ANAIS DO II SEMINÁRIO SOBRE GÊNERO: Os 10 anos da lei Maria da Penha e os desafios das políticas públicas transversais

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Transcrição:

A CONCEPÇÃO DAS MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ATENDIDAS PELO CENTRO DE REFERÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO MUNICÍPIO DE NOVA ESPERANÇA. Daniele Moro (moro.dani@hotmail.com), Maria Inez Barboza Marques (marques@sercomtel.com.br), Rosani Borin (borinrosani@gmail.com) UNESPAR/Campus Paranavaí/PR Resumo: Este trabalho tem por objetivo estudar a concepção de mulheres vítimas de violência doméstica atendidas pelo Centro de Referência de Assistência Social, no município de Nova Esperança- PR. Evidenciou-se aspectos específicos relacionados à violência doméstica a partir da discussão de gênero, demonstrando os avanços legais e as políticas direcionadas às mulheres vítimas de violência doméstica. O trabalho retrata, também, a trajetória do desenvolvimento das políticas públicas para a defesa das mulheres e a eficácia da Lei Maria da Penha no que se refere à efetivação das medidas protetivas previstas pela Lei. Demonstrou-se, através de pesquisa qualitativa de cunho exploratório, o contexto e a vivência da violência doméstica por parte das mulheres entrevistadas. Palavras chaves: Violência de Gênero; Violência Doméstica; Medidas Protetivas. Introdução Gênero constitui-se uma construção social do masculino e do feminino, fruto de um processo social e histórico, no qual não compete deixar de fora a questão dos sujeitos envolvidos, estando relacionado o processo social e o biológico (LOURO, 1996). Segundo Pereira (2008), as relações de gênero surgem de uma construção sociocultural, que leva a compreender uma realidade vivenciada por homens e mulheres, sendo fruto da biologia, como se estes já nascessem com características próprias de seu sexo. Gênero pode ser entendido como a construção sociocultural do masculino e do feminino, a socialização da masculinidade e da feminilidade dominantes. Em termos práticos, são os papéis ensinados às meninas e mulheres e aos meninos e homens. (INSTITUTO PATRÍCIA GALVÃO, 2004, p.27 apud PEREIRA, 2008). A violência de gênero, também chamada violência contra a mulher, ocorre no mundo inteiro e atinge diversas mulheres em todas as idades, graus de instrução, classes sociais, raças/etnias e orientação sexual. Essa problemática, em seus aspectos de violência física, sexual, psicológica e social,

está diretamente relacionada ao poder, em que de um lado impera o domínio dos homens sobre as mulheres, e do outro, há uma ideologia dominante, que lhe dá sustentação (BRASIL, 2003). Rocha (2007) enfatiza que a violência de gênero é resultado de relações desiguais e hierárquicas, que têm sua essência na dominação masculina aliada a outros elementos que a legitimam. Saffioti (1987) destaca que as relações entre homens e mulheres demonstram que as desigualdades são construídas historicamente numa relação de exploração-dominação e privilégio dos homens em detrimento das mulheres. Isso quer dizer que os valores e ideias existentes na sociedade estabelecem uma hierarquia de poder entre os sexos e faz com que a relação dominação/submissão entre homem e mulher esteja presente em todos os papéis sociais que são estabelecidos na família, nas instituições ou trabalho, nas igrejas, nos sindicatos e nos partidos políticos. Segundo Saffioti (2001) a violência doméstica e familiar está compreendida na violência de gênero, podendo ocorrer no interior do domicílio ou fora dele, embora seja mais freqüente o primeiro caso. A lei 11.340/06, Lei Maria da Penha (BRASIL, 2006), define a violência doméstica e familiar contra a mulher como: qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe (à mulher) cause morte, lesão, sofrimentos físicos, sexuais ou psicológicos e dano moral ou patrimonial. Materiais e Métodos Essa pesquisa teve como base uma abordagem qualitativa (Minayo, 1994) com entrevista gravada, semiestruturada (Triviños, 1997), seguindo um roteiro composto por questões abertas, divididas em quatro eixos de análises: Perfil das mulheres vítimas de violência; Concepção destas em relação à violência e à violência doméstica; Medidas protetivas; Superação das violências vividas. Os dados foram coletados em 2009 no Centro de Referência de Assistência Social- CRAS, de Nova Esperança- PR, com três mulheres, usuárias da assistência social, com idade entre 30 a 40 anos, moradoras em bairros periféricos do mesmo município e que denunciaram seus agressores ou que sofreram violência doméstica. O universo da pesquisa, parte do número de

atendimento geral do CRAS (1.711) no primeiro semestre de 2009, e portanto, a partir dos casos identificados. Resultados e Discussões A pesquisa demonstrou que as classes mais vulneráveis estão mais suscetíveis ao aumento da violência doméstica, esteja ela ligada à situação econômica, à falta de conhecimento, baixo grau de escolaridade, ou pela submissão existente perante o companheiro por este ser o provedor da família. Segundo Rocha (2007), as dificuldades enfrentadas pelas vítimas de violência doméstica não são poucas, pois as questões de trabalho, renda e habitação, são os principais problemas enfrentados por elas, sendo que, a dependência econômica da mulher em relação ao homem, aparece como um dos elementos utilizados para a manutenção das relações violentas. Em relação ao requerimento das medidas protetivas, a violência física é a principal queixa das entrevistadas. Segundo elas, foi em decorrência das agressões físicas que resolveram tomar esta decisão, pois o fato de ter seu corpo marcado pela violência é uma forma de mostrar que realmente foi agredida e que necessita de proteção. Priori (2007) aponta que as vítimas enfrentam muitas barreiras ao realizarem as denúncias e requererem a punição de seus agressores, pois tais ações, na maioria das vezes, acabam culminando no encorajamento da violência, pois os agressores continuam impunes ou passíveis de condenação. Ressalta-se que a denúncia só ocorre após as agressões físicas, demonstrando que o tempo sofrido de violência psicológica, embora seja significativo (de cinco a onze anos, segundo as sujeitas desta pesquisa), não é denunciada de imediato. No entanto, as entrevistadas disseram que a violência psicológica dói na alma. Subentende-se então, que ainda existe uma falta de legitimidade quando se trata de violência psicológica, embora ela esteja muito presente. A violência psicológica ou emocional tem por objetivo degradar ou controlar as ações, crenças e decisões de outra pessoa, por meio de intimidação, manipulação, ameaça direta ou indireta, humilhação, isolamento ou qualquer outra conduta que implique em prejuízo à saúde psicológica, à autodeterminação ou ao desenvolvimento pessoal (Lei 11.340/06).

A Lei Maria da Penha (Lei n.11.340/06) classifica em seis os tipos de violência doméstica: violência psicológica ou emocional, física, sexual, moral, patrimonial e social. No que se refere ao conhecimento sobre a Lei Maria da Penha, as entrevistadas reconhecem sua importância para a segurança, proteção e manutenção da integridade física, moral e psicológica das vítimas de violência. A partir das falas das pesquisadas, pode-se observar que a superação é muito difícil e, mesmo quando ocorre, não é alcançada por completo. Isso ocorre, principalmente, por conta da subalternidade feminina no interior de uma relação hierarquizada e reprodutora dos papéis sociais alimentados pela dominação patriarcal. Nesse sentido, Priori (2007) ainda esclarece que a violência de gênero acarreta uma série de fatores emocionais nas vítimas, tais como medo, constrangimentos e abalos psíquicos, devido à opressão em que vivem, contribuindo assim, para infringir nas mesmas o sentimento de culpa, inferioridade e isolamento. Ainda em concordância com Rocha (2007), as violências sofridas transformam a vida da mulher, tornando-a insegura; passando a não acreditar mais em suas capacidades e em seu valor e na possibilidade de ter autonomia para dominar sua própria vida. Considerações Finais Esse estudo alcançou os objetivos propostos, pois qualitativamente, constatou-se a concepção das mulheres vítimas de violência doméstica atendidas pelo CRAS de nova Esperança. Evidenciou-se que as marcas da violência doméstica são irreversíveis e que a superação de fato não existe, pois todas elas vivem em constate processo de retomada da própria identidade como mulher, protagonistas da sua própria história. A Lei Maria da Penha é um instrumento legal de extrema importância no que se refere ao combate à violência contra mulher e à violência doméstica e deve ser amplamente divulgada e trabalhada no contexto das diferentes políticas sociais públicas.

As discussões relacionadas às questões de gênero são ainda inexistentes em alguns contextos, embora já exista um histórico de avanços e conquistas, materializados, inclusive, em um Plano Nacional de Políticas para Mulheres. Entretanto, existem avanços que são frutos das lutas oriundas dos movimentos sociais e feministas, aliados ao comprometimento do poder público em efetivar políticas que levem em conta as discussões de gênero como sendo fundamentais dentro de uma sociedade composta por sujeitos de direitos, homens e mulheres, que podem ser protagonistas de uma reconstrução social, sem exploração/submissão e/ou discriminação de raça/etnia, classe social e sexo/gênero. Conclui-se que embora existam políticas voltadas para as mulheres e a própria Lei Maria da Penha, instrumentos conquistados com muita luta, a efetivação desses mecanismos depende do comprometimento de um conjunto de atores, que envolve a sociedade civil e o poder público, nos níveis municipal, estadual e federal. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei Maria da Penha. Lei N. 11.340, de 7 de Agosto de 2006. BRASIL. Programa de Prevenção, Assistência e Combate à Violência Contra a Mulher Plano Nacional: diálogos sobre violência doméstica e de gênero: construindo políticas públicas. Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres: Brasília, 2003. INSTITUTO PATRÍCIA GALVÃO. Violência Contra as Mulheres. Campanha onde tem violência, todo mundo perde. São Paulo, 2004. LOURO, Guacira Lopes. Nas redes do conceito de gênero. In:. Gênero e Saúde. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. MINAYO, Maria Cecília de Souza. Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 1994. PEREIRA, Beatriz dos Santos. O ciclo da violência e a contribuição das medidas protetivas de urgência, previstas na lei Maria da Penha, para o seu rompimento. 2008. 90 f. Trabalho de Conclusão decurso (Serviço Social) Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2008. PRIORI,Claudia. Retratos da Violência de Gênero: Denuncias na delegacia da Mulher de Maringá (1987-1996). 1 edição. Maringá: Eduem, 2007. ROCHA, Lourdes de Maria Leitão Nunes. CASAS-ABRIGO: No Enfrentamento da Violência de Gênero. 1 edição. São Paulo: Veras,2007. SAFFIOTTI, Heleieth I. B. O poder do macho. 9 edição. São Paulo: Moderna,1987., H.I.B. (2001) Contribuições feministas para o estudo da violência de gênero. Cadernos Pagu,16, p.115-136. TRIVIÑOS. Augusto. Introdução à pesquisa em ciências sociais. São Paulo: Ed. Atlas, 1997.