ANÁLISE MACRO E MICROSCÓPICA DAS LESÕES EM CAPRINOS SOROPOSITIVOS PARA O VÍRUS DA ARTRITE-ENCEFALITE CAPRINA SEM A PRESENÇA DE SINAIS CLÍNICOS RESUMO

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Ciência Animal, 11(2):113-118, 2001 ANÁLISE MACRO E MICROSCÓPICA DAS LESÕES EM CAPRINOS SOROPOSITIVOS PARA O VÍRUS DA ARTRITE-ENCEFALITE CAPRINA SEM A PRESENÇA DE SINAIS CLÍNICOS (Macro and microscopic examination of lesions in soropositive goats for the caprine arthritis encephalitis virus without clinical signs ) Ana Paula Ribeiro RODRIGUES 1, Marília Taumaturgo PINTO 2, Maria Fátima da Silva TEIXEIRA 1, Ana Célia Mendes MELO 1 & Vicente José de Figueirêdo FREITAS 1 1 Faculdade de Veterinária/Universidade Estadual do Ceará, 2 Clínica Zoovet RESUMO Este trabalho teve como objetivo verificar as alterações histopatológicas em animais soropositivos para o vírus da Artrite Encefalite Caprina (CAE), sem a presença de sinais clínicos da doença. Foram utilizados 16 animais, 4 machos e 12 fêmeas, adultos, com idade entre três e seis anos e naturalmente infectados com o vírus da CAE. Após o sacrifício, procedeu-se a necropsia para a realização do exame macroscópico dos órgãos e líquido sinovial. Em seguida, amostras de membrana sinovial, pulmão, cérebro e glândula mamária, foram coletadas e fixadas em solução de formol a 10% por 24 h para a realização do exame histopatológico. O exame macroscópico demonstrou que 44%, 63%, 69% e 92% dos animais mostraram pulmão, articulação carpo-metacarpiana, cérrebro, sistema nervoso e glândula mamária normais, respectivamente. Algumas alterações microscópicas foram observadas nos órgãos estudados. O pulmão foi marcado por uma pneumonia intersticial crônica caracterizada por hiperplasia de tecido linfóide, constituído principalmente por linfócitos, eosinófilos e um menor número de macrófagos. A membrana sinovial foi caracterizada por um aumento na sua espessura, hiperplasia de células sinoviais, discreta infiltração de linfócitos e aumento das vilosidades. No cérebro, a alteração mais freqüentemente observada foi uma discreta cromatólise com satelitose nas substâncias branca e cinzenta. E finalmente no que concerne à glândula mamária, verificou-se que aproximadamente 80% dos animais apresentaram tecido mamário com áreas de proliferação de células mononucleares, linfócitos e plasmócitos, no tecido conjuntivo intra e interlobular. Concluindo, os resultados do presente estudo confirmam que animais soropositivos para o vírus da CAE, embora clinicamente sadios, podem apresentar algum tipo de lesão macro e/ou microscópica em órgãos-alvo como o pulmão, o sistema nervoso central, membrana sinovial das articulações carpo-metacarpiana e a glândula mamária. PALAVRAS-CHAVE: artrite encefalite caprina, retrovírus, alterações histopatológicas, caprino. ABSTRACT The aim of this work was to verify the histopathological changes in goats seropositive to the Caprine Arthritis Encephalitis Virus (CAE), without manifesting clinical signs of this disease. Twenty animals, 4 males and 12 females, aged from 3 to 6 years, naturally infected with CAEV were sacrificed. At necropsy, the organs and the synovial liquid were examined macroscopically. Samples of synovial membrane, lung, brain and mammary gland were collected, fixed in formol (10% for 24 h) and submitted to histopathology. At macroscopic examination, 44%, 63%, 69% and 92% of the animals showed normal lungs, carpal and metacarpal joints, brain, central Endereço para correspondência: Av. Paranjana, 1700, 60740-000 Fortaleza-CE e-mail: aprrodrigues@yahoo.com.br 113

nervous system, and mammary glands, respectively. At the microscopic level, some alterations were seen in organs. In thelungs, there was a chronic interstitial pneumonia, characterized by hyperplasic lymphoid tissue, composed of lymphocytes, eosinophils and a small number of macrophages. The synovial membrane was characterized by increased thickness, hyperplasic synovial cells, discrete lymphocytic infiltration and augmented vilosities. Regarding the white and gray substances in the brain, the most common alteration observed was a light chromatolysis with satellitosis. Finally, concerning the mammary gland, 80% of the animals showed proliferation areas with mononuclear cells, lymphocytes and plasma cells, in the connective tissue, inter and intralobular. In conclusion, the results of the present study confirm that in animals seropositive for CAE virus, although clinically healthy, may show some macro and/or microscopic lesions in target organs such as lung, central nervous system, synovial membrane of carpal and metacarpal joints and mammary gland. KEY WORDS: caprine arthritis encephalitis, retrovírus, histopathological changes, caprine. INTRODUÇÃO A Artrite Encefalite Caprina (CAE) é uma doença infecciosa (FRANK, 1998), crônica, degenerativa que acomete os caprinos e, é caracterizada por lesões inflamatórias em vários órgãos (CRAWFORD & ADAMS, 1981; STORSET et al., 1997). O agente etiológico da CAE é um vírus da família Retroviridade, sub-família Lentivirinae, que apresenta semelhanças morfológicas, bioquímicas e antigênicas com o vírus da Maedi-visna de ovinos (ADAMS et al., 1980a; KLEVEJER-ANDERSON & CHEEVERS, 1980; PERK, 1990; CLAVIJO & THORSEN, 1996). Esta enfermidade apresenta um longo período de incubação, além de uma evolução lenta e progressiva. Os animais infectados passam a ser portadores permanentes do vírus (FRANK, 1998). A transmissão do vírus ocorre principalmente, através da ingestão do colostro ou leite contaminados podendo ocorrer também a partir de excreções como fezes, saliva e secreções urogenitais e respiratórias de animais infectados (ROWE & EAST, 1997). Neste caso, o contato prolongado entre animais infectados e sadios, particularmente em rebanhos caprinos de alta densidade, também pode resultar em transmissão significativa (ROWE & EAST, 1997). A CAE é mais freqüentemente manifestada por sinovite proliferativa crônica e periartrite em animais adultos (CRAWFORD et al., 1980, KLEVEJER- ANDERSON & ANDERSON, 1982) e uma leucoencefalomielite aguda em animais entre 2 e 4 meses de idade (CORK et al., 1974; CRAWFORD & ADAMS, 1981; KLEVEJER-ANDERSON & ANDERSON, 1982). A infecção é insidiosa por meses a anos e alguns animais nunca apresentam os sinais clínicos da doença (ROWE & EAST, 1997). Neste sentido, o objetivo do presente trabalho foi verificar as alterações histopatológicas de animais soropositivos para o vírus da CAE, sem a presença de sinais clínicos. MATERIAL E MÉTODOS Animais Neste experimento foram utilizados 16 animais, sendo 4 machos e 12 fêmeas, adultos com idade entre três e seis anos, naturalmente infectados com o vírus da CAE, dos quais 11 eram da raça Saanen, 4 da raça Alpina e 1 sem raça definida. Os animais estudados eram criados em regime intensivo e, oriundos da região metropolitana de Fortaleza, bem como dos municípios de São Gonçalo do Amarante e Sobral. Exame clínico Os animais foram avaliados clinicamente em relação aos seguintes parâmetros: temperatura retal, freqüências respiratória e cardíaca, movimentos ruminais, linfonodos e aparência das mucosas, segundo os métodos semiológicos descritos por KELLY (1986). Ao exame clínico também foi realizada a palpação na região correspondente às articulações e determinado o índice clínico articular. Este índice é dado pela diferença entre a maior medida dos diâmetros das articulações carpo-metacarpiana, joelho, e a menor medida do metacarpo, canela (MONICART, 1987). 114

Sorologia Amostras de sangue de cada um dos animais foram colhidas através de venopunção da jugular. O sangue foi centrifugado a 4.000 rpm por 15 min para obtenção do soro, o qual foi utilizado posteriormente para a pesquisa de anticorpos séricos contra o vírus da CAE, através do teste de Imunodifusão em Gel de Agarose (IDGA kit do Institut Pourquier, Montpellier France), segundo CRAWFORD et al. (1980). Coleta e preparo do material para estudo histopatológico Os animais naturalmente infectados foram eutanasiados, injetando-se por via intracardíaca, 10 ml de uma solução de cloreto de potássio a 10%. Os animais foram necropsiados para a realização do exame macroscópico dos órgãos e líquido sinovial. Em seguida, foram coletados fragmentos de 0,5 cm de tamanho, de membrana sinovial a 1 cm de tamanho do pulmão, cérebro, e glândula mamária. Os fragmentos foram fixados por imersão em solução de formol a 10% por 24 h. Após a fixação, o material foi desidratado, diafanizado em xilol, embebido em parafina e seccionado à espessura de 7 mm. As secções foram montadas em lâminas de vidro, coradas pelo método PAS-hematoxilina e analisadas por microscopia ótica (400 X). RESULTADOS Ao exame clínico, observou-se que todos os animais infectados apresentavam valores normais para os parâmetros de freqüência cardíaca e respiratória, bem como para índice clínico articular (Direito: 5 ± 0,96; Esquerdo: 5 ± 1,06). Do total de animais estudados, sete, apresentaram aumento de volume da articulação carpo-metacarpiana 71% dos machos e 29% das fêmeas, porém somente quatro, 3 machos e 1 fêmea, apresentaram índice clínico igual ou maior a sete. Alterações macroscópicas Dos animais estudados, cinco não apresentaram nenhum sinal de lesões nos sistemas respiratório, nervoso e articular. De uma maneira geral, lesões indicativas de congestão, enfisema, atelectasia e aderência dos lobos pulmonares, também foram observados em alguns animais. Dentre as fêmeas, apenas uma apresentou uma pequena área de fibrose no tecido da glândula mamária, mastite. Na Tab. 1 pode-se observar detalhadamente as lesões mais comumente encontradas nos órgãos-alvo coletados dos animas estudados. Lesões microscópicas Pulmões O exame histopatológico revelou pneumonia intersticial crônica caracterizada com maior freqüência por hiperplasia de tecido linfóide, constituído principalmente por linfócitos, eosinófilos e um menor número de macrófagos. A hipertrofia do músculo liso e hiperplasia do tecido conjuntivo contribuíram para o espessamento da parede alveolar, cujo grau de severidade variou de discreta a intensa. Membrana Sinovial Apenas 30% dos animais estudados não mostraram nenhum tipo de lesão na membrana sinovial. Por outro lado, alterações como aumento da espessura da membrana, hiperplasia de células sinoviais, discreta infiltração de células mononucleares predominantemente linfócitos e aumento das vilosidades também foram encontradas. Sistema Nervoso Central Na substância branca do cérebro foi observada uma discreta cromatólise com áreas de satelitose. Foi observado também uma infiltração de astrócitos com escassos oligodendrócitos e raras células microgliais. Além dessas alterações ocasionalmente, observou-se a presença de discretos manguitos perivasculares. Na substância cinzenta, observou-se que em todos os casos, os corpos celulares mantiveram-se preservados e, somente pequenas alterações como uma discreta cromatólise com satelitose, raramente foram observadas. Glândula mamária Raras alterações foram observadas na glândula mamária. Aproximadamente 80% dos animais apresentaram tecido mamário com áreas de proliferação de células mononucleares, linfócitos e plasmócitos, no tecido conjuntivo intra e interlobular. Além disso, observou-se freqüentemente que o tecido 115

Tabela 1. Lesões macroscópicas observadas no pulmão, articulação, sistema nervoso central (SNC) e glândula mamária de animais naturalmente infectados com o vírus da CAE. Órgãos /tecidos Tipo de alteração Machos Fêmeas Total % Pulmão Normal 02 05 07 44 Enfisema - 02 02 13 Fibrose - 01 01 05 Aderências - 01 01 06 Congestão - 02 02 13 Enfisema/congestão - 01 01 05 Enfisema/hemorragia - 01 01 05 Articulação carpometacarpiana Normal 01 09 10 63 Superfície rugosa 01-01 05 Erosão - 02 02 13 SNC Normal 02 09 11 69 Friável - 01 01 05 Hemorrágico - 01 01 06 Glândula mamária Normal 11 11 92 Fibrose 01 01 08 mamário exibia inúmeras áreas císticas de conteúdo acidofílico. DISCUSSÃO O presente estudo mostrou que os valores encontrados para as freqüências cardíaca e respiratória e temperatura retal observados nos animais infectados, naturalmente com o vírus da CAE mantiveram-se dentro do normal para a espécie caprina. Estes resultados estão de acordo com aqueles encontrados por WOODARD et al. (1982). Embora, todos os animais fossem comprovadamente infectados pelo vírus da CAE, o cálculo do índice clínico igual ou superior a sete foi verificado apenas em quatro animais. É importante frisar que este índice indica apenas um quadro de artrite e, não significa necessariamente que o animal esteja apresentando CAE, uma vez que a artrite pode ser provocada por outros agentes infecciosos, fatores nutricionais ou traumáticos (FRANK, 1998). Conforme observado, macroscopicamente, apenas sete animais não mostraram nenhuma lesão nos sistemas respiratório e nervoso e articulações. No que concerne às articulações, resultados similares foram observados por STORSET et al. (1997). Este resultado pode ser explicado pelo fato de que a infecção com o vírus da CAE é insidiosa (PHELPS & SMITH, 1993; ROWE & EAST, 1997) por meses ou anos, sendo que, alguns indivíduos nunca mostram sinais clínicos da doença (ROWE & EAST, 1997). As lesões macroscópicas no pulmão, articulações e glândula mamária foram similares àquelas descritas por outros pesquisadores (CORK et al., 1974; CRAWFORD & 116

ADAMS, 1981; WOODARD et al., 1982). A infiltração de células mononucleares nos septos alveolares, comumente observada, revelou a presença de uma pneumonia intersticial, a qual tem sido freqüentemente encontrada em cabras infectadas com o vírus da CAE. Resultados similares foram obtidos por CORK et al. (1974) e ADAMS et al. (1980a). De acordo com PHELPS & SMITH (1993), a presença de macrófagos nos septos alveolares, sugerem que estas células fornecem uma fonte de estimulação antigênica contínua da resposta imune contra o vírus da CAE. No que concerne ao sistema nervoso central, as raras lesões encontradas, foram caracterizadas pela infiltração de astrócitos, oligodendrócitos e células microgliais. Estes resultados podem ser devido ao fato de que a forma nervosa da CAE seja mais comumente encontrada em animais jovens, com idade entre dois e quatro meses. (AL-ANI & VESTWEBER, 1984; ZINK et al., 1990). Embora a artrite seja a forma mais comum da CAE nos animais adultos, o exame histopatológico mostrou que a membrana sinovial dos animais estudados apresentou discretas lesões. Estes resultados, provavelmente podem ser explicados devido ao vírus da CAE causar uma síndrome crônica (PHELPS & SMITH, 1993) e lentamente progressiva (CRAWFORD et al., 1980; KLEVEJER- ANDERSON et al., 1984). Como foi verificado, das 14 cabras estudadas, somente duas apresentaram sinais clínicos de mastite, embora, microscopicamente, em 80% delas tenha sido observada infiltração de células mononucleares no tecido mamário. A mastite tem sido encontrada em cabras infectadas natural ou experimentalmente com o vírus da CAE. A infiltração mononuclear do estroma periductal pode resultar em obliteração de estruturas normais e foco necrótico. O vírus da CAE pode ser isolado do leite e colostro de cabras lactantes infectadas (PHELPS & SMITH, 1993). KENNEDY- STOSKOPF et al. (1985) isolaram facilmente o vírus da CAE do tecido mamário de uma cabra adulta e de uma cabrita de três meses de idade, ambas apresentando mastite crônica. Concluindo, os resultados do presente estudo confirmam que os animais soropositivos para o vírus da CAE, embora não apresentando sintomatologia clínica podem apresentar algum tipo de lesão macro e/ ou microscópica em órgãos-alvo como o pulmão, o sistema nervoso central, a membrana sinovial das articulações carpo-metacarpiana e a glândula mamária. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADAMS, D. S.; CRAWFORD, T. B.; KLEVJER- ANDERSON, P. A pathogenetic study of the early connective tissue lesions of viral caprine arthritisencephalitis. American Journal of Pathology, 99:257-271, 1980a. ADAMS, D. S.; CRAWFORD, T. B.; BANKS, K.; McGUIRE, T.; PERRYMAN, L. E. Immune responses of goats persistently infected with caprine arthritisencephalitis virus. Infectious Immunology, v. 28, n. 421-427, 1980b. AL-LANI, F. K.; VESTWEBER, J. G. E. Caprine arthritis-encephalitis syndrome (CAE): a review. Veterinary Research Communication, v. 8, n.243-253, 1984. CLAVIJO, A.; THORSEN, J. Application of polymerase chain reaction for the diagnosis of caprine arthritisencephalitis. Small Ruminant Research, v. 22, n. 69-77, 1996. CORK, L. C.; HADLOW, W. J.; CRAWFORD, T. B.; GORHAM, J. R.; PIPER, R. C. 1974. Infectious leukoencefalomyelitis of young goats. Journal of Infectious Diseases, v. 129, p. 134-141. CRAWFORD, T. B.; ADAMS, D. S. Caprine arthritisencephalitis: Clinical features and presence of antibody in selected goat populations. Journal of the American Veterinary Medicine Association, v. 178, p. 713-719, 1981. CRAWFORD, T. B.; ADAMS, D. S.; SANDE, R. D.; GORHAM, J. R.; HENSON, J. B. The connective tissue component of the caprine arthritis-endephalitis syndrome. American Journal of Pathology, v. 100, p. 443-454, 1980. FRANK, C. R. Controle sanitário da artrite-encefalite caprina. Universidade Federal da Bahia, 70p. 1998. KELLY, W. R. 1986. Temperatura. Diagnóstico clínico veterinário. Interamericana, 3ª ed. p. 22-39. KENNEDY-STOSKOPF, S.; NARAYAN, O.; STRANDBERG, J. D. The mammary gland as a terget organ for infeccion with caprine arthritis-encephalitis virus. Journal of Compared Pathology, v. 95, p. 609-617, 1985. KLEVEJER-ANDERSON, P.; CHEEVERS, W. P. Characterization of the infection of caprine synovial 117

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