IMPORTÂNCIA SOCIOAMBIENTAL DA CONSERVAÇÃO DO PULSO DE INUNDAÇÃO DO PANTANAL. Por: *Débora Fernandes Calheiros.

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ADM139 IMPORTÂNCIA SOCIOAMBIENTAL DA CONSERVAÇÃO DO PULSO DE INUNDAÇÃO DO PANTANAL Por: *Débora Fernandes Calheiros. Ao longo dos últimos 20 anos a Embrapa Pantanal tem contribuído para informar à sociedade brasileira sobre a necessidade de conservação dos processos hidrológicos que regem o funcionamento e as inter-relações ecológicas características do Pantanal Mato-Grossense e de cada um dos seus rios formadores, pertencentes à Bacia do Alto Paraguai (BAP), salientando sobre a importância dos chamados pulsos de inundação, ou ciclos de cheias e secas anuais e interanuais. Os ciclos de cheias e secas influenciam as relações sociais, culturais e econômicas da população pantaneira e sustentam as atividades econômicas tradicionais da região como a pecuária extensiva, a pesca e o turismo, em especial o turismo de pesca, bem como a qualidade de vida das suas comunidades ribeirinhas e tradicionais, que dependem da saúde ambiental do bioma. Esta saúde ambiental, por sua vez, depende da manutenção do funcionamento hidro-ecológico natural do sistema BAP/Pantanal, resultando na manutenção dos serviços ambientais que os pantaneiros usufruem como o acesso à água em quantidade e qualidade, oferta de alimentos de qualidade como os peixes, acesso à biodiversidade vegetal como a oferta e renovação das pastagens nativas, plantas medicinais, fibras, etc. No entanto, o volume de água e periodicidade das inundações de cada rio formador do Pantanal e, por conseguinte, do pulso de inundação de todo o sistema, tem elevado potencial de alteração atualmente devido à proliferação de centenas de barragens para geração de energia hidrelétrica na área de transição planalto-planície pantaneira sem um adequado planejamento. Atualmente a Agencia Nacional de Energia Elétrica (Aneel) prevê, além das 29 barragens já em operação (7 Usinas Hidrelétricas UHEs, 16 Pequenas Centrais Hidrelétricas - PCHs e 6 Centrais Geradoras de Hidroeletricidade - CGHs), a implantação de mais 87 barragens: 10 em construção (PCHs), 29 em projeto básico (em processo de licenciamento, após a Licença Prévia e antes da Licença de Instalação); 30 estudos de inventários (PCHs), 1/5

17 estudos de inventário de rios e 1 estudo de viabilidade de UHE (esta no rio Coxim MS), perfazendo um total de 116 empreendimentos. Em todo o sistema BAP/Pantanal, cerca de 70% da água tem origem na parte norte da bacia, sendo a subbacia do rio Cuiabá, responsável por cerca de 40% da água de todo o sistema, tendo o rio Cuiabá como o principal afluente formador do Pantanal. Contudo, do total Barragem sendo construída em dezembro de 2007, no rio São de projetos previstos para BAP, Lourenço (MT). Foto: Marlene Mármora 75% estão na região norte, no Estado Mato Grosso, e todos os principais tributários do Cuiabá já apresentam barramento de grande porte (rios Manso/Casca, Itiquira, Correntes e São Lourenço), já sendo constatadas alterações do pulso de inundação no rio Cuiabá pela influência da barragem de Manso. Tais alterações incluem redução na vazão durante o começo das chuvas em cerca de 20% e aumento na fase de seca, resultando em elevação do nível em cerca de 1 m, com implicações ecológicas e socioeconômicas. Desta forma, vislumbra-se um cenário preocupante relacionado ao elevado potencial do conjunto desses empreendimentos alterarem o regime de inundações sazonais e interanuais de forma significativa em toda a planície pantaneira, ameaçando, inclusive, a saúde da principal Unidade de Conservação e Sítio Ramsar do bioma, o Parque Nacional do Pantanal Mato-Grossense, bem como a parte sul do Pantanal, no Estado de Mato Grosso do Sul. Grande parte (73%) do total desses empreendimentos refere-se a Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), todavia localizadas e/ou previstas para um mesmo rio, resultando num impacto conjunto significativo. Além disso, mesmo operando à fio d água, sem necessariamente formar reservatório, há necessidade de barramentos, muitas vezes de altura elevada (10-40 m), resultando em alteração da descarga de nutrientes e material em suspensão e, portanto, da ciclagem de nutrientes, importantes na manutenção da cadeia alimentar 2/5

aquática e na interação terra-água (zona de transição aquático-terrestre, segundo W.J. Junk) que resulta em fertilização do solo, útil, para o desenvolvimento de pastagens nativas, por exemplo. Por outro lado, a presença de uma barreira física sabidamente impede a movimentação das espécies de peixes migratórios na fase de piracema, afetando a produção pesqueira em médio e longo prazo. Os impactos da construção de barragens na conservação de ambientes aquáticos e, por conseguinte, de seus serviços ambientais é uma preocupação mundial. Com base no Princípio da Precaução (Rio 92 - Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento), dever-se-ia previamente discutir tecnicamente a questão, de forma multidisciplinar, e realizar estudos para propor alternativas e ações mitigatórias. Todas as alterações e impactos no funcionamento hidro-ecológico de cada sub-bacia formadora do Pantanal deveriam ser avaliados de forma conjunta e integrada, levando-se em conta a área da bacia hidrográfica do Alto Paraguai e o Princípio de Usos Múltiplos, como determina a Lei de Recursos Hídricos (Lei 9.433/1997), antes de se implementar tais projetos. A multiplicidade de usuários na região inclui ribeirinhos, pescadores profissionais ou amadores, turistas, produtores rurais de pequeno a grande porte, setor de turismo e navegação, além do setor elétrico. O Pantanal Mato-Grossense é considerado Patrimônio Nacional pela Constituição Federal Brasileira (1988) a qual determina que: sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. A UNESCO (2000) denominou a região como Reserva da Biosfera e Patrimônio Natural da Humanidade. Para se discutir esta questão da Embrapa Pantanal coordenou o workshop Influências de usinas hidrelétricas no funcionamento hidro-ecológico do Pantanal, Brasil realizado em julho de 2008 durante o VIII INTECOL Conferência Internacional de Áreas Úmidas, em Cuiabá (MT). A Carta de Recomendações resultante recomenda que o setor elétrico brasileiro e os gestores da área ambiental e de recursos hídricos dos dois Estados e da esfera federal se sensibilizem quanto à fragilidade do ecossistema Pantanal frente às alterações hidrológicas e avaliem a premência de se realizar um estudo prévio como a Avaliação Ambiental Integrada (AAI), para identificar os 3/5

impactos do aproveitamento do potencial elétrico da bacia do Alto Paraguai, antes que novas licenças sejam concedidas. O tradicional critério de gestão de recursos hídricos denominado vazão mínima ou de referência, como valor único, válido para todos os anos e para todas as estações do ano, tem-se mostrado insuficiente e ineficaz para a conservação da qualidade e quantidade de água. A quantidade de água necessária para dar sustentabilidade ecológica a um rio é variável no tempo, e os critérios de definição de vazão remanescente nos rios devem contemplar não apenas as situações de vazões mínimas durante os períodos de estiagem, mas também os outros períodos que caracterizam o regime hidrológico, bem como suas inter-relações ecológicas, o chamado hidrograma ecológico ou vazão ambiental, que leva realmente em consideração informações ecológicas, ou melhor, eco-hidrológicas, como denomina a Organizações das Nações Unidas ONU. A Conferência Internacional sobre Processos Ecohidrológicos e Manejo Sustentável de Planícies de Inundação, organizada pelo Centro Regional Europeu de Ecohidrologia Instituto para Educação para a Água (UNESCO IHE), também em 2008, reforça a importância das áreas úmidas regidas por pulso de inundação, que quando conservadas, proporcionam serviços ambientais como produção de água em quantidade e qualidade, produção de alimentos (pesca) e, consequentemente, geração de renda e emprego, por exemplo, através do turismo, além de minimizar a pobreza e conservar valores culturais das populações locais. Deve-se conciliar conservação e necessidades sociais, além da busca pela formulação de princípios de manejo sustentáveis por meio de políticas públicas com base em ciência multidisciplinar. Nesta mesma linha a Avaliação Ecossistêmica do Milênio (ONU 2005), estudo feito por um grupo de 1.350 cientistas de 95 países, incluindo o Brasil, propõem uma efetiva mudança nos usos dos recursos naturais para garantir a qualidade de vida das atuais e futuras gerações. Recomenda que se evite o excesso de pressões do homem sobre os serviços ambientais de um mesmo ecossistema (bacia hidrográfica, por exemplo), para que não se exceda a sua capacidade de manter o fornecimento desses recursos. Entendemos que a sociedade pantaneira e brasileira precisa ser informada e ter garantido o seu direito de opinar se aceita que a bacia do Alto Paraguai seja 4/5

fornecedora de energia em detrimento da manutenção das funções ou serviços ambientais já tradicionalmente e historicamente usufruídos. A comunidade científica e as organizações não-governamentais regionais, nacionais e internacionais, reunidas no workshop em questão cumpriram, assim, o seu papel de alertar aos tomadores de decisão e à toda sociedade sobre esta problemática que põe em risco a conservação da maior área úmida do planeta, uma vez que a Carta de Recomendações* resultante foi amplamente divulgada para os órgãos gestores federais e estaduais, órgãos colegiados (Conselhos Estaduais e Nacional de Meio Ambiente e de Recursos Hídricos, além do Comitê Nacional de Zonas Úmidas), Ministério do Meio Ambiente/Secretaria de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano, Ministério de Minas e Energia, Agencia Nacional de Energia Elétrica, Empresa de Pesquisa Energética, IBAMA, Agencia Nacional de Águas, Ministério Público Estadual e Federal, bem como imprensa em geral. Débora Fernandes Calheiros (debora@cpap.embrapa.br) é doutora em Ciências pelo CENA/USP e pesquisadora da Embrapa Pantanal na área de limnologia e ecotoxicologia de rios e áreas inundáveis. COMO CITAR ESTE ARTIGO CALHEIROS, Débora Fernandes. Importância socioambiental da conservação do pulso de inundação do Pantanal. Corumbá: Embrapa Pantanal, 2010. 5p. ADM Artigo de Divulgação na Mídia, n.139. Disponível em: <http://www.cpap.embrapa.br/publicacoes/online/adm139>. Acesso em: 28 jul. 2010. 5/5