ARQUEOTURISMO NA CORVETA CAMAQUÃ: UM MUSEU EM MAR ABERTO

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Transcrição:

ARQUEOTURISMO NA CORVETA CAMAQUÃ: UM MUSEU EM MAR ABERTO Carlos Rios 1 André Felipe Mozzini Hüther 2 Lucas Barbosa Lins 2 Eric Henrique Silva de Moura 2 Resumo: O litoral de Pernambuco possui 187,5 km de praias e uma estimativa de 300 naufrágios que vão desde os primórdios de sua história colonial até a atualidade. O Parque de Naufrágios existente em seu mar adjacente está constituído por 41 embarcações, das quais pouco se sabe e algumas nem o seu nome. Em face às condições excepcionais de temperatura e visibilidade da água, bem como a diversidade de artefatos náuticos soçobrados, Recife é considerada pela mídia brasileira como a capital brasileira do mergulho em naufrágio. Nesse contexto, utilizando o viés do Arqueoturismo Subaquático, o trabalho tem como objetivo a transformação de um sítio de naufrágio em um museu em mar aberto, como já ocorre em alguns países da Ásia, Europa e da América do Norte que, por enquanto, é teórico e pioneiro no Brasil e tem como protótipo a Corveta Camaquã. Abstract: The coast of Pernambuco has 187.5 km of beaches and an estimated 300 shipwrecks ranging from the beginnings of its colonial history to the present. The existing Wreck Park in its adjacent sea is made up of 41 vessels, of which little is known and some not even its name. In view of the exceptional conditions of temperature and water visibility, as well as the diversity of sunken nautical artifacts, Recife is considered by the Brazilian media as the Brazilian capital wreck dive. In this context, using the bias of Underwater Archaeoturism, the paper aims at the transformation of a wreck site in a museum in the open sea, as already occurs in some countries in Asia, Europe and North America that, for now, is theoretical and pioneer in Brazil and its prototype Corvette Camaquã. 1 Departamento de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). 2 Discente do Curso de Bacharelado em Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 78

INTRODUÇÃO Na América do Sul existem cerca de 11.000 naufrágios. Na costa brasileira que possui dimensões continentais, com 7.367 km 3, ocorreram cerca de 3.000 naufrágios em mais de 500 anos, isto sem falar nos soçobramentos em outros corpos d'águas, tais como rios e lagos (RIOS, 2010). Apesar de ter um número considerável de naufrágios, observa-se que nenhum dos estados brasileiros utiliza o potencial do Arqueoturismo como ferramenta para pesquisas subaquática, divulgação do patrimônio arqueológico submerso, turismo cultural ou disseminação da mentalidade marítima do povo brasileiro. Ao se analisar o estado de Pernambuco, pode-se verificar que, devido à sua história, a privilegiada posição geográfica 4, dentre outros fatores ele tem vocação direta com a navegação marítima, mas não utiliza essa maritimidade a contento. Nos primórdios da navegação marítima as embarcações que cruzavam os mares eram de propulsão à vela 5, sendo assim não navegavam, normalmente, contra a corrente. Os navios saíam da Europa, passavam próximasa costa da África e seguiam pela corrente de Benguela até as águas territoriais brasileiras. Foi em uma dessas missões exploratórias que o estado de Pernambuco passou a ter o primeiro naufrágio descrito em diário de bordo do Brasil 6. Recife é considerada a capital brasileira do mergulho em naufrágio. No Parque de Naufrágios existem aproximadamente 300 embarcações soçobradas, porém apenas 50 são conhecidas e 41 são realmente visitadas, entretanto Pernambuco não é o estado detentor do maior número de cascos soçobrados. Dentre os dezessete Estados que possui litoral, esse título cabe, ao menos teoricamente, ao Rio de Janeiro, com 351 naufrágios (RIOS, 2010), Pernambuco, de acordo com o site "Naufrágios do Brasil", se enquadra como o oitavo estado neste quesito. O 3 IBGE, 2014. 4 A bifurcação da corrente de Benguela (Sul Equatorial), que se divide nas correntes marítimas do Brasil e da Guiana (GARRISON, 2010). 5 Navios que se movem pela ação do vento em suas velas. 6 Nau Capitânia de Gonçalo Coelho, cujo soçobramento se deu em 10 de agosto de 1503 (PEREIRA DA COSTA, 1983). Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 79

somatório destes fatores reforça o atrativo para as modalidades de mergulho conhecidas como Mergulho em Naufrágios e Caça Submarina. Com referência a distribuição espacial dos naufrágios no estado de Pernambuco, pode-se dizer que os soçobramentos se estendem do litoral norte (Goiana) ao sul (Sirinhaém). As concentrações de naufrágios no período da navegação a vela se dão, mormente nos portos de Recife e Suape, motivados pelo alto fator de risco no momento que é a entrada ou saída do porto, instante no qual a embarcação estaria mais sujeita a três dos oito fatores causadores de naufrágios existentes (RIOS, 2011). Devido ao grande número de embarcações soçobradas ainda não descobertas o Parque de Naufrágios deve ser ampliado com o passar dos anos, agregue-se também o aumento de naufrágios propositais que vem sendo efetuado desde 1990. O presente artigo tem por objetivo a criação de uma proposta museológica de um patrimônio submerso, no caso o sítio de naufrágio da Corveta Camaquã, localizado no litoral pernambucano. Tal proposição está embasada em conceitos de visitação museológica, ação promocional turística e pesquisa arqueológica marítima, de modo que se efetue um circuito de visitação utilizando o mergulho como ferramenta acessória a essa interdisciplinaridade. Proposta para o Arqueoturismo Subaquático em Pernambuco O Arqueoturismo subaquático já ocorre em alguns países da Ásia, Europa e da América do Norte. Como exemplos, seguem alguns sítios submersos: Caesarea (Israel); Flórida Keys National Marine Sanctuary (EUA); Kronprins Gustav Adolf (Finlândia); Sítios de Naufrágios Protegidos (Croácia), Ústica (Itália) e Wellington (Nova Zelândia) 7, mas infelizmente no Brasil ainda não se tornou uma realidade por falta de políticas públicas dos governos nas três esferas do Poder (Federal, Estadual e Municipal), bem como pelo desinteresse da Marinha do Brasil 7 Underwater Museums, Unesco, 2014. Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 80

(MB),em que pese essa não ser uma das suas missões basilares 8 e dos centros de mergulhos sobre o assunto. No que concerne a distribuição dos sítios de naufrágio em Pernambuco há uma verdadeira diversidade, tanto batimétrica quanto tipológica, existindo desde sítios visitáveis 9, a 12 m de profundidade até a isóbata de 57 m, assim sendo serão produzidos alguns trabalhos científicos com isobatimétricas pertinentes as diversas categorias de mergulho 10. Para alcançar o efeito desejado, a metodologia empregada envolveu áreas do conhecimento pertinentes à Arqueologia Subaquática, Arte Naval, História Marítima, Turismo, Mergulho, Museologia e Preservação Patrimonial, que explora a interdisciplinaridade da Arqueologia, mas devido às especificidades retarda e dificulta a sua implantação. O primeiro fator limitante para visitação do sítio de naufrágio da Corveta Camaquã é o mergulho que não está ao alcance de todos, apenas 20.000 brasileiros 11 estão credenciados nesse esporte aquático. O segundo é que o navio está em uma profundidade de 57 m, portanto trata-se de um mergulho Técnico, significando que, no Brasil, devido ao custo financeiro, somente 1% do universo de 20.000 mergulhadores está habilitado para essa categoria de mergulho 12, mas para o turista estrangeiro esse óbice não é tão significativo, podendo acarretar em uma nova fonte de divisas com todos os outros valores agregados13 a permanência do turista na cidade do Recife. Ainda no que diz respeito ao mergulho, o que se está criando é uma nova modalidade "Arqueoturismo Cultural" onde o mergulhador de qualquer categoria ou certificadora vai adquirir novos conhecimentos sobre a história de um patrimônio arqueológico submerso, dados sobre arte naval da belonave, pertinentes aos aparelhos e acessórios a ela incorporados. 8 As duas principais missões da MB são a salvaguarda da vida humana no mar e a segurança da navegação. 9 Aqueles com visibilidade de no minimo 1 m. 10 Básico (até 25 metros); Avançado (até 39 metros) e Técnico (de 40 metros em diante). 11 Comunicação pessoal do Cel. (BM) e mergulhador Josualdo Moura, instrutor credenciado por diversas instituições de mergulho recreativo, profissional e técnico, 2014. 12 Comunicação pessoal do instrutor de mergulho Josualdo Moura, 2014. 13 Despesas com hotel, alimentação, passagens etc. Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 81

Para que se acessem as informações acima descritas, existem duas categorias de entrada, a primeira por meio de palestra ainda no centro de mergulho, ou seja, antes da saída para o mar ou durante o trajeto a caminho do naufrágio, a bordo da embarcação que vai levar os mergulhadores. O mergulhador antes de efetuar os dois mergulhos naquele mesmo naufrágio, terá uma aula sobre a história do navio, bem como sobre os artefatos arqueológicos, mormente os bélicos daquele santuário militar, bem como sobre os equipamentos e acessórios existentes no mesmo e, ao efetuar a primeira imersão em mar aberto, estará acompanhado de um arqueólogo mergulhador 14, fazendo um circuito externo (por questão de segurança não haverá penetração no interior do navio), pré-determinado, acompanhando as placas descritivas de cada parte da embarcação, como se estivesse em um museu em terra firme. Depois de cumprido o intervalo de superfície, no segundo mergulho, o indivíduo estará acompanhado de sua dupla 15, mas sem a supervisão do arqueólogo mergulhador, ficando assim livre para explorar com maior riqueza de detalhes o que mais lhe chamou atenção no mergulho anterior. Todos esses procedimentos serão efetuados em consonância com as regras vigentes nos protocolos do Mergulho Técnico da International Association of Nitrox and Technical Divers (IANTD), com as Normas Técnicas da Marinha do Brasil (NORMAN), bem como serão observados os preceitos da Convenção da UNESCO sobre a proteção do Patrimônio Cultural Subaquático de 2001. O enfoque museológico, como parcialmente descrito, ocorre no fundo do mar, por meio de 11 placas fixadas em poitas de 70 x 70 x 70 cm, confeccionadas em PVC, com letras pretas na fonte Arial Black, tamanho 72, com informações sobre partes significativas do navio. O circuito 14 Podendo ser também um biólogo, museólogo, historiador, turismólogo, desde que habilitado em mergulho. 15 Mergulho efetuado, por medida de segurança, em duplas (grupos de dois mergulhadores). Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 82

tem 100 m de comprimento e será feito em até 20 minutos de permanência de fundo com mistura gasosa de Trimix 16. No tocante a abordagem turística das empresas de mergulho junto ao público alvo, a disseminação desse novo tipo de serviço cultural pela internet servirá como atrator para a fatia de mergulhadores que querem adquirir mais informações sobre um sítio de naufrágio e não mergulhar simplesmente para ver um navio sem conhecimento do seu contexto. Outros meios de disseminar essas informações são os folders deixados nos hotéis e a propaganda lançada na mídia televisiva e radiofônica. Corveta Camaquã Durante a Segunda Guerra Mundial alguns submarinos alemães e italianos atuaram no litoral brasileiro, causando o temor de um ataque às embarcações brasileiras e estrangeiras em águas territoriais nacionais 17, como de fato veio a acontecerem com vários estados da federação. Em Pernambuco foram torpedeados os navios mercantes Anadie (FR), Motocarline e Adelfots (GR) (ARAUJO, 2000). Impulsionados pelo clima de beligerância, os Aliados adotaram a tática de comboios protegidos por uma escolta naval e coberturaaérea para impedir mais ataques às embarcações (BARROS NETO, 2006). Devido à falta de estrutura em praticamente todos os sentidos para fazer frente a uma guerra mundial e de uma esquadra deficiente em números, diversos navios da Marinha do Brasil passaram por alterações para que a sua frota tivesse um quantitativo numérico suficiente para aquelas missões de comboio de navios mercantes. Uma das belonaves que sofreram esta 16 Mistura gasosa elaborada a base de Hélio, Oxigênio e Nitrogênio. 17 O mar territorial brasileiro compreende uma faixa de doze milhas marítima de largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular, tal como indicada nas cartas náuticas de grande escala, reconhecidas oficialmente no Brasil.(LF n 8.617/93). Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 83

adaptação foi o navio mineiro 18, corveta 19 (figura 02). da Classe Carioca (figura 01), que foi transformado em Figura 1: Configuração original da Camaquã. Navio mineiro Camaquã. Foto: Maurício Carvalho. Figura 2: Configuração final da Camaquã. Corveta Camaquã. Foto: Maurício Carvalho. Depois de completar 4 anos e 44 dias de serviços no mar, escoltar próximo de 700 navios, efetuar 15 patrulhas e mais de 50.000 milhas náuticas navegadas a Camaquã soçobra.o fator hidrometereológico 20 (RIOS, 2010) pode ser considerado como uma das causas do naufrágio, 18 Lançador de minas (CHERQUES, 1999). 19 É um moderno navio de combate de 500 a 1.200 toneladas de deslocamento, boa mobilidade, velocidade moderada em torno de 15 nós, destinado à patrulha antissubmarino e socorros marítimos (CHERQUES, 1999). 20 Fator relacionado às mudanças climáticas, correntes, dentre outros (RIOS, 2010). Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 84

uma vez que a embarcação foi atingida por três sequências de ondas que culminaram no sinistro, a outra é pertinente ao fator humano, uma vez que o navio havia gasto boa parte do seu combustível e não tinha lastrado os tanques com água salgada para minimizar o balanço e baixar o centro de gravidade. No tocante aos dados do navio, ela era segundo Barreto Neto (2006): "Corveta de ferro, da Marinha do Brasil, construída no Arsenal de Marinha RJ, quilha 21 batida 22 em 22 de outubro de 1938, lançada 23 ao mar em 16 de setembro de 1939 e incorporada 24 em 07 de junho de 1940. Possuía as seguintes dimensões: 57 m decomprimento, 7,8 m de boca 25 e 2,5 m de calado 26. Seu sistema de propulsão consistia em duas caldeiras e duas máquinas alternativas, gerando cerca de 1.300 horse-power (HP), deslocava550 toneladas". A Camaquã está na posição 07 50'633"S e 034 29'699"W, a 27 milhas do litoral, pelo través da praia de Maria Farinha, na cota de 57 m, com visibilidade variando entre 20 e 50 m. Naufragou no dia 21 de julho de 1944 e seu último comandante foi o Capitão-de-Corveta Gastão Monteiro Moutinho, desaparecido no naufrágio. Está em razoável estado de conservaçãoe permanece com parte do seu armamento espalhado pelo solo marinho. Uma parcela do material retirado dela por mergulhadores de Pernambuco encontra-se em exposição no Espaço Cultural da Marinha no Rio de Janeiro e a outra com particulares (RIOS, 2010). Durante o mergulho é possível encontrar ossos humanos (mandíbula, tíbia e fíbula) das vítimas do naufrágio, espalhados pelo leito marinho, dessa forma a Corveta Camaquã pode ser considerada também um sítio santuário de heróis da Segunda Guerra Mundial em águas brasileiras. 21 Peça estrutural básica de embarcação (CHERQUES, 1999). 22 Início da construção da quilha (CHERQUES, 1999). 23 Data em que a embarcação foi lançada pela primeira vez ao corpo d água. 24 Data de incorporação à Marinha do Brasil 25 Distância máxima horizontal de uma lateral a outra (CHERQUES, 1999). 26 Distância vertical medida da linha de flutuação à face inferior da quilha (CHERQUES, 1999) Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 85

Circuito e Placas No que concerne a ordenação dos dados para a distribuição e disposição do circuito, apresentar-se-á apenas a parte externa da embarcação, acessórios e apêndices (proa, costado, hélice, lemeâncora, pau de carga). Serão dispostas onze placas no circuito, da primeira à última respectivamente, fazendo alusão à: Informações sobre o navio; Âncora, ainda presa ao costado, que demonstra sua condição de navegação no momento do sinistro; Condição intacta do costado 27, o que refuta o mito criado por uma parcela da população de que o navio teria naufragado por torpedeamento causado por submarino; Instrumentos de navegação e propulsão do navio; Cargas de profundidade, armamento explosivo de combate a submarinos, que se espalharam pelo leito marinho após o naufrágio; Pau de carga ou turco, apêndice da embarcação que servia para embarque e desembarque de carga; Timão e Bitácula 28, instrumentos que serviram para dar direção e orientam à embarcação durante sua singradura; Ponte de comando, estrutura de comando da embarcação, cuja deterioração acabou se desmantelando; Armamentos da embarcação localizados à proa, compostos pelo canhão de 102 mm, e metralhadoras 20 mm; Cabrestante, mecanismo utilizado para lançar e recolher as âncoras; Placa final que agradece aos mergulhadores pela visita e colaboração quanto à preservação e manutenção do sítio de naufrágio. 27 Parte do forro exterior do casco da embarcação a plena carga, acima da linha de flutuação. (CHERQUES, 1999). 28 Pedestal fixo na ponte de comando, onde se aloja a agulha de marear (CHERQUES, 1999). Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 86

Figura 03: Croqui da Corveta Camaquã (Fonte: M. Carvalho, modificado) e placas informativas. Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 87

Espera-se que essa nova modalidade de mergulho venha a cooptar um maior número de adeptos, haja vista o novo produto oferecido e o despertar por parte da comunidade de mergulho pela maritimidade, bem como a criação de uma identidade marítima. Outros naufrágios serão objeto de estudo, só que em profundidades distintas de modo a permitir que outras categorias de mergulhadores possam usufruir do patrimônio subaquático existente no Parque de Naufrágios de Pernambuco. Referência ARAUJO, J. G. Naufrágios e afundamentos: costa do Brasil - 1503 a 1995. Salvador: IGHB, 2000. BARRETO NETO, R. C. Flores ao mar: os naufrágios navais brasileiros na Segunda Guerra Mundial. Salvador: Presscolor, 2006. BOITEUX, B. T.; WERNER, M. Introdução ao estudo do turismo. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. BRUNO, M. C. O. Musealização da Arqueologia. Lisboa: Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologia, 1999. BRUNO, M. C. O. Museologia e turismo: os caminhos para a educação patrimonial. São Paulo: Coordenadoria de Ensino Técnico, 1998. CHERQUES, S. Dicionário do Mar. São Paulo: Globo, 1999. DIRETORIA DE PORTOS E COSTAS (BRASIL). Normas da Autoridade Marítima parapesquisa, Exploração, Remoçãoe Demolição de Coisas e Bens Afundados,Submersos, Encalhados e PerdidosNormam -10. Rio de Janeiro: Marinha do Brasil, 2003. DIRETORIA DE PORTOS E COSTAS (BRASIL). Normas da Autoridade Marítima para as Atividades Subaquáticas Normam -15. Rio de Janeiro: Marinha do Brasil, 2003. FONSECA, M. M. Arte Naval. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha, 2005. GARRISON, T. Fundamentos da Oceanografia. São Paulo: Cengage Learning, 2010. GUEDES, M. J. História Marítima do Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Marinha, Serviço de Documentação, 1986. IBGE. Disponível em: www.ibge.gov.br. Acesso em 17.12.2014. La convención de la Unesco sobre la protección del Patrimonio Cultural Subacuático. Paris: 2001. Fumdhamentos (2014), vol. XI, pp.134-145. 88

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