1. - Habermas defende que a noção de objetividade presente em Lukács deriva de um amálgama. Habermas, Teoria da Ação Comunicativa, v. I, cap. 4.

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Habermas, Teoria da Ação Comunicativa, v. I, cap. 4.1 Referência: HABERMAS, Jürgen. De Lukács a Adorno: racionalizacion como coisificacion. In: HABERMAS, Jürgen. Teoria de la Acción Comunicativa. Tomo 1. Racionalidad de la acción y Racionalización Social. Trad.: Manuel Jimenez Redondo. Ed. TAURUS. Madrid, Objetivo: Apresentar os passos principais da crítica que Habermas desenvolve contra Lukács ao analisar o modo como esse último se apropria da tese da racionalização desenvolvida por Weber. Preâmbulo: Habermas acredita que os pressupostos para uma crítica da tipologia da ação, desenvolvida por Max weber, encontram-se implícitos nos próprios textos do sociólogo alemão. Diante disso, Habermas propõe uma mudança no paradigma da ação, abandonando os pressuposto teleológicos e adotando a perspectiva da ação comunicativa. Diga-se de passagem, a teoria da ação comunicativa não é um subsistema do modelo da ação racional com respeito a fins, mas sim, uma tipologia com o intento de explicitar, a partir do próprio desenvolvimento histórico, o nexo ontogenético da sociabilidade, qual seja., o intercambio interpessoal por via da linguagem. Problema: Segundo Habermas, Lukács e a tradição que a ele se segue, o marxismo ocidental, se apropriou da tipologia da ação com respeito a fins para explicitar o problema da racionalização da sociabilidade capitalista, traduzida em uma coisificação das relações sociais objetivas e ideológicas. Sendo assim, identificar como Habermas entende essa apropriação do princípio da racionalização weberiana por Lukács, bem como os limites dessa apropriação, é o que se propõe a expor essa apresentação. 1. - Habermas defende que a noção de objetividade presente em Lukács deriva de um amálgama que unifica a noção de objetividade sócio histórica, cunhada por Dilthey, e as determinações dialéticas do conceito de totalidade desenvolvido por Hegel. Ao introduzir o debate acerca da apropriação que Lukács faz da tese weberiana da racionalização, Habermas delimita o seu ponto de partida da seguinte maneira:na estrutura da relação mercantil pode-se descobrir o protótipo de todas as formas de objetividade e as correspondentes formas de subjetividade, que se formam na sociedade burguesa. Para Habermas, a noção de objetividade presente neste texto é, ao mesmo tempo, uma forma de existência ou de pensamento que surgiu historicamente e caracteriza a totalidade do nível evolutivo da sociedade global. E essas formas de objetividades medeiam o enfrentamento do homem com o 1

seu entorno conformando a objetividade a sua vida interior e exterior ( p 452) 1 Sendo assim, as formas de objetividade são mediações através das quais os seres humanos determinam a realidade ambiente e a sua própria subjetividade, exteriorizando-as em uma forma de racionalidade que se desenvolve inteiramente independente da vontade dos indivíduos. Na sociedade burguesa essa forma de racionalidade assume o caráter da mercadoria, pois é determinada primariamente pela relação de mercantil, e configura-se como uma relação estranhada. Na sequência, Habermas busca equacionar o problema da objetividade aos termos de sua teoria da ação comunicativa: a forma de objetividade na sociedade capitalista pré-julga [submete] as relações com o mundo a maneira como o sujeitos dotados de linguagem e de ação se referem a algo no mundo objetivo, no mundo social e no mundo subjetivo próprio de cada um (p. 453) Essa forma de submissão do ser humano às formas de objetividades específicas do capital é formulado por Lukács através do fenômeno da reificação: uma forma de racionalização caracterizada pela conformação das relações sociais e as vivências interpessoais a coisas, isto é, a objetos que podemos perceber e manipular. Compreendida como forma objetiva da racionalização capitalista, a reificação afeta toda a configuração social e não se detém apenas a um fenômeno da consciência. A reficação não se trata apenas de uma forma reificada de pensamento, mas de um modo de exteriorização da vida, apresentando intrincados traços categoriais que coordenam e articulam todos os modos da ação humana, determinando as manifestações vitais do metabolismo social. Em termos habermasianos, é o mundo da vida, ele mesmo, que se coisifica ( p. 453). As causas dessa reificação do mundo da vida, para Lukács, repousa sobre a trabalho assalariado. Nesse perspectiva, a relação de troca é o protótipo de toda reificação, posto que se configura como uma conversão dos atributos da individualidade humana, em uma coisa que pode ser manipulada e trocada, ou seja, em uma mercadoria. Isso só é possível porque a mercadoria assume a característica de uma objetividade capaz de influir em todas as formas de racionalidade e intercambio interpessoal, com as características descritas acima. 2. Lukács entende a reificação e a racionalização como duas faces de um mesmo problema e, com isso, dá um passo para além da teoria weberiana, pois será capaz de explicitar o nexo causal ( o fator econômico) que se esconde por traz das relações que weber apenas indica através de sua tipologia da ação. Ao associar a reificação e a racionalização a um mesmo processo social, 1 Las formas de objetividad mediatizam el enfrentamento do homem com seu entorno, que determina la objetividade lo mismo de su vida interior que de sua vida externa problemas com a tradução. 2

Lukács conseguiu desenvolver dois argumentos que se apoiam na análise de Weber e que, no entanto, se dirigem contra suas consequências. Com o conceito de racionalidade formal Weber consegue apreender as analogias estruturais que a ação econômica racional com respeito a fins tem em outros âmbitos da vida, sobretudo a burocracia estatal. Porém, segundo Lukács, Weber não chega a entender o nexo causal que se oculta pro trás dessas analogias, mas afasta os fenômenos da reificação da base econômica de sua existência', eternizando-os 'como um tipo intemporal de possibilidades da relação humana'; porém sem mostrar que os processos de racionalização social tem efeito estruturador para a sociedade capitalista em seu conjunto (p. 454). Além disso, Lukács também utiliza o conceito de racionalização em um segundo sentido. Ele associa este conceito ao fundamento da coisa-em-si da teoria do conhecimento de Kant, sendo assim, segundo Habermas, a racionalidade é, para Lukács, a ponte entre a forma mercadoria e a forma do conhecimento intelectivo analisado por Kant (p. 454). A isso, Lukács ainda agrega a noção de uma totalidade da vida organizada racionalmente, desenvolvida por Hegel, e assim consegue atribuir um sentido a mais à ideia weberiana de que com a dissolução das esferas culturais de valor, atentas cada uma a sua própria lógica, resulta-se definitivamente destruída a unidade da razão que a metafísica havia suposto, quer dizer, a afirmação de que essa unidade não pode ser reconstruída nem sequer dialeticamente (p. 454). Precisamos reter aqui o movimento de conformação do desenvolvimento sócio -histórico que a tipologia da ação Weberiana pretende explicitar. O desenvolvimento da cultura se dá por via de uma linha evolutiva que tende abandonar os tipos de ação baseados na racionalidade com respeito a valores, na tradição, para um tipo baseado na ação racional com respeito a fins. Na apropriação efetivada por Lukács dessa tipologia, tem destaque o fato de que a racionalização influi nos processos de trabalho, caracterizado como um modo de produção cuja a escolha dos meios visa sempre a produção da maior quantidade de mais valia possível. Sendo assim, o modo de produção desenvolveu-se historicamente seguindo uma linha evolutiva que o leva de caracteres normativos moldados pela tradição, para uma ação empresarial com base em meios cada vez mais eficientes do ponto de vista da extração de mais valia. Esses passos, caracterizam a formulação definitiva do argumento desenvolvido por Lukács, uma constelação de problemas cujo centro é o fetichismo da mercadoria, analisado por Marx, em torno do qual gravitam problemáticas de ordem epistemológicas e sociais. A principal preocupação de Lukács é descrever a passagem da extração de mais valia, para uma movimente de racionalização do trabalho em direção à racionalização/reificação da totalidade da vida social. Diante disso, Habermas entende que O peculiar apontamento de Lukács consiste em ver tão conjuntamente a Weber e Marx, que pode considerar a separação da esfera do trabalho a 3

social com respeito aos contextos do mundo da vida simultaneamente sob ambos aspectos, sob o aspecto de coisificação e sob o aspecto de racionalização. Ao orientar agora sua conduta por valores de troca, os agentes têm seu mundo da vida contraído e reduzido a um mundo objetivo: adotando frente a si mesmos e frente aos demais a atitude objetivante própria da ação orientada ao êxito, convertendo-se deste modo a si mesmo em objeto de manejo pelos demais atores (p. 457) O conjunto das transformações sociais determinantes do processo de reificação da vida social encontra seu termo mais evoluído na sociedade capitalista, onde as formas de organização da produção e do intercambio social não estão mais associadas aos valores comunitários que antes regiam as normativas do ser social; no modo de produção capitalista a ação empresarial persegue fins que são arranjados segundo uma institucionalização burocrática, para Lukács, o princípio que assim se impõe é o princípio do Cálculo, ' a racionalização adaptada ao cálculo'. Diga-se de passagem, esse 'princípio do cálculo' está associado às investimentos tecnológicos com o objetivo de possibilitar a ação capitalista perseguir a melhor forma de extração de mais valia, o fim último da racionalização capitalista, segundo Lukács. 3. Segundo Habermas, Lukács entende o caráter global da racionalização social como uma confirmação da hipótese de que a forma mercadoria se impõe como forma de objetividade dominante na sociedade capitalista. A mercadoria é entendida por Lukács como protoforma de todas as relações sociais engendradas no interior da sociedade capitalista. Com o capitalismo foi possível conceber uma forma de sociedade onde não apenas a economia chegou a ser coordenada por uma estrutura unitária, mas também produziu formas de consciência que se adequam a uma totalidade unitária. A medida em que a forma mercadoria se converte em forma de objetividade e rege as relações dos indivíduos entre si e o enfrentamento dos homens com o mundo externo e com sua própria natureza interna subjetiva, o mundo da vida tem que coisificar-se e o indivíduo, como prevê a teoria dos sistemas, torna-se degradado ao contorno de uma sociedade que se lhe torna externa, que se converteu em sistema opaco, abstraído e autonomizado (p 459). 4. Lukács demonstrará, em termos filosóficos, aquilo que Marx buscou descrever nos termos da economia política, por meio de uma teoria das crises. Ou seja, uma teoria da derrocada do capital será desenvolvida por Lukács, através de teoria da superação das barreiras imanentes a racionalização capitalista. Partindo da crítica efetivada por Hegel contra a teoria do conhecimento de Kant, Lukács desenvolveu uma teoria da racionalidade formal que, por sua vez, teria se desenvolvido seguindo a esteira do cientificismo contemporâneo a Kant cuja a expressão mais acabada encontra-se na física 4

de Newton. A teoria kantiana do conhecimento despedaça sem misericórdia as ilusões metafísicas do passado enterra as pretensões dogmáticas da razão objetiva, porém somente o faz, pensa Lukács, para justificar o cientificismo, ou seja, a suposição novamente dogmática de que 'a forma de conhecimento formalista racional é 'para nós' a única forma possível de apreender a realidade' (p. 460). Segundo Lukács, Kant não faz nada mais que representar as formas reificadas de consciência em sua teoria do conhecimento. Ele reflete a reificação da vida em forma de uma reificação do pensamento. Com essa crítica, Lukács estaria seguindo a Schiller e Hegel em suas tentativas de conceber uma reconciliação do homem socialmente fragmentado com sua essência. Habermas, ressalta, contudo, que Lukács está longe de postular uma forma de objetividade que restaure as visões do pensamento cosmológico de tipo religioso-metafísico. Até mesmo sua relação com a dialética hegeliana foge a isso, pois aparece mediada pela crítica marxiana a Hegel. Para Habermas, Lukács considera que a filosofia clássica, desde sempre, buscou superar as antinomias da sociedade burguesa. Entretanto, não fez nada além de uma descrição a priori desta mesma sociedade. Isso se deve ao fato de o pensamento clássico ter se detido somente sobre as determinações intelectuais de tipo especulativo formal, dissolvendo na lógica especulativa problemáticas que possuem uma ancoragem ontológica. A solução postulada por Lukács é, pois, a superação de todas as antinomias do pensamento burguês a partir de uma método científico filosófico que começasse por superar a antinomia teoria e prática, deixada ao longo do desenvolvimento histórico do pensamento burguês. Não obstante os méritos atingidos, é exatamente nesse ponto onde repousa as falhas do pensamento Lukácsiano. 5. Ao seguir Marx, em sua explicitação da relação entre teoria e prática, Lukács teria cometido segundo Habermas, o erro cabal de sua teoria. O erro fundamental de Marx reside no fato de ele buscar uma perspectiva teórico-prática cuja a determinação última é a realização da filosofia (teoria) na prática. A visão habermasiana considera que Marx adota um conceito mutilado de práxis que não dá conta de explicitar a substancialidade da própria práxis, isto é, Marx não consegue desvelar as determinações da ação comunicativa. Em outros termos, o equívoco de Marx e de Lukács reside no fato de eles não serem capazes de apreender o verdadeiro nexo sociabilizador do ser humano, que Habermas concebe como caracterizado pelas determinações de uma racionalidade comunicativa. Por permanecer no âmbito de uma ação teleológica, Lukács se mantém na linha do pensamento especulativo, sem desenvolver o nexo objetivo da sociabilização, apesar de descrever com maestria as consequências da racionalização aprofundando-a em um sentido que Weber não a concebe. 5