Agências de Bacia. Os fóruns devem ser constituídos, através de sensibilização e consenso, pelas lideranças locais de cada bacia e, posteriormente, devem participar de um processo simultâneo de capacitação em planejamento e elaboração do plano de bacia. INTRODUÇÃO Os esforços em direção a uma gestão mais adequada dos recursos hídricos resultaram na sanção, em 08/01/97, da Lei 9.433, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Recursos Hídricos. A Lei 9.433 estabelece princípios básicos para a gestão dos recursos hídricos: a adoção da bacia hidrográfica como unidade de planejamento, associada ao reconhecimento da água como bem econômico; o reconhecimento da importância de seus usos múltiplos e a necessidade de um trabalho de gestão a um só tempo descentralizado e participativo. Estes princípios são praticados hoje em todos os países que avançaram na gestão de seus recursos hídricos. Também é definido na lei um conjunto de instrumentos considerados essenciais à boa gestão do uso da água: Os planos de recursos hídricos [1], que são planos diretores que visam fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e o gerenciamento dos recursos hídricos; a outorga de direito de uso dos recursos hídricos [2], instrumento através do qual o usuário assegura, por prazo determinado, o seu direito ao uso desse recurso; a cobrança pelo uso dos recursos hídricos [3], instrumento capaz de promover as condições de equilíbrio entre as forças de oferta (disponibilidade de água) e da demanda, promovendo, em conseqüência,

a harmonia entre os usuários; o enquadramento dos corpos d água em classes de uso, que se constitui de certa forma numa classificação que permite destinarem-se volumes de água de determinado padrão de qualidade a usos cuja exigência seja compatível com esse padrão; e o Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos, conjunto de elementos organizados sob a forma de banco de dados, que auxilia no gerenciamento e planejamento dos recursos hídricos. A Lei 9.433 também cria novos tipos de organização para a constituição do Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos: O Conselho Nacional e os Conselhos Estaduais de Recursos Hídricos, que são os órgãos mais elevados da hierarquia do Sistema de Gerenciamento. A eles cabem, em linhas gerais, decidir sobre questões relevantes dessa gestão, assim como dirimir conflitos e contendas de maior vulto; os Comitês de Bacia, que representarão o fórum de decisão no âmbito de cada bacia hidrográfica; sendo constituídos por representantes dos usuários de recursos hídricos, da sociedade civil organizada e dos três níveis de governo; e as Agências de Água, que servirão como o braço técnico de um ou mais comitês e, entre outras responsabilidades, deverão realizar os estudos necessários para a gestão dos recursos hídricos em sua área de atuação, cobrar pelo uso dos recursos hídricos e gerir os recursos oriundos dessa cobrança, elaborar o plano de recursos hídricos de sua bacia e submetê-lo à apreciação do comitê e gerir o sistema de informação sobre recursos hídricos em sua área de atuação. Apesar da experiência de planejamento no Brasil apontar para a necessidade de se dar mais atenção aos demais mecanismos institucionais de articulação política e tomada de decisões em tempo real (Scelza Cavalcanti e Cavalcanti, 1980, p,10), este estudo pretende abordar os planos de recursos hídricos; mais especificamente os planos de bacia, procurando oferecer contribuições para sua elaboração. 1. DIMENSÃO DOS PLANOS DE RECURSOS HÍDRICOS E DESAFIOS À SUA IMPLEMENTAÇÃO Conforme mencionado, os planos de recursos hídricos serão elaborados em três níveis: nacional, estadual e de bacia. O Plano Nacional abordará questões de relevância para todo o país e questões que, embora de impacto num só Estado ou numa só bacia, por alguma limitação desses níveis precisam contar com tratamento

complementar da União. O Plano Nacional de Recursos Hídricos não deve ser interpretado, portanto, como a consolidação dos planos estaduais e de bacia; ele é mais abrangente e também fornece - em vez de só receber - subsídios à elaboração desses últimos. Os planos estaduais de recursos hídricos e os planos de bacia, por sua vez, tratam, como a análise realizada no parágrafo anterior leva a deduzir, de questões de impacto num só Estado ou numa só bacia. Dado o caráter de complementaridade entre os três planos, é possível presumir que a formulação e implementação de cada um poderão conter desafios comuns e desafios peculiares. Como desafios comuns é possível citar a escassez de recursos para a implementação, o que pode ser superado com a implementação da cobrança; e a necessidade de minimizar os obstáculos que em geral cercam a implementação de planos no Brasil, já que é significativo no país o número de planos que são elaborados com qualidade técnica e que não são implantados. Leal e Rovere (1997) destacam três fatores principais que contribuem para que isso aconteça: Falta de respaldo legal. A legislação precisa prever a elaboração do plano diretor como um instrumento de gestão, pois, esse mecanismo facilita a implementação do plano, uma vez que cria um compromisso legal. Também a entidade responsável pela elaboração do plano deve ter respaldo legal para colocá-lo em prática, e ter essa incumbência prevista na lei. Financiamento. Os mecanismos de financiamento das intervenções precisam estar previstos na fase de elaboração do plano, caso contrário, tais intervenções dificilmente serão implantadas. Participação dos usuários. Um plano diretor elaborado sem a participação dos usuários termina muitas vezes não atendendo as necessidades desses usuários e a sua formação cultural. A falta de participação dos usuários na elaboração dos planos é um problema que ameaça a implementação dos planos estaduais e dos planos de bacia. No caso específico dos planos de bacia, como sua elaboração é responsabilidade das Agências de Água, a

efetiva participação dos usuários e da sociedade dependerá da composição de tais organizações. 2. UMA PROPOSTA ALTERNATIVA A proposta deste estudo, em sintonia com a Agenda 21, é que os planos de bacia sejam elaborados por fóruns de desenvolvimento, constituídos pelas lideranças comunitárias de cada bacia. Cada fórum deverá passar por um processo de capacitação em planejamento e, simultaneamente, elaborar o plano. As etapas básicas para a constituição do fórum podem ser as seguintes: a) Estabelecimento de Parcerias com Instituições de Ensino Superior em Administração - os Comitês de Bacia podem buscar o apoio de universidades para a constituição do fórum e a posterior capacitação de seus integrantes. As universidades, por sua vez, podem buscar o envolvimento de alunos que estão em fase de conclusão. b) Mobilização das Lideranças Locais - definida a equipe responsável pela constituição e capacitação de cada fórum, deverá ser definida a data de reunião para a constituição dos mesmos e ter início um amplo trabalho de divulgação da iniciativa. A comunidade da bacia deverá ser convidada e motivada a participar da reunião. c) Sensibilização dos Participantes da Reunião e Constituição do Fórum no dia da reunião, havendo representação expressiva da bacia, a equipe responsável pela constituição do fórum deverá fazer exposição sobre a situação da água no mundo e na bacia em questão, e sobre a necessidade de definição e implementação de estratégias para um cenário menos crítico. Após esta exposição, deverá ser apresentada e justificada a proposta de trabalho participativo, com explicação detalhada de suas etapas. Somente após esta sensibilização, deverá ter início a constituição do fórum. A composição do fórum deverá ser resultado de um consenso construído pelos participantes; deve-se evitar ao máximo decidir quem entre e quem não entra nesta instância a partir do método de votação; exceto nos casos em que for impossível superar impasses através do esforço, repetido muitas vezes, de diálogo e negociação. d) Definição do Termo Diagnóstico e Elaboração do Roteiro para a Coleta - a primeira atividade concreta da capacitação para a elaboração do plano será o

desenvolvimento do conceito de diagnóstico. Para facilitar a compreensão do conceito e sua aplicação na realização dessa etapa da experiência de planejamento, deverá ter início a discussão dos problemas do município. Esse procedimento favorecerá a internalização da noção do diagnóstico como um retrato do município, além de contribuir para um maior conhecimento, por parte de todos, inclusive da equipe de capacitação, da realidade local. Os principais problemas apontados serão registrados, analisados e, em seguida, relacionados aos dados disponíveis em instituições oficiais de pesquisa. O confronto com os problemas locais permitirá a validação ou o reexame de tais dados. Aqueles que necessitarem de revisão deverão ser acrescentados na relação dos que serão alvo de coleta (todos os dados considerados importantes que não foram encontrados em instituições de pesquisa). A partir do entendimento da noção de diagnóstico, e da relação dos dados que precisam ser coletados, tem início a discussão e elaboração do roteiro para a coleta de dados. e) Sistematização e Validação do Diagnóstico - após a elaboração do roteiro para coleta de dados, o processo de capacitação deverá ter um intervalo, a fim de que os integrantes do fórum possam buscar os dados necessários e iniciar o diagnóstico. A etapa denominada Sistematização e Validação do Diagnóstico consiste numa análise mais detalhada do levantamento de dados e do diagnóstico realizados durante o intervalo monitorado. Essa análise é realizada pelo fórum e pela equipe de capacitação. Sua realização pode ser considerada fundamental, uma vez que a coerência do diagnóstico é pré-condição para a coerência do Plano. A partir do diagnóstico local, o fórum realizará nova discussão sobre os principais problemas da bacia. Essa discussão conduzirá à definição dos objetivos prioritários e das alternativas de solução dos problemas da região. As técnicas utilizadas pela equipe capacitadora, durante esta etapa, serão a Árvore de Problemas, a Árvore de Objetivos e a Árvore de Alternativas. A árvore de problemas é uma técnica participativa que ajuda a desenvolver idéias criativas para identificar um problema e que organiza as informações coletadas sobre o mesmo.

A árvore de problemas tem um tronco, raízes e uma copa. O tronco é o problema central, as raízes são as suas causas e a copa os seus efeitos. Cada problema é conseqüência de outros que aparecem abaixo no gráfico e, por sua vez, provoca problemas que aparecem na parte de cima do mesmo gráfico. Para montar a árvore de problemas é necessário estruturar um amplo esquema de causa e efeito na forma de uma árvore, seguindo os passos apresentados a seguir: - O moderador distribui fichas aos participantes solicitando que cada um escreva o problema que considera deva ser o problema central. - As fichas são afixadas em um painel para serem visualizadas por todos. - O grupo determina o problema central. - Os participantes escrevem, em fichas, as causas do problema central. - Os participantes escrevem, em fichas, as conseqüências do problema central. - Os problemas apresentados são discutidos, sendo ou não confirmados pelo grupo. (É bom lembrar que, a partir do momento que as idéias são colocadas no painel, elas são consideradas de propriedade do grupo). - O grupo constrói um diagrama, em forma de árvore obedecendo à relação causaefeito entre os problemas. - Se for o caso, novos problemas são acrescentados. A árvore de objetivos é elaborada a partir da árvore de problemas e do diagnóstico. Os passos para sua elaboração são os seguintes: - Reformular as condições negativas da árvore de problema em condições positivas, atendendo-se o mais possível às palavras utilizadas na formulação dos problemas. - Verificar se há a necessidade de alterar formulações ou acrescentar novos objetivos relevantes. Proceder às alterações necessárias.

A árvore de objetivos é a base para a definição das ações, ou seja, para a elaboração da árvore de alternativas, que, por sua vez, possui duas etapas: - Identificar, na árvore de objetivos, diferentes combinações de meios-fins que possam se constituir em estratégias de projetos. - Estabelecer critérios de seleção: recursos disponíveis, duração do projeto, não duplicidade com outros projetos, sustentabilidade temporal dos efeitos, etc. O produto desta dinâmica deverá ser registrado em papel, para subsidiar a formulação do plano. f) Capacitação para a Elaboração do Plano de Bacia - após o segundo intervalo monitorado tem início a Capacitação para a Elaboração do Plano. Inicialmente será apresentada aos fóruns a estrutura proposta para o plano: - OBJETIVOS PRIORITÁRIOS - METAS - ESTRATÉGIAS - PROJETOS a) Projeto 1 Objetivos gerais e específicos; Breve justificativa Identificação dos órgãos ou instituições que participarão das atividades do projeto, tanto como financiadores quanto apoiadores; Viabilidade; Anexos, quando necessário. b) Projeto 2

Objetivos gerais e específicos; Breve justificativa Identificação dos órgãos ou instituições que participarão das atividades do projeto, tanto como financiadores quanto apoiadores; Viabilidade; Anexos, quando necessário. c) Projeto n Objetivos gerais e específicos; Breve justificativa Identificação dos órgãos ou instituições que participarão das atividades do projeto, tanto como financiadores quanto apoiadores; Viabilidade; Anexos, quando necessário. - FORMAS DE PARTICIPAÇÃO DOS CIDADÃOS: formas de participação das instituições estatais municipais, estaduais, regionais, federais; formas de participação dos outros parceiros (Terceiro Setor, Mercado) - SISTEMA DE MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO Apresentada a estrutura do Plano, a equipe de capacitação deverá favorecer o desenvolvimento dos conceitos relacionados à mesma. Para enriquecer essa etapa, sugere-se que os fóruns recebam resumos de bibliografias sobre os seguintes temas: Desenvolvimento Sustentável Planejamento: conceito de Objetivos, Metas e Estratégias

Descentralização Participação e Controle Social Redes Interorganizacionais Monitoramento e Avaliação Negociação Sistema de Informações Orçamento e Custos Após a discussão dos conceitos contidos na estrutura do Plano, terá início a formulação do Plano de Bacia. Para garantir a concatenação das idéias, é recomendável retomar os principais problemas, os objetivos prioritários e as alternativas; definidos no fim da segunda etapa da capacitação. A partir destas definições, o fórum formulará, através de dinâmicas, o que consideram deva constar nos itens Objetivos Prioritários, Metas, Estratégias, Projetos, Formas de Participação dos Cidadãos, Sistema de Monitoramento e Avaliação. A técnica sugerida nesta etapa é a visualização móvel por meio de fichas e painéis: as informações transmitidas, além de faladas, devem ser visualizadas em fichas e afixadas em painéis. Algumas recomendações podem ajudar os participantes nesta tarefa (Oliveira, 1997): O QUE? Escrever com letra legível. Facilita a leitura. POR QUE? Escrever 3 ou, no máximo, 4 linhas por ficha. Apenas uma idéia por ficha. Idéias precisas e concisas. Cada idéia deve ser compreensível sem comentários. Usar fichas da mesma cor para os mesmos assuntos. Possibilita a leitura à distância. Facilita a estruturação das idéias. Reduz os mal entendidos. Facilita a visualização por assunto. Após discussão sobre o conteúdo das fichas, o mesmo deverá ser reproduzido em papel, sob forma de versão preliminar do plano. Este documento deverá ser revisado pelo fórum e pela equipe de capacitação.

Em síntese, a Capacitação para a Elaboração dos Planos de Bacia será dividida em quatro etapas, demonstradas na figura 1. Figura 1: Etapas Básicas da Capacitação para a Elaboração do Plano Apresentação do Conceito Revisão e demonstração Discussão com exemplos Estudo de Caso

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS A necessidade de participação nos processos decisórios de cada bacia é uma questão que precisa receber especial atenção. Somente com a participação da população da bacia será possível identificar a verdadeira realidade da região e definir estratégias de ação que possuam viabilidade de implementação. Este artigo procurou oferecer uma alternativa para viabilizar a participação. A sugestão apresentada está, inclusive, em sintonia com o Plano Nacional de Capacitação em Recursos Hídricos, que objetiva, em linhas gerais, implementar as capacidades de avaliar esses recursos, facilitar melhor planejamento no contexto do planejamento nacional do desenvolvimento, promover sustentabilidade financeira e ambiental mais eficiente e mais efetivo fornecimento de serviços de água, nos seus diversos usos. É sabido que toda metodologia possui limitações e precisa ser adaptada à realidade de cada grupo de trabalho. Entretanto, com as adaptações necessárias, a metodologia apresentada neste estudo parece ser viável, uma vez que favorecerá a elaboração participativa dos planos, com custos econômicos menores que os custos de instalação e manutenção de uma agência. Além disso, a proposta também favorecerá a realização de um dos importantes papéis da universidade: a extensão. Enfim, o estudo sugere que é possível alcançar participação e qualidade no processo de planejamento de cada bacia sem a sofisticação determinada pela Lei 9.433/97.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Lei 9.433, de 8 de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. LEAL, Márcia Souza, ROVERE, Emílio Lebre La. Aspectos institucionais na implantação do modelo de gestão de recursos hídricos. In: XII SIMPOSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS, 1997... Anais: p. 164-167. OLIVEIRA, Maria Odília A Ribeiro. Gerenciamento de Projeto. Versão preliminar preparada para o Curso de Gestão Social da ENAP. Março de 1997. SCELZA CAVALCANTI, CAVALCANTI, Irapoan. Dinâmica dos comitês de bacia hidrográfica e agências de água. P. 5,6, 1998. [1] Estes planos serão elaborados em três níveis: Plano Nacional de Recursos Hídricos, Plano Estadual de Recursos Hídricos, Plano de Bacia Hidrográfica. [2] Independem de outorga pelo Poder Público o uso de recursos hídricos para a satisfação das necessidades de pequenos núcleos populacionais, distribuídos no meio rural e; as derivações, captações, acumulações e lançamentos considerados insignificantes. [3] Serão cobrados os usos de recursos hídricos sujeitos a outorga.