USADIA CRIATIVA NAS PRÁTICAS DE EDUCADORES MATEMÁTICOS

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Transcrição:

O USADIA CRIATIVA NAS PRÁTICAS DE OUSA ONA EDUCADORES MATEMÁTICOS

I n s u b o r d i n a ç ã o C r i a t i v a Comissão Editorial: Adair Mendes Nacarato Universidade São Francisco Andreia de Oliveira Universidade Estadual de Feira de Santana Antonio Vicente Garnica Unesp/Bauru/Rio Claro Gelsa Knijnik Unisinos Iran Abreu Mendes UFRGN Luiz Percival Leme Britto Ufopa Marcelo Almeida Bairral Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Maria Isabel Ortigão Universidade Estadual do Rio de Janeiro Maria da Conceição F. Reis Fonseca Universidade Federal de Minas Gerais Mauricio Rosa Universidade Federal do Rio de Janeiro Milton Rosa Universidade Federal de Ouro Preto Regina Célia Grando Universidade São Francisco Siobhan Victoria Healy (Lulu Healy) Uniban Vinicio Macedo Santos USP

Beatriz Silva D Ambrosio Celi Espasandin Lopes organizadoras O USADIA CRIATIVA NAS PRÁTICAS DE EDUCADORES MATEMÁTICOS

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Ousadia criativa nas práticas de educadores matemáticos / Beatriz Silva D`Ambrosio, Celi Espasandin Lopes, organizadoras. Campinas, SP : Mercado de Letras, 2015. (Coleção Insubordinação Criativa) Vários autores. ISBN 978-85-7591-352-9 1. Educação matemática 2. Matemática Ensino 3. Prática de ensino 4. Professores Formação profissional I. D`Ambrosio, Beatriz Silva. II. Lopes, Celi Espasandin. III. Série. 15-02933 CDD-370.71 Índices para catálogo sistemático: 1. Professores de matemática : Formação profissional : Educação 370.71 capa e gerência editorial: Vande Rotta Gomide preparação dos originais: Leda Maria de Souza Freitas Farah revisão final: Editora Mercado de Letras DIREITOS RESERVADOS PARA A LÍNGUA PORTUGUESA: MERCADO DE LETRAS VR GOMIDE ME Rua João da Cruz e Souza, 53 Telefax: (19) 3241-7514 CEP 13070-116 Campinas SP Brasil www.mercado-de-letras.com.br livros@mercado-de-letras.com.br 1 a edição abril/2015 IMPRESSÃO DIGITAL IMPRESSO NO BRASIL Esta obra está protegida pela Lei 9610/98. É proibida sua reprodução parcial ou total sem a autorização prévia do Editor. O infrator estará sujeito às penalidades previstas na Lei.

Dedicatória Aos professores que ensinam Matemática e aos formadores desses professores, na esperança de que ousem práticas insubordinadas em prol do direito que todas as pessoas têm de aprender Matemática.

Agradecimentos Ontem um menino que brincava me falou que hoje é semente do amanhã... Para não ter medo que este tempo vai passar... Não se desespere não, nem pare de sonhar Nunca se entregue, nasça sempre com as manhãs... Deixe a luz do sol brilhar no céu do seu olhar! Fé na vida Fé no homem, fé no que virá! nós podemos tudo, Nós podemos mais Vamos lá fazer o que será Gonzaguinha Aos coautores deste volume, que nos agraciaram com seus relatos reflexivos, e aos alunos e professores que compartilharam das práticas aqui relatadas, o nosso muito obrigada e votos de que suas trajetórias sejam de sucesso em Matemática e na vida.

S UMÁRIO SUM SMÁ Apresentação PRáTICAS PEDAGóGICAS INSUBORDINADAS CRIATIVAMENTE 13 Beatriz Silva D Ambrosio e Celi Espasandin Lopes INSUBORDINAçÃO CRIATIVA CONSENTIDA E ESPERADA NA FORMAçÃO DE PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS 21 Maria Auxiliadora B. Andrade Megid A APRENDIZAGEM, A PRáTICA DOCENTE E ALGUNS INDÍCIOS DE INSUBORDINAçÃO CRIATIVA DE PROFESSORAS que ENSINAM MATEMáTICA NA INFÂNCIA 43 Antonio Carlos de Souza e Debora de Oliveira PROFESSORES DE MATEMáTICA EM FORMAçÃO: INVENçõES E (SUB)VERSõES 65 Sônia Maria Clareto e Giovani Cammarota

Algumas insubordinações criativas presentes na prática de uma professora de Matemática 87 Gabriela Félix Brião Nós nos constituímos naturalmente insubordinados e, assim, nosso trabalho também... 103 Conceição Aparecida Cruz Longo A prática colaborativa de uma professora na mediação entre a leitura e a escrita em aulas de Matemática e a insubordinação criativa 133 Regina Célia Grando e Cidinéia da Costa Luvison Insubordinação criativa e tecnologia informática: experiências de ensino e de formação de professores que ensinam matemática 169 Cármen Lúcia Brancaglion Passos e Ana Paula Gestoso de Souza Insubordinações criativas em práticas pedagógicas em modelagem matemática 197 Andréia Maria Pereira de Oliveira e Jonei Cerqueira Barbosa Cyberformação com professores de matemática: desvelando práticas de forma/ação que podem vir ao encontro da insubordinação criativa 221 Maurício Rosa

Insubordinações criativas relacionadas com a ação pedagógica do Programa Etnomatemática 247 Daniel Clark Orey Posfácio Práticas que redimensionam o sucesso em Matemática 269 Beatriz Silva D Ambrosio e Celi Espasandin Lopes Sobre os autores 285

P Apresentação RÁTICAS PEDAGÓGICAS PRÁT PINS INSUBORDINADAS CRIATIVAMENTE Beatriz Silva D Ambrosio Celi Espasandin Lopes Aquele mestre ensina justamente aquilo Que não me interessa saber Esquece de dizer - meninos nossa sina é saber viver Impõe, implora, impera e vocifera É que ele tem a vara de condão Da transformação, da conformação, da educação, da revolução É que são tantos verbos de persuadir De sujeitar o sujeito a não existir É que são tantos objetos indiretos Condicionais do porvir (Ednardo) 1 E tantos verbos de persuadir requerem os verbos de ousar. De provocar o sujeito a significar sua existência pela contraposição ao que está posto, de forma a atender as suas reais necessidades. Assumir insubmissões é 1. Disponível em: http://letras.mus.br/ednardo/810663/?domain_redirect=1. 13

exercer o direito à liberdade de pensar, de questionar, de buscar respostas... a fim de se desenvolver cada vez mais. Se nosso foco é a aprendizagem matemática de toda e qualquer pessoa, que práticas teremos que assumir para que este objetivo seja alcançado? Seremos ousados em pensar sobre qual matemática se deseja aprender? Confrontaremos o currículo prescrito e a realidade de nossas turmas? Criaremos alternativas avaliativas que dialoguem mais com o processo do que com o produto? Que ações insubordinadas assumiremos para formar pessoas que utilizem o conhecimento matemático em prol da dignidade humana? Esses questionamentos remetem à ousadia em aceitar que a Matemática escolar é apenas uma maneira de se ver a Matemática; podemos considerar outras formas de entendê-la. Como nos adverte Freire (1996), precisamos estar atentos à séria possibilidade que temos de docilmente aceitar uma verdade distorcida, pois a capacidade de penumbrar a realidade pode nos conduzir a assumir uma prática em Educação Matemática que não dialoga com as necessidades das pessoas com quem assumimos o compromisso da formação, seja em qual nível de ensino for. Adotar práticas que incorporem novas perspectivas, como a Etnomatemática, a Modelagem Matemática, a Educação Estocástica, a Educação Tecnológica... dentre outras, é romper com o pragmatismo pedagógico (Freire 1996) e proporcionar múltiplas visões sobre o que vem a ser o fazer matemático. Tais considerações nos direcionaram a convidar alguns colegas da Educação Matemática a produzirem relatos sobre suas práticas que apresentem interface com o conceito de insubordinação criativa. Em seus textos eles apresentam novas possibilidades para questionar o que é possível e importante ser trabalhado na Educação Básica. Expõem uma perspectiva de uma Matemática que se faz rica, ao dialogar com a realidade do aluno, ao 14

adotar práticas que permitem ao aluno ser ativo e investigador em seu processo de construção do conhecimento. A ruptura com o pragmatismo pedagógico permite um conhecimento produzido que não pode ser antecipado e uma apropriação de saberes que ocorre por trajetórias que, embora sejam individualizadas, são sempre compartilhadas. No capítulo 1, Megid, ao abordar a formação de professores dos anos iniciais, faz uma discussão sobre a falta de habilidade e de segurança no trabalho com a Matemática na infância e apresenta sua proposta de uma insubordinação ao vivido, ou ao mal vivido, consentida pelos professores com os quais é compartilhada nos momentos de formação. Ela revela sua compreensão sobre uma insubordinação continuada e organizada, ao relatar o trabalho com um grupo de professoras que já atuam em diferentes espaços docentes e que se reúnem para discutir suas ações pedagógicas. Seguindo a discussão sobre a insubordinação criativa de professores que ensinam Matemática na infância, Souza e Oliveira nos contam sobre suas pesquisas de doutorado, quando desenvolveram trabalhos com grupos formados por professoras que lecionam para a Educação Infantil e os anos iniciais do Ensino Fundamental. Eles investigaram as contribuições de processos de aprendizagem docente centrados na reflexão sobre a prática, a partir de espaços formativos, nos quais se discutiu a Estocástica. Os autores, ao realizarem uma releitura de seus relatórios de pesquisa, percebem que as professoras que participaram dos espaços formativos gerados por suas pesquisas apresentaram indícios de insubordinação criativa: o relato que elas fazem de seus processos reflexivos sobre suas práticas revela a autonomia adquirida e a importância do trabalho colaborativo na redimensão de seus fazeres pedagógico e investigativo. 15

Perseguindo ainda a ideia de formação inicial de professores que ensinam Matemática na Educação Básica, Clareto e Cammarota trazem o diálogo com as versões e (sub)versões sobre esse processo. Os autores discutem a invenção na Matemática, elucidando a desnaturalização de saberes cristalizados nesta ciência. Promovem uma reflexão sobre a desnaturalização de uma matemática exata e verdadeira, que é também a medida de todas as inteligências. Revelam sua insubordinação diante da política cognitiva da recognição, que opera na aprendizagem matemática. Para elucidar a prática pedagógica de uma professora subversivamente responsável que atua na formação inicial do professor de Matemática, temos o capítulo de Brião. Com o objetivo de formar pessoas mais ousadas, a autora provoca a insubordinação criativa dos futuros professores diante do fazer matemático, considerando que, se eles assumirem tal perspectiva em suas futuras práticas, poderão influenciar esse movimento de libertação de ideias em seus futuros alunos. Ao chegarmos ao capítulo 4, nos deparamos com o relato de Longo, que expõe seu processo de constituição como pessoa naturalmente insubordinada e criativa. Ela discute o uso do livro didático, a prática com modelagem matemática e suas criações no trabalho com geometria e com o uso da calculadora. A autora traz para reflexão a importância de o professor assumir práticas que honrem seu compromisso de gerar a aprendizagem matemática de seus estudantes, assumindo atitudes de insubordinação criativa sempre que necessário. No texto seguinte, Grando e Luvison trazem a prática de colaboração e de pesquisa entre elas; a primeira, como professora da universidade e a segunda autora, como professora da escola. O foco do estudo relatado centra-se no trabalho com leitura e escrita em aulas de Matemática e na forma como tais práticas possibilitam 16

uma insubordinação criativa. As autoras evidenciam que a prática de dar liberdade ao pensamento do aluno por meio do registro no diário de aprendizagem possibilita que ele olhe para a sua condição de aprendiz e reconheça o quanto ele foi importante para que a aula acontecesse. Essa prática pode ser considerada de insubordinação criativa diante do que está posto tradicionalmente na escola, em que os alunos apenas reproduzem o texto produzido pelo professor. Com esse trabalho, superam-se a opressão e o silenciamento, tornando o aluno coautor, de fato, do processo de ensino e aprendizagem. Na mesma perspectiva de trabalhos colaborativos entre professores da universidade e professores da escola, a produção de Passos e Souza apresenta discussões sobre a tecnologia informática na formação de professores e no ensino de Matemática nos anos iniciais. As autoras relatam experiências vividas por meio de episódios que consideram significativos em sua constituição profissional e evidenciam a composição de um grupo com professores dos anos iniciais e graduandos. Elas consideram que as ações desenvolvidas durante seus estudos são criativas e críticas em relação à formação matemática dos professores dos anos iniciais, já que os futuros professores são ouvidos e reconhecidos como produtores de conhecimento. Destaca-se, a partir desse estudo relatado pelas autoras, que a prática dos formadores de professores requer ousadia no ato de formar, assumindo ações de insubordinação criativa diante de qualquer passividade que se faça presente no processo de formação docente. Ao adentrarmos o sétimo capítulo, nos deparamos com o texto envolvente de Oliveira e Barbosa, que tem o foco sobre as práticas pedagógicas em modelagem matemática como um ambiente de aprendizagem que provoca os estudantes a investigar, por meio da Matemática, problemas oriundos de outras áreas do conhecimento ou do cotidiano. Os autores reconhecem que a inserção da 17

modelagem matemática pode ser reveladora de insubordinação criativa, pois promove alterações no conteúdo e na forma da comunicação matemática em sala de aula. Eles destacam o potencial da insubordinação criativa no ambiente de modelagem, pelo fato de instigar professores e estudantes a romperem com as regras de produção dos textos já presentes e consolidados historicamente nas práticas pedagógicas. Rosa também nos brinda com um escrito sobre a formação de professores diante das tecnologias. Ele apresenta o conceito de Cyberformação com professores de Matemática e discute como este vai ao encontro da concepção de insubordinação criativa. Considera que o professor de Matemática em Cyberfomação está em constante movimento e a todo momento é incentivado a vislumbrar elementos técnicos, mas sempre considerando a sua evolução pessoal, social, cognitiva e cultural. A interface da Cyberformação com a insubordinação criativa se estabelece ao promover a criatividade tecnológica, ao invés da concepção enraizada de domínio completo de uma tecnologia. No último capítulo produzido por nossos coautores, temos as articulações promovidas por Orey, no que se refere às insubordinações criativas e à ação pedagógica do Programa Etnomatemática. O autor entende a Etnomatemática como um programa de pesquisa surgido em oposição ao discurso dominante e eurocêntrico na Educação Matemática e, portanto, pode ser considerado como uma proposta pedagógica que auxilie os alunos de grupos culturais distintos a terem acesso ao discurso matemático acadêmico. Para ele o estudo das práticas matemáticas desenvolvidas pelos membros de grupos culturais distintos pode ser entendido como uma posição de resistência, a qual requer dos professores flexibilização de suas práticas pedagógicas institucionalizadas, por meio da contextualização das atividades cotidianas. Esse movi- 18

mento caracterizador dessa prática é marcado por ações de insubordinação criativa. Para finalizar o volume 3, nós, autoras desta apresentação e organizadoras deste volume, trazemos reflexões sobre o sucesso em Matemática, a partir de considerações emergentes das leituras dos capítulos apresentados no decorrer da obra. Manifestamos nossas percepções sobre como as práticas pedagógicas em Matemática, marcadas por ações de insubordinação criativa, podem gerar a formação de pessoas com êxito, pelo movimento que elas dão ao conhecimento matemático em suas vidas. Toda pessoa que considere a necessidade do saber matemático em prol de sentir-se mais segura para discutir e refletir sobre o contexto pessoal e profissional em que exerce sua cidadania irá curvar-se ao desafio de exigir seu direito de aprender Matemática. Não é possível que a maioria das pessoas prefira a obediência à insubordinação de tornar-se efetivamente capaz de pensar e fazer matemática. É preciso repelir a ideia de que o conhecimento matemático é apenas para alguns, para aqueles que supostamente foram dotados de uma forma diferenciada de pensar. Todo homem e toda mulher são dotados de inteligência e precisam requerer seu direito à liberdade de pensar a Matemática de seu jeito, tornando a não submissão mais vantajosa que a submissão (Tolstói 2010 2 ). Aos leitores deste volume desejamos ousadia para trilhar caminhos subversivos, a partir das múltiplas leituras a serem realizadas. 2. Tolstói, L. (2010). A insubmissão, in: Coelho, P. A. (org.) A insubmissão e outros escritos Tolstói. Cotia: Atêlie Editorial, pp. 29-42. 19