Josefa Varela Guerra; Diogo de Oliveira Marques Departamento de Oceanografia, IGEO, UERJ

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PADRÃO DE CIRCULAÇÃO NA REGIÃO DO CANAL CENTRAL DA BAÍA DE ILHA GRANDE E IMPLICAÇÕES PARA A DISPERSÃO SEDIMENTAR-RESULTADOS PRELIMINARES DA COMPILAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS PRETÉRITOS Josefa Varela Guerra; Diogo de Oliveira Marques Departamento de Oceanografia, IGEO, UERJ (josie.guerra@gmail.com) Abstract The main purpose of this work was to assemble and reprocess the existing data on the circulation and sediment distribution in the Ilha Grande Bay area, southern coast of Rio de Janeiro state. This work focuses on the Canal Central area, that separates the continent from Ilha Grande island. An extensive research was conducted on public databases as well as in published materials. The available information were reprocessed and reinterpreted in the light of sediment transport processes. Despite the scarcity of information, it was possible to identify a few interesting features such as: ) a clear bidirectionality of the water column currents associated with the ESE/OSO directions, not related to tidal cycles; ) the association of the most frequent and strongest water column currents with E and SE directed flows. Therefore, throughout the water column, suspended sediment from Sepetiba bay may enter the Canal Central, settling in the protected areas. Although the database on surface sediment texture is relatively complete, there are almost no measurements of current velocity and direction in the bottom boundary layer. No measurements of suspended sediment concentration were found and information on wave and wind conditions are also scarce. Comparison of datasets from 9 and 99, collected under similar tidal and seasonal conditions, indicate the existence of significant interannual variability. This observation reinforces the need of research programs devoted to the acquisition of time series long enough to document seasonal and interannual variability, including long term cycles associated with El Niño and La Niña phenomena. Palavras-chave: baía de Ilha Grande; circulação; dinâmica sedimentar. Introdução A baía de Ilha Grande (Fig. ) é uma área de alto interesse ambiental na qual se encontram unidades de conservação que incluem parques e reservas ecológicas. Por outro lado, a presença de um terminal marítimo de petróleo (TEBIG), usinas nucleares, um porto, um estaleiro naval de grande porte e diversas marinas, além da proximidade da baía de Sepetiba (fortemente poluída) constituem ameaças potenciais à manutenção de sua condição atual, que inclui também intensa atividade turística, pesqueira e de aqüicultura. O objetivo principal deste trabalho foi compilar os dados existentes acerca da circulação da baía de Ilha Grande, compará-los ao padrão de cobertura sedimentar atual e identificar as possíveis trajetórias de dispersão sedimentar, particulamente através da região do Canal Central, situado entre o continente e a ilha Grande.. Área de estudo A baía de Ilha Grande é um corpo d água limitado a oeste pela Ponta de Trindade, a leste pela Ponta da Marambaia e ao sul pelo oceano Atlântico (Fig. ). Mahiques (98) dividiu a baía de Ilha Grande em três unidades fisiográficas: Porção Oeste, Canal Central e Porção Leste, terminologia que será adotada neste trabalho (Fig. ). O Canal Central é uma feição estreita e alongada, de orientação E-W, e que apresenta as maiores profundidades do interior da baía, atingindo metros. Na baía de Ilha Grande, segundo Signorini (980), predominam ventos dos quadrantes SE (0º) e NE (0º). O clima da região é fortemente

influenciado pelo relevo acidentado da Serra do Mar e pela ocorrência sistemática de chuvas orográficas. Na altura da baía de Ilha Grande, a Serra do Mar passa a constituir a própria linha de costa e a falta de espaço impede o desenvolvimento de planícies costeiras de expressão (Muehe & Valentini 998). Os cursos d água da região são perenes, em geral de pequena extensão e caracterizados por eventos torrenciais (Muehe & Valentini 998). O intenso desmatamento e o regime pluviométrico colaboram para a ocorrência freqüente de deslizamentos e desmoronamentos nas encostas e margens de rios, resultando no aporte de grande quantidade de sedimentos para as águas costeiras. Na Porção Oeste, a profundidade média é superior a 0 m e os valores máximos situam-se em torno de 0 m. A Porção Leste apresenta relevo mais aplainado e profundidades entre 0 e m (Mahiques 98). O mesmo autor identificou quatro grupos principais de sedimentos: areias médias e grossas da Porção Leste, lamas do Canal Central e das áreas protegidas, areias finas da Porção Oeste e plataforma continental adjacente, e sedimentos mistos, na transição entre as areias finas e os sedimentos pelíticos. A transição entre as lamas do Canal Central e as areias finas é gradativa a oeste e brusca a leste (Fig. ). A baía de Sepetiba também é uma possível fonte de sedimentos para a Baía de Ilha Grande e há diversos indícios de interação entre as duas baías, entre eles a presença de frentes salinas na Porção Leste (Miranda et al. 9; Ikeda & Stevenson, 98), que é a principal conexão da baía de Sepetiba com o oceano. O conjunto formado pelas baías de Ilha Grande e Sepetiba foi classificado por Signorini (980) como um sistema estuarino parcialmente estratificado, onde a baía de Sepetiba funcionaria como principal fonte de água doce para a região. Uma característica marcante da circulação no interior da baía de Ilha Grande, particularmente na região do Canal Central, é a ausência de uma forte correlação entre os ciclos de maré, o padrão de ventos e a direção e intensidade das correntes (Signorini, 980). Este mesmo autor identificou, ao redor da Ilha Grande, fluxos horários quase-estacionários, possivelmente gerados por gradientes de densidade existentes entre as Porções Oeste e Leste da baía de Ilha Grande: água salgada oriunda da plataforma continental, entraria na baía através da Porção Oeste, circularia ao redor de Ilha Grande, se encontraria com água mais doce proveniente da baía de Sepetiba e retornaria ao oceano pela entrada leste da baía de Ilha Grande. Os dados hidrográficos apresentados por Signorini (980) indicam a presença, abaixo de m de profundidade, de água com valores de sigma-t característicos da Água Central do Atlântico Sul (ACAS) que, segundo Corrêa (99), preencheria toda a coluna d água abaixo dos 0 m de profundidade. A dinâmica da plataforma, associada a meandros e vórtices da Corrente do Brasil, estaria associada a essa entrada da ACAS em áreas rasas (Corrêa 99; Silveira et al. 000). Na região do Canal Central foram detectadas componentes com períodos superiores a 0 horas que Fragoso (999) atribui a forçantes meteorológicas. Seiches com período de cerca de horas e outras oscilações com períodos entre - horas também têm sido observados em todo o sistema da baía de Ilha Grande (Signorini 980; Ikeda & Stevenson 98; Corrêa 99). Medições de altura significativa (H s ) e período de ondas (T), realizadas entre 9 e 98 na Porção Oeste, resultaram em média anual de H s =,8m e T=0,s (ENCAL 98).. Material e Métodos Em busca de informações a respeito da circulação e textura dos sedimentos superficiais da baía de Ilha Grande foram pesquisadas bases de dados públicas (BAMPETRO e BNDO-Banco Nacional de Dados Oceanográficos) e publicações diversas. Os dados compilados foram analisados para a identificação de lacunas e

inconsistências. Detalhes a respeito da posição das estações disponíveis, duração e profundidade das medições são apresentados em Marques & Guerra (submetido). Neste trabalho, dentre os dados fornecidos pelo BNDO, será apresentada apenas a série temporal mais longa (estação DHN, Fig. ) juntamente com uma série temporal (estação TEBIG), gentilmente cedida pelo CENPES- Petrobras. Na estação DHN foram realizadas 0h de medições horárias de velocidade e direção das correntes, a e 0m abaixo da superfície, entre -/08 de 9. Na estação TEBIG esses mesmos parâmetros foram medidos a e m abaixo da superfície durante 80h, a cada minutos, entre 9/08 e 08/09 de 99. Neste trabalho são apresentados os valores médios e máximos de velocidade do escoamento e a freqüência de ocorrência por direção segundo intervalos de º (Tabela ). O primeiro intervalo (N) compreende fluxos entre,º e,9º; o segundo intervalo (NE) fluxos entre,º e,9º e assim sucessivamente. Por fim, um mapa textural detalhado da região do Canal Central da baía de Ilha Grande foi elaborado com os dados compilados de Mahiques (98) e os dados fornecidos pelo BAMPETRO (Fig. ).. Resultados Estação DHN: durante este período, a altura da maré variou entre 0, e,m e as medições foram realizadas quase totalmente sob condições de maré de sizígia. A m abaixo da superfície as médias horárias da velocidade do escoamento oscilaram entre e 80 cms -. Observou-se um predomínio dos fluxos dirigidos para leste ( % das ocorrências) que também correspondem às maiores médias horárias (Tabela ). Os fluxos dirigidos para oeste (,% das ocorrências), ocasionalmente alcançaram velocidades máximas acima de 0 cms -. Os fluxos para N e NO apresentaram os menores valores médios e a menor variabilidade (Tabela ). Estação TEBIG: as medições foram realizadas durante períodos de maré de sizígia e um de quadratura; a variação máxima da altura da maré alcançou,m. A série temporal coletada m abaixo da superfície apresentou pequenas oscilações, aparentemente ligadas aos ciclos diários de maré, superpostas a oscilações de períodos mais longos, com duração de a dias. A velocidade do escoamento oscilou entre valores próximos a 0 e, cms -. As correntes apresentaram forte polarização nas direções ESE e ONO que perfizeram, respectivamente, e 9% das ocorrências (Tabela ). As correntes dirigidas para leste e sudeste também estiveram associadas às maiores velocidades do escoamento ( e, cms - ) seguidas pelas direções O e NO (respectivamente 0, e, cms - ). A m abaixo da superfície (ou seja, m acima do fundo) foram observadas oscilações semelhantes àquelas registradas próximo à superfície e as velocidades do escoamento variaram entre 0 e,8 cms -. A polarização do escoamento nas direções ESE e ONO aproxima-se das condições observadas a m de profundidade (Tabela ) embora seja observado um maior alinhamento ao longo do eixo E-O. Cobertura sedimentar: o mapa textural detalhado da região do Canal Central de Ilha Grande (Fig. ) mostra que a porção a oeste, coberta por areias muito finas, é texturalmente mais homogênea que a porção a leste do mesmo. Nesta área, observa-se uma brusca transição de areias médias e grossas a siltes. A região do Canal Central revela-se texturalmente complexa: nos seus limites oeste e leste o fundo é ocupado por sedimentos finos (siltes médios a argilas) enquanto que na região entre a Ilha Grande e o continente o padrão de distribuição sedimentar é mais caótico. A localização das amostras (pontos negros na Fig. ) indica que a malha amostral não é homogênea e deve ser completada.

. Discussão Os dados aqui apresentados mostram que na região do Canal Central da baía de Ilha Grande o escoamento, em diversas profundidades, é nitidamente bidirecional, polarizado na direção ESE-ONO (próximo à superfície) e E-O (mais próximo ao fundo), embora assimétrico para leste. Entretanto, como já indicado por diversos autores (p. ex. Signorini, 980) essa bidirecionalidade não guarda relação com os ciclos de maré; outras forçantes, de baixa freqüência, parecem determinar o padrão de circulação resultante e, possivelmente, da direção de transporte de sedimentos. No entanto, a curta duração das medições não permite a resolução adequada da periodicidade dessas forçantes. As velocidades observadas atingem valores suficientes para transportar em suspensão sedimentos menores que areia fina. Vale lembrar que as séries temporais aqui apresentadas, que são as mais longas disponíveis para a área de estudo, limitam-se a medições superficiais (DHN) ou a medições realizadas a grande distância do fundo (TEBIG). Existem algumas medições de direção e velocidade de correntes realizadas a m acima do fundo, mas são extremamente escassas, e possivelmente não representativas do espectro de condições observáveis na área de estudo (Guerra & Marques, em preparação). O padrão textural representado na Figura mostra a possível deposição atual de siltes e argilas em áreas de baixo hidrodinamismo a NO e NE da Ilha Grande. Já a porção do Canal Central situada entre o continente e a Ilha Grande, mostra um padrão sedimentar complexo, que requer uma amostragem mais detalhada tanto dos sedimentos de fundo como do padrão de circulação. A comparação das medições realizadas próximo à superfície em 9 (DHN) e 99 (TEBIG) constitui uma excelente oportunidade para a avaliação de variações interanuais dos padrões de circulação e, potencialmente, dos padrões de dispersão sedimentar. As duas séries temporais foram adquiridas durante o período de inverno, incluem medições realizadas durante períodos de sizígia e têm duração semelhante. Nas duas séries é evidente a importância do escoamento dirigido para leste e sudeste, sempre associado aos fluxos mais velozes e também aos mais freqüentes (Tabela ). Entretanto, há algumas diferenças importantes: ) a série TEBIG mostra uma forte polarização do fluxo no sentido E-O, menos nítida na série DHN; sob estas condições é de se esperar que sedimentos contaminados, provenientes da baía de Sepetiba, sejam episodicamente levados para o interior da região do Canal Central, onde seriam incorporados aos sedimentos de fundo; ) para algumas direções, as velocidades médias e máximas da série DHN, são até vezes maiores que as velocidades da série TEBIG (Tabela ).. Conclusões O presente trabalho apresenta uma síntese do padrão de circulação na região do Canal Central de Ilha Grande. Embora a base de dados seja limitada, os resultados mostram que, ao menos ocasionalmente, existem condições favoráveis à entrada de material particulado em suspensão proveniente da baía de Sepetiba e sua dispersão em direção à Porção Oeste da baía de Ilha Grande, até o momento menos impactada em relação à outras áreas costeiras do estado do Rio de Janeiro. Os resultados mostram também a importância da aquisição de séries temporais de longa duração (da ordem de anos) acerca dos padrões de circulação, do aporte sedimentar e das condições meteorológicas pois somente com esse tipo de informação poderão ser corretamente calibrados modelos de transporte de sedimentos e de dispersão de poluentes.. Referências CORREA MA. 99. Análise das oscilações das correntes observadas na baía de Ilha

Grande (RJ). Dissertação de Mestrado. IOUSP. p. ENCAL S/A. 98. Campanha de medições e análise de dados oceanográficos Itaorna (Angra dos Reis RJ). Relatório Final. ELETRONUCLEAR. FRAGOSO MR. 999. Estudo numérico da circulação marinha da região das Baías de Sepetiba e Ilha Grande (RJ). Dissertação de Mestrado. IOUSP. p. IKEDA Y e STEVENSON MR. 980. Determination of circulation and short period fluctuation in Ilha Grande Bay (RJ), Brazil. Bolm Inst oceanogr, S Paulo, 9 (): 89-98 IKEDA Y e STEVENSON MR. 98. Seasonal characteristics of hydrography, turbulence and dispersion near Iha Grande (RJ), Brazil, based on R/V Prof. W. Besnard data. Bolm Inst oceanogr, S Paulo, (): -. IKEDA Y, GODOI SS e CACCIARI PL. 989. Um estudo de séries temporais de corrente na Baía de Ilha Grande, RJ. Relat int Inst oceanogr Univ S Paulo 8: - MAHIQUES MM. 98. Considerações sobre os sedimentos de superfície de fundo da Baía de Ilha Grande, Estado do Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado. IOUSP. Vols. e. MARQUES DO e GUERRA JV. Gestão ambiental da zona costeira do estado do Rio de Janeiro: lacunas de informação quanto à dinâmica sedimentar da baía de Ilha Grande-RJ. Submetido. MIRANDA LB, IKEDA Y, CASTRO-FILHO BM e PEREIRA-FILHO N. 9. Note on the occurrence of saline fronts in the Ilha Grande (RJ) region. Bolm Inst oceanogr, S Paulo : 9-. MUEHE D e VALENTINI E. 998. O litoral do estado do Rio de Janeiro: uma caracterização físico-ambiental. FEMAR, Rio de Janeiro. 0p. SILVEIRA ICA, SCHMIDT ACK, CAMPOS EJD, GODOI SS, IKEDA Y. 00. A Corrente do Brasil ao Largo do Sudeste Brasileiro. Rev Bras Ocean 8 (): - 8. 8. Agradecimentos Ao BNDO, BAMPETRO e Wellington C. Belo (CENPES-Petrobras) pelos valiosos dados utilizados neste trabalho. Tabela : Comparação entre medições realizadas m abaixo da superfície na estação DHN e a e m abaixo da superfície na estação TEBIG.

- 8' - ' - ' - ' - - 8' - ' 0000 000 0000 000 0000 8 - ' - 8' 0000-000 - ' - ' 0000 - ' 000-8' 0000 Freqüência Velocidade Média Velocidade Máxima Desvio Padrão BS (%) (cms ) (cms ) (cms ) Direção DHN TEBIG DHN TEBIG DHN TEBIG DHN TEBIG m m m m m m m m m ANGRA DOS REIS N..8.8....0 9.8..0.. PORÇÃO NE.8..8....0 CANAL.LESTE.... CENTRAL PTA. DA E.....9 PORÇÃO. 88.0..8..9.8 ILHA MARAMBAIA OESTE SE 0.0 8... 0.0. 8.0 GRANDE.. 9.9.8.8 S.0. 8.8 PARATI....0 0..... SO 9...8 0....0.. 9... O.. 0. PONTA DE. TRINDADE...0 0....8. NO...0....0.. 9.0.. 0 0 0 0 km Figura : Localização da Baía de Ilha Grande e compartimentos (Porção Oeste, Leste e Canal Central) propostos por Mahiques (98). BS=Baía de Sepetiba. Adaptado de Ilhagrande.com - ' - 0' - ' - 0' - ' 000 0000 000 0000 000 80000 8000 90000 9000 00000 ANGRA DOS REIS 8 ILHA GRANDE 000 0000 000 0000 000 80000 8000 90000 9000 00000 - ' - 0' - ' - 0' - ' - Phi 0..0..0..0..0..0..0..0. 8.0, 0,,0, km WGS 8 / UTM zone S Grossa Média Fina Muito Fina Silte Silte Silte Grosso Médio Fino Silte Argila Muito Fino Grossa Figura : Mapa textural dos sedimentos superficiais de fundo na região do Canal Central da baía de Ilha Grande. A estrela branca indica a localização aproximada das estações DHN e TEBIG referidas no texto. Fonte dos dados sedimentológicos: BAMPETRO e Mahiques (98).