Asma e eczema atópico numa criança: Tratamento eficaz com omalizumab

Documentos relacionados
ASMA EM IDADE PEDIÁTRICA

Asma: Manejo do Período Intercrise. Pérsio Roxo Júnior Divisão de Imunologia e Alergia Departamento de Puericultura e Pediatria

12 PROVA DE CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS ALERGISTA. Com relação à corticoterapia sistêmica na dermatite atópica grave, assinale a resposta CORRETA:

Doença inflamatória crónica das vias aéreas de elevada prevalência. Uma patologias crónicas mais frequentes

Omalizumab no tratamento da asma brônquica alérgica: Experiência num Serviço de Imunoalergologia

Introdução. Corticoide inalado é suficiente para a maioria das crianças com asma.

Diagnosis and treatment of asthma in childhood: a PRACTALL consensus report. Allergy Global Initiative for Asthma

Asma Diagnóstico e Tratamento

O PAPEL DO OMALIZUMAB NA DERMATITE ATÓPICA GRAVE

PEDIATRIA 1 AULAS TEÓRICAS. DOENÇAS ALÉRGICAS EM PEDIATRIA José António Pinheiro

Sílvia Silvestre 08/11/2017. Asma : abordagem e como garantir a qualidade de vida a estes pacientes

Mediadores pré-formados. Mediadores pré-formados. Condição alérgica. Número estimado de afetados (milhões) Rinite alérgica Sinusite crônica 32.

Imunologia Clínica e Esofagite Eosinofílica

A EFICÁCIA DA IMUNOTERAPIA EM DOENÇAS ALÉRGICAS RESPIRATÓRIAS

CASO CLÍNICO ASMA - PUC - PR - SPP

ASMA E RINITE: UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA PROGRAMA DE CONTROLE DA ASMA E RINITE DA BAHIA - PROAR DRA. LÍVIA FONSECA

Declaração sobre Potenciais Conflitos de Interesse

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA ASMA DE DIFÍCIL CONTROLE EM PEDIATRIA

Anexo II. Conclusões científicas e fundamentos para a alteração dos termos das Autorizações de Introdução no Mercado

RELATÓRIO PÚBLICO DE AVALIAÇÃO PRÉVIA DO MEDICAMENTO EM MEIO HOSPITALAR

ASMA GRAVE: COMO DEFINIR E MANEJAR NA PRÁTICA DIÁRIA? OBJETIVOS DO MANEJO DA ASMA. Future Risks TRATAMENTO ATUAL DA ASMA GRAVE.

PROTOCOLO MÉDICO URTICÁRIA E ANGIOEDEMA HISTAMINÉRGICO

Resultados Foram examinados 76 doentes (idades

ASMA BRÔNQUICA CONDUTA NA EMERGÊNCIA PEDIÁTRICA

CASO CLÍNICO ASMA. Identificação: MSB, 46 anos, fem, do lar, Porto Alegre

Classificação dos fenótipos na asma da criança. Cassio Ibiapina Pneumologista Pediatrico Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG,

SERIAM OS CORTICOÍDES INALATÓRIOS OS VILÕES DO CRESCIMENTO EM CRIANÇAS PORTADORAS DE ASMA? Cláudia dos Santos Martins Sarah Sella Langer

Metas do Manejo da Asma

TRATAMENTO AMBULATORIAL DA ASMA NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA Andréa da Silva Munhoz

Sessão Televoter Pneumologia Como eu trato a DPOC

Probióticos Reduzem Severidade da Dermatite Atópica Infantil

Spray nasal de azelastina: o melhor tratamento para a rinite alérgica

TUDO O QUE DEVE SABER. - sobre - ASMA

ASMA DE DIFÍCIL CONTROLE ASMA DE DIFÍCIL CONTROLE ASMA DE DIFÍCIL CONTROLE

Tratamento personalizado da asma. Objetivos do manejo da Asma AJUSTES DO TRATAMENTO 04/06/ Etapas do tratamento

Protocolo de Manejo da Asma

ENFERMAGEM DOENÇAS CRONICAS NÃO TRANMISSIVEIS. Doenças Respiratórias Parte 2. Profª. Tatiane da Silva Campos

PREFÁCIO... 3 RECOMENDAÇÕES... 4 DEFINIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO... 5 FACTORES DESENCADEANTES DA RINITE ALÉRGICA... 6 MECANISMOS DA RINITE ALÉRGICA...

ARTIGOS COMENTADOS / REVIEW ARTICLES. Coordenação: José Pinto Mendes, Emília Faria

Modificadores dos leucotrienos papel no tratamento de manutenção da asma em crianças

Departamento De Pediatria

Anafilaxia. Pérsio Roxo Júnior. Divisão de Imunologia e Alergia Departamento de Puericultura e Pediatria

Paradoxos no tratamento da asma

Para além da bula: Prescrição off-label na patologia alergológica em idade pré-escolar

Consenso Internacional em Asma Pediátrica (ICON)

do Acidente Vascular Cerebral

Avaliação Funcional na Asma Pediátrica. Dr. Diego Brandenburg Pneumologista Pediátrico Hospital de Clínicas de Porto Alegre

Respostas. Utilize o verso se necessário

Unifacisa Questões de Imunologia Clínica Profª Socorro Viana º Módulo

HOSPITALIZAÇÕES E MORTALIDADE POR ASMA: É POSSÍVEL EVITAR? DR. GUILHERME FREIRE GARCIA ABRA MAIO DE DIA MUNDIAL DA ASMA

Consenso de asma sob a forma de um mapa conceitual

Spray nasal de azelastina - Um tratamento à medida para a rinite alérgica e não alérgica

EFICÁCIA DO TRATAMENTO COM OMALIZUMAB NA URTICÁRIA CRÓNICA ESPONTÂNEA RESISTENTE À TERAPÊUTICA HABITUAL COMBINADA

RINITE ALÉRGICA E CONTROLE DA ASMA GRAVE: UM ESTUDO. Objetivo: O objetivo do presente estudo foi avaliar o papel da rinite alérgica em

Corticoides por via inalatória: há diferença entre eles? Cris&na G. Alvim Profa. Associada Dpto Pediatria UFMG Grupo Pneumologia Pediátrica HC/UFMG

PROTOCOLO DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DE ASMA DA SOCIEDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Omalizumab na Prática Clínica Estudo de Casos

VIA SUBCUTÂNEA USO ADULTO E PEDIÁTRICO ACIMA DE 6 ANOS (ASMA ALÉRGICA) USO ADULTO E PEDIÁTRICO ACIMA DE 12 ANOS (URTICÁRIA CRÔNICA ESPONTÂNEA)

IMUNOGLOBULINA G ENDOVENOSA NA DERMATITE ATÓPICA UM CASO CLÍNICO

Fármacos que actuam sobre o aparelho respiratório

ENFERMAGEM DOENÇAS CRONICAS NÃO TRANMISSIVEIS. Doenças Respiratórias Parte 3. Profª. Tatiane da Silva Campos

RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO DO PEDIDO DE COMPARTICIPAÇÃO DE MEDICAMENTO PARA USO HUMANO

Página 1 de 5 GABARITO - PRÁTICA QUESTÃO 1 ITEM A

Lactobacillus plantarum Mais um Aliado na Redução dos Sintomas na Dermatite Atópica

Imunoterapia com extratos padronizados Avanços e tendências

HIPERSENSIBILIDADE. Acadêmicos: Emanuelle de Moura Santos Érica Silva de Oliveira Mércio Rocha

Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed. Omalizumabe (Xolair ) no tratamento da asma grave

Hiperresponsividade Brônquica X Asma. Alexsandro Zavadniak Londrina, 2018

Anexo II. Conclusões científicas

Confira o ativo inovador que pode ser utilizado como alternativa natural aos antialérgicos tradicionais 1.

IMPACTO DA RINITE SOBRE CONTROLE CLÍNICO E GRAVIDADE DA ASMA EM UM PROGRAMA DE REFERÊNCIA DO ESTADO DO MARANHÃO

04/06/2012. Ache Eurofarma Genetech Boehringer AstraZeneca GSK Novartis Chiesi MSD TIOTRÓPIO NA ASMA UMA NOVA OPÇÃO?

Anotadas do 4º Ano 2007/08 Data: 26 Novembro Tema da Aula Teórica: Asma brônquica Autores: Vanessa Rodrigues Equipa Revisora: Cátia Almeida

Direcção-Geral da Saúde

Fármacos com Ação na Rinite Alérgicas, Asma e Tosse

Provas. Diagnóstico. em Alergia

Assistência Farmacêutica em Asma

Nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 2º do Decreto Regulamentar nº 14/2012, de 26 de janeiro, por

ASMA. Curso de Operacionalização de Unidades Sentinelas Caxias do Sul /RS 09 a 11/

ASMA. + Que seguem por reações tardias, constituindo a resposta inflamatória crônica característica da perenidade da doença.

25 de SETEMBRO de 2015 AUDITÓRIO II EMESCAM - VITÓRIA/ES

Sessão Televoter Pneumologia Como eu trato a DPOC

E-BOOK DERMATITE ATÓPICA (DA)

Saúde e Desenvolvimento Humano

Propriedades farmacológicas do furoato de fluticasona no tratamento da rinite alérgica

Consolidar a atualização em Imunoalergologia na zona Centro. 2º Fórum de Imunoalergologia do Centro. Coimbra Hotel Dona Inês 13 de Novembro de 2015

Consolidar a atualização em Imunoalergologia na zona Centro. 2º Fórum de Imunoalergologia do Centro. Coimbra Hotel Dona Inês 13 de Novembro de 2015

Aspectos práticos do seguimento do doente com asma

ASMA. FACIMED Curso de Medicina. Disciplina Medicina de Família e Comunidade. Prof. Ms. Alex Miranda Rodrigues

ASSOCIAÇÃO ENTRE ASMA E RINITE ALÉRGICA EM ESTUDANTES DE MEDICINA DO NORDESTE

N.o336/CA/2006. o Conselho de Administração do INFARMED- Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento, considerando que:

REAÇÕES DE HIPERSENSIBILIDADE. Prof. Dr. Helio José Montassier

SOCIEDADE informações sobre recomendações de incorporação de medicamentos e outras tecnologias no SUS RELATÓRIO PARA A

José R. Jardim Escola Paulista de Medcina

Omalizumabe para o tratamento da asma alérgica grave

Dermatologia e Alergologia Veterinárias Évora, 30 de Abril a 2 de Maio de 2010 Luís Martins Departamento de Medicina Veterinária Instituto de

Avaliação da evolução e controlo da asma em grávidas num serviço de Imunoalergologia

APRESENTAÇÃO DA UNIDADE CASO CLÍNICO

DPOC Doença pulmonar obstrutiva crônica Resumo de diretriz NHG M26 (segunda revisão, julho 2007)

Transcrição:

CASO CLÍNICO Asma e eczema atópico numa criança: Tratamento eficaz com omalizumab Asthma and atopic eczema in a child: Successful treatment with omalizumab Data de recepção / Received in: 12/07/2012 Data de aceitação / Accepted for publication in: 17/07/2012 Rev Port Imunoalergologia 2013; 21 (1): 49-53 José Geraldo Dias, Ana Mendes, Elisa Pedro, Manuel Pereira Barbosa Serviço de Imunoalergologia, Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte RESUMO Introdução: O omalizumab está aprovado como terapêutica adicional na asma alérgica grave a partir dos 6 anos. Caso clínico: Menino de 10 anos com asma alérgica e eczema atópico, que se agravaram aos 8 anos e se mantiveram não controlados (ACT-11; SCORAD -70,9), apesar de terapêutica com corticosteróide inalado (CI), β 2 agonista de longa acção, antagonista dos receptores dos leucotrienos, corticosteróide e imunomodulador tópicos. Iniciou corticosteróides orais (CO), verificando -se melhoria clínica, que regredia com a redução dos CO, pelo que iniciou omalizumab 150 mg/mês. Suspendeu os CO após 2 meses, está sob omalizumab há 27 meses e está desde as 16 semanas com asma controlada (ACT-24), com redução da dose de CI, do uso da medicação de alívio e da frequência e gravidade das exacerbações, e com melhoria do eczema (SCORAD-12,3). Discussão: O omalizumab, como terapêutica adicional, foi eficaz numa criança com asma alérgica e eczema graves, permitindo a suspensão dos CO e o controlo da asma e do eczema. Palavras -chave: Asma, criança, eczema atópico, omalizumab. 49

José Geraldo Dias, Ana Mendes, Elisa Pedro, Manuel Pereira Barbosa ABSTRACT Background: Omalizumab is approved as add -on therapy in severe allergic asthma above 5 years old. Case report: Ten- -year-old boy with allergic asthma and atopic eczema, which worsened at 8 years old and remained uncontrolled (ACT-11; SCORAD -70,9), despite treatment with inhaled corticosteroids (IC), long acting β 2 agonist, leukotriene receptor antagonist and topical corticosteroid and immunomodulator. Started oral corticosteroids (OC), with clinical improvement, which disappeared when OC were reduced. For this reason, he started omalizumab 150 mg/month. OC were suspended after two months, is under treatment with omalizumab for 27 months and since 16 weeks of treatment has controlled asthma (ACT-24), with reduction of the dose of IC, rescue medication use and frequency and severity of exacerbations, and improvement of atopic eczema (SCORAD-12,3). Discussion: Omalizumab, as add -on therapy, was effective in a child with severe allergic asthma and atopic dermatitis, allowing OC suspension and control of asthma and atopic eczema. Keywords: Asthma, atopic eczema, child, omalizumab. INTRODUÇÃO A asma brônquica é uma das doenças crónicas mais comuns em idade pediátrica. Frequentemente as crianças têm asma não controlada, muitas vezes como resultado da submedicação, verifi cando -se, no entanto, a existência de crianças com asma não controlada apesar de cumprirem o tratamento recomendado 1. As exacerbações de asma estão associadas a deterioração da função pulmonar, a admissões hospitalares e ao absentismo escolar. São frequentemente tratadas com corticosteróides orais (CO), que podem associar -se a efeitos adversos graves 2. De acordo com as guidelines do Global Initiative for Asthma (GINA) 2011 3, o omalizumab está indicado para doentes com asma alérgica grave a partir dos 6 anos, como alternativa aos CO e como terapêutica adicional em doentes tratados com alta dose de corticosteróides inalados (CI) e β 2 agonistas de longa acção (LABA). O omalizumab é um anticorpo monoclonal IgG humanizado, que ao ligar -se à IgE livre, impede a sua ligação aos receptores específicos presentes nas membranas celulares de vários tipos de células (mastócitos, basófilos, eosinófilos, linfócitos B), reduzindo a libertação de mediadores inflamatórios como leucotrienos, citocinas e histamina 4. Tem um bom perfil de tolerância nas crianças, com um risco de efeitos adversos semelhante ao dos grupos placebo 1,2,5. Neste artigo reportamos o caso de uma criança com asma brônquica e eczema atópico, não controlados apesar do cumprimento da terapêutica recomendada, tratado com omalizumab. CASO CLÍNICO Menino de 10 anos, com eczema atópico e asma brônquica ligeira desde o primeiro ano de vida e rinite alérgica persistente moderada/grave desde os 4 anos, medicado diariamente com cetirizina e montelucaste, e com salbutamol inalado e mometasona creme como medicação de alívio. Aos 7 anos iniciou imunoterapia específica (IE) por via sublingual para Dermatophagoides pteronyssinus (Dpt). Clinicamente estável até aos 8 anos, altura em que é referido agravamento da asma (sintomas diurnos e despertares nocturnos frequentes, má tolerância ao esforço físico, com necessidade de salbutamol cerca de 5 dias/se- 50

ASMA E ECZEMA ATÓPICO NUMA CRIANÇA: TRATAMENTO EFICAZ COM OMALIZUMAB / CASO CLÍNICO mana), da rinite e do eczema atópico (lesões eritemato- -descamativas generalizadas, pruriginosas, com interferência no quotidiano e no sono). Tinha testes cutâneos por picada positivos para Dpt e Dermatophagoides farinae (Df). Analiticamente a destacar: IgE total de 693 ku/l, IgE específica sérica para Dpt de 98,3 ku/l e para Df de 44,2 ku/l. A radiografia do tórax era normal e o exame funcional respiratório revelava obstrução brônquica (volume expiratório máximo por segundo (FEV 1 ) 44,2% do previsto) com prova de broncodilatação positiva (24% de aumento do FEV 1 ). Nesta altura, tendo em consideração o agravamento do quadro, suspendeu IE e foi adicionada terapêutica com fluticasona inalada, tendo -se aumentado progressivamente a dose de CI e adicionado posteriormente um LABA, tendo em conta que não se verificava melhoria clínica. Estava medicado com salmeterol/fluticasona inalados 100/500 μg/dia, montelucaste oral 5 mg/dia, ebastina oral 10 mg/dia, fluticasona intranasal 100 μg/dia, mometasona e pimecrolimus tópicos diariamente. O valor do Asthma Control Test (ACT) era 11 e do Scoring Atopic Dermatitis (SCORAD) era 70,9. Por não se ter verificado melhoria dos quadros respiratório e cutâneo, foi adicionada prednisolona oral 0,5 mg/kg/dia. Nesta altura, assistiu- -se a uma melhoria clínica, tanto do quadro respiratório como cutâneo, que regredia quando se tentava reduzir a dose de CO. Dada a instabilidade clínica, sintomas diurnos e despertares nocturnos frequentes que só resolviam quando o doente estava sob CO (prednisolona 0,5 mg/kg/dia), foi proposta terapêutica com omalizumab por via subcutânea 150 mg de 4/4 semanas (com base no peso do doente e no valor de IgE total). Após dois meses de terapêutica foi possível suspender os CO. Às 16 semanas de tratamento, estava medicado com metade da dose de CI e reportava um melhor controlo da asma (ACT-24). Com base no ACT, verificou -se nessa altura, a diminuição da necessidade de medicação de alívio rápido e a diminuição da frequência das exacerbações. Estas passaram a ser ligeiras, sem necessidade de CO. O valor do FEV 1 era superior a 80% do previsto. Relativamente ao quadro cutâneo, às 16 semanas de tratamento, era visível uma melhoria significativa (SCORAD-56,8), encontrando -se medicado com emolientes diariamente e mometasona tópica quando necessário. Com a asma e o eczema controlados, sob tratamento com omalizumab há 23 meses, foi novamente iniciada IE para ácaros (Dpt/Df) por via subcutânea, não se tendo verificado efeitos adversos, agravamento da asma ou do eczema. Actualmente está sob omalizumab há 27 meses, sem qualquer reacção adversa relacionada com a sua administração. Encontra -se a fazer terapêutica com salmeterol/ fluticasona 25/125 μg/dia, montelucaste 5 mg/dia, ebastina 5 mg/dia, fluticasona intranasal 100 μg/dia. Verifica -se controlo da asma (ACT-24), com boa tolerância ao esforço físico e redução da dose diária de CI, da necessidade de medicação de alívio e do número das exacerbações, que são ligeiras, no contexto de infecções respiratórias. De realçar que não voltou a necessitar de CO desde os 2 meses de tratamento com omalizumab. Paralelamente, refere também controlo das queixas nasais, que são intermitentes e sem interferência nas actividades diárias ou no sono. No que diz respeito ao eczema, é visível uma melhoria franca (SCORAD-12,3). Refere apenas prurido ligeiro, sem interferência nas actividades diárias ou no sono, com lesões cutâneas localizadas e controladas apenas com a aplicação diária de emolientes. Nega necessidade de pimecrolimus ou mometasona tópicos, bem como CO. DISCUSSÃO O omalizumab está indicado em doentes com asma alérgica grave a partir dos 6 anos, como alternativa aos CO e como terapêutica adicional em doentes tratados com alta dose de CI e LABA (GINA 2011) 3. Para além da sua eficácia em adultos, vários estudos controlados têm demonstrado a utilidade em crianças a partir dos 6 anos através da redução da gravidade e frequência das exacerbações 1,2,5, do uso de corticoterapia (inalada e/ou oral), de medicação de alívio e do tempo de absentismo escolar 5. 51

José Geraldo Dias, Ana Mendes, Elisa Pedro, Manuel Pereira Barbosa Relativamente aos doentes com eczema atópico, estima -se que apenas um terço será atópico 6. Contudo, apesar de não estar ainda aprovada a utilização de omalizumab no tratamento de doentes apenas com eczema, tendo em conta a importância da IgE na atopia e a eficácia da terapêutica anti -IgE na asma alérgica, têm sido realizados estudos para analisar o efeito do omalizumab no eczema atópico grave. Um estudo prospectivo com 21 doentes (14 a 64 anos) com eczema e asma alérgica grave, evidenciou melhoria das lesões cutâneas em todos os doentes, independentemente dos níveis de IgE sérica total 6. Num estudo retrospectivo, 5/7 doentes tratados com omalizumab para a asma, melhoraram também do eczema ao fim de 3 meses de terapêutica 6. Outro estudo retrospectivo, demonstrou melhoria do eczema em 3 crianças (10 a 13 anos) tratadas com omalizumab após 2 a 12 semanas 6. Numa série recentemente publicada com 11 doentes com eczema grave (12 a 52 anos) tratados com omalizumab, verificou -se melhoria progressiva do SCORAD, diminuição dos sintomas, melhoria da qualidade de vida e diminuição do absentismo escolar e laboral em todos os doentes 7. Por outro lado, numa outra série, nenhum dos 3 doentes com eczema atópico grave (34 a 48 anos) tratados com omalizumab (450 mg de 2/2 semanas) melhorou após 4 meses de tratamento 6. O doente apresentado tinha asma alérgica grave, rinite alérgica moderada/grave e eczema atópico grave, não controlados apesar de medicação com CI em dose alta, LABA, antagonista dos receptores dos leucotrienos, anti- -histamínico, corticóide nasal, corticóide e imunomodulador tópicos diariamente. Tinha um valor no ACT de 11 e no SCORAD de 70,9. O controlo da sintomatologia respiratória e cutânea apenas era atingido quando estava medicado com CO (prednisolona 0,5 mg/kg/dia), sendo que se verificava agravamento da asma e do eczema quando se tentava suspender ou reduzir a dose de CO. Após dois meses de tratamento com omalizumab, foi possível suspender os CO, tendo em conta a melhoria dos quadros respiratório e cutâneo. A avaliação realizada às 16 semanas de tratamento evidenciou resultados favoráveis no que diz respeito à sintomatologia respiratória e cutânea, pelo que se manteve a terapêutica com omalizumab. O omalizumab também tem sido utilizado em doentes com asma não controlada apesar do uso de CI, para diminuir os efeitos adversos associados à IE, possibilitando que uma maior proporção de doentes atinjam a dose de manutenção pretendida 8. Neste doente, sob omalizumab, foi possível iniciar e manter a IE, que no passado coincidiu com o agravamento da asma, obrigando à sua suspensão. Actualmente, sob omalizumab há 27 meses, a fazer IE há 4 meses, tem a rinite e a asma controladas (ACT-24), está medicado com 1/4 da dose de CI que fazia antes de iniciar o omalizumab, não voltou a ter necessidade de CO, tem menor necessidade de medicação de alívio e menos exacerbações, que são ligeiras e no contexto de infecções respiratórias. No que diz respeito ao eczema, o SCORAD passou de 70,9 para 12,3; com clínica ligeira, controlada apenas com a aplicação diária de emolientes, sem necessidade de CO ou terapêutica tópica com pimecrolimus ou mometasona. O doente adaptou -se bem à obrigatoriedade de recorrer mensalmente ao hospital para administração subcutânea de omalizumab, tendo as administrações decorrido sem intercorrências, sendo bem toleradas pelo doente, não se tendo verificado efeitos adversos relacionados com a sua administração. Com o decurso da IE, é esperada uma evolução favorável da doença alérgica, que poderá permitir num futuro próximo a suspensão do omalizumab. CONCLUSÃO Este caso ilustra a eficácia do omalizumab como terapêutica adicional numa criança com asma alérgica e eczema atópico graves, permitindo não só a suspensão dos CO, como também o controlo da asma e do eczema. Financiamento: Nenhum. Declaração de conflitos de interesse: Nenhum. 52

ASMA E ECZEMA ATÓPICO NUMA CRIANÇA: TRATAMENTO EFICAZ COM OMALIZUMAB / CASO CLÍNICO Contacto: José Geraldo Dias Serviço de Imunoalergologia Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte Av. Prof. Egas Moniz 1649-035 Lisboa E -mail: ze.geraldodias@gmail.com REFERÊNCIAS 1. Lanier B, Bridges T, Kulus M, Fowler Taylor A, Berhane I, Fernandez Vidaurre C. Omalizumab for the treatment of exacerbations in children with inadequately controlled allergic (IgE-mediated) asthma. J Allergy Clin Immunol 2009;124:1210-6. 2. Kulus M, Hébert J, Garcia E, Fowler Taylor A, Fernandez Vidaurre C, Blogg M. Omalizumab in children with inadequately controlled severe allergic (IgE-mediated) asthma. Curr Med Res Opin 2010;26:1285-93. 3. Global Initiative for Asthma. Global strategy for asthma management and prevention [Updated 2011; cited 2012 June 27]. Available from: http://www.ginasthma.org/. 4. Plosker G, Keam S. Omalizumab A review of its use in the treatment of allergic asthma. Biodrugs 2008;22:189-204. 5. Milgrom H, Fowler -Taylor A, Fernandez Vidaurre C, Jayawardene S. Safety and tolerability of omalizumab in children with allergic (IgE- -mediated) asthma. Curr Med Res Opin 2011;27:163-9. 6. Walling H, Swick B. Update on the management of chronic eczema: new approaches and emerging treatment options. Clin Cosmet Investig Dermatol 2010;3:99-117. 7. Ramírez del Pozo M, Contreras Contreras E, López Tiro J, Gómez Vera J. Omalizumab (an anti -IgE antibody) in the treatment of severe atopic eczema. J Investig Allergol Clin Immunol 2011;21:410-21. 8. Massanari M, Nelson H, Casale T, Busse W, Kianifard F, Zeldin R, et al. Effect of pretreatment with omalizumab on the tolerability of specific immunotherapy in allergic asthma. J Allergy Clin Immunol 2010;125:383-9. 53