CASA EM MANGABEIRAS Local: Belo Horizonte MG Ano: 2012 Escritório: Grupo SP Autores: Márcia Silveira Rodrigues e Ana Elísia da Costa Casa em Mangabeiras Promenade Contemporânea 1 A Casa em Mangabeiras é uma edificação de uso misto - residência unifamiliar e escritório -, situada em um bairro residencial de Belo Horizonte - Minas Gerais. Projetada no ano de 2012, a casa possui aproximadamente 212,00m² e está implantada em um lote de grandes dimensões (836,40m²) e topografia muito íngreme (Figura 1). Figura 1: Casa em Mangabeira (a) Implantação; (b) Perspectiva. Fonte: http://www.gruposp.arq.br (Intervenções nas bases: da autora) Implantação e Partido Formal A topografia do terreno com um aclive de 45 graus se caracteriza como um dos principais condicionantes do projeto. A testada do lote tem orientação leste e se encontra na cota mais baixo do terreno. A composição é formada pela tangência de três volumes. O bloco principal (Bloco 1) da casa é implantado de forma solta no lote, tanto no que se refere aos seus limites, quanto em relação ao aclive do terreno. Outros dois blocos conectam o Bloco 1 aos extremos verticais do terreno: na parte inferior, e encravado no terreno, o bloco da garagem (Bloco 2), que é 1 Trabalho desenvolvido para a disciplina "Casa Moderna e Contemporânea", ministrada pelas professoras Ana Elísia da Costa e Celia Gonsales, junto ao Programa de Pós-Gaduação em Arquitetura e Urbanismo (PROGRAU), da Universidade Federal de Pelotas, em abril de 2016
o principal e único acesso da residência; e na parte superior, um bloco com terraço-estar (Bloco 3) que sugere ser uma espécie de ponte entre o bloco principal e o terreno (Figura 2). Figura 2: Casa Mangabeira - (a) Corte Transversal; (b) Esquema Volumétrico Fonte: (a) http://www.gruposp.arq.br (Intervenções nas bases: da autora); (b) RODRIGUES, Márcia S. (2016). O tratamento da fachada do prisma principal sugere a configuração de dois planos longitudinais paralelos em que predomina os cheios sobre os vazios. Essa intenção pode ser ilustrada pelos rasgos de vidro transversais e pela desconexão do plano de fachada frontal em relação à laje de piso do segundo pavimento, e ainda pelo recuo das platibandas transversais da cobertura em relação aos limites do volume. Nesta fachada destaca-se também a grande abertura do quarto andar que abre a sala de jantar para o exterior e que garante o enquadramento da paisagem. Essa grande abertura se contrapõe ao fechamento dos demais pavimentos, sugerindo a intenção de garantir privacidade do morador em relação à rua. No bloco da garagem, o tratamento planar também se evidencia com o deslocamento dos dois planos verticais transversais em relação à laje de cobertura (Figura 3). Figura 3: Casa em Mangabeiras - (a) Perspectiva; (b) Perspectiva Explodida.
Configuração Funcional Na estreita volumetria (3,60m x 24,20 m), o arranjo dos ambientes obedece a um zoneamento por níveis, ficando o acesso (garagem) e o uso mais público (escritório) no primeiro e segundo pavimento e os usos residenciais, nos pavimentos superiores, o que garante privacidade e o enquadramento das melhores visuais. Também se observa que o corpo principal (Bloco1 1) é segmentado em três faixas, onde a faixa central cumpre sempre o papel de ambiente de convivência e de espaço de distribuição e as faixas periféricas (a norte e sul) abrigam as áreas de apoio e suítes (Figura 4). Figura 4: Casa em Mangabeiras - (a) Grelha Compositiva; (b) Esquema Volumétrico do Arranjo Funcional. Fonte: (a) http://www.gruposp.arq.br (Intervenções nas bases: da autora); (b) RODRIGUES, Márcia S. (2016). A circulação vertical é externa ao volume principal, conferindo autonomia de uso a todos os pavimentos. Observa-se, contudo, que por dar acesso também ao terraço da cobertura, essa escada não é coberta, comprometendo os percursos protegidos das intempéries. (Figura 5). Observa-se, ainda, que a estrutura permite a planta livre, estando os ambientes compartimentados em planta pela disposição de blocos hidráulicos internalizados que envolvem os pilares e por divisórias leves ou portas de correr (Figura 5). Figura 5: Casa em Mangabeiras Esquema Circulação e Arranjo Funcional. Fonte: http://www.gruposp.arq.br/(intervenções nas bases: da autora)
Espacialidade O acesso à residência é demarcado pela rampa da garagem que cria, ao ser implantada em uma cota acima do nível da rua, uma tensão no sentido ascendente com o pilotis como ponto focal. O ambiente da garagem é tratado como espaço de transição e propicia a alternância entre as sensações de dilatação (rua), compreensão (sombreamento criado pela projeção do corpo principal da residência (Bloco 1) e novamente dilatação (circulação vertical externa) (Figura 6). Ao chegar ao primeiro degrau da escada, depara-se com a visual da circulação externa. A sucessão de lances e patamares indica o percurso e os acessos ao interior dos pavimentos. A claridade da circulação externa, principalmente no horário de sol a pino, prevalece sobre sob seu confinamento entre a topografia e a construção, o que mantém o efeito de dilatação e o foco da tensão espacial unidirecional no sentido ascendente (Figura 6). Figura 6: Casa em Mangabeiras - (a) Perspectiva Acesso; (b) Perspectiva Circulação Vertical. Ao adentrar no espaço central do segundo pavimento, há uma contraposição entre o efeito da luz junto ao piso, proveniente da janela baixa que cria uma sensação de confinamento, e luz oriunda dos ambientes periféricos que possuem aberturas do piso ao teto e que se abrem para as visuais da lateral do terreno, assumindo um caráter mais extrovertido (Figura 7). Figura 7: Casa em Mangabeiras - (a) Perspectiva Espaço Central 1 Pavimento; (b) Perspectiva Ambiente Periférico 2 Pavimento.
A introversão, como experiência espacial, tem o seu ápice quando o fruidor chega ao terceiro pavimento (Figura 8). Seu ambiente central (estar íntimo) possui janelas piso-teto, voltadas somente para o terreno, e divisórias que barram a claridade oriunda dos ambientes periféricos. Neste pavimento, as divisórias, barreiras entre o ambiente central (estar íntimo) e os periféricos (suítes) criam circulações íntimas estreitas, onde vivencia-se a escolha do deslocamento pode-se: a esquerda contornar o banheiro e acessar o closet e a frente se deslocar para o dormitório, cujo pano de vedação translúcida enquadra a vista da lateral do terreno e se torna o ponto focal do ambiente. (Figura 8) Figura 8: Casa em Mangabeiras - (a) Perspectiva Espaço Central 3 Pavimento; (b) Perspectiva Suíte 3 Pavimento. A partir do terceiro até o quarto pavimento, o lance da escada se torna fechado por vidro em ambas as laterais. A solução propicia que o fruidor se desloque entre estes pavimentos protegido das intempéries. Neste trajeto, a sensação espacial gradativamente se dilata até chegar ao patamar de acesso ao quarto pavimento que possibilita o encaminhamento em duas direções - para a esquerda o usuário adentra o ambiente do jantar e para a direita do estar (Figura 9). Figura 9: Casa em Mangabeiras - (a) Perspectiva Escada 3 Pavimento; (b) Perspectiva Patamar 4 Pavimento.
A prevalência dos fechamentos em vidro, em ambos ambientes sociais do último pavimento, conduz a uma experiência de extroversão. No ambiente de estar, os panos de vidro voltados para as laterais do terreno e para topografia criam uma tensão multidirecional, o que também pode ser observado no jantar, com vistas para o entorno, favorecidas pela altitude do terreno. (Figura 10) Figura 10: Casa em Mangabeiras - (a) Perspectiva Estar Social 4 Pavimento; (b) Perspectiva Jantar 4 Pavimento. Para ter acesso ao penúltimo lance da escada, agora descoberto, o fruidor deve contorná-lo, por um dos ambientes sociais, até chegar ao seu patamar, para então ser conduzido aos terraços. O primeiro terraço, acima do estar, faz a interface da topografia do terreno com a edificação e o segundo, acima do corpo principal (Bloco 1), acessa a piscina e favorece a apreciação do entorno, como um mirante (Figura 11). Figura 11: Casa em Mangabeiras - (a) Perspectiva Acesso Terraço; (b) Perspectiva Vôo de Pássaro: Visão Panorâmica. Assim, ao longo de seu percurso, é perceptível que a casa explora a alternância de espacialidades que exploram a contração e dilatação espacial ou ainda diferentes graus de dilatação espacial. A casa em si promove diversas surpresas nas passagens de nível e se configura como uma grande promenade.
Considerações finais A Casa em Mangabeiras (2012), ao se impor verticalmente na topografia íngreme do terreno, configura uma casa-torre, cujas referências tipológicas possui pouca ou nenhuma correspondência entre os exemplares das casas contemporâneas estudadas nesta pesquisa. Contudo, observa-se que o vocabulário formal empregado remete a outros projetos do próprio escritório e/ou à linguagem da arquitetura brutalista paulista, destacando-se o uso de empenas cegas contrapostas a superfícies envidraçadas; e a ambiguidade entre o tratamento planar e volumétrico, determinado pela extensão horizontal e/ou vertical das empenas cegas em relação ao possível volume original. Este vocabulário pode ser também observado na integridade ou em partes dos arranjos volumétricas de outras casas do Grupo SP: Morro do Querosene (2004), Marília (2007), Pinheiros (2007) e, depois da própria casa Mangabeiras, na Casa em Curitiba (2014). Na Mangabeiras, contudo, o tratamento da empena longitudinal representa uma transgressão, pois esta passa a assumir um duplo papel contraponto para as superfícies transversais envidraçadas e moldura para a grande abertura para a paisagem. A forma como a circulação vertical se desenvolve também pode representar uma nova investigação espacial, pois, externalizada, proporciona maior fluidez ao arranjo das plantas livres contidas no estrito volume, investigação esta que pode se relacionar com a solução adotada na casa Morro do Querosene de 2004.