CORRELAÇÃO DA PRÉ-ESTAÇÃO COM A ESTAÇÃO CHUVOSA NA BACIA HIDROGRÁFICA DO AÇUDE EPITÁCIO PESSOA Francisco de Assis Salviano de Sousa, DCA/CCT/UFPb, e-mail: fassis@dca.ufpb.br Josiclêda Domiciano Galvíncio, CPGM/CCT/UFPb, e-mail: josicle@dca.ufpb.br ABSTRACT The objective of the paper is to identify by the use of multiple correlation technique areas in the Paraiba river basin, upstream of the Boqueirão dam, which show a positive correlation between rainfall during and before the rainy season. Monthly rainfall totals during eleven years at ten stations in the region are used in the study. The results indicate the influence of two systems in the area: the ITCZ and the cold front disturbences. INTRODUÇÃO As águas armazenadas no açude Epitácio Pessoa, localizado na cidade de Boqueirão, no Estado da Paraíba, são captadas pela sub-bacia hidrográfica do Alto Paraíba e bacia do Rio Taperoá. Essas sub-bacia e bacia têm área de aproximadamente 14 mil quilômetros quadrados que corresponde a 24,7% da área do Estado e estão inseridas na região mais seca do Estado, o Cariri paraibano, parte da região semi-árida do Nordeste brasileiro. O açude Epitácio Pessoa, popularmente conhecido por açude de Boqueirão, é responsável pela produção de água para o abastecimento público de cerca de quinhentas mil pessoas (considerando apenas os habitantes das cidades ribeirinhas e da mais importante e populosa delas: Campina Grande, distante 42 km do açude. Dessas, cerca de cento e quarenta mil residem nas cidades ribeirinhas de Aroeiras, Mogeiro, Salgado de São Félix, Itabaiana, Pilar, Juripiranga e São Miguel da Taipu, todas à jusante da barragem do açude. Campina Grande enfrentou, de outubro de 1998 a abril de 2000, um racionamento de 50%, necessário para evitar o colapso do sistema, no seu abastecimento de água devido ao baixo nível do reservatório, conseqüência direta da pouca quantidade de chuva ocorrida no ano de 1998 nas sub-bacia e bacia do reservatório. Apesar de tardia, a opção pelo racionamento foi acertada visto que as chuvas do ano seguinte (1999) não foram suficientes para recuperar, de forma satisfatória, o volume do açude. Historicamente busca-se uma explicação para alta variabilidade espacial e temporal da precipitação da região Nordeste em geral, em particular para a região semi-árida. Cinco fenômenos de larga escala podem influenciar a precipitação pluvial no Nordeste do Brasil: o fenômeno conhecido por El-Niño, que é o aquecimento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico ao longo da região equatorial, segundo Hastenrath; Heller (1977), as Ondas de Leste, a Zona de Convergência Intertropical, as Perturbações de Frentes Frias e os Vórtices de Circulação do Ar Superior (VCAS). O objetivo deste trabalho é o de identificar, através do uso da correlação múltipla, áreas, na sub-região de estudo (sub-bacia e bacia do açude de Boqueirão) que apresentam correlações positivas entre a precipitação pluviométrica da pré-estação e da estação chuvosa e, em seguida associar as chuvas dessas áreas aos fenômenos de larga escala supracitados. MATERIAL E METODOS Para o cálculo das correlações foram utilizados os totais mensais precipitados, dos meses novembro e dezembro (pré-estação chuvosa) e janeiro, fevereiro, março, abril e maio (estação chuvosa, com onze anos de observações concomitantes: 1970, 1971 1975, 1976, 1977, 1978, 1981, 1982, 1983, 1984, 1985. Os postos desses dados localizam-se nos Municípios de Camalaú, Cabaceiras, São João do Tigre, Desterro, Soledade, Gurjão, Pocinhos, Prata, Coxixola e Boqueirão, todos pertencentes à sub-região de estudo. Uma observação importante é que os anos de 1981, 1984 e 1985, da série dos totais precipitados, foram os anos em que o açude apresentou cota máxima, ou seja, transbordou água pela soleira do vertedor. Portanto, esses anos podem ser classificados como muito chuvosos. 1386
RESULTADOS E DISCUSSÃO A Figura 1 mostra a localização espacial dos postos utilizados no estudo para o cálculo das correlações. SOL POC DES GUR PRA COX CABOQ CAM SJT Figura 1. Estações: Soledade (SOL), Pocinhos (POC), Gurjão (GUR), Desterro (DES), Cabaceiras (CAB), Boqueirão (BOQ), Coxixola (COX), Prata (PRA), Camalaú (CAM) e São João do Tigre (SJT) A Tabela 1 apresenta os coeficientes de correlação entre a pré-estação (novembro) e a estação chuvosa (janeiro a maio) para os dez postos estudados. Aqui analisar-se-á o sinal da correlação e não o seu valor numérico, visto que investiga-se a origem da umidade que produz chuva sobre a área de estudo. Portanto, nota-se ao final das colunas três a sete dessa Tabela 1, os valores percentuais de ocorrência de correlação positiva entre a pré-estação e a estação chuvosa. Na contabilidade geral verifica-se que o mês de março é o mês que agrega o maior percentual de ocorrência de correlação positiva. 1387
Tabela 1. Coeficientes de correlação entre a pré-estação e a estação chuvosa janeiro fevereiro março abril Maio Postos (1) (2) (3) (4) (5) (6) (7) Camalaú Cabaceiras São João do Tigre Desterro Soledade Gurjão Pocinhos Prata Coxixola Boqueirão 0.01 0.66-0.09-0.01 0.03 - - 0.82 0.45-0.19 0.48 0.27-0.16-0.06 0.13 0.05 0.42-0.45-0.31-0.21-0.14-0.12 0.18 0.22 0.72 0.16 0.39 0.68 0.27 0.12 0.13 0.25 0.37 0.76 084-0.09 0.68 0.09-0.07 0.38 0.63 0.18-0.25 0.06-0.44 - -0.24-0.32-0.18 0.75 0.33-0.32-0.14 0.28-0.46-0.12-0.15 0.33-0.18 0.67-0.36-0.31 0.34 - -0.27-0.11 0.08-0.30 50% 50% 85% 40% 35% As Figuras 2 e 3, mostram que as chuvas sobre a área de estudo concentram nos meses de marco e abril. Pode ser visto na Figura 2, com onze postos pluviométricos, que as chuvas concentram-se em meados do mês de março. Já na Figura 3, com seis postos pluviométricos, as chuvas concentram-se em meados do mês de abril. Pode ser notado ainda que os valores numéricos das chuvas concentradas em meados de março (Figura 2) são bem maiores que aqueles apresentados em meados do mês de abril (Figura 3). Em resumo tem-se: mais chuva e mais postos concentrados em meados do mês de março. Isto explica em parte o maior percentual de ocorrência de correlações positivas no mês de março. Ou seja, explica o porquê de o mês de março ser o mês dominante das chuvas na sub-região do Cariri paraibano. 200 Precipitação (mm) 150 100 50 0 JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ Meses TAPEROA SUMÉ SOLEDADE S.J.CARIRI S.S.UMBUZEIRO S.J.TIGRE PRATA CONGO CARAUBAS BOA VISTA B.S.MIGUEL Figura 2.Precipitação média mensal com máximos em meados dos meses de março e abril. 1388
Precipitação (mm) 160 140 120 100 80 60 40 20 0 JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ Meses ALGODÃO S.BRANCA OLIVEDOS JUAZEIRINHO GURJÃO CABACEIRAS Figura 3. Precipitação média mensal com máximos em meados dos meses de março e abril As correlações, colunas três a sete, da Tabela 1, foram distribuídas espacialmente sobre a região de estudo e verificou-se que: as correlações dos meses novembro janeiro, novembro fevereiro e dezembro fevereiro foram consideradas muito fracas. Já as correlações dos meses de novembro abril, novembro maio, dezembro abril, dezembro maio apresentaram campos de precipitação indefinidos. janeiro apresentaram correlações muito fortes. março apresentaram correlações muito fortes com precipitação de Noroeste (direção e sentido em que atua a ZCIT na área de estudo). Os meses de dezembro março apresentaram correlações fracas e indicaram precipitação de Sul (direção e sentido das perturbações de frentes frias na área de estudo). As Figuras 4 e 5 mostram as correlações espaciais mais significativas, com relação ao sentido e direção da precipitação. Figura 4. Correlação da precipitação entre os meses de novembro e março 0.70 0.65 0.60 0.55 0.50 0.45 0.30 0.25 0.15 0.10 0.05-0.05 1389
0.80 0.70 0.60 0.50 0.30 0.10 Figura 5. Correlação da precipitação entre os meses de dezembro e março. - -0.30 CONCLUSÕES Pode-se utilizar a correlação múltipla, como ferramenta, para identificar áreas que apresentam correlações positivas entre a precipitação pluviométrica da pré-estação e da estação chuvosa e, em seguida associar essa precipitação ao fenômeno que a provocou. Mas, poderá haver confusão nessa identificação quando os coeficientes de correlação forem excessivamente fracos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS HASTENRATH, S.; HELLER, L. Dynamics of climate hazards. in Northeast Brazil. Quartely Journal Royal Meteorological Society. 103, 77 92, 1977. 1390