SOCIALIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO: POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO

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Transcrição:

23 SOCIALIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO: POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO Márcio Felipe Albuquerque Prazim da Silva 1 Gustavo Henrique de Araújo Freire 2 RESUMO Identifica possíveis contribuições que nascem da interface entre a Ciência da Informação (CI) e a Educação, relacionando a temática da socialização da informação a contribuições de Paulo Freire. Trata-se de parte de estudo teórico desenvolvido na dissertação Socialização da Informação: intersecções temáticas entre a Ciência da Informação e a Educação. Destaca que a CI e a Educação têm construído uma interface fecunda, principalmente no campo da socialização da informação, considerando fundamentos da pedagogia freiriana e que essa relação pode trazer contribuições mais significativas com o aprofundamento dos estudos. Palavras-chave: Socialização da informação. Ciência da Informação (CI). Educação. Paulo Freire. ABSTRACT Identifies possible contributions that arise from the interface between Science Information (SI) and Education, linking the issue of information socialization for Freire s contributions. It is part of theoretical study developed in the dissertation Information Socialization: thematic intersections between Science Information and Education. Highlights that the SI and Education have built a rich interface, especially in the field of information socialization, considering the fundamentals Freire s pedagogy and that this relationship can bring more significant contributions to the deepening of the studies. Keywords: Information Socialization. Science Information (SI). Education. Paulo Freire. 1 INTRODUÇÃO A socialização da informação, temática emergente da Ciência da Informação (CI) na década de 1990, ainda continua em emergência na atualidade, fazendo-se necessário fazer revisão e desenvolver novas pesquisas abordando esse campo promissor que traz o usuário da periferia para o cerne do processo de construção da informação e do conhecimento. Este estudo advém de parte da dissertação Socialização da Informação: intersecções temáticas entre a Ciência da Informação e a Educação, e visa identificar possíveis contribuições que nascem da interface entre a CI e a Educação, relação ainda pouco explorada 1 Mestre em Ciência da Informação. E-mail: marcioprazim@yahoo.com.br 2 Doutor em Ciência da Informação. Professor no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação. E- mail: ghafreire@gmail.com

24 nos estudos de CI, mas que pode ser bastante frutífera para ambos os campos na chamada sociedade do aprendizado contínuo ou do aprendizado em rede. O diálogo com o campo educacional, na dissertação, se dá, principalmente, por meio da obra Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, que já serviu de base para outros estudos no campo da CI, mas que ainda traz relevantes contribuições, desde a formação do contexto comunicativo, passando pela construção e reconstrução de produtos informacionais. A socialização da informação compreende atividade complexa, no entanto, mais democrática e humanizada, que envolve uma série de conhecimentos, metodologias e visa a superar visões tradicionais, baseadas na eficiência do sistema de informação, fontes informacionais e no documento. Constitui-se como campo científico ainda longe de ser esgotado e que pode trazer grande contribuição para os estudos de CI, principalmente quando relacionada à proposta pedagógica de Paulo Freire. Observa-se que o diálogo com esse educador brasileiro pode trazer significativas contribuições para o campo da CI e, mais especificamente, para a discussão da socialização da informação. 2 A SOCIALIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO NO ÂMBITO DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO De acordo com Loureiro (2009), o termo socialização vem do latim socius, que significa associado. O conceito faz parte das ciências humanas e sociais e compreende uma série de concepções. Além disso, as propostas de concretização fundamentam modelos e mecanismo diversificados. A expressão socialização da informação, conforme Leite (1996), aparece nos estudos de Comunicação Científica e Sociologia do Conhecimento Científico, compreendendo temáticas como, comunicação e divulgação científica, estrutura, fluxo e representação do conhecimento, tornando-se especialidade emergente da CI, segundo Heloísa Christovão e Gilda Braga (1997), na década de 1990. Conforme Oliveira (2005), a socialização da informação, na medida em que destaca a função social da informação e a harmoniza com a concepção da CI, considera também pressupostos, novas teorias e valoriza a intertematicidade. Silva e Marinho Junior (1996) entendem que diversos elementos compreendem um trabalho de socialização da informação e partem de duas definições associadas para configurar caminhos e níveis que podem ser realizados para se desenvolver um projeto de socialização da informação. Observa-se, com base em revisão de literatura, a existência de dois conceitos de socialização da informação presentes no campo da CI: (1) um conceito lato sensu, mais geral, que entende a socialização da informação como processo de disseminação de informação (HENIE, PINHEIRO e LOPES, 2001; REBELO e STEMPLIUK, 2007), e (2) um stricto sensu, mais específico, que ratifica um processo de parceria (emissores e receptores/produtor e usuário) em relação à construção e tratamento informacional, defendido principalmente por Christovão e Braga (1994) nas pesquisas de CI. Este estudo é focado, principalmente, nessa vertente específica, seguida por vários estudos do campo (SILVA e MARINHO JUNIOR, 1996; FREIRE, G., 2000; LOUREIRO,

25 2002, 2009; FREIRE, I, 2004 e 2008, etc.), que, de acordo com Christovão e Braga (1994, p. 14), entende a socialização da informação: (...) não só como a 'tradução' da informação científica e tecnológica para o público em geral, mas principalmente como a construção, tratamento e divulgação da informação de diferentes tipos em parceria, ou seja, a partir da definição conjunta por parte de produtores e usuários, que aqui se confundiriam, de suas necessidades, e de quais seriam os caminhos (metodologias) mais adequados para atendê-las. A linha de pensamento desenvolvida por Braga e Christovão (1994) se aproxima de muitas orientações da pedagogia freiriana, que considera experiências de vida, a linguagem e historicidade do homem, a participação na construção e modificação da sociedade. Essa participação não pode ser vista de maneira diferente no processo de construção informacional, que tem de ocorrer de forma mais democrática, responsável e cidadã, fazendo com que produtores e usuários atuem juntos como sujeitos do processo. O processo de socialização da informação, como já destacado, compreende muitas etapas. Inicialmente, faz-se mister desenvolver um contexto comunicativo ideal. Silva e Marinho Junior (1996) dizem que um dos percursos possíveis pode acontecer por meio da Teoria da Ação Comunicativa (TAC), de Jürgen Habermas, mas destacam que esse não é o único percurso. 3 FORMAÇÃO DE CONTEXTO COMUNICATIVO Em estudo de CI, Silva e Marinho Junior (1996) tratam da identificação de parâmetros para a fomentação de uma realidade comunicativa onde a socialização da informação possa se desenvolver a partir da TAC. Esta, associada aos conceitos de socialização da informação de Nora e Minc (1978) e Christovão e Braga (1994), pode criar um contexto específico cujas atividades comunicativas sejam pertinentes à implementação de ações que favoreçam a socialização da informação. Conforme Silva e Marinho Junior (1996, p. 467): (...) um dos primeiros passos para o desenvolvimento de um estudo sobre socialização da informação é a criação de um contexto comunicativo, no qual estejam presentes produtores e usuários da informação com a qual se pretenda trabalhar. A área de proveniência dos referidos integrantes do grupo já deverá ter sido previamente definida (educação, saúde, arquivística, economia, etc.). Silva e Marinho Junior (1996) dizem que Habermas considera experiências, cotidiano, mundo vivido, senso comum de pessoas em geral, objetivando criar aproximações de realidades afastadas e apartadas e trabalha principalmente com três elementos: (1) diálogo, (2) linguagem e (3) grupo. Quanto mais próximo do grupo, melhor será a aplicação da TAC. Isto implica que o contexto de origem seja, ao mesmo tempo, origem e fonte de recursos (SILVA e MARINHO JUNIOR, 1996, p. 469). Para Silva e Marinho Junior (1996):

26 A TAC é uma grande revolução em todos os sentidos, ante as alterações sugeridas em sua abordagem para o desenvolvimento da relação/interação entre pessoas que formem um grupo. A ciência da informação, se analisada sob a ótica do paradigma emergente de Boaventura Santos, encaixa-se perfeitamente na teoria que Habermas oferece, facilitando o entendimento e a compreensão dos processos informacionais e comunicacionais em direção à socialização. Neste sentido, poder superar as barreiras da individualidade por meio de uma ação com base na coletividade, da construção realizada pelo grupo e para ele, possui expectativas positivas para o tratamento da informação. Quando as atividades dos profissionais da informação não se norteiam pelos misteres da coletividade que fazem parte do contexto do grupo, os resultados, sob o aspecto social, serão limitados. Segundo os autores, Ao usarmos o contexto dos grupos como fonte e origem de recursos, estaremos valorizando e reforçando os laços e as referências que são importantes para o exercício da cidadania (SILVA e MARINHO JUNIOR, 1996, p. 469). Pode-se observar vários elementos que aproximam a TAC da pedagogia desenvolvida por Paulo Freire e, concomitantemente, da temática da socialização da informação, sob o ponto de vista específico da CI: A teoria freiriana (1996), assim como a de Boaventura Santos e a de Jürgen Habermas, considera as experiências dos sujeitos, inclusive como ponto de partida e fonte para o diálogo, como é bem trabalhado na Pedagogia do Oprimido (2005). Freire (1996) tenta acabar com dicotomias como teoria/prática, sujeito/objeto, entre outras, que não permitem que o homem se realize em sua totalidade. De certa forma, Paulo Freire também pode ser considerado pós-moderno, claro que, como defende (2011), à maneira dele. Os três elementos principais trabalhados por Habermas na TAC (linguagem, diálogo e grupo) também são compreendidos na teoria dialógica de Paulo Freire (2005) ou podem ser substituídos por outros semelhantes. Os três contextos enumerados por Silva e Marinho Júnior (1996) (1) contexto de origem, (2) de mediação e (3) de desenvolvimento, e seus respectivos elementos, podem se relacionar a noções, orientações procedimentais e ações propostas por Paulo Freire na investigação de temas geradores, encontrada na Pedagogia do Oprimido. Diante disso, defende-se que a pedagogia de Paulo Freire pode trazer relevantes contribuições para o campo da CI, principalmente no âmbito da socialização da informação. Segundo Loureiro Conceitos e noções instrumentalizados por Freire em seu sistema pedagógico são empregados nas ações de socialização da informação, como especialidade da Ciência da Informação, de modo a subsidiar a horizontalidade orgânica de seus processos infocomunicacionais (LOREIRO, 2002, p. 63).

27 4 CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO Em campo bastante próximo da CI, o campo da Comunicação, observa-se a relevância de Paulo Freire. O estudo de Stumpf e Branco (2010), que investigou a produção científica em Ciências da Comunicação, a partir da Revista Brasileira de Ciências da Comunicação Intercom, situa Paulo Freire na quinta colocação em relação aos nomes mais citados, estando à frente de Guilherme Orozco Gómez, César Ricardo Siqueira Bolaño, Jürgen Habermas, Néstor García Canclini, Sérgio Caparelli, Roland Barthes, Muniz Sodré e Humberto Eco. A CI possui trabalhos que se fundamentam em estudos desse pedagogo, mas o número de citação desse teórico educacional está bem aquém em relação à citação em outras áreas do conhecimento. Em pesquisa realizada em base de dados da CI Base de Dados Referenciais de Artigos de Periódicos em Ciência da Informação BRAPCI, colocando-se o nome desse pedagogo entre aspas, considerando todos os descritores, vê-se a escassa, para não dizer insignificante, menção feita a Paulo Freire, pelo menos nessa base de dados. Dos poucos estudos que consideram o educador, pode-se destacar os trabalhos de Loureiro (2002) e Freire (2000). No entanto, vê-se que Paulo Freire pode trazer grandes contribuições para a temática da socialização da informação. Os estudos de Silva e Marinho Junior (1996), Leite (1996), Loureiro (2002; 2009) e Freire (2000), direta e indiretamente, foram seminais para relacionar a temática da socialização da informação à obra de Paulo Freire. O escopo do estudo de Loureiro (2002) considera, de maneira essencial, o conceito de práxis, conforme foi fomentado pelo materialismo dialético. A práxis se realiza como uma ação criticamente reflexiva. De acordo com o autor, entre os estudiosos de linha marxiana que pensaram acerca da práxis, Paulo Freire é o que guarda relações mais estreitas com a socialização da informação, como especialidade da CI. De acordo com Loureiro (2002, p. 63): Em sua obra, [Paulo Freire] reconhece a realidade social e objetiva como fruto da ação humana e, assim, a transformação dessa realidade se constitui tarefa histórica que compete aos homens enquanto seres da práxis. (...) Ação e reflexão não se dão em bases dicotômicas, mas simultaneamente, e direcionadas à transformação de estruturas, quer sejam cognitivas, culturais ou mesmo sócio-políticas. (grifos do autor) A pedagogia de Paulo Freire pode ser bem usada nas ações de socialização da informação. Na socialização da informação, no contexto da CI, a obra freiriana pode contribuir não apenas por tentar explicar a realidade do sujeito, mas por valorizar a construção de relações por meio de um diálogo com eles, para intervir na realidade e construir um produto informacional a partir do interesse da coletividade. Assim, a dialogicidade se mostra como essencial ao processo. Com base na ação dialógica, a mudança do mundo acontece a partir da colaboração (participação) dos sujeitos. Nas palavras de Petrucci e Pimenta (2010, p. 140): A contribuição da educação, numa perspectiva freireana, traduz-se na opção pelo diálogo e também pelo conflito, assumindo-se, mesmo com paradoxos, a construção coletiva para articular em rede os diversos

28 conhecimentos considerados válidos pelo grupo. Especificamente a educação popular viabilizada pelo método freireano ao tomar a cultura local como peça central para a conscientização e para a atuação do sujeito cognoscente exige deste o desenvolvimento de sua capacidade de interagir criticamente no contexto sócio-político, econômico, cultural e tecnológico. Ainda na década de 1990, um projeto pioneiro de socialização da informação desenvolvido no campo da CI, coordenado por Gilda Braga e Heloísa Christovão, considerou as contribuições, direta e indiretamente, de Paulo Freire, construindo relação interdisciplinar, principalmente, entre o campo da CI e da saúde. Acerca do conceito de socialização da informação desenvolvido pela equipe do Projeto Integrado de pesquisa Socialização da Informação: desenvolvimento de metodologias para a sua efetivação. Estudo aplicado às áreas de Ciência da Informação e de Saúde (Projeto Saci), Freire (2000, p. 101-102) diz: O nosso propósito foi construir um produto de informação a partir da interação com seus usuários potenciais, levando em consideração sua visão de mundo, suas formas de expressão e meios de comunicação, de modo a contribuir para o desenvolvimento de instrumentos de socialização da informação. Um produto de informação a partir do conhecimento próprio das pessoas que poderão vir a usá-lo, na sociedade. E construí-lo mediante um modelo interativo que relacione as funções de produção e de transferência, permitindo uma troca efetiva entre produtor e usuário da informação nas várias etapas em que esta é produzida e distribuída aos seus usuários potenciais. Em artigo, Freire (2000) aborda experiência realizada como resultado de dissertação defendida no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, Convênio CNPq/IBICT-UFRJ/ECO. De acordo com o cientista da informação, a ideia da pesquisa veio do desejo de desenvolver um trabalho que viesse a contribuir para a geração de novos conhecimentos na temática socialização da informação e tornou-se madura durante a participação como membro do projeto. O autor em sua pesquisa incluiu a área de Educação às anteriormente previstas no Projeto Saci (Ciência da Informação e Saúde), ao escolher como campo de pesquisa um espaço informacional voltado para a educação de jovens, a Escola Técnica Joaquim Venâncio. Esses são apenas alguns exemplos da contribuição que Paulo Freire pode trazer para o campo da CI, principalmente para a implementação de uma proposta de socialização da informação. É importante destacar que a Pedagogia do Oprimido, mais especificamente a metodologia de investigação de temas geradores, pode ser utilizada para a formação de contexto comunicativo e desenvolvimento de projeto de socialização da informação. O Projeto Saci considera muitas dessas orientações. Não desmerecendo o trabalho de Habermas, importantíssimo para a socialização da informação no campo da CI, traz-se uma outra via que pode, perfeitamente, contribuir para a formação de um contexto comunicativo adequado, a fim de desenvolver uma proposta de socialização da informação, principalmente se realizada em pequenos ambientes. Segundo Lockhart (1996, p. 64) Em pequenos âmbitos Freire será sempre um guia útil para promover mudanças nas idéias, nas práticas e na consciência social das pessoas.

29 Considerar parte das obras de Paulo Freire para a formação de um contexto comunicativo com condições de desenvolver um trabalho de socialização da informação significa compreender aspectos singelos de socialização do ser humano. Pode-se dizer que essa aparente simplicidade esconde vários elementos que podem minar todo o processo e impedir a realização de um projeto de socialização da informação. Por tratar-se de atividade que envolve o ser humano, observa-se que, para que esse processo ocorra de forma ideal, fazse mister realizar um trabalho de planejamento, ter disciplina, humildade e vontade de estar junto, de se comunicar, de dialogar, o que não se constitui como atividade simples, mas complexa e singular. 5 CONSIDERAÇÕES Este artigo trouxe algumas contribuições identificadas na interface entre a CI, a partir da temática da socialização da informação, e a Educação, com fundamento na pedagogia freiriana. Observa-se que orientações feitas por esse pedagogo já fazem parte de estudos de CI e mostram-se fundamentais para o desenvolvimento de propostas de socialização da informação. Além disso, afirma-se que os procedimentos de investigação de temas geradores expostos na Pedagogia do Oprimido podem ser adaptados, de forma análoga à TAC de Habermas, para a formação de um contexto comunicativo. REFERÊNCIAS CHRISTOVÃO, H. T.; BRAGA, G. M. Ciência da Informação e Sociologia do Conhecimento científico: a intertemacidade plural. Transinformação, Campinas, v. 9, n. 3, p. 33-45, set./dez. 1997. CHRISTOVÃO, H. T.; BRAGA, G. M. Socialização da informação: desenvolvimento de metodologias para a sua efetivação. Estudo aplicado às áreas de Ciência da Informação e Saúde. Projeto Integrado de Pesquisa. Rio de Janeiro: Pós-Graduação em Ciência da Informação; Convênio CNPq/IBICT-UFRJ/ECO, 1994. FREIRE, G. H. Construindo um hipertexto com o usuário. Ciência da Informação, Brasília, v. 29, n. 3, p. 101-110, set./dez. 2000. FREIRE, I. M. A Rede de Projetos do Núcleo Temático da Seca da UFRN como possibilidade de socialização da informação. Info. & Soc.: Est., João Pessoa, v. 14, n. 2, p. 201-216, jul./dez. 2004. FREIRE, I. M. Ampliando o acesso livre à informação: a digitalização do acervo do Núcleo Temático da Seca. Info. & Soc.: Est., João Pessoa, v. 18, n. 2, p. 137-142, maio/ago. 2008. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à pratica educativa. 12. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção leitura).

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